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Revista Psicopedagogia

versão impressa ISSN 0103-8486

Rev. psicopedag. vol.38 no.115 São Paulo abr. 2021

http://dx.doi.org/10.51207/2179-4057.20210009 

RELATO DE EXPERIÊNCIA

 

A influência de mídias multissensoriais na aprendizagem de crianças com transtorno de leitura

 

The influence of multisensory media on learning children with reading disorder

 

 

Ellen Paixão SilvaI; Glauco AmorimII; Gustavo GuedesIII; Joel dos SantosIV; Renata MousinhoV

ICentro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET/RJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil
IICentro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET/RJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil
IIICentro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET/RJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil
IVCentro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET/RJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil
VUniversidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A dislexia é um transtorno específico de aprendizagem que pode afetar a habilidade de leitura prejudicando, principalmente, o processo de alfabetização. Na leitura, alguns dos sintomas observados são os erros de reconhecimento de palavras e a dificuldade de decodificação de palavras, o que acaba ocasionando um prejuízo na compreensão de textos. Pesquisas publicadas na literatura indicam que o uso de conteúdos multimídia melhoram o desempenho de leitura de escolares com dislexia. No entanto, a maioria das aplicações multimídia usam apenas dois dos cinco sentidos humanos: a visão e a audição. O MBook, livro multissensorial desenvolvido para este trabalho, utiliza um rastreador ocular para sincronizar mídias multissensoriais de vento, cheiro, sons e luzes ao texto que está sendo lido. Baseado na hipótese de que o livro multissensorial poderia diminuir a sobrecarga na memória de trabalho durante a leitura, favorecendo a compreensão de textos, aumentando o número de palavras lidas por minuto e aumentando a motivação pela leitura, foi realizada uma comparação entre dois estudos de caso individuais, um com um escolar com dislexia e outro sem. Os resultados apontam para um ganho maior na compreensão do texto e aumento na velocidade da leitura pelo escolar com dislexia ao utilizar mídias multissensoriais. Além disso, em ambos os casos, o uso da ferramenta indicou um aumento na motivação pela leitura.

Unitermos: Dislexia. Livro Multissensorial. Efeitos Sensoriais. Rastreador Ocular.


SUMMARY

Dyslexia is a specific learning disorder that can affect reading ability, mainly impairing the literacy process. In reading, some of the symptoms observed are errors of word recognition and difficulty in decoding words, which causes a loss in the comprehension of texts. Studies published in the literature indicate that the use of multimedia content improves the reading performance of students with dyslexia. However, most multimedia applications use only two of the five human senses: vision and hearing. The MBook, a multisensory book developed for this work, uses an eye tracker to synchronize wind, smell, sounds, and light effects to the text being read. Based on the hypothesis that the multisensory book could reduce the overload in working memory during reading, favoring the comprehension of texts, increasing the number of words read per minute and increasing motivation for reading, a comparison of two individual case studies was conducted: one with a student with dyslexia and one without. The results pointed to a greater gain in the comprehension of the text and an increase in reading speed by the student with dyslexia when multisensory media were used. In addition, with both students, the use of the tool pointed to an increase in reading motivation.

Keywords: Dyslexia. Multisensory Book. Sensory Effects. Eye Tracking.


 

 

INTRODUÇÃO

Avanços tecnológicos possibilitaram a inclusão de inúmeros indivíduos com os mais diferentes tipos de necessidades especiais e o uso da tecnologia como ferramenta de inclusão. Tais avanços oferecem recursos para viabilizar a comunicação e aproximar pessoas1. Além disso, possibilitam a redução do impacto negativo, em termos educacionais, sociais e emocionais, que determinadas deficiências e transtornos podem causar ao longo da vida do indivíduo que possui algum tipo de transtorno2-4.

Neste contexto, a contribuição da tecnologia na área das necessidades educacionais especiais abre novas possibilidades de inclusão de indivíduos com transtornos de aprendizagem. Como discutido em Frota D'Abreu & Marturano5, o mau desempenho de um aluno pode ser causado por diversos motivos e distintas origens. Entretanto, uma vez diagnosticado como um transtorno de aprendizagem, o uso de recursos tecnológicos nas atividades educacionais surge como estratégia para promover uma redução dos danos causados por esta condição2-4.

Dentre os transtornos caracterizados pela dificuldade de aprendizagem, a dislexia é o de maior incidência e estima-se que de 7 a 15% da população mundial seja acometida por esse transtorno6. O uso da tecnologia associada à dislexia pode estimular o desenvolvimento de habilidades de leitura, principalmente em crianças que apresentam dificuldades já no início da alfabetização. Nesta etapa, a persistência dessa condição sem qualquer intervenção resulta em prejuízo no desempenho escolar.

Em indivíduos com dislexia, as dificuldades em interpretação de textos são frequentemente relacionadas com a sobrecarga da memória de trabalho7. A leitura não automatizada, ou seja, lenta e silabada, demanda um esforço tão grande que o leitor não consegue reter e associar as informações do parágrafo lido, tendo, com isso, dificuldades de compreensão.

