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Revista Psicopedagogia

Print version ISSN 0103-8486

Rev. psicopedag. vol.39 no.118 São Paulo Jan./Apr. 2022

http://dx.doi.org/10.51207/2179-4057.20220001 

ARTIGO ORIGINAL

 

Competências acadêmicas e habilidades sociais: Estudo correlacional em crianças

 

Academic competences and social skills: Correlational study in children

 

 

Sendy Christine Pinheiro MartinsI; Lariana Paula PintoII

IGraduação em Psicologia - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC MINAS); Pós-graduação Lato Sensu em Avaliação Psicológica - PUC MINAS; Especialização em Neuropsicologia aplicada à Neurologia Infantil - Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM UNICAMP); Mestrado em Educação - Universidade do Vale do Sapucaí (UNIVÁS), Pouso Alegre, MG, Brasil
IIGraduação em Psicologia - Universidade do Vale do Sapucaí (UNIVÁS); Mestrado e Doutorado em Psicologia - Universidade São Francisco (USF); Professora do Mestrado em Educação da UNIVÁS, Pouso Alegre, MG, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente estudo apresenta correlações entre competências acadêmicas e habilidades sociais evidenciadas em 50 escolares da rede pública de 6 a 13 anos (M=9,14; DP=2,01) moradores do interior de Minas Gerais. As competências acadêmicas foram mensuradas por meio do Teste de Desempenho Escolar (TDE) e as habilidades sociais pelo Inventário de Habilidades Sociais, Problemas de Comportamento e Competências Acadêmicas para Crianças (SSRS). Os resultados evidenciaram correlações positivas e significativas entre a habilidade social de Responsabilidade e competências de escrita, aritmética e desempenho acadêmico geral. Também se verificou correlação semelhante entre a habilidade social de assertividade e as competências de leitura, escrita e desempenho acadêmico geral. Os resultados e estudos mostram que o repertório de habilidades sociais em crianças pode estar atenuado no processo de aprendizagem, e programas de desenvolvimento de habilidades sociais na infância podem ser realizados como preventivos de problemas de aprendizagem e comportamento.

Unitermos: Habilidades Sociais. Competências Acadêmicas. Crianças.


SUMMARY

This study presents correlations between academic competences and social skills evidenced in 50 schoolchildren from the public network aged 6 to 13 years (M=9.14; SD=2.01) living in the interior of Minas Gerais state. Academic competencies were measured through the School Performance Test (TDE) and social skills by the Inventory of Social Skills, Behavioral Problems and Child Academic Competencies (SSRS). The results showed positive and significant correlations between Social Responsibility skills and writing skills, arithmetic and general academic performance. The results and studies show that the repertoire of social skills in children can be attenuated in the learning process, and programs for the development of social skills in childhood can be carried out as a preventive measure of learning and behavior problems.

Keywords: Social Skills. Academic Skills. Children.


 

 

INTRODUÇÃO

O processo de aprendizagem na infância pode ser considerado dinâmico. Para que a aprendizagem aconteça, o desenvolvimento necessita ter atingido determinada etapa e, consequentemente, a maturação de funções cognitivas específicas. Quando a criança avança um passo no campo da aprendizagem, ela está evoluindo dois no âmbito de desenvolvimento, sendo desenvolvimento e aprendizagem processos complementares. A aprendizagem segue sempre o desenvolvimento, e o desenvolvimento antecede a aprendizagem1.

Este processo se caracteriza como essencial e universal para o desenvolvimento de funções psicológicas, nas quais ocorrem alterações comportamentais por meio das experiências, vivências, interações ambientais e subjetivas do sujeito2. A aprendizagem possibilita que a criança construa estruturas cada vez mais elaboradas para interagir com o meio, tornando-se ativa nele, ou seja, conforme aprende, amplia seu repertório de habilidades1.

Com a chegada da terceira infância (6 anos), o desenvolvimento se direciona para o processo de escolarização, voltando-se para o desempenho nesse contexto. O desempenho acadêmico está relacionado com as capacidades da criança em acompanhar e executar os conteúdos apresentados em sua faixa etária, envolvendo tanto aspectos qualitativos como quantitativos. O âmbito escolar se apresenta como provedor, mediador e facilitador das aprendizagens. É na escola que a criança amplia seu repertório social e acadêmico3.

