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Jornal de Psicanálise

Print version ISSN 0103-5835

J. psicanal. vol.53 no.98 São Paulo Jan./June 2020

 

CHRONOS/KAIRÓS

 

O tempo eróptico: algumas notas sobre o mal-estar do silêncio e as respostas na contemporaneidade

 

The eroptic time: some notes on the malaise of silence and the answers in contemporary times

 

El tiempo eróptico: algunas notas sobre el malestar del silencio y las respuestas en los tiempos contemporáneos

 

Le temps eroptique: quelques notes sur le malaise du silence et les réponses à l'époque contemporaine

 

 

José Luiz Cordeiro Dias Tavares

Psicanalista pelo Centro de Estudos Psicanalíticos (CEP), São Paulo; com aperfeiçoamento em Psicopatologia Psicanalítica e Clínica Contemporânea pelo Instituto Sedes Sapientiae, São Paulo; pós-doutorado em Medicina pelo Imperial College of Science, Technology and Medicine pela University of London. Faz mestrado em Literatura pela Pontifícia Universidade Católica, São Paulo / jltavares2016@gmail.com

 

 


RESUMO

Este artigo propõe olhar para o sofrimento psíquico contemporâneo. Para isso, o percurso feito pela psicopatologia desde o século XVII é revisitado, nele se destacando o impacto promovido por Freud, que passou da ausculta para a escuta das vozes falando dos conflitos neuróticos que desafiavam a anatomia e a fisiologia médica. A psicanálise se dá na relação com a cultura. Como pensar a psicopatologia hoje? Na clínica psicanalítica atual, a infelicidade neurótica divide espaço com outros sofrimentos, como, por exemplo, as várias formas de adição química, comportamentos workaholic, vício digital, descontrole no uso dos cartões de crédito, transtornos alimentares e manifestações psicossomáticas, além de respostas erópticas em uma modalidade selfie do existir. Propõe-se que um dos articuladores dessas ocorrências possa ser um estado de mal-estar do silêncio, próprio da contemporaneidade, que produz ruídos para ensurdecer a experiência do estar-em-si.

Palavras-chave: psicopatologia, contemporâneo, silêncio


ABSTRACT

This article proposes to look at contemporary psychological suffering. To this end, the path taken by psychopathology since the 17th century is revisited, highlighting the impact promoted by Freud, who went from auscultation to listening to the voices that spoke of neurotic conflicts that defied anatomy and medical physiology. Psychoanalysis takes place in relation to culture. How to think about psychopathology today? In the current psychoanalytic clinic, neurotic unhappiness shares space with other sufferings such as the various forms of chemical addiction, workaholic behaviors, digital addiction, uncontrolled use of credit cards, eating disorders and psychosomatic manifestations in addition to eroptic responses in a selfie mode of existence. It is proposed that one of the articulators of these occurrences may be a state of malaise of silence, typical of contemporary times, which produces noises to deafen the experience of being-in-itself.

Keywords: psychopathology, contemporary, silence


RESUMEN

Este artículo propone mirar el sufrimiento psicológico contemporáneo. Con este fin, se revisa el camino tomado por la psicopatologia desde el siglo XVII, destacando el impacto promovido por Freud, que pasó de la auscultación a escuchar las voces que hablaban de conflictos neuróticos que desafiaban la anatomía y la fisiología médica. El psicoanálisis tiene lugar en relación con la cultura. ¿Cómo pensar hoy en psicopatología? En la clínica psicoanalítica actual, la infelicidad neurótica comparte espacio con otros sufrimientos, como las diversas formas de adicción química, comportamientos de adicción al trabajo, adicción digital, uso descontrolado de tarjetas de crédito, trastornos alimentarios y manifestaciones psicosomáticas, además de respuestas erópticas en un modo selfie de la existencia. Se propone que uno de los articuladores de estos acontecimientos puede ser un estado de malestar del silencio, típico de los tiempos contemporáneos, que produce ruidos para ensordecer la experiencia del ser en sí mismo.

