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Jornal de Psicanálise

versión impresa ISSN 0103-5835

J. psicanal. vol.50 no.93 São Paulo dic. 2017

 

SONHOS

 

A ponte com Isabela: construção da figurabilidade

 

Building bridges with Isabela: the work of figurability

 

Haciendo un puente con Isabela: construcción de la figurabilidad

 

Un pont vers Isabela: la construction de la figurabilité

 

 

Bruna Paola Zerbinatti

Psicanalista, mestre e doutora em Semiótica e Linguística geral pela USP e Supervisora do Núcleo Psicanálise com Crianças do Centro de Estudos Psicanalíticos. São Paulo. brunapaola@uol.com.br

 

 


RESUMO

Este trabalho tem como ponto de partida uma experiência clínica. A partir da narração de uma vinheta de atendimentos ocorridos com Isabela, uma menina de nove anos, a autora procura pensar o que ocorreu na sessão teoricamente. Para tanto, utiliza-se do conceito de figurabilidade tal como trabalhado pelo casal Botella com base em "A interpretação dos sonhos" de Freud. Em um segundo momento, pensa-se na imbricação entre a experiência clínica, a teoria e a escrita do caso por meio de uma breve discussão a respeito do momento de figurabilidade como uma construção diacrônica ou como um "pequeno milagre", seguindo a denominação de Jay Greenberg.

Palavras-chave: figurabilidade, sonho, construção


ABSTRACT

This paper starts from a clinical experience. The author's purpose is to think theoretically about what she has both experienced and observed in her sessions with Isabela, a nine-year-old patient. In order to build her theory, the author uses the concept of figurability as it has been proposed by César and Sara Botella, based in Freud's work in "The interpretation of dreams". In this paper, the author establishes connections between clinical experience, theory, and the writing of this clinical case, by discussing the work of figurability as either a diachronic work or a "relational miracle", as it was called by Jay Greenberg.

Keywords: figurability, dream, construction


RESUMEN

Este trabajo tiene como punto de partida una experiencia clínica. A partir del relato de una viñeta de sesiones de análisis de Isabela, una niña de nueve años, la autora se propone pensar, desde un punto de vista teórico, lo que ocurrió en la sesión. Para eso, utiliza el concepto de figurabilidad, tal como es concebido por los Botella, a partir de "La Interpretación de los Sueños" de Freud. A continuación, enfoca la imbricación entre la experiencia clínica, la teoría y la escritura del caso a través de una breve discusión sobre el momento de figurabilidad como una construcción a lo largo del tiempo o como un "pequeño milagro", siguiendo la denominación de Jay Greenberg.

Palabras clave: figurabilidad, sueño, construcción


RÉSUMÉ

Ce travail prend pour point de départ une expérience clinique. Fondée sur une vignette clinique qui présente Isabela, une petite fille de neuf ans, l'auteur cherche à comprendre théoriquement ce qui s'est passé pendant quelques séances. Pour ce faire, on convoquera le concept de figurabilité tel qu'il est développé par le couple Botella, basé sur "L'interprétation des rêves", de Freud. Dans un second temps, on envisagera l'imbrication entre l'expérience clinique, la théorie et l'écriture de ce cas clinique, à la lumière d'une brève discussion concernant le moment de la figurabilité, celle-ci vue comme une construction diachronique ou comme un "petit miracle", selon l'expression de Jay Greenberg.

Mots-clés: figurabilité, rêve, construction


 

 

Isabela e a ponte

Isabela tem nove anos. Desde o começo, pergunto-me com frequência que tipo de trabalho podemos realizar juntas, indagação que encontra momentos de arrefecimento, mas que em outros volta com certa força. A mãe a traz com uma queixa puramente escolar: Isabela não sabe ler e escrever e a mãe teme que ela repita de ano. A professora da escola vai ainda mais longe: Isabela não só não sabe ler e escrever como por vezes não sabe pensar, embora não consiga explicar bem o que isso significa.

Quando recebo Isabela, encontro uma menina articulada, com um bom vocabulário e que sabe, sim, ler e escrever, embora prefira não fazê-lo. Ao longo do tempo, crio a hipótese de que as dificuldades são menos de alfabetização do que de simbolização: parece que algo falha na sua capacidade de representar. Isso fica mais claro quando, em um jogo de cartas, Isabela sorteia uma repleta de instruções. Ela me pede para lê-las e naquele momento eu digo: "Ah, inventa! Inventa o que pode estar nessa carta." Então ela lê, compreende as instruções e prosseguimos o jogo. Ler é mais fácil do que inventar.