A inserção da criança no ambiente escolar, consequentemente, possibilitará aquisições de novas habilidades. Conforme o processo de escolarização acontece, crescem gradualmente as demandas sociais em busca de uma adequação ao meio. As necessidades escolares requerem que as crianças desenvolvam um novo desempenho, que está associado às necessidades de seguir as regras propostas pelos professores, evitar brigas com os colegas de classe, solicitar e fornecer informações, prestar atenção e diversos outros4. Fernandes et al.5 abordam que a experiência escolar envolve processos multifatoriais, incluindo variáveis individuais, contextuais (família, comunidade e escola), sociais, políticas e econômicas.

A infância também se apresenta como marco para o desenvolvimento das habilidades sociais que, por sua vez, estão associadas aos comportamentos, sentimentos e atitudes que refletem civilidade, empatia, assertividade, autocontrole e boas relações sociais. Del Prette & Del Prette6 e Leme et al.7 abordam que as habilidades sociais começam a se desenvolver desde o nascimento da criança e se incrementarão durante toda a vida por meio das vivências, experiências e influências presentes no contexto social (escola, família e sociedade).

Morrison & Bellack8, citados por Feitosa9, acrescentam que a competência social está associada à capacidade do sujeito em interpretar e interagir com o meio social, requerendo que o mesmo realize uma análise do funcionamento e do que se espera em um determinado ambiente por meio de suas normas e particularidades. Os autores ainda evidenciam que somente obter um repertório de habilidade social não se faz suficiente para uma interação social significativa, e sim como e quando tais habilidades necessitam ser utilizadas.

Esse repertório possibilita a sustentação entre as relações interpessoais e comportamento social como, por exemplo, como se posicionar em um grupo de pessoas, demonstrar suas opiniões, pedir e solicitar auxílio, ser gentil, aceitar críticas e tomar decisões adequadas10.

Segundo Del Prette & Del Prette6, as habilidades sociais mais valorizadas e pesquisadas no cenário global estão relacionadas com as interações interpessoais (cumprimentar, elogiar, ofertar e solicitar ajuda, convidar), autocontrole (controlar humor, seguir e respeitar regras), habilidades acadêmicas (realizar tarefas escolares e seguir instruções dos educadores), ajustamento (comportar-se e obedecer) e asserção (iniciar diálogos, aceitar elogios e realizar convites).

Del Prette & Del Prette6 ainda classificam as habilidades sociais em sete pilares, quais sejam: o autocontrole e expressividade emocional, correspondentes à capacidade da criança em expressar suas emoções (negativas e positivas) e se posicionar em situações frustrantes; a civilidade, a capacidade de ser gentil, cumprimentar e agradecer; a empatia, com a capacidade de ouvir, expressar compreensão ao sentimento ou situação vivenciada pelo outro; a assertividade, com a capacidade de defender seus direitos; fazer amizades, iniciar e manter contato com seus pares e adultos; solução de problemas interpessoais, com a capacidade de identificação e elaboração de estratégias para resolução de problemas; e, por fim, habilidades acadêmicas, com a capacidade em seguir regras, participar de discussões e se posicionar no âmbito escolar.

Casali-Robalinho et al.11 identificam que o ambiente familiar possui grande importância para o desenvolvimento de habilidades sociais na infância, considerando que crianças desde seus primeiros anos de vida aprendem por meio da observação, de orientações e regras apresentadas por seus familiares. Grol & Andreatta12 abordam que o contexto cultural e as regras sociais impostas por determinada sociedade ou país também influenciam no repertório social, enfatizando que cada cultura é regida por regras e costumes subjetivos. Del Prette & Del Prette13 corroboram que as habilidades sociais podem ser consideradas "situacionais", podendo variar de acordo com a sociedade, em se tratando de um construto aprendido por meio de experiências e relações sociais.