A memória de trabalho, também conhecida como memória operacional ou de curta duração, é composta por um conjunto de sistemas cognitivos. Estes sistemas funcionam como um espaço de trabalho no qual a representação mental das informações sensoriais e eventos externos, que não mais existem, são mantidos para a realização de uma tarefa proposta.

Para a compreensão de textos, a memória de trabalho é essencial. Durante a leitura, há a necessidade do leitor ir adquirindo o entendimento do que está sendo lido e, de forma simultânea, recorrer a informações anteriores. Informações referentes aos parágrafos lidos anteriormente são armazenadas na memória de curta duração, enquanto aquelas que permitem associações com outras leituras são armazenadas na memória de longa duração. Dessa forma, prejuízos na memória de trabalho tornam a leitura menos rica e menos proveitosa8. A Figura 1 apresenta a relação destes componentes de memória.

 

 

De acordo com a Figura 1, o processamento da informação se inicia com sua entrada a partir do ambiente na memória sensorial. Segundo Baddeley el al.10, a memória sensorial está ligada ao breve armazenamento de informação relacionado à percepção (visual, auditiva e emotiva). Em seguida, a informação é transferida para um sistema de curta duração (a memória de trabalho ou operacional), que retém mais itens que a memória sensorial e utiliza estratégias de evocação para acessar e armazenar informações na memória de longo prazo. A memória de longo prazo mantém todo o conhecimento por um período indefinido de tempo11 e é considerada a estrutura cognitiva que armazena a base do conhecimento12.

Em Kast et al.4 foi desenvolvido um programa de aprendizagem multissensorial, o Dybuster, para ativar regiões subdesenvolvidas do cérebro e fortalecer o cérebro por meio de diferentes canais multissensoriais. Nesse programa, cores, formas e sons são incorporados ao ensino de crianças com dislexia e discalculia. De acordo com os resultados apresentados, essa ativação de múltiplos sentidos promove o armazenamento eficiente e a retenção de novas informações no cérebro. Também foi verificado que palavras que não fizeram parte do treinamento prévio, efetuado por crianças disléxicas e não disléxicas, foram registradas de forma correta, revelando uma transferência de aprendizagem.

Em Ekhsan et al.3 foi desenvolvida uma ferramenta multimídia, o Smart Lexic, para suporte à tomada de decisão no diagnóstico de distúrbios de aprendizagem. Os resultados indicaram que o uso de diferentes mídias pode influenciar positivamente no desempenho dos estudantes disléxicos, uma vez que ao utilizar a ferramenta multimídia as crianças se demonstraram mais interessadas e concentradas nos testes do que quando foram submetidas aos testes tradicionais feitos em papel. A triagem com o Smart Lexic produziu resultados mais confiáveis, uma vez que as atividades dos testes foram realizadas de forma prazerosa, pelo fato das crianças experimentarem uma emoção semelhante à de estar em um jogo.

Pesquisas como de Kast et al.4 e Ekhsan et al.3 apontam uma melhora no desempenho de escolares com dislexia quando recursos multimídia são utilizados. Aplicações multimídia tradicionais estimulam somente dois sentidos humanos: a visão e a audição e pesquisas recentes como Ghinea et al.1 têm buscado formas de incluir em tais aplicações estímulos a outros sentidos, como tato, paladar e olfato. Aplicações que incluem além de mídias tradicionais estímulos a outros sentidos são chamadas de aplicações multissensoriais ou mulsemedia (do inglês Multiple Sensorial Media).

Uma aplicação multissensorial é apresentada em Alam et al.13, em que os autores propõem um e-book capaz de apresentar imagens, sons e produzir efeitos de vibração sincronizados com um conteúdo textual. O trabalho teve como objetivo examinar se o aumento de modalidades de mídia influencia os padrões de aprendizado do usuário. Foram realizados cinco experimentos e seus resultados indicaram uma melhoria considerável na experiência dos leitores, seja na aprendizagem ou no entretenimento, porém o experimento não envolveu indivíduos com dislexia.

Com base nos resultados de Kast et al.4, Ekhsan et al.3 e Alam et al.13, espera-se que a incorporação de estímulos a outros sentidos além de visoauditivos ajude na formação da memória de indivíduos com dislexia, diminuindo a sobrecarga da memória de trabalho, possibilitando assim uma melhor compreensão do texto lido.

Desta forma, este artigo apresenta uma ferramenta, o MBook, desenvolvida para permitir uma leitura multissensorial. O MBook inclui um dispositivo rastreador de olhos, permitindo que mídias multissensoriais possam ser executadas conforme o leitor progride na leitura de um determinado texto. O uso de um dispositivo rastreador ocular é de grande importância para o objetivo deste trabalho, pois é esperada uma grande variação nos tempos de leitura dos indivíduos com dislexia.

Apesar do MBook poder ser utilizado por qualquer usuário que queira experimentar uma leitura interativa, no contexto deste trabalho ele foi utilizado como base para analisar a influência de mídias multissensoriais na compreensão de textos por crianças com transtorno de leitura. Outro fator a ser avaliado por meio dos experimentos é o quanto o uso de livros multissensoriais atua como fator motivador para as crianças no tratamento de dislexia.

Um estudo realizado por Wang & Guthrie14 em escolares da 4ª série do Ensino Fundamental examinou até que ponto os processos motivacionais facilitam a compreensão de textos e conclui que a motivação intrínseca se correlaciona positivamente com a compreensão de textos e promove a melhora na leitura ao longo do tempo. Estudantes intrinsecamente motivados tendem a explorar o mundo da leitura encontrando uma variedade de tópicos que lhes interessam15. Eles persistem em lidar com as dificuldades e desejam dominar as habilidades necessárias para a leitura16.

Por outro lado, após realizar estudo utilizando uma estrutura de metas para avaliar as mudanças na motivação dos alunos para leitura e escrita em escolares do ensino fundamental, Meece & Miller17 concluíram que a motivação extrínseca se relaciona ao uso de estratégias para a leitura, como por exemplo memorização simples, no desejo de concluir uma tarefa para obter uma nota em vez de entendê-la.

Dessa forma, pretende-se, por meio dos experimentos, validar a hipótese do potencial do uso livros multissensoriais para a diminuição da sobrecarga na memória de trabalho pelo indivíduo com dislexia, favorecendo a compreensão. Para isso, será verificado se há aumento no desempenho da aprendizagem, ou seja, se há aumento da capacidade de interpretação do conteúdo do texto lido com a utilização de mídias multissensoriais. Além da capacidade de interpretação, será avaliada a velocidade de leitura, para verificar se tais efeitos facilitaram o processo de leitura. Além disso, como objetivo secundário, será avaliado se o uso de livros multissensoriais é fator motivador para a leitura em indivíduos com dislexia.

 

MÉTODO

Neste artigo serão descritos dois estudos de casos únicos: um com uma criança com dislexia e outro com uma criança sem dislexia. Em seguida, apresentamos uma comparação entre os dois estudos de caso individuais. Segundo Triviños18, o estudo de caso "é uma categoria de pesquisa cujo objeto é uma unidade que se analisa aprofundadamente", podendo esse objeto ser uma determinada comunidade, ou a história de vida de uma pessoa ou um processo terapêutico. Para o autor, o estudo de caso orienta a reflexão sobre uma cena, evento ou situação, produzindo uma análise crítica que leva o pesquisador à tomada de decisões e/ou à proposição de ações transformadoras.

Amostra

Duas crianças participaram dos estudos de caso individuais. Ambas as crianças possuem recursos socioculturais semelhantes. A criança com dislexia foi captada por meio de divulgação realizada no Ambulatório de Aprendizagem do Curso de Fonoaudiologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), no Instituto de Neurologia Deolindo Couto. Por simplicidade nos referiremos a essa criança como CCD no restante do texto. A CCD é do sexo feminino, possuía 9 anos no ato do estudo de caso e estava cursando a quarta série do Ensino Fundamental em escola privada.

A criança não disléxica foi selecionada por meio de divulgação realizada em redes sociais e aplicativos de mensagem instantânea. Por simplicidade nos referiremos a essa criança como CND no restante do texto. Vale ressaltar que a seleção da CND se deu de forma a permitir o pareamento entre os dois estudos de caso. A CND também é do sexo feminino, possuía 10 anos no ato do estudo de caso e estava cursando a quarta série do Ensino Fundamental em escola privada.

Os responsáveis e a criança convidada para realizar o estudo de caso foram informados e esclarecidos sobre todos os detalhes do estudo e todos os procedimentos do experimento, confirmando ciência através do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Nenhuma das duas crianças possuía histórico de alterações significativas de comportamento, sensibilidade à essência de eucalipto ou diagnóstico de epilepsia.

Instrumentos e procedimentos

Os experimentos foram realizados nas instalações do Instituto de Neurologia Deolindo Couto, destinadas aos Ambulatórios de Fonoaudiologia, de forma individual, com o mesmo profissional treinado.

O experimento foi desenhado de forma que cada participante fizesse três leituras do livro multissensorial, sendo a primeira leitura sem a presença de mídias multissensoriais e a segunda e terceira com a presença de mídias multissensoriais. O objetivo de realizar três leituras foi viabilizar a análise entre leituras com e sem efeitos (primeira e segunda leituras) e a análise entre leituras com efeitos (segunda e terceira leituras). A Figura 2 resume as etapas da condução dos experimentos que serão descritas em mais detalhes nas seções a seguir.

Antes da primeira leitura, os participantes responderam a um questionário de avaliação inicial da motivação pela leitura. Em seguida, na etapa de instrução de uso do MBook é feita a calibração do rastreador ocular para o participante conforme será apresentado na seção MBook. Após a calibração, o participante é apresentado à interface do MBook. Como forma de se ambientar à interface do MBook, o participante é convidado a abrir um livro sem mídias multissensoriais do catálogo de livros da interface, ler uma página, avançar e retroceder as páginas apenas fixando o olhar nos botões da interface por poucos segundos.

Passada essa etapa de calibração e ambientação, os participantes selecionam o livro E.T - O extraterrestre do catálogo de livros e é iniciada a contagem de tempo da primeira leitura. A mancha do gaze trace, que é um recurso do rastreador ocular que torna visível na tela de leitura a posição do olhar, ficou ativada durante todo o experimento. Concluída a leitura do livro, a própria ferramenta encerra a contagem do tempo de leitura. Após a leitura, é aplicado o questionário de interpretação do livro.

A segunda e terceira leituras são realizadas com a presença de mídias multissensoriais. Assim como na primeira leitura, foi contabilizado o tempo de leitura e, após a leitura, foi aplicado o questionário de interpretação. Ao final da terceira leitura, os participantes voltaram a realizar uma avaliação da motivação pela leitura. O objetivo foi verificar se o uso da ferramenta MBook interferiu na motivação do participante. As seções a seguir apresentam em mais detalhes os questionários de avaliação utilizados no estudo de caso.

Avaliação da motivação pela leitura

O objetivo de realizar a avaliação da motivação foi obter informações de como o participante se percebe em relação às fontes de sua motivação (intrínseca e extrínseca). Segundo Martinelli & Sisto19, a motivação intrínseca se relaciona ao interesse natural por novidades e desafios que mobilizam o indivíduo à ação. A motivação extrínseca se relaciona à tomada de ação do indivíduo disparada por elementos externos em busca de obtenção de recompensas materiais ou sociais ou de reconhecimento. A motivação geral é a soma das motivações intrínseca e extrínseca.

Para a avaliação da motivação pela leitura, foi adaptado um questionário com 12 itens baseados na escala para avaliação da motivação escolar infanto-juvenil (EAME-IJ), constituído de seis questões relacionadas à motivação extrínseca e seis questões à motivação extrínseca. São elas:

1. (MI) Quando eu estou melhorando na leitura, eu me esforço mais.

2. (ME) Eu leio porque meus pais me obrigam.

3. (ME) Eu só leio para que o professor não fique bravo comigo.

4. (MI) Sinto vontade de ler porque gosto de aprender.

5. (ME) Eu me esforço mais para ler só para ganhar um prêmio.

6. (ME) Eu me esforço para ler porque eu quero que a professora preste atenção em mim.

7. (MI) Eu leio para aprender coisas novas.

8. (MI) Quanto mais difícil o texto, mais eu me esforço para ler.

9. (ME) Na escola eu leio melhor quando sou elogiado.

10. (ME) Ganhar presentes me faria ler mais.

11. (MI) Eu leio em casa o que o professor ensinou para saber mais.

12. (MI) Eu me sinto feliz quando vejo que estou melhorando na leitura.

O participante deveria responder cada questão selecionando as opções: sempre, às vezes ou nunca. Conforme apresentado na Figura 2, o questionário de avaliação da motivação pela leitura foi aplicado antes da primeira leitura e após a terceira leitura. Na seção de avaliação, será comparada a motivação dos participantes em cada um desses momentos.

Respostas classificadas como "sempre" receberam 2 pontos, "às vezes" receberam 1 ponto e "nunca" receberam 0 pontos. A pontuação total do participante foi calculada como a soma da pontuação obtida em cada uma das 12 questões, sendo a pontuação máxima do questionário de motivação geral equivalente a 24 pontos. Como o questionário de motivação geral é composto por seis questões de motivação intrínseca e seis questões de motivação extrínseca, a pontuação máxima para cada uma delas é 12 pontos.

Avaliação da compreensão do texto

Após a conclusão de cada leitura, o avaliador realiza, em voz alta, o questionário de avaliação da compreensão do texto. Esse questionário é composto de cinco perguntas referentes à história lida. Para permitir a avaliação do impacto das mídias multissensoriais na compreensão, as perguntas foram elaboradas levando em consideração os momentos da história nos quais haveria a ocorrência desse tipo de mídia. O esperado é que a pontuação obtida seja maior quando o participante está exposto às mídias multissensoriais. Abaixo, são descritas as perguntas de avaliação de interpretação:

1. Elliot ouviu um barulho vindo do depósito, mas percebeu que não era um coiote. Por quê?

2. Quando as crianças foram para a escola e a mãe de Elliot foi trabalhar, o E.T. ficou sozinho em casa. O que o E.T. fez enquanto estava sozinho?

3. Elliot encontrou uma caixa cheia de coisas que o E.T. havia juntado e quando foi pegar uma lâmina de serra acabou se cortando. Como o E.T. ajudou Elliot?

4. O dia do Halloween era o momento certo para levar o E.T. para a floresta para testar o rádio. Como Elliot e o E.T. chegaram na floresta?