Palabras clave: psicopatología, contemporáneo, silencio


RÉSUMÉ

Cet article propose d'examiner la souffrance psychologique contemporaine. À cette fin, le chemin emprunté par la psychopathologie depuis le XVIIe siècle est revisité, mettant en évidence l'impact promu par Freud, qui est passé de l'auscultation à l'écoute des voix qui parlaient de conflits névrotiques qui défiaient l'anatomie et la physiologie médicale. La psychanalyse a lieu par rapport à la culture. Comment penser la psychopathologie aujourd'hui ? Dans la clinique psychanalytique actuelle, le malheur névrotique partage l'espace avec d'autres souffrances telles que les diverses formes de dépendance chimique, les comportements de bourreau de travail, la dépendance numérique, l'utilisation incontrôlée de cartes de crédit, les troubles de l'alimentation et les manifestations psychosomatiques en plus des réponses éroptiques en mode selfie de la existence. Il est proposé que l'un des articula-teurs de ces événements puisse être un état de malaise du silence, typique de l'époque contemporaine, qui produit des bruits pour assourdir l'expérience d'être en soi.

Mots-clés : psychopathologie, contemporain, silence


 

 

Levei à boca uma colherada de chá onde deixara amolecer um pedaço de madeleine. Mas, no mesmo tempo em que esse gole misturado com os farelos do biscoito tocou meu paladar, estremeci, atento ao que se passava de extraordinário em mim_ De onde vinha essa alegria poderosa? Sentia que estava ligada ao gosto do chá e do biscoito, mas ultrapassava-o. E de súbito a lembrança apareceu. Aquele gosto era o pedacinho de madeleine que minha tia me dava aos domingos pela manhã em Combray quando eu ia dar bom-dia, em seu quarto, após mergulhá-lo em sua infusão de chá. O aroma e o sabor permanecem ainda por muito tempo, como almas, chamando-se, ouvindo, esperando, sobre as ruínas de tudo o mais, levando sem se submeterem, sobre suas gotículas quase impalpáveis, o imenso edifício das recordações.

(Proust, 1913, Vol. 1)

 

A xícara, o tempo e o mal-estar do silêncio

Cem anos depois de Proust, o tempo contemporâneo flui ao sabor de novas formas de subjetivação sob um imperativo de consumo tão voraz e veloz, que dificultaria o chá de sua xícara ser degustado com o tempo e a quietude necessários para que os aromas próprios da infusão fossem devidamente saboreados por ele. Essa forma de organização da cultura dificulta a instalação de um ambiente propício para a elaboração das experiências do viver, afetando a construção do edifício simbólico das recordações. Em vez de um mergulho no espaço fecundo de recolhimento em que as dúvidas, as incertezas e as frustrações próprias da natureza humana possam surgir e abrir perspectivas criativas, estabelece-se no homem contemporâneo um verdadeiro mal-estar do silêncio a ser rapidamente tamponado por um excesso de ruídos que abafam a experiência. No agir excessivo e imediato, evita-se o silêncio. Elege-se dar ouvidos à exterioridade e viver ao encalce de articulações que propiciem para o sujeito um distanciamento das vivências de sofrimento. Em uma modalidade selfie de ser, o outro passa a ser considerado um espectador da cena. O retorno ao narcísico é posto em prática, a alteridade se vai, e se esvai a riqueza da intersubjetividade. Ao buscar o que é igual a si mesmo para dar um match, evita-se o espaço da inventividade decorrente das diferenças e despreza-se a enorme fortuna que o que é estrangeiro à alma poderia trazer. Há, portanto, um certo ensurdecimento para a voz alheia, que, por ser distinta, tende a ser extinta, criando-se guetos que escapam do convívio plural, empalidecendo a trama dos laços sociais. Assim, a amplitude da experiência vincular se torna estreita, e o like decorrente do encontro daquilo que parece ser igual a si mesmo cria uma partitura com uma tonalidade monocórdica e opaca.

Na sociedade contemporânea, alicerçada em um arcabouço utilitarista atrelado à pressão pelo desempenho sob os ditames da efetividade, do sucesso e de outros norteadores relacionados à exaltação e glorificação de si mesmo, o sujeito é visto como um empreendedor dependente de metas que, se não alcançadas, o condenam a experimentar uma amarga sensação de ruína.

Instala-se uma dinâmica do tudo ou nada permeada pelo risco do confronto com um abissal estado de fracasso, vazio e impotência. Nesse espaço cabem diversas próteses que obliteram momentos silenciosos, que seriam preciosos se fossem vividos como oportunidades para simbolização de experiências além da perspectiva do reconhecimento e aceitação da própria castração em um trabalho psíquico que permitiria ao sujeito dar algum sentido às suas vivências, falhas e faltas. O jargão muito ouvido acerca do objetivo de acumular um milhão de dinheiros antes de se atingir determinada idade me remete à imagem do acumular um milhão de excessos. Buscam-se então rotas de fuga que se manifestam, por exemplo, em diferentes formas de adicção, seja no consumo de drogas lícitas e ilícitas ou de qualquer outra coisa que seja imaginada como desejável e indispensável para o sujeito. A mesma rota é trilhada nas relações amorosas, tão efêmeras quanto intolerantes e superficiais, nos comportamentos caracterizados como workaholic, nas diferentes formas de vício digital, no uso excessivo do celular, no descontrole no uso dos cartões de crédito e várias outras formas de compulsão e dependência, além de transtornos alimentares e manifestações psicossomáticas vistas na clínica contemporânea. Trata-se aqui da questão dos afetos que não encontraram tempo, espaço, nem o silêncio-em-si necessários para serem nomeados, vivenciados, elaborados e simbolizados psiquicamente.

 

O contemporâneo que se inaugura entre maio de 1968 e agosto de 1969

Durante muito tempo e até o início do século xx as estruturas sociais garantiram um modelo vertical no qual a hierarquia per se era legitimada. Após o final da Segunda Guerra Mundial, surgiram diversos movimentos de inconformismo. Seja nos protestos urbanos de maio de 1968 em Paris ou nas canções de Woodstock em agosto de 1969, tais manifestações clamavam por transformações das relações sociais, almejando a passagem da autoridade chancelada pelo modelo hierárquico para um cenário de menor assimetria e maior liberdade. Os movimentos que buscavam migrar da verticalidade para a horizontalidade interferiram no modo de funcionamento coletivo e, portanto, no papel das estruturas até então garantidoras da construção identitária. Ampliavam-se as formas possíveis para o advento do sujeito e suas possibilidades de inserção no tecido social. No final da década de 1960, Caetano e os Mutantes anunciavam que era proibido proibir, Hélio Oiticica apresentava seus parangolés e Zé Celso reinventava a arte dramática com o Teatro Oficina. Era o final de um período, marcando a mudança do tempo que passa a ser considerado contemporâneo.

Nesse movimento, a família patriarcal, assim como as instituições educacionais e religiosas, além de outros organizadores sociais, como os vínculos trabalhistas ou ideologias políticas que operavam como referências identitárias, foram progressivamente ressignificados. Novas técnicas reprodutivas também surgiram e se difundiram. A maior disponibilidade dos recursos contraceptivos trouxe a possibilidade de dissociação entre sexo e procriação. Com esse movimento, reposiciona-se a perspectiva do prazer, que ingressa nessa equação conduzindo à autonomia do sujeito em relação ao próprio corpo. Trata-se de um momento transformador que também ampliou as modalidades de investimento vincular nessa nova ordem social, que, mais recentemente, levou ao surgimento de famílias expandidas, ho-moparentais, monoparentais ou outros arranjos familiares diversos. A movimentação do que estava posto pela força do hábito trouxe uma nova dimensão da experiência social, não por acaso também articulada com outras indagações acerca do que se entende por diferenças e igualdades entre os sexos, pavimentando o caminho para questões de gênero mais atuais, assim como para o atravessamento desse tema nas diferentes possibilidades de estruturação dos laços sociais.

Outras modificações foram observadas na sequência. A perspectiva da construção grupal comunitária vivida em um espaço de paz e amor, que exaltava o valor da alteridade na construção da subjetividade, deu lugar ao espaço da web, no qual a intersubjetividade é praticada num computador ou telefone celular, configurando uma cena na qual um interlocutor de um lado da tela mantém-se vivo ou cancelado de acordo com a fantasia onipotente de quem está do outro lado em um ilusório controle da situação. A relação do homem com o espaço e o tempo modificou-se muito rapidamente. Na sequência linear mensurável de Cronos algo qualitativo inscreveu-se nesse intervalo de tempo. Instaurou-se uma dinâmica do aqui e agora, ilusoriamente sem limites nem impedimentos, mantida por um imediatismo que é sustentado pela variedade, facilidade, rapidez e descartabilidade de opções. Nessa trama torna-se difícil a construção de uma identidade memorial no sentido de um continuum histórico no qual as experiências seriam integradas ao longo da escritura do sujeito. Ao contrário, como em uma tela de iPhone, as páginas das experiências que não mais interessam vão sendo deslizadas e descartadas, resultando numa narrativa fragmentada e descontínua de si mesmo e do modus operandi de articulação com o outro.

 

A psicopatologia psicanalítica e a passagem da ausculta para a escuta

A psicopatologia psicanalítica desenha uma cartografia que transita em um campo em que há alguns aspectos a considerar. Inicialmente, há a questão epistemológica no que tange a pretender olhar para o sofrimento psíquico singular referenciando-o a um conhecimento universal. Trata-se de uma situação que traz certa complexidade na medida em que na experiência da singularidade sempre há algo que resta, algo do não dito que chancela o que há de particular naquele sujeito e que, portanto, escapa do engessamento dos registros que visam o universal. Da mesma forma, conceitos universais também não conseguem abarcar todas as nuances próprias da diversidade infinita do singular.

Nos séculos XVII e XVIII a psicopatologia era demasiado rudimentar e a medicina clínica formulava as questões de modo mais rigoroso, levando-a, no século xix, a dirigir-se às ciências constituídas ou em fase de constituição como a biologia, a fisiologia e a anatomia patológica. No livro Freud e a filosofia, Birman (2003) comenta que a psiquiatria, orientada para o esclarecimento e tratamento dos distúrbios mentais, foi um saber instaurado na passagem do século XVIII para o século xix, por ocasião do advento da Revolução Francesa. O estabelecimento do asilo como instituição para cuidado dos loucos levou ao rompimento com o Hospital Geral que havia sido estabelecido no século XVII, no qual os loucos eram misturados com outros igualmente excluídos do convívio social como criminosos e indigentes. A relevância desse momento refere-se ao fato de a psiquiatria então destinar o lugar de doentes mentais aos loucos que passavam, desta forma, a ser considerados como portadores de uma enfermidade como as habitualmente abarcadas pela medicina somática e que, portanto, permitiria à psiquiatria pleitear a condição de especialidade médica. A medicina baseava-se, entretanto, nas evidências anatomoclínicas que justificavam os sintomas das doenças somáticas, dificultando à psiquiatria obter o reconhecimento como especialidade médica, pois no cérebro dos doentes mentais não havia evidências de alterações anatômicas. Tratava-se, portanto, de um obstáculo à consideração da alienação mental como uma enfermidade. Restava, então, a instauração de um olhar de ordem moral para a loucura. Nesse sentido, Esquirol, junto com Pinel, um dos fundadores da psiquiatria, enunciava que as paixões excessivas seriam estruturantes da alienação mental. Dessta forma, o tratamento moral era o que a psiquiatria propunha para reverter o estado de alienação com o recurso das internações nos asilos, retirando o louco da promiscuidade que havia nos hospitais gerais (Birman, 2003).

Na segunda metade do século xix o discurso psiquiátrico foi progressivamente se distanciando da etiologia moral e se aproximando das hipóteses biológicas, principalmente no que tange à hereditariedade e à degenerescência, dificultando, portanto, a consideração de uma perspectiva terapêutica. A etiologia somática da loucura passou a sobrepujar a etiologia moral, mas, ainda assim, para a psiquiatria, a alienação mental inscrevia-se no registro da consciência, seja para os que atribuíam a ela a etiologia moral, ou para os que defendiam uma causalidade de natureza hereditária ou degenerativa. Nesse mesmo período do século xix, a psicologia focava nos elementos também relacionados à consciência, onde residia a verdade psíquica e fundamentava-se a subjetividade. Tal perspectiva tinha uma estreita correlação com o cogito cartesiano, que entendia a existência como vinculada ao pensamento e à consciência, isto é, constituía uma concepção do psiquismo atrelado ao registro da cognição, representante de uma estrutura racionalista voltada para a produção do conhecimento. Nesse contexto, a alucinação era tida como uma modalidade de falsa percepção e o delírio, como um juízo equivocado sobre a realidade. Dessa maneira, não haveria qualquer sentido de positividade na loucura, mas sim apenas negatividade, pois entendia-se que, nos episódios de alucinações e delírios, a subjetividade não se expressava, e a loucura seria uma errância do psiquismo (Birman, 2003). O desenvolvimento de uma psicopatologia no âmbito da psiquiatria almejou classificar desordens psíquicas com base principalmente na sintomatologia e no processo evolutivo das manifestações verificadas em observações clínicas fundamentadas em causas orgânicas, o que orientava esse processo na direção de uma classificação racional para as manifestações do sofrimento psíquico.

O grande desafio surgiu no final do século xix com as pacientes histéricas, que desacomodavam as leis da anatomia e da fisiologia médicas e apontavam para a expressão de uma outra psicopatologia, um outro corpo estruturado em um afeto recalcado que insistia em retornar e se fazer ouvir sob a forma de sinais e sintomas absolutamente singulares e rebeldes em relação aos compêndios hipocráticos. Suas vozes falavam de conflitos entre desejo e interdição regidos pela sexualidade. Freud legitima essas vozes e fala de uma ética baseada na singularidade do sujeito, que, diante da castração, se vê na contingência de dar algum destino para suas pulsões. Tomemos como referência a ética aristotélica, que trata da virtude do equilíbrio por aqueles dotados de prudência visando a conexão entre a felicidade e a boa ação humana. De modo inusitado, Freud nomeia a ética da psicanálise que privilegia a existência humana sob o prisma de um imperativo particular e original que se baseia no inconsciente e se estrutura no campo da linguagem, revelando a relação do sujeito com o desejo que o constitui. Para essa forma de sofrimento, a ausculta médica não mais servia. Com Freud, a ausculta cedeu lugar à escuta.

Em sua publicação Contribuição à história do movimento psicanalítico, Freud (1914/2015) diz que a pedra angular da psicanálise é o recalque. A importância dessa afirmativa está no fato de o recalque ser um importante operador da epistemologia freudiana no sentido da estruturação e discriminação das modalidades de sofrimento psíquico que o consideram como o mecanismo de defesa característico das neuroses, assim como a negação é o mecanismo que opera nas perversões e a recusa é a marca das psicoses. Exatamente por escutar o sujeito em vez de auscultá-lo, a psicopatologia psicanalítica freudiana repensa os limites entre o que seja o normal e o patológico e permite que este possa ser olhado como uma forma particular de subjetivação, e não como algo contrário àquele. O sofrimento passa a ter um referencial subjetivo, e a normalidade psíquica não mais residiria então no negativo ou na ausência, mas sim na positividade de algo que é produzido pela singularidade do sujeito. A normalidade não seria definida por outrem, mas sim decorreria da minimização do sofrimento acarretado pelos sintomas e, também, da possibilidade de saber lidar com o que há de mais pulsional em si mesmo e que segue pressionando para se fazer ouvir e ultrapassar as justificativas oferecidas pela razão.

A psicanálise como experiência a ser vivida propõe aproximar-se do que possa ser a singularidade do sujeito. Trata-se de um convite para seguir uma trilha que passa por um eventual desajuste em relação ao que esteja consagrado por constructos que visam homogeneizar e normalizar os costumes. No trajeto construído e percorrido no setting analítico, que vai desde a nomeação da dor psíquica pelo analisando até a minimização do sofrimento, há um caminho longo, impreciso e de desfecho imprevisível para o sujeito. Propõe-se aqui o não enquadramento desse sujeito em molduras preestabelecidas que tenderiam a normalizá-lo em uma posição alienante. Busca-se legitimar a singularidade como estatuto da existência humana validado pela ética psicanalítica. Poder estar em desacordo com o que está a seu redor e dar voz à sua própria voz constitui o desafio da psicanálise tanto para o analisando como para o psicanalista, que busca, na psicopatologia, examinar a articulação entre o que se observa na clínica e na cultura e o pensamento teórico.

No início de seu percurso Freud deparou com quadros histéricos com uma expressão fenomenológica tão exuberante quanto surpreendente apontando para o valor simbólico daquelas manifestações. Como entender a exuberância das manifestações do sofrimento contemporâneo? Como poderia ser pensada a psicopatologia na contemporaneidade?

 

I don't need you, I have wi-fi

Em 1920, Freud propõe um protótipo de aparelho psíquico no qual haveria uma vesícula com a superfície voltada para o mundo externo e, portanto, destinada ao recebimento de estímulos excitatórios, que, quando repetidos, acarretariam uma certa impossibilidade de qualquer outra alteração decorrente da passagem de excitações adicionais, pois seus elementos já teriam sido modificados até o máximo. Esse fragmento de substância viva, entretanto, acha-se exposto a um mundo externo repleto de estímulos e pode sucumbir, caso não haja um escudo protetor. Neste sentido, Freud considera que há situações nas quais as excitações provindas de fora são tão intensas, que atravessam esse escudo protetor, e propõe que o conceito de trauma implicaria uma articulação desse processo com a ruptura da barreira que, sob outros aspectos, seria eficaz contra os estímulos e poria em movimento as medidas defensivas possíveis (Freud, 1920/2014b). Assim, o princípio de prazer é momentaneamente afetado. A psique é então inundada por grandes quantidades de estímulos, acarretando o desprazer decorrente do atravessamento do escudo protetor. Instaura-se um fluxo contínuo de excitações desde a periferia até o aparelho central da psique, tal como normalmente surgiria apenas a partir do interior do aparelho (Freud, 1920/2014b). Surge, portanto, a questão de como dominar tais quantidades de excitação que irromperam e como elaborar a experiência para, então, vinculá-la no aspecto psíquico e dar a ela algum sentido.