O desenvolvimento precário de habilidades sociais na infância apresenta riscos para o funcionamento psicossocial da criança e pode gerar consequências aversivas, que podem se perpetuar por toda a vida10. Leal et al.14 abordam que o desenvolvimento das habilidades sociais na criança pode ser considerado como preventivo ao desenvolvimento socioemocional e psicológico saudável, por se tratar de um sistema de classes que provê bem-estar e relações interpessoais positivas. Cia & Barham15 destacam que crianças com melhores repertórios socioemocionais podem ser consideradas mais confiantes e persistentes em seu funcionamento.

Gardinal & Marturano16 identificam que avaliações, tanto positivas quanto negativas no repertório de habilidades sociais, associam-se com o processo de aprendizagem, e que as relações estabelecidas pelos escolares são atenuadas perante as competências acadêmicas. Bartholomeu et al.17, por sua vez, elucidam que crianças com dificuldades acadêmicas podem não apresentar déficits em habilidades sociais, mas identificam a necessidade de uma análise ampliada entre diversos aspectos relacionados ao desenvolvimento infantil.

Haager & Vaughn18, citados por Feitosa9, evidenciaram em seus estudos que, por meio da perspectiva de educadores, escolares com distúrbios de aprendizagem e baixo desempenho acadêmico tendem a apresentar déficits em habilidades sociais (cooperação, autocontrole e asserção) e maiores problemas de comportamento. Marturano et al.19 abordam que as dificuldades de aprendizagem podem ser caracterizadas como uma síndrome psicossocial, relacionando as dificuldades de interações sociais e identificando que um repertório amplo de habilidades sociais na infância está associado com melhores competências acadêmicas.

Fernandes et al.5 evidenciam, por meio da literatura, que as habilidades sociais auxiliam as competências acadêmicas e o bom desempenho escolar e também estimulam a capacidade de tomada de decisão e minimização de comportamentos disfuncionais e de risco, que contribuem para o processo de aprendizagem. Elias & Amaral20 abordam que programas interventivos em habilidades sociais na infância, em âmbito nacional e internacional, identificam amplos efeitos positivos no desenvolvimento infantil, caracterizando as habilidades sociais como protetivas no desenvolvimento humano.

Considerando o público pesquisado, que se encontra em pleno desenvolvimento acadêmico e social, fez-se como objetivo do presente estudo correlacionar competências acadêmicas e habilidades sociais em crianças.

 

MÉTODO

Participantes

Participaram deste estudo escolares da rede pública de ensino que frequentam uma instituição socioassistencial de uma cidade no interior do estado de Minas Gerais, com idades de 6 a 13 anos (M=9,14; DP=2,01). Todos os participantes cursavam o Ensino Fundamental de escolas estaduais e municipais, sendo 7 (14%) do 1º ano, 9 (18%) do 2º ano, 8 (16%) do 3º ano, 8 (16 %) do 4º ano, 7 (14%) do 5º ano, 10 (20%) do 6º ano e 1 (2%) do 7º ano. A pesquisa também contou com a contribuição dos professores dos escolares, a fim de ampliar acerca das habilidades sociais e desempenho acadêmico no âmbito escolar.

Procedimentos e instrumentos

Os participantes foram avaliados em sessões individuais, de forma aleatória, em condições ambientais adequadas e em horários de atendimento socioassistencial em uma entidade localizada em um município do interior de Minas Gerais. Respeitaram-se todos os parâmetros éticos em investigações com seres humanos. As crianças aceitaram participar da pesquisa e foram autorizadas pelos responsáveis a participarem do estudo, mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e do Termo de Assentimento Livre e Esclarecido (TALE).

Seus respectivos professores também aceitaram a participação por meio da assinatura do TALE, após aprovação do projeto de pesquisa pelo Comitê de Ética em Pesquisa, sob CAEE 16585019.4.0000.5102.Além dos instrumentos utilizados na análise dos critérios de inclusão, foram administrados os seguintes instrumentos para avaliação das variáveis dependentes do estudo:

Teste de Desempenho Escolar (TDE)21: é um teste caracterizado como instrumento psicométrico que possibilita avaliação das capacidades fundamentais como escrita, aritmética e leitura de forma clara e objetiva. A área da escrita possibilita a execução de nomes próprios e de palavras contextualizadas sob ditado; a de aritmética, expressões de soluções de problemas (oral e escrita) e cálculos de operações aritméticas; e leitura, manifestar o reconhecimento de palavras isoladas do contexto21. O instrumento pode ser aplicado por profissionais de saúde e educação em escolares entre o 1ª e 6ª ano do Ensino Fundamental; sua aplicação possui variância de 20 a 30 minutos e sua correção é realizada conforme o levantamento de dados computando-se os itens respondidos corretamente, sendo cada item correto equivalente 1 ponto, enfatizando que o instrumento encontra-se recém-lançado em uma versão atualizada (TDE II). A soma dos pontos dos três subtestes constrói o Escore Bruto Total (EBT)21.

Inventário de Habilidades Sociais, Problemas de Comportamento e Competência Acadêmica (SSRS; adaptação e padronização brasileira)22: é um instrumento de uso restrito a psicólogos que permite mapear três áreas do comportamento da criança, sendo elas habilidades sociais, problemas de comportamento e competências acadêmicas. O SSRS possui três questionários de avaliação, sendo um destinado à própria criança, um aos pais ou familiares e um para os professores; o questionário direcionado para a própria criança possibilita que ela mesma faça uma autoavaliação sobre suas habilidades sociais e comportamentos e também oportuniza a perspectiva de seus pais e professores. A versão original do instrumento foi validada por meio da correlação com outras escalas validadas nos Estados Unidos que avaliavam construtos similares22.

Análise de dados

Os dados foram analisados com o pacote estatístico SPSS (13.0) para fins de execução das análises estatísticas descritivas e inferenciais. O procedimento de análise quantitativa dos dados foi realizado por meio da análise descritiva de média e desvio padrão e inferencial do Coeficiente de Correlação de Pearson, com um nível de significância de p0,05.

 

RESULTADOS

Buscando justificar os objetivos propostos, serão apresentadas a seguir as estatísticas da análise descritiva relativa aos resultados dos instrumentos utilizados, assim como as inferências a respeito das correlações identificadas entre os testes aplicados (SSRS e TDE). O desempenho da amostra nos instrumentos aplicados pode ser observado na Tabela 1, em que foram levantados os valores mínimo, máximo, média e o desvio padrão dos resultados.

Os fatores de competências acadêmicas do instrumento TDE e habilidades sociais do inventário SSRS, assim como os escores mínimos, máximos, média e desvio padrão, encontram-se na Tabela 1. Na Tabela 2, são apresentadas as estatísticas inferenciais da amostra, na qual se dá início às correlações entre os resultados obtidos pelos participantes nos instrumentos SSRS pela perspectiva das crianças/professores e TDE.

A partir da Tabela 2, pode-se verificar que foram encontradas correlações significativas (p<0,05), por meio da correlação de Pearson, entre a habilidade de Responsabilidade (F2) com os resultados relacionados à competência de Escrita (r=0,324; p=0,022), à Aritmética (r=0,392; p=0,005) e ao desempenho total no TDE (r=0,332; p=0,019).

Essas correlações de magnitude fraca e positiva revelam que, quanto mais frequente os comportamentos autopercebidos de responsabilidade, como demonstrar compromisso com as tarefas, prestar atenção no professor, seguir os direcionamentos, deixar seus objetos e carteira organizados, fazer atividades no tempo estabelecido e outros, melhores serão as pontuações relativas ao desempenho em tarefas de ditado de palavras e operações matemáticas, assim como no desempenho global em atividades escolares. Diante disso, verificou-se a correlação entre os fatores do SSRS agora avaliados pelos professores, e o desempenho dos estudantes, observados na Tabela 3.

Pode-se verificar na Tabela 3 que houve correlações significativas por meio da correção de Pearson entre a habilidade de Assertividade/Desenvoltura social (F3) com as competências de Leitura (r=0,438; p=0,001), Escrita (r=0,333; p=0,018) e no desempenho total do TDE (r=0,408; p=0,003). Os coeficientes encontrados foram positivos e variaram de magnitude fraca a moderada, revelando que comportamentos como questionar regras injustas, autocontrole, expressar opiniões inferem na desenvoltura nas competências acadêmicas de Leitura, Escrita e Globais.