Assim, os jogos estruturados, com regras, são-lhe fáceis e agradáveis bem como a conversa sobre as histórias que percorreram sua semana. Incomoda-me que todo esse discurso verbal bem articulado pareça o discurso de um outro; é como se Isabela nunca estivesse em suas palavras nem no seu modo de dizê-las (considerando ritmo, entonação, prosódia etc).

Quando vamos em direção aos jogos menos estruturados, as dificuldades aparecem. Embora diga que gosta de desenhar em casa, os desenhos que faz na sessão são torturantes. Primeiramente, decidir o que desenhar é extremamente angustiante. Muitas vezes opta por desenhar a analista e é preciso que cuide de todos os detalhes para reproduzir uma cópia fiel de mim. A primeira manipulação da massa de modelar é bidimensional: árvore, nuvens, sol e flor colocados como um desenho em uma folha sulfite.

Entendo que o "tema livre" é para ela tão insuportável que a desampara, deixando nós duas em uma vivência de muita solidão e distanciamento, embora seja ela mesma que escolha as atividades não-estruturadas. Assim sendo, pouco a pouco, tento ao longo das sessões "ajudá-la" um tanto, estando muito presente com ela e às vezes propondo figuras e temas gerais para desenvolvermos juntas quando ela me pede por isso. Esses temas eram tirados com certa liberdade de elementos que apareciam no "aqui e agora" daquela sessão.

Quando sinto avançarmos um pouco na construção de nossas histórias, na sessão seguinte Isabela volta tendo "esquecido" como se jogam todos os jogos que conhece de cor e por vezes esquece até mesmo meu nome, como se fosse tomada de um branco. Essa alternância, bastante extrema, lança-me em um sentimento de impotência e de impasse, com muita incerteza sobre o que está ocorrendo. Isabela sabe e não sabe ler, sabe e não sabe escrever, sabe e não sabe jogar, sabe e não sabe pensar...

Durante uma sessão, Isabela trouxe esboços de uma história em quadrinhos que deveria fazer na aula de artes para um concurso que ela queria muito ganhar, e mostrou-me frases muito desconexas que não formavam uma narrativa. O desenho da hq também era bastante confuso. Ficava muito angustiada de não conseguir fazer encadeamentos e pensar em algo que quisesse narrar. Na sessão seguinte, sua mãe havia construído uma história "correta" acompanhada de um desenho bastante bonito de Isabela, mas não era uma história terminada e, quando pensamos no final, os caminhos por onde Isabela queria ir diferiam bastante daquele proposto pela mãe e, com o aumento da tensão, abandonou o projeto na sessão.

Meses se passam nesse ritmo de lembrar e esquecer até que em uma sessão, Isabela pega a massa de modelar, divide o conteúdo em dois me dando metade e pega duas folhas de papel, uma para cada, para fazermos nossa produção em cima delas "para não sujar". Começamos apenas entrando em contato com o material, manipulando sem chegar a uma forma. Pergunto o que ela vai fazer e ela começa repetindo exatamente o que havia feito da última vez, já alguns meses atrás: bonecos de neve. Antes mesmo de começar o primeiro desiste e pergunta o que vou fazer. Sinto naquele momento que Isabela precisa de fato que eu "faça" algo por ela, que eu "comece" algo realmente novo para nós duas.

Surpreendendo até a mim mesma, decido fazer uma ponte. Isabela se anima imediatamente e começa então a fazer uma história: em torno da ponte haverá a história do monstro do lago. Assim, fazemos a ponte, o lago, os peixes, o monstro e sua família, os jornalistas... Uma série de figuras são criadas e, em determinado momento, Isabela não quer mais que eu continue ajudando-a com a massinha, quer que eu escreva a história que ela está criando, deixando-me então como relatora.

