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Journal of Human Growth and Development

Print version ISSN 0104-1282

Rev. bras. crescimento desenvolv. hum. vol.23 no.1 São Paulo  2013

 

ORIGINAL RESEARCH

 

Tradução, adaptação e validação do conteúdo da secção i da escala: "assessment of peer relations"para o idioma português

 

 

Elsa SoaresI; Ana SerranoII; Michael J. GuralnickIII

ITerapeuta da Fala - Doutoranda Instituto de Educação - Universidade do Minho - Centro de Investigação em Educação - Bolseira de Investigação da Fundação para a Ciência e a Tecnologia - SFRH / BD / 70351 / 2010, Projeto Co-financiado pelo Fundo Social Europeu
IIAna Serrano - Professora Associada - Universidade do Minho - Instituto de Educação - Centro de Investigação em Educação - Campus de Gualtar 4710
IIIMichael J. Guralnick, Ph.D. - Director, Center on Human Development and Disability - Professor of Psychology and Pediatrics - University of Washington - Seattle, Washington

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: realizar a adaptação e validação do conteúdo da secção I da escala "Assessment of Peer Relations" - Avaliação das Relações com Pares para o idioma Português.
MÉTODO: a secção I foi traduzida e retro traduzida por tradutores experientes. A versão de consenso resultante desta tradução foi utilizada em dois estudos piloto que indicaram a necessidade de melhoramentos linguísticos. Realizadas as alterações necessárias, reuniu-se um painel com oito peritos - investigadores na área da intervenção precoce e das interações sociais - que procedeu à discussão aprofundada de cada um dos itens secção I.
RESULTADOS: todo o processo inerente a este estudo revelou-se de extrema importância para a exploração aprofundada da secção I e para a realização de todas as alterações consideradas necessárias para que a escala possa ser funcional e aplicável na Língua e Cultura Portuguesas.
CONCLUSÕES: o processo de investigação permitiu atingir o objetivo delineado e, assim, foi possível adaptar e validar, para o idioma português, o conteúdo da secção I da escala Assessment of Peer Relations - Avaliação das Relações com Pares.

Palavras-chave: ajustamento social; relações interpessoais; transtornos do comportamento social; comportamento infantil; validação de conteúdo.


 

 

INTRODUÇÃO

As situações de interação com os pares são contextos nos quais a criança pode evoluir e complexificar todas as suas competências que a curto e a longo prazo serão essenciais para o seu ajustamento social num mundo menos protegido e onde as situações são reais e, portanto, distantes dos vários mundos de faz de conta que pode encontrar dentro da sua cultura de pares1-4.

É nestas interações que a criança pode experimentar estratégias sociais para resolver determinados desafios como sejam, a entrada no grupo de pares, a resolução de conflitos e a manutenção da brincadeira; é também nestas interações que a criança pode vivenciar e/ou observar as consequências de determinadas opções e, assim, perceber se estas serão escolhas viáveis em situações sociais futuras1,3. No decorrer destas trocas sociais torna-se, ainda, possível perceber se a criança persiste ou desiste dos seus objetivos e os possíveis porquês da opção que tomou - dificuldades em flexibilizar e recