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Jornal de Psicanálise

versão impressa ISSN 0103-5835

J. psicanal. vol.53 no.99 São Paulo jul./dez. 2020

 

TRADUÇÃO

 

Comentário

 

 

Darcy A. Portolese

Membro efetivo e analista didata da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP). São Paulo / portoles@terra.com.br

 

 

Inicialmente me chamou a atenção o objetivo a que se propõe o livro:

"um amontoado vivo de nossa própria criatividade possa ser inesperadamente localizado no topo desse amontoado híbrido: uma florescência de cogumelos ou de surpreendentes narcisos...". Anteriormente fala "De incrementar a fertilidade dos avanços de outras pessoas, para ajudá-las a trazer à vida sua criatividade nascente".

Podemos observar um propósito que amplia, dando um sentido construtivo aos objetivos do trabalho. Continua procurando descongestionar os meandros divisionistas da construção de núcleos de Poder em que o termo "bioniano" é carregado de significados da mente do analisando e do analista, que podem obstruir o sentido do Conhecimento. Ao comentar sobre o livro Transformações revela a mudança evolutiva para Atenção e interpretação, com o objetivo de criar uma linguagem conceitual que aproximasse mais seus interlocutores, evitando uma atitude idiossincrática, favorecendo a isolamento e divisionismo.

Uma interessante reflexão continua a respeito do "estado de mente" do analista diante da Complexidade e sua formulação sobre a Teoria do Pensar. Esta é formada pela pressão dos pensamentos que vão sendo formados pelo contato emocional entre as duas mentes. Vale a pena lembrar uma formulação de Bion em Transformações, em que no cap. VI descreve: "O Narcisismo insatisfeito impede que Amor se estenda aos objetos...". Surge aqui uma interessante formulação a respeito do surgimento da Dor mental como uma espécie de evidência de um processo mental que, atua independente do mundo sensorial. A questão do objeto ausente vai se configurar como uma experiência emocional de uma ausência equivalendo a uma perseguição presente.

Uma dimensão interessante surge na progressão do pensamento de Meltzer é que ao lado da complexidade das teorias, surge a interação entre analista e analisando numa cooperação mútua, onde um depende do outro, para que se estabeleça uma reciprocidade entre a atenção do analista e a cooperação do paciente: O continente se cria numa relação de interdependência.

Uma questão que me pareceu significativa é a menção a respeito da Psicanálise como uma Coisa em si mesma. E uma formulação bastante sofisticada, na medida em que Kant formula este Conceito: Em um Grupo, dirigido pelo prof. de Filosofia Franklin Leopoldo e Silva ao estudarmos este Conceito ficou claro que a "Coisa em Si" não pode ser alcançada ou conhecida, mas pode ser pensada. Como desenvolvemos nosso trabalho baseado em experiência emocional e intuição, estas vivências diante do 0 infinito e inefável, nos permite criar algum nível de Conhecimento, que beneficia nosso paciente e também nos alimenta.

No final Meltzer define sua posição particular a respeito do processo de investigação psicanalítica baseado nestes dois pilares: O Método e o processo por ele engendrado. Para mim uma consequência desta formulação implica justamente em uma intimidade que vai gerando novos desdobramentos. Ressalta a necessidade que cada analista deve ter seu próprio conceito do tipo e base do Método que desenvolve, para criar sua especificidade de experiência com cada paciente.

Um aspecto importante diz respeito a flexibilidade necessária para estabelecer um vínculo com o paciente segundo suas necessidades, respeitando suas condições específicas e, tomar cuidado para atender a pessoa e não ser um escravo da Instituição.

A atualidade do pensamento de Meltzer contém um processo evolutivo e contemporâneo que nos ajuda a pensar nossa prática psicanalítica.

 

 

Recebido em: 6/5/2020
Aceito em: 9/8/2020

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