Recriamos o cenário e a história durante mais três sessões, até chegarem as férias de verão. Isabela torna a ponte, onde tudo sempre começa, cada vez mais sofisticada, procurando novos materiais e misturando-os, colocando peças de Lego e blocos de madeira, criando novas sustentações. Continuo no papel de escrever a história, com personagens que vão ganhando nome e se relacionando entre si. Isabela se surpreende com o tamanho da história, já ocupando várias páginas e repete muitas vezes com brilho nos olhos: "nossa! Eu não sabia que eu tinha ideias! Eu até que estou tendo ideias! A história está ficando grande!"

Na última sessão de antes das férias, Isabela, que sempre desmancha o que foi feito sem questionamentos, pede para guardarmos o que produzimos em um lugar que ninguém pudesse ver, para retomarmos no retorno. Após a volta das férias, a análise é interrompida abruptamente, de modo que não pudemos tirar a história e a massinha da caixa em que as havíamos guardado.

 

A figurabilidade

O que ocorreu naquela sessão que parece ter causado uma mudança importante? Teoricamente, é possível pensar que trata-se de um momento de figurabilidade na analista que promoveu a superação de um impasse momentâneo. Tomamos o conceito de figurabilidade conforme trabalhado por César e Sára Botella, em La Figurabilité Psychique (Botella & Botella, La figurabilité psychique, 2007), a partir do capítulo 6 de "A interpretação dos sonhos", de Freud (Freud, 1900/2013). O termo aparece em Freud como um dos procedimentos de trabalho do sonho ao lado do deslocamento, condensação e elaboração secundária.

Freud se dedicou pouco à figurabilidade dando ênfase à interpretação. Entretanto, quando lidamos com núcleos não-representados, a interpreta- ção se mostra de pouca valia, já que falta uma etapa anterior na constituição do sujeito. Tais núcleos, proeminentes nos chamados casos-limites, também se encontram por vezes na análise de neuróticos e exigem do analista a capacidade de figurabilidade não possível para o paciente, para que, posteriormente, possa haver uma interpretação do representado.

O casal Botella propõe diferentes - porém complementares - definições do conceito ao longo de sua obra, sendo para eles uma fonte de pesquisa bastante fecunda. Na versão brasileira de seu livro, a figurabilidade aparece como "o produto de um trabalho psíquico diurno comparável ao do sonho, com seu percurso regrediente resultando numa percepção interna próxima da alucinação do sonhador" (Botella & Botella, Irrepresentável: mais além da representação, 2002, p. 26)

O que está em jogo na figurabilidade é que, a partir de um processo regressivo do analista (os autores preferem o termo regrediente), semelhante ao do trabalho do sonho, torna-se possível ascender a uma condição quase alucinatória que permite a emergência de uma figuração para conteúdos até então não-representados. Para haver representação, é necessário primeiramente haver inscrição, o que coloca em jogo as relações entre a alucinação como uma percepção sem objeto e a representação como sendo da ordem do que foi recalcado.

Assim, afirmam os Botella que não é a perda do objeto mas o perigo da perda de sua representação e, por extensão, o risco de não-representação que marca o desamparo. É preciso notar que, diante de pacientes que apresentam esses estados, o analista também se sente muito impotente e desamparado, como se corresse o risco de entrar na mesma condição.

Para desenvolver o conceito, os autores apresentam o caso de Thomas, um menino de quatro anos submetido a muitas hospitalizações até os dois anos de idade, que apresenta uma terrível angústia de despersonalização ao final das sessões. A analista tenta todo tipo de interpretação e intervenção ao longo dos encontros, mas nada alivia a criança, e a própria analista se sente esvaziada. Em uma das sessões, diante do menino "pálido, imóvel, com olhar desvairado, a própria imagem do terror" ela tem um flash, um pesadelo acordada com um lobo e pergunta ao menino se ele tem medo do lobo, imitando o animal. O menino fica com medo, mas a confusão desaparece e ele vai embora. Na sessão seguinte, a analista traz de volta o lobo no final da sessão e ele já não sente a mesma despersonalização diante da separação. Posteriormente, o lobo pôde se tornar uma representação e uma história, sendo utilizado em uma interpretação. A figurabilidade do lobo na analista pôde dar um sentido ao sentimento de desamparo da criança, incapaz de tal "sonho".