5. Os cientistas encontraram o E.T. e o colocaram em uma caixa. Como o E.T. conseguiu escapar e voltar para sua casa?

O avaliador dispunha, além das perguntas, do gabarito de cada questão. À medida que o participante elaborava sua resposta, também em voz alta, o avaliador selecionava as palavras-chave contidas no gabarito e fazia anotações do que o participante respondia que não constava no gabarito. Quanto mais próxima do gabarito maior a pontuação obtida na questão. A Figura 3 apresenta exemplos de resposta da questão 4 dada pelos participantes.

 

 

Conforme apresentado na Figura 3, a definição da pontuação de cada questão foi dada comparando a resposta do participante com o gabarito da questão. Para uma resposta que apresentou dois ou mais elementos contidos no gabarito, a escala selecionada foi a 5, correspondendo ao máximo de pontos da questão, ou seja, 2 pontos. Para uma resposta com somente um elemento do gabarito, a escala atribuída foi a 4, recebendo 1,5 pontos na questão. Para uma resposta "não sei" ou "não lembro" foi atribuída a escala 3, correspondendo a zero pontos na questão. Para uma resposta que englobou elementos do gabarito, porém outros elementos incorretos, como por exemplo, na resposta da questão 4 em que o participante relata que "todos os amigos ajudaram e saíram voando" quando na verdade só o Elliot e o E.T saem voando naquele trecho da história, a escala selecionada foi a 2 recebendo 0,5 ponto na questão. E finalmente, para uma resposta errada, a escala selecionada foi a 1, como por exemplo na resposta da questão 4 em que o participante relata que o Elliot e o E.T. chegaram na floresta em uma "nave espacial" e isso não ocorre na história, recebendo zero ponto na questão.

MBOOK

O MBook estende a proposta apresentada em Vieira et al.20 para a criação de livros multissensoriais, de forma a incluir um dispositivo rastreador ocular. Assim, diferentemente do que foi apresentado em Vieira et al.20, é possível uma sincronização mais fina das mídias executadas em paralelo à leitura com o conteúdo sendo lido. É importante salientar que a falta de sincronismo fino em Vieira et al.20 proporcionou um impacto negativo para os usuários nos experimentos realizados naquele trabalho. Levando-se em consideração que no uso deste tipo de leitura com indivíduos com dislexia é esperada uma grande variação nos tempos de leitura, o uso de um dispositivo rastreador ocular é de grande importância para o objetivo deste trabalho.

A Figura 4 apresenta a tela principal da ferramenta onde se encontram a biblioteca de livros disponíveis na região A, os detalhes do livro selecionado na região B, a mancha do gaze trace do eye tracker na indicação C, além de uma barra de menu para configuração e obtenção de ajuda.

Para que o rastreador ocular funcione de forma correta, é necessário que o usuário faça a calibração do dispositivo. Para isso, a barra de menu disponibiliza a opção de configuração do MBook, onde se encontra essa funcionalidade. Quando selecionada a opção de calibração, a ferramenta solicita ao usuário a execução de alguns passos, como pode ser visto na Figura 5. Após realizar a calibração, a tela principal é exibida novamente.

 

 

Na Figura 4 é possível ver, na região B, que, quando um livro é selecionado, as informações dele são exibidas na parte inferior da tela. Para selecionar um livro, basta olhar ou clicar na capa dele. Na Figura 4, na indicação C, é possível também ver a mancha do gaze trace habilitado (em cima do botão "Iniciar"). Esse recurso é opcional e pode ser desabilitado a qualquer momento.

Para abrir um livro, é necessário fixar o olhar por 2 segundos no botão "Iniciar" que fica sobre a capa do livro selecionado. Ao selecionar o livro através do botão "Iniciar", ele é exibido conforme a Figura 6. É possível observar na figura os botões "Anterior", "Próxima" e "Fechar", nas regiões C, D e E, respectivamente. Esses botões podem ser executados por fixação do olhar sobre eles ou pelo click do mouse. A região A informa o título do livro e a região B o número da página que está sendo exibida.

 

 

Montagem do experimento

A história usada no experimento é uma narrativa com linguagem simples e de tamanho pequeno adaptada do filme E.T. - O Extraterrestre, de Steven Spielberg. Sincronizados com a leitura da história são executados efeitos de som, luz, vento e cheiro, que são disparados, respectivamente, por duas lâmpadas RGB, um ventilador, um dissipador de cheiro com ventoinha e uma caixa de som portátil. A Figura 7 apresenta a configuração do experimento.

 

 

O texto do livro foi dividido em 25 páginas, com todas as páginas possuindo pelo menos uma mídia multissensorial sendo executada. Efeitos de luz branca foram usados para simular ambientes internos/externos ou dia/noite. Também foram usados nos trechos da história onde o dedo do E.T brilhava. Os efeitos de cor das lâmpadas foram usados para situações específicas, por exemplo, verde quando os personagens estavam na floresta, vermelho para o dispositivo de rastreamento de cientistas e variação de cores para a magia do E.T. Um cheiro de eucalipto foi lançado toda vez que a história se passava na floresta e o efeito do vento nos momentos em que o E.T. e as crianças voaram em suas bicicletas. Além disso, efeitos de áudio foram usados para dar vida aos ruídos descritos na história.