Expor-se ao outro é expor-se a vivências e excitações a serem representadas na psique. O processo de subjetivação conta, entretanto, com o exercício da alteridade no qual o encaixe entre o Eu e um outro não pode ser perfeito e traz consigo o aprendizado de uma não adaptação plena, possivelmente articulada com dificuldades na assimilação e na incorporação simbólicas (Coelho Jr. & Figueiredo, 2004). Na contemporaneidade, como já comentado, a vivência da frustração decorrente do encontro com o que é estranho no outro, tão natural no processo da construção de vínculos, tende a ser abafada pela rapidez e facilidade de ofertas que visam diluir a possível dor da experiência prometendo o céu em prazo imediato com um suposto baixo custo. Tal dinâmica progressivamente desloca e concentra o eixo de funcionamento desse homem contemporâneo para um modo narcísico de operação psíquica no qual se constrói um protagonismo que, ao ser encenado, lhe dificulta a oportunidade de viver o profícuo mergulho no silêncio e a possibilidade de experimentar as vivências da intersubjetividade que lhe facultariam a riqueza de indagar-se acerca do próprio sofrimento, elaborar o ocorrido e dar um sentido construtivo para si mesmo. Aprisionado na ratoeira de um espetáculo, o homem contemporâneo busca a luz do proscênio em uma entrega sacrificial a uma plateia que lhe devolve, pelo aplauso, o reflexo de uma ilusão. I don't need you, I have wi-fi, dizia recentemente um cartaz em uma esquina do centro da cidade. As palavras estampadas na rua denunciam o sofrimento que ouvimos na clínica nos dias de hoje.

 

O cubismo, a dinâmica eróptica contemporânea e o desígnio divino

O corpo é um palco. Na psicanálise, o corpo adquire um estatuto cuja envergadura amplia os limites do biológico e assume também o lugar de manifestação das moções pulsionais. Trata-se do corpo como terreno fértil para a expressão de desejos recalcados que buscam soluções de compromisso que de alguma forma ao mesmo tempo expressam um conflito e visam a satisfação. Tomar o corpo como representante da subjetividade é algo que se verifica nas variadas formas de desconstrução e reconstrução corporal. Desde simples tatuagens ou piercings até as intervenções mais radicais, observamos o deslocamento da linguagem falada para a linguagem imagética, que expressa mais do que as marcas inscritas na pele pretendem exibir. Tais intervenções corporais podem ser vistas como emblemas que articulam as relações pessoais em uma forma adicional de escritura.

Se consideramos que o sujeito diz mais do que fala, esse alfabeto corporal deliberada e notadamente ruidoso também diz bem mais do que o registro visual consegue mostrar ao traduzir aquilo que, vindo da alma, busca expressão. Nesse contexto, Kehl (2009) em O tempo e o cão, referindo-se a Guy Debord e a noção de sociedade do espetáculo, alerta para o fato de que, na cena social contemporânea, mais do que simplesmente imagens a exibir, trata-se aqui de elementos que organizam as modalidades de estruturação do laço social de tal forma, que deparamos com relações sociais mediadas por imagens. A palavra como ferramenta mestra do processo de intersubjetividade cede espaço à imagem como um passaporte identitário de si mesmo. Nesse ambiente, como observa Fuks (2015) em Narcisismo e vínculos na atualidade, verifica-se atualmente um neonarcisismo que privilegia a aparência da superfície em detrimento da profundidade das relações que se organizam ao redor de palavras, pensamentos e afetos. Com isso surge o risco da aproximação entre o narcisismo e a pulsão de morte, pois a pretensão narcísica da equivalência absoluta com o ideal traz a consequência da morte do sujeito desejante, que, em situações extremas, pode acarretar a sensação de vazio e o sentimento de não mais existir (Fuks, 2015).

Nesse contexto contemporâneo, a efetividade da interlocução social vem se estabelecendo na estampa daquilo que se exibe. Pelo recurso de modificações corporais desenha-se um cubismo de si mesmo que eventualmente transgride a estética e cria um espaço destinado ao deleite e o impacto de espectadores, em uma performance na qual a imagem apresentada mescla o que se exibe com aquilo que se é. Trata-se de uma dinâmica eróptica contemporânea, na qual a combinação de Eros e óptico articula o registro predominantemente imagético que guia os investimentos libidinais pertinentes às trocas intersubjetivas.

