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Jornal de Psicanálise

versión impresa ISSN 0103-5835

J. psicanal. vol.47 no.87 São Paulo dic. 2014

 

CARTA-CONVITE

 

Transmissão da psicanálise e regulamentação

 

 

O Jornal de Psicanálise tem como vocação histórica funcionar como uma caixa de ressonância dos importantes momentos institucionais. Foi e ainda se presta a ser palco de reflexões e discussões, bem como berço para o surgimento e circulação de novas ideias. Com esse intuito, propusemos como o tema do número anterior "A transmissão da psicanálise e a prática analítica atual", trazendo para nossos meios a discussão realizada no "XVII Encontro de Institutos da FEPAL".

A quantidade de artigos recebidos e o excelente debate ocorrido no "I Encontro do Instituto e Jornal de Psicanálise", no dia 29 de março de 2014, mostram a relevância do tema entre nós. Acreditando termos identificado uma demanda coletiva em estado latente sobre o tema da "Transmissão da psicanálise" em nosso Instituto, julgamos oportuno aprofundar essa discussão, ampliando o seu campo de reflexão para outras direções. Tal proposta, que não havia sido planejada previamente, é fruto do encontro entre o trabalho editorial do Jornal de Psicanálise e da resposta que obtivemos por parte dos leitores e dos membros da SBPSP.

Para tanto, propusemos a realização de uma trilogia sobre o tema em questão: "Transmissão da psicanálise e a prática analítica atual" (n. 85), "Transmissão da psicanálise e regulamentação" (n. 86) e, por último, "Transmissão da psicanálise e análise das instituições" (n. 87).

O termo transmissão utilizado nos títulos desta trilogia visa assimilar a complexidade dos processos imbricados no tornar-se analista. Ele traz consigo a ideia de transição, de passagem entre dois pontos. Traduz, desse modo, um eterno movimento, o da rede de identificações mobilizadas pelo percurso institucional, o de tornar-se psicanalista a cada novo encontro analítico e muitos outros.

O tema "Transmissão e regulamentação" foi pensado tendo em vista que um dos elementos do enquadre em que se dá a transmissão é sua regulamentação. Se, por um lado, as regras são imprescindíveis para o funcionamento institucional, seu excesso ou o apego rígido a elas, por outro lado, pode também tornar-se obstrutivo à promoção de um espírito crítico e criativo nos analistas que buscam a formação.

A tensão constante e infindável entre a liberdade do analista e a observação aos regulamentos (Instituto) e estatutos (Sociedades), entre o singular e o plural, certamente não é circunscrita às questões institucionais da formação. Em uma esfera mais ampla, atinge a dinâmica institucional e, de forma mais ampla ainda, atinge também o problema que se coloca sobre a psicanálise como profissão a ser regulamentada ou não pelos órgãos oficiais.

Mas essa tensão atinge, sobretudo, nosso cotidiano de prática clínica: como trabalhamos e "escutamos" o setting criado e recriado com cada paciente. A mera reprodução de teorias já consagradas, com ausência de uma apreensão criteriosa de seus fundamentos, traz o risco de imposição aos pacientes dos modelos e compreensões preexistentes. O singular da relação fica, desse modo, excluído. Ao mesmo tempo, se consideramos próprio da psicanálise sua reinvenção a cada encontro, não podemos desconsiderar as invariâncias que tornam tal reinvenção possível. A polarização entre uma ou outra perspectiva poderia ocultar uma tentativa de resolver uma tensão e um paradoxo que em si mesmo é insolúvel.

Assim, o número sobre "Transmissão da psicanálise e regulamentação" pretendeu apresentar os trabalhos e as questões que surgiram no "I Encontro do Instituto e Jornal de Psicanálise" e receber o que os colegas de dentro e de fora da SBPSP estão produzindo sobre tais apontamentos.

Passamos agora ao terceiro eixo desta trilogia: "Transmissão da psicanálise e análise das instituições". Resolvemos antecipar seu anúncio para que o prazo de preparação dos artigos seja maior e, portanto, os colegas se sentissem mais estimulados a participarem do último número da trilogia.

Toda instituição tem um espaço psíquico próprio, cuja dinâmica solicita a compreensão por parte de seus membros. Como afirma Käes:

As instituições, com efeito, reúnem e ligam em combinações variáveis, e gerenciam com destinos diversos formações e processos heterogêneos: sociais, econômicos, culturais, políticos e psíquicos. Níveis de realidade e lógicas de ordem distinta interferem nesse fenômeno compósito, inextricável e, no entanto, unificado e unificante, total, na perspectiva de M. Mauss. (1991, p. XVI)

Por isso, quando a instituição se encontra em situações de impasse ou de polarizações, torna-se difícil o trabalho conjunto entre os diversos grupos internos.

Caberia, assim, aos institutos de formação garantir espaços para pensar sobre seus funcionamentos internos e externos, suas inevitáveis zonas de não ditos, seus contratos narcísicos e demais elementos inconscientes que escapam a qualquer formalização ou regulamentação.

Desta forma, procurando dar palavras e tornar pensáveis demandas latentes entre nós, lançamos aqui este convite duplo a todos os membros da SBPSP, colaboradores de outras instituições e demais leitores que se proponham a contribuir com o debate sobre a "Transmissão da psicanálise", seja qual for a vertente escolhida entre as duas que complementam esta trilogia.

Lembramos que o Jornal também está aberto ao envio de artigos temáticos, não temáticos e de resenhas. Os trabalhos devem seguir a orientação editorial e normas para publicação que se encontram no final de cada número e devem ser enviados para o próximo número até o dia 30 de abril de 2015 pelo correio eletrônico jornaldepsicanalise@SBPSP.org.br.

 

Equipe editorial
Marina Massi, Editora
Abigail Betbedé
Alexandre Socha
Any Trajber Waisbich
Gustavo Gil Alarcão
Heloisa Helena Sitrângulo Ditolvo
Maria do Carmo Meirelles Davids do Amaral
Suzana Kiefer Kruchin

 

Referências

Käes, R. (1991). A instituição e as instituições: estudos psicanalíticos. São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

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