A Figura 8 apresenta um exemplo de efeitos apresentados durante a leitura da página 20 do livro. Nela, um efeito de luz verde é executado junto com o cheiro de capim limão para definir o ambiente da floresta. Um efeito de vento é executado no momento em que os personagens estão voando. Além disso, dois áudios são executados, um som de bicicleta, quando o personagem principal coloca o E.T. na bicicleta, e um som de rádio sendo sintonizado, quando os personagens montam um rádio na floresta. Cada efeito é simbolizado visualmente sobre o texto da página na Figura 8.

 

 

 

RESULTADOS/DISCUSSÃO

Estudo de caso CCD (com dislexia)

A Figura 9 apresenta o questionário de avaliação de compreensão com as respostas da CCD. Na figura é possível observar as marcações das partes do gabarito abordadas na resposta e anotações de elementos adicionais das respostas que não constam no gabarito.

Avaliação da Questão 1. Na primeira avaliação, a resposta foi classificada como parcialmente incorreta (0,5 pontos) visto que não "tinha uma perna estranha" e sim uma pegada estranha no gabarito. A resposta se mantém na segunda avaliação, recebendo, portanto, a mesma classificação. Na terceira avaliação, CCD continuou respondendo que "tinha uma perna estranha" e, além disso, relatou que "estava se escondendo". Sendo assim, a terceira avaliação também foi classificada como parcialmente incorreta (0,5 pontos).

Avaliação da Questão 2. Na primeira avaliação a resposta foi de que o E.T. foi "explorar o local" de forma parcialmente correta (1,5 pontos) visto que foi o que o E.T. fez de fato, porém a resposta não englobou detalhes do gabarito. Na segunda avaliação, a resposta foi classificada como totalmente correta (2,0 pontos) pois além de relatar que o E.T foi "explorar a casa", foram dados detalhes sobre o brinquedo e a televisão. Na terceira avaliação, a resposta também foi classificada como totalmente correta (2,0 pontos), pois foram relatados o brinquedo e a televisão, englobando detalhes do gabarito.

Avaliação da Questão 3. Na primeira avaliação a resposta foi classificada como parcialmente correta (1,5 pontos), visto que além do dedo do E.T. começar a brilhar existiam mais detalhes que poderiam ser relatados. Na segunda avaliação, além de relatar que o dedo do E.T. começar a brilhar, informou ainda que o machucado sumiu. Sendo assim, a resposta da segunda avaliação foi classificada como totalmente correta (2,0 pontos). Na terceira avaliação, a resposta se manteve, sendo avaliada também como totalmente correta (2,0 pontos).

Avaliação da Questão 4. Na primeira avaliação, a resposta foi de que Elliot e o E.T. chegaram à floresta de bicicleta. A resposta foi classificada como parcialmente correta (1,5 pontos), pois não relata outros detalhes. Na segunda avaliação, a resposta incluiu o detalhe de que Elliot e o E.T. saíram voando, sendo, portanto, classificada como totalmente correta (2,0 pontos). A resposta se mantém na terceira avaliação, sendo avaliada também como totalmente correta (2,0 pontos).

Avaliação da Questão 5. Na primeira avaliação, a resposta foi de que o E.T. voltou para casa com a ajuda dos amigos, sem relatar outros detalhes, sendo classificada como parcialmente correta (1,5 pontos). Na segunda avaliação, a resposta inclui relato sobre a nave espacial enorme, sendo classificada como totalmente correta (2,0 pontos). Na terceira avaliação, a resposta também incluiu que o E.T. fugiu para a floresta, sendo classificada como totalmente correta (2,0 pontos).

Avaliação global. Com o somatório dos pontos obtidos, a nota da primeira avaliação foi de 6,5, com um tempo de leitura de 15 minutos. Na segunda avaliação, a pontuação foi de 8,5, com um tempo de leitura de 13 minutos. Por fim, na terceira avaliação, a pontuação se manteve em 8,5, mas com uma variação no tempo de leitura para 11,5 minutos.

A Figura 10 exibe as respostas da CCD para o questionário de motivação. Na figura, são apresentados o questionário inicial (A) e final (B). A pontuação obtida na motivação intrínseca inicial foi de 11 pontos e a da motivação extrínseca inicial foi de 7, com uma motivação total de 18 pontos. A pontuação obtida na motivação intrínseca final foi de 12 pontos e a da motivação extrínseca final foi de 8, com uma motivação total de 20 pontos.

Estudo de caso CND (sem dislexia)

A Figura 11 apresenta o questionário de avaliação de compreensão com as respostas da CND. Na figura é possível observar as marcações das partes do gabarito abordadas na resposta e anotações de elementos adicionais das respostas que não constam no gabarito.