Também se observa correlação significativa, positiva e de magnitude fraca entre a pontuação geral no repertório percebido pelos professores em relação à pontuação geral nas habilidades sociais com o subteste Leitura (r=0,328; p=0,020) e a pontuação total no TDE (r=0,329; p=0,019), evidenciando que o perfil global das habilidades sociais apresenta inferências nas competências acadêmicas específicas e gerais da criança.

 

DISCUSSÃO

Os resultados encontrados evidenciaram correlação positiva e significativa entre a habilidade social de Responsabilidade (autopercepção da criança) e as competências acadêmicas de Escrita, Aritmética e Desempenho Acadêmico Total. A habilidade de responsabilidade possibilita que a criança estabeleça uma conexão de atenção e preocupação com as atividades escolares propostas. Além disso, permeia possibilidades de boas interações interpessoais, capacidade de seguir as regras e direcionamento dos educadores e influências em seu interesse e execução de atividades.

Verifica-se que esses resultados corroboram com o estudo de Feitosa9, que relacionou habilidades sociais, desempenho acadêmico e processos cognitivos, no qual foram verificadas correlações entre a habilidade de Responsabilidade com a capacidade de raciocínio geral e leitura de expressões faciais. A pesquisa também evidenciou que os processos cognitivos podem ser compreendidos como mediadores nas competências acadêmicas e habilidades sociais.

Essa correlação também possibilita analisar a habilidade social de Responsabilidade como preventiva a problemas de comportamento. Casali-Robalinho et al.11 evidenciaram que a habilidade de Responsabilidade apresenta maior peso preditivo sobre problemas de comportamento, sendo considerada como preventiva e potencializadora no desenvolvimento socioemocional infantil. Em síntese, identifica-se que a habilidade social de Responsabilidade possa estar atenuada em relação às competências acadêmicas, que possibilitam à criança uma demonstração de compromisso com relação a suas atividades, prestar atenção nas aulas e explicações nos educadores e, consequentemente, a realização de tarefas no tempo estabelecido21.

Os resultados apontam a correlação positiva e significativa entre a habilidade social de Assertividade/Desenvoltura social (perspectiva dos professores) com as competências acadêmicas de leitura, escrita e desempenho acadêmico total. A competência de Assertividade oferece à criança condições para adequar-se ao contexto social, auxiliando também na formação de um pensamento assertivo e no favorecimento da manutenção de outras habilidades6.

Com isso, essa correlação corrobora com o estudo de Bartholomeu et al.17 sobre habilidades sociais e desempenho escolar em português e matemática em crianças em idade escolar, o qual evidenciou correlação entre a habilidade social de Assertividade com as competências de escrita por figuras e ditado e execução de problemas aritméticos. O estudo evidenciou associação entre a habilidade social de Assertividade com a capacidade de resolução de problemas matemáticos, sendo uma variável que apresenta algum tipo de melhora nessa competência acadêmica; essa correlação não foi evidenciada diretamente na competência acadêmica de aritmética neste estudo, mas pode estar atenuada no desempenho acadêmico total.

Foram identificadas correlações significativas e positivas entre o perfil geral de habilidades sociais com a competência acadêmica de Leitura. Essa correlação se aproxima da literatura de Gardinal & Marturano16, que evidenciaram que relações sociais positivas em crianças se associam a bons desempenhos em leitura.

Os resultados em geral corroboram com pesquisas na área das habilidades sociais e competências acadêmicas em crianças, sendo que Elias & Amaral20, em seu estudo sobre habilidades sociais, comportamentos e desempenho acadêmico pré e pós-treino de habilidades sociais, evidenciaram que crianças expostas a um programa de treinamento de habilidades sociais apresentaram resultados superiores às que não foram expostas, sendo que os professores também identificaram resultados relevantes no âmbito escolar. Esses resultados reforçam os conceitos sobre a importância de programas de intervenção de habilidades sociais na infância como possibilidade de trabalho preventivo a problemas de comportamento no contexto escolar.