Com Isabela, eu me sentia menos exposta ao terror do que ao vazio, a despersonalização estava presente naqueles momentos de esquecimento completo e na incapacidade de criação. Quando Isabela não sabia nem meu nome, minha existência como analista também estava ameaçada, a dupla quase que deixava de existir bem como todo o trabalho já realizado. Era como se tivéssemos que recomeçar a cada duas sessões. Entretanto, não era um recomeço do zero, porque alguma coisa voltava a funcionar, a prosseguir, até que desabasse mais uma vez. Eu sabia que não podia deixá-la mas sabia pouco o que poderia fazer com ela.

Acredito que neste caso também havia uma série de elementos não-representados que a impediam de narrar, de criar histórias. A ponte que surge no meu psiquismo, desta vez aparentemente desconectada dos elementos que apareciam nas sessões, parece ter podido inscrever algo não-representado, tanto que depois virou uma longa história.

É possível pensar na figura da ponte de diversas maneiras: no après-coup, encontro um fragmento de sonho que havia tido naquela noite em que deveria fazer a travessia de uma ponte e tinha medo. Talvez eu já estivesse então "sonhando" Isabela mesmo antes da sessão, embora no momento em que a figurabilidade aparece, não me lembrasse do sonho.

Não se pode deixar de notar também o que sugere a figura: a ponte, precisamos construir entre nós, as ligações que precisamos estabelecer entre conteúdos e entre sessões que variam de construções ao esquecimento completo do que foi construído. A ponte também pode ser entendida como a ligação possível dos elementos que se encontravam desligados e que finalmente ganham uma possibilidade de representação pela ligação. Todas essas explicações poderiam ser satisfatórias, no entanto, a força sensorial da cena parece ultrapassar os sentidos que podem ser desenvolvidos a posteriori.

Fica uma questão a ser pensada: ponte ou lobo, por que aquela figura naquele momento específico produz um efeito após tantas outras tentativas fracassarem? Trata-se de um "pequeno milagre" ou produto de uma construção?

 

Entre a construção e o "pequeno milagre"

O termo "pequeno milagre" aparece de forma crítica na fala de Jay Greenberg a partir dos trabalhos de Phillip Bromberg (2000) referindo-se aos casos relatados por diversos psicanalistas relacionais que descrevem "pequenos milagres" de enactments ocorridos com a dupla analítica, caracterizados pela espontaneidade e surpresa, sendo portanto, irrepetíveis. Greenberg (2001) aponta para o risco de um excesso na participação do analista nos relatos de casos que se servem exclusivamente de tais procedimentos para se escrever sobre as análises.

Embora os autores se concentrem mais nos enactments da tradição americana, na tradição francesa - com a figurabilidade do casal Botella e a quimera de Michel de M'Uzan (1994), por exemplo - também aparece a marca da surpresa e de uma certa espontaneidade. O analista é "tomado", em uma posição mais passiva, ou com dizem os Botella:

Quando em situações-limite, de uma maneira inesperada, totalmente involuntária, o pensamento do analista regride para além da atenção flutuante e quando suas representações de palavra tendem a ser desinvestidas, pode surgir um acidente de pensamento, uma ruptura com os princípios de organização do mundo das representações. (Botella & Botella, 2007, p. 84)

Não é possível negar que haja certa espontaneidade e surpresa na aparição da imagem tanto do lobo quanto da ponte, para tomar os exemplos aqui explorados. Entretanto, embora aparecendo como uma irrupção, um acontecimento sem rastros lógicos sobre a figura em si, existe um processo por trás do momento sentido quase como "mágico" ou como "pequeno milagre" que o sustenta e que fornece as condições para que a figurabilidade emerja. É preciso criar condições para o sonho, algo que faltava tanto em Isabela como em Thomas.

Assim, trata-se menos de milagre que de construção. Nos relatos de caso contemporâneos, nota-se que a descrição dos casos não é de uma imagem, de uma figura ou de uma reverie que aparece em um início de análise. As descrições são sempre de um longo tempo de trabalho até que se chegue a tal momento. Em geral, tendemos a interpretar que esses tais longos anos de trabalho referem-se a uma possibilidade do analista de chegar a uma tal construção. Penso, no entanto, que deve-se a um caminho da dupla, que cabe também ao paciente desenvolver certa capacidade de se instalar na mente do analista para que este seja capaz de produzir as figuras que podem vir a ser representadas.