Avaliação da Questão 1. Na primeira avaliação, a resposta foi classificada como totalmente correta (2,0 pontos), visto que relata que as pegadas não pareciam ser de coiotes e que coiotes não brincam com bolas de forma detalhada. A mesma resposta foi dada na segunda e terceira avaliações, sendo também classificadas como totalmente correta (2,0 pontos).

Avaliação da Questão 2. Na primeira avaliação, a resposta foi de que o E.T. foi comer e viu televisão. A resposta foi classificada como totalmente correta (2,0 pontos). A resposta se manteve na segunda avaliação e foi complementada na terceira avaliação com a informação de que o E.T. fez amizade com a fauna, achou um brinquedo e uma história, além de ter visto televisão. Tanto na segunda quanto na terceira avaliação, a resposta foi classificada como totalmente correta (2,0 pontos).

Avaliação da Questão 3. Na primeira avaliação, a resposta foi classificada como parcialmente correta (1,5 pontos), visto que além da informação de que o dedo do E.T. começa a brilhar, foram apresentados mais detalhes que poderiam ser relatados. Na segunda avaliação, a resposta se manteve, sendo também classificada como parcialmente correta (1,5 pontos). Na terceira avaliação, a resposta incluiu o relato de que o machucado sumiu, sendo classificada como totalmente correta (2,0 pontos).

Avaliação da Questão 4. Na primeira avaliação, a resposta foi de que Elliot e E.T. chegaram na floresta voando. A resposta foi considerada parcialmente correta (1,5 pontos), pois não relata outros detalhes. Na segunda avaliação, a resposta incluiu o detalhe de que Elliot e E.T. chegaram na floresta de bicicleta, sendo classificada como totalmente correta (2,0 pontos). Na terceira avaliação a resposta se manteve, sendo também classificada como totalmente correta (2,0 pontos).

Avaliação da Questão 5. Na primeira avaliação, a resposta foi classificada como totalmente incorreta (0 pontos), pois relata que o E.T. "tinha um telefone dentro dele", ficando a resposta fora do contexto da pergunta. Na segunda avaliação a resposta foi de que o E.T. fugiu com os amigos e relata que o E.T. "tinha um telefone dentro do peito dele". Por ter apresentado elementos fora do contexto da pergunta, a resposta foi classificada como parcialmente incorreta (0,5 pontos). Na terceira avaliação a resposta foi de que o E.T voltou para casa na nave espacial e relata que "o telefone/rádio começou a brilhar no peito" do E.T. Por ter apresentado elementos fora do contexto da pergunta, a resposta também foi classificada como parcialmente incorreta (0,5 pontos).

Avaliação global. Com o somatório dos pontos obtidos, a nota da primeira avaliação foi de 7,5, com um tempo de leitura 7,5 minutos. Na segunda avaliação a pontuação foi de 8,0, com um tempo de leitura de 6,5 minutos. Por fim, na terceira avaliação a pontuação foi de 8,5 e manteve-se o tempo de leitura em 6,5 minutos.

A Figura 12 exibe os questionários da CND para o questionário de motivação. Na figura são apresentados o questionário inicial (A) e final (B). A pontuação obtida na motivação intrínseca inicial foi de 6 e a da motivação extrínseca inicial foi de 5 pontos, com uma motivação total de 11 pontos. A pontuação obtida na motivação intrínseca final foi de 7 pontos e a da motivação extrínseca final foi de 2 pontos, com uma motivação total de 9 pontos.

Análise comparativa

Com base nos resultados dos dois estudos de caso usando o MBook, foram investigados o impacto das mídias multissensoriais para a compreensão do texto lido, o impacto para o ganho de automatismo durante a leitura e quanto o aplicativo atuou como fator motivador para a leitura. As Tabelas 1 e 2 apresentam os resultados dos dois estudos de caso comparando o tempo de leitura e a compreensão. A comparação apresentada nas tabelas se dá entre a primeira leitura, que foi realizada sem mídias multissensoriais, e na segunda leitura, que foi realizada com mídias multissensoriais. Em seguida, a segunda leitura é comparada com a terceira, tendo ambas sido realizadas com mídias multissensoriais.

No que diz respeito à velocidade da leitura, conforme resumido na Tabela 1, CCD levou 15 minutos para completar a primeira leitura. Esse tempo diminuiu para 13 minutos na segunda leitura, uma redução de 13%. Na terceira leitura esse tempo diminuiu para 11,5 minutos, uma redução de 12%. Já CND levou 7,5 minutos para completar a primeira leitura. Esse tempo diminuiu para 6,5 minutos na segunda leitura, uma redução de 13%, e se manteve em 6,5 minutos na terceira leitura. Nos dois estudos de caso houve uma diminuição maior do tempo de leitura da primeira leitura para segunda (quando as mídias multissensoriais foram inseridas) do que da segunda para a terceira.