A função da imagem em posição de destaque na contemporaneidade, presente em qualquer projeto ou atividade, profissional ou social, traz junto o risco de esvaziamento do conteúdo do mundo interno (Lambotte, 2001). O individualismo deixa sua marca muito claramente evidente no tempo atual, pois o outro é alguém que está ali para se usufruir e ser consumido, o que acarreta a diluição de valores coletivos. O sujeito do mundo contemporâneo pleiteia seu lugar em uma cena social vivida como um espetáculo no qual se requer a presença de um outro em um papel de testemunha (Fuks, 1999).

A possibilidade relativamente recente de se esculpir o próprio corpo, em oposição ao que foi dado pelo acaso biológico - ou desígnio divino -, fornece ao indivíduo a liberdade de buscar soluções e escolher caminhos radicalmente transformadores, de alguma forma articulados com o momento atual, no qual as referências sociais ordenadoras também se modificaram. A identidade sexual e sua representação na coletividade estruturaram desde sempre um arcabouço a serviço de representações sociais de poder nas quais padrões hegemônicos eram facilmente reconhecidos e garantiam ordenações constituintes e mantenedoras de alguns modelos de equilíbrio e inserção na cultura. Novas tecnologias deram oportunidade para que insatisfações encontrassem soluções em processos de reconstrução corporal, tornando o homem não mais necessariamente feito à imagem e semelhança de Deus, mas sim alguém que dá voz - e corpo - à imagem e semelhança de seu próprio desejo e projeto de existir.

A questão da sexualidade vai além do sexo dado pela herança do genótipo, do sexo esculpido no fenótipo, do modo pelo qual o indivíduo se vê na cena social - sua identidade de gênero - e da articulação disso tudo com a forma pela qual seu desejo se manifesta no que tange às suas relações objetais. Desde muito cedo em seu desenvolvimento as crianças se reconhecem em uma determinada identidade de gênero, em certa medida, pela atribuição feita pelos próprios pais e pela cultura. Já nessa fase um ideal lhes é apresentado, e é em referência a ele que o sujeito se organiza. Quando essas condições não encontram um diálogo harmonioso, surgem conflitos que buscam conciliação quanto ao modo como o sujeito se vê em sua dinâmica corpo-psique e, também, como ele espera ser reconhecido no mundo. Sua expectativa é integrar o constructo de sua própria imagem a um contexto social e cultural no qual ele mesmo se reconheça e se legitime.

Trata-se de algo que de alguma maneira traz reflexões acerca das formas de se pensar os papéis sociais. O que parecia estar irreversivelmen-te posto pelo destino passa a ser potencialmente capaz de ser modificado pelas intervenções corporais radicais no tocante aos procedimentos relativos à transexualidade. Descolando a anatomia da sexualidade, ao ser humano contemporâneo é garantida a possibilidade de revoltar-se no que se refere à decisão do Pai, sem que isso lhe acarrete, como consequência, a expulsão do paraíso, mas sim a possibilidade de nele ingressar por meio do prazer de ser reconhecido e validado naquilo que sua alma acredita ser com base na moção do próprio desejo. Em Considerações sobre as relações entre sexo, gênero e sexualidade, Aidar (2015) vai além e refere-se à noção de neossexualida-de proposta por McDougall, na qual há que se considerar a reinvenção do erotismo sexual e das relações amorosas articuladas com a identidade sexual e com os constructos referentes aos conteúdos de masculinidade e feminilidade, remetendo à instigante questão de se a existência de dois gêneros é capaz de dar conta de toda a extensão da diversidade existente.

Essas novas possibilidades de escritura da identidade requerem que formulações igualmente inovadoras se instalem nos laços sociais não apenas nas relações amorosas, mas também em outros ambientes sociais nos quais novos avatares interagem com igualmente novos ordenadores comunitários. Como comentado acima, masculino e feminino são construções que vão além de considerações acerca do genotipo, do fenotipo, da identidade de gênero e da relação do desejo com os objetos de investimento da libido. Trata-se aqui de considerar mais um elemento imiscuído nessa trama que é de ordem discursiva, fruto da cultura na qual estamos inseridos e que se articula com a expectativa do lugar social que se aspira a ocupar.

 

A permanente impermanência

A história da psicanálise desenvolve-se na relação com a cultura. As proposições iniciais de Freud sobre a constituição do sujeito e suas modalidades de sofrimento referem-se a um cenário sociocultural que, desde então, sofreu transformações. A preocupação de Freud com a necessidade de uma psicopatologia que se aplicasse à psicanálise está presente em vários trechos de sua obra. Em alguns momentos isso fica bastante explícito, quando, por exemplo, ao abordar as pulsões, ele diz sobre sua expectativa de que a investigação dos fenômenos que ele estava observando pudesse fazer apreender seus conceitos fundamentais de tal forma, que fossem utilizáveis em larga medida e livres de contradição, e que este seria o momento de então defini-los, não negligenciando o fato de que conceitos firmemente estabelecidos podem sofrer modificação de conteúdo ao longo do tempo (Freud, 1915/2014a).