Fernandes et al.5, em sua pesquisa sobre preditores do desempenho escolar ao final do Ensino Fundamental, também evidenciaram que as habilidades sociais (recurso do aluno) impactam positivamente no desempenho escolar, podendo ser auxiliadoras durante toda trajetória escolar. O estudo também evidenciou, por meio dos resultados, possibilidades de intervenção com alunos, famílias e agentes educativos.

Cia & Costa4 também contribuem com seu estudo sobre desempenho acadêmico em relação ao desenvolvimento social com escolares do Ensino Fundamental, corroborando correlações significativas entre repertório de habilidades sociais e desempenho acadêmico. Os resultados obtidos na pesquisa identificaram que, quanto mais amplo o repertório de habilidades sociais nas crianças, menores os índices de problemas de comportamento, e, quanto mais elevados os índices de problemas de comportamento, menor o desempenho acadêmico.

Os autores também reforçaram a necessidade de intervenção de habilidades sociais na infância, sendo que as habilidades sociais podem ser tornar possibilidades para diminuição do surgimento de problemas durante o desenvolvimento. Esse estudo corrobora com os resultados da pesquisa e literatura na área sobre a relação entre o repertório de habilidades sociais e competências acadêmicas.

As pesquisas de Cia & Barham15, Leal et al.14, Haager & Vaughn18, Bandeira et al.23, Carvalho24, Marturano et al.19, Barbosa25 e Ferrão et al.26 apontaram correlação entre habilidades sociais, aspectos acadêmicos na infância e outras variáveis relacionadas. Também houve comprovação para esta discussão, uma vez que evidenciaram associações entre o repertório de habilidades sociais e competências acadêmicas, considerando que relações interpessoais bem-sucedidas podem ser consideradas canais de processo para a aprendizagem. Compreendendo que crianças se encontram em processo ascendente para o desenvolvimento acadêmico e social e, conforme se desenvolvem, há maiores capacidades de percepção social, isso, consequentemente, atenua as experiências, vivências e estímulos que recebe no âmbito familiar e social.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ressalta-se que a natureza dos dados desse estudo foi correlacional; em suma, conclusões sobre a direção causal não se estabelecem. Considera-se os resultados desta pesquisa importantes para verificar competências acadêmicas e habilidades sociais em crianças em seu pleno desenvolvimento. Foram obtidas correlações entre a habilidade de Responsabilidade e as competências acadêmicas de escrita, aritmética e desempenho acadêmico geral, e habilidade social de Assertividade com leitura, aritmética e desempenho acadêmico geral.

A presente pesquisa se harmoniza com a literatura da área, que evidencia as associações significativas entre as habilidades sociais e competências acadêmicas na infância, sendo consideradas como facilitadoras e canais de processo para aprendizagem. Programas de treinamento de habilidades socioemocionais na infância se apresentam como preventivos a problemas de aprendizagem e comportamento.

Dentre as limitações deste estudo, identifica-se a quantidade reduzida de participantes e a ausência de adesão por parte dos familiares, impossibilitando análises entre as habilidades sociais das crianças pela perspectiva da própria família, fazendo com que se pense na possibilidade de estudos futuros relacionados ao tema, como a presença de grupo comparativo (controle) e estudos longitudinais.

Os resultados deste estudo podem contribuir para o planejamento de estratégias que possam auxiliar no desenvolvimento, qualidade de vida e desempenho das habilidades em crianças e adolescentes. Deste modo, as suas contribuições podem alcançar ainda as instituições de atendimento e acompanhamento social das crianças no sentido de (re)organizarem seus ambientes e projetos de convivência em contextos acolhedores e funcionais.

 

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Endereço para correspondência:
Sendy Christine Pinheiro Martins
R. Professora Maria Benedita Fernandes, 435 - Jardim do Lago
Conchal, SP, Brasil - CEP 13835-000
E-mail: psicosendypinheiro@hotmail.com

Artigo recebido: 14/7/2021
Aprovado: 5/1/2022

 

 

Trabalho realizado na Universidade do Vale do Sapucaí (Univás), Pouso Alegre, MG, Brasil.
Conflito de interesses: As autoras declaram não haver.

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