No que diz respeito à compreensão da leitura, conforme resumido na Tabela 2, CCD atingiu uma nota 6,5 na primeira leitura. Essa nota aumentou para 8,5 na segunda leitura, um aumento de 31%, e se manteve na terceira leitura. Já CND atingiu uma nota 7,0 na primeira leitura. Essa nota aumentou para 8,0 na segunda leitura, um aumento de 14%. Na terceira leitura essa nota aumentou para 8,5, um aumento de 6%. Nos dois estudos de caso houve um ganho de compreensão maior da primeira leitura para segunda (quando os efeitos multissensoriais foram inseridos) do que da segunda para a terceira.

A Tabela 3 apresenta os resultados para a motivação intrínseca e a motivação extrínseca. Antes do início do experimento, a motivação intrínseca da CCD era de 11 pontos. Após a utilização do MBook essa motivação subiu para 12 pontos, um aumento de 9%. No caso da CND a motivação intrínseca começou em 7 pontos e subiu para 8 pontos, um aumento de 14%. Já a motivação extrínseca da CCD começou em 6 pontos. Após a utilização do MBook, essa motivação aumentou para 7 pontos, elevação de 14%. No caso da CND a motivação extrínseca começou em 5 e diminuiu para 2, uma redução de 60%.

Nos dois estudos de caso, a motivação intrínseca aumentou depois do experimento. O mesmo comportamento, entretanto, não foi observado para a motivação extrínseca, pois a CND reduziu consideravelmente sua motivação extrínseca. Por outro lado, a CCD teve um aumento de um ponto.

 

DISCUSSÃO

Os resultados apresentados acima apontam para um ganho maior na compreensão do texto com a inserção das mídias multissensoriais. Tanto CCD quanto CND apresentaram maior razão de ganho em compreensão da primeira para a segunda leitura (quando foram inseridas as mídias multissensoriais) do que o observado da segunda para a terceira leitura (repetição da leitura com mídias multissensoriais).

Tais resultados apontam que a inclusão de efeitos multissensoriais facilitou o processo de compreensão e que o efeito da repetição não foi causador desse aumento na compreensão. Os resultados também apontaram que o ganho de compreensão de CCD foi maior que o de CND quando houve a inclusão das mídias multissensoriais, conseguindo a CCD equiparar sua pontuação com a da CND.

Esses resultados são apoiados por pesquisas publicadas na literatura que indicam que a formação de memória engloba diferentes sentidos21 e que o uso de conteúdos multimídia melhora o desempenho de escolares com dislexia3, sendo apontada uma melhoria no aprendizado de crianças com dislexia quando este é acompanhado de estímulos multissensoriais4.

Em relação à velocidade de leitura, os resultados revelaram um aumento de velocidade da primeira leitura (sem efeitos) para a segunda leitura (com efeitos) maior que da segunda leitura (com efeitos) para terceira leitura (com efeitos) para CND. Para CCD, houve a mesma razão de ganho de velocidade da primeira leitura (sem efeitos) para a segunda leitura (com efeitos) e da segunda leitura (com efeitos) para terceira leitura (com efeitos).

De acordo com Mousinho et al.22, a precisão e velocidade de leitura, apesar de não serem suficientes para garantir a interpretação desejada de textos, favorecem muito a possibilidade de compreensão. Com isso, podemos relacionar a melhora obtida na interpretação do texto ao aumento da velocidade de leitura, indicando que os efeitos sensoriais promoveram um contexto na formação da memória, facilitando sua recuperação, diminuindo a sobrecarga na memória de trabalho necessária para a leitura, auxiliando, assim, o indivíduo com dislexia a ganhar automatismo e melhorar sua compreensão do texto.

Como objetivo secundário, foi avaliado se o uso do livro multissensorial atuou como fator motivador para a leitura. Os resultados apontaram para um aumento na motivação intrínseca pela leitura nos dois estudos de caso. A motivação extrínseca da CCD aumentou em menor razão do que a sua motivação intrínseca e a motivação extrínseca da CND reduziu significativamente. Com os resultados obtidos, concluímos que o uso de mídias multissensoriais associadas à leitura é um importante fator para aumento da motivação intrínseca de leitura e para o aumento da compreensão de texto e que o uso do MBook pode ser uma ferramenta importante para a continuidade no tratamento de crianças com dislexia.

Por fim, de acordo com os achados de Wang & Guthrie14 e Meece & Miller17, estas variações de motivação podem ter contribuído para o ganho de compreensão. Tais estudos sugerem que, embora a motivação extrínseca esteja associada positivamente com notas de avaliação da leitura, é menos provável que influencie significativamente na compreensão do texto, como ocorre em escolares com predominância de motivação intrínseca.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência:
Ellen Paixão Silva
Rua Dr. Satamini, 84/102 - Tijuca
Rio de Janeiro, RJ, Brasil - CEP 20270-230
E-mail: ellenpaixao@gmail.com

Artigo recebido: 12/3/2020
Aprovado: 31/1/2021

 

 

Trabalho realizado no Instituto de Neurologia Deolindo Couto da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Conflito de interesses: Os autores declaram não haver.

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