Sendo assim, qual seria o estatuto das questões freudianas na contem-poraneidade? A experiência da clínica de hoje nos surpreende e aponta para a necessidade de revisitar determinados temas com um olhar atravessado pelo presente imediato no qual estamos submersos. A constante ebulição da cultura traz em seu caldo a irrupção de manifestações que fazem emergir novas formas de conflitos. A própria condição do estado de contemporanei-dade traz questões que inicialmente soam desajustadas diante do que está posto. Promove-se assim um natural estado de tensão que se faz presente em um movimento que vai desde a surpresa com o que até então era desconhecido até o momento de sua assimilação pela cultura. Em um ritmo cíclico, essa dinâmica vai se repetindo e promovendo transformações sociais. Nessa instabilidade fértil do espaço social vai se inscrevendo a pluralidade com que se escreve a história humana e, consequentemente, também diz respeito à psicanálise. Refiro-me às vicissitudes do desejo que enfrentam o desafio de realização em novos cenários que oscilam entre o que já está posto pela força do tempo e do hábito e a necessidade de novas ordenações.

 

O deserto ruidoso que oscila entre a escassez e o excesso

O tempo urge, porém, a alma tem seu tempo, não se submete, e, como comentado, o silêncio psíquico se faz necessário como espaço de elaboração da experiência. Em Sociedade do cansaço, Han (2015) refere-se a Nietzsche em seu texto Crepúsculo dos ídolos, no qual o filósofo diz que devemos aprender a ver, o que significa habituar o olhar ao descanso, à paciência e ao deixar aproximar-se de si, promovendo uma atenção contemplativa que seria uma modalidade de escolarização para o espírito, levando à possibilidade de não reagir imediatamente aos estímulos. A atividade pura nada mais faz do que prolongar o que já existe, e, na atualidade, o mundo é pobre de interrupções e de tempos intermédios, diz Han (2015). Sem a generosidade do tempo que nos permite escutar, olhar, hesitar e lidar com as incertezas da dúvida, não conseguimos sonhar sobre o que vivemos nem tecer simbolicamente o que sofremos. Não há tempo nem espaço para a experiência do luto. Evita-se a angústia, não se tolera a falta nem a frustração, a demanda reina e se anuncia pelo excesso que traz o contrapeso do empobrecimento dos recursos de simbolização, a impossibilidade de elaboração psíquica e o transbordamento pulsional, resultando no comprometimento da construção da interioridade tão fundamental no processo de subjetivação.

Vive-se em um deserto ruidoso, no qual o outro não consegue verdadeiramente entrar. Consome-se o outro, mas não se constrói com o outro. Há um canibalismo voraz dos afetos, dos próprios e também os dos outros. Tudo é passageiro, muito rápido, e não se semeiam possibilidades para que brotem aberturas criativas e novas perspectivas possam ser colhidas. A construção da subjetividade requer o investimento objetal. Afetar o outro e se permitir ser afetado pelo outro. Para isso se requer a generosidade de viver o tempo e o silêncio, com toda a sensibilidade, acuidade, complexidade, sutileza e requinte implícitos nos registros psíquicos das experiências que passam tanto pelas inscrições de prazer como pelas de desprazer e que eventualmente nos levam de volta a experiências primordiais de desamparo que desde sempre nos marcaram, mas que ao mesmo tempo deixariam emergir o potencial de construção de novas urdiduras sobre nós mesmos.

A psicanálise como um saber sobre a psique nasceu da observação clínica de Freud. Os novos sintomas e modalidades de sofrimento que surgem na clínica contemporânea nos convidam a repensar o que está estabelecido, o que atribui à psicopatologia psicanalítica o estatuto de um saber em constante transformação. As novas modalidades de subjetivação nos desafiam exatamente pela riqueza de possibilidades que diariamente nos instigam no exercício da clínica e na escrita da psicanálise. Trata-se de olharmos com atenção para a diversidade do sofrimento psíquico atual para ajustarmos as velas e seguirmos acompanhando o continuum do existir humano.

 

Referências

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Recebido em: 29/5/2020
Aceito em: 21/6/2020

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