Com Isabela, eu me deixava - e nos deixava - livre para produzir fosse na modelagem ou no desenho as figuras que me viessem à mente, mas elas estavam todas de algum modo ligadas ao universo de Isabela ou ao menos ao universo das figuras que apareciam em nossas sessões, ao contrário da ponte, que surge exclusivamente do psiquismo da analista. Entretanto, creio que a figurabilidade da ponte só pode ser totalmente aproveitada porque antes de eu poder chegar a figurar a ponte, já havíamos procurado uma série de outras figuras, que pouco a pouco constituíram-se como alicerces desta ponte que pôde enfim estabelecer as ligações faltantes, essa ponte entre o branco e alguma capacidade de narração. Nesse sentido, não há um "pequeno milagre" que faz mudar toda a análise, mas uma construção paulatina, quase invisível, que pôde finalmente se revelar em todo seu esplendor. Foi preciso muito trabalho de ambas para que esse momento de virada sobreviesse, ainda que, quando ocorrido, tenha a força de um acontecimento totalmente inesperado.

Trata-se, portanto, sobretudo de um processo e não de um "momento", e, ainda pensando com os Botella, um processo fundamental do trabalho do sonho, em que a figurabilidade do analista,

traçando novas ligações na simultaneidade dos campos e níveis múltiplos e variados da sessão, produzirá uma inteligibilidade quase alucinatória das ligações entre os efeitos representáveis e os efeitos re-perceptíveis do discurso do analisando, entre a transferência e a contra-transferência, mas igualmente com todo um "material perceptivo atual" indo da percepção sensorial e das impressões corporais do momento aos "restos", no sentido de restos diurnos das sessões precedentes. (Botella & Botella, La figurabilité psychique, 2007, p. 84)

É preciso lembrar que tudo isso que chamamos de processo, que se constrói ao longo do tempo, que envolve sentimentos de desamparo e impotência por parte não só do analisando como do analista e que podem eventualmente originar um momento de virada é apenas uma parte do trabalho analítico destes pacientes, já que somente a partir da representação é que haverá uma análise mais clássica, baseada na interpretação dos conteúdos.

Se o sintoma dos relatos de caso contemporâneos é a escrita do "pequeno milagre", talvez a explicação seja a da necessidade de escrevê-lo para tentar dar-lhe um sentido processual, representá-lo no seio de uma teoria que foi criada com base na interpretação. Não estaríamos longe da velha tensão entre força e sentido, (fundamental para a teorização de André Green), que para além de seu estatuto metapsicológico, encontra também na escrita de um caso a tentativa de dar sentido a uma experiência emocional vivida em sessão, de transpor as "forças" da vivência de um momento com um paciente para o domínio do sentido, um sentido que possa ser minimamente organizado e comunicável.

Tal foi a tentativa deste trabalho. A partir do relato de uma experiência clínica, houve o intuito de pensá-la teoricamente e, posteriormente, de pensar a imbricação entre a experiência clínica, a teoria e a escrita do caso. Se, como diz Green, "o afeto é um movimento em busca de uma forma" (Green, 1995, p. 100), ficam aqui as marcas de uma busca de pontes possíveis.

 

Referências

Botella, C., & Botella, S. (2002). Irrepresentável: mais além da representação. Porto Alegre: Criação Humana.         [ Links ]

Botella, C., & Botella, S. (2007). La figurabilité psychique. Paris: Éditions In Press.         [ Links ]

Bromberg, P. (2000). Potholes on the royal road: Or is it an abyss? Contemporary Psychoanalysis, 36,5-28.         [ Links ]

Danon-Boileau, L. Tamet, J-Y. (org). (2016). Des psychanalystes en séance: glossaire clinique de psychanalyse contemporaine. Paris: Gallimard.         [ Links ]

Freud, S. (2013). A interpretação dos sonhos (Vol. 2). Porto Alegre: L&PM. (Trabalho original publicado em 1900)        [ Links ]

Green, A. (1995). Propédeutique: la métapsychologie revisitée. Seyssel: Champ Vallon.         [ Links ]

Greenberg, J. (Spring de 2001). The analyst's participation: a new look. J Am Psychoanal Assoc., 49(2),359-381.         [ Links ]

M'Uzan, M. (1994). La bouche de l'inconscient. Paris: Gallimard.         [ Links ]

 

 

Recebido em: 2/5/2017
Aceito em: 2/8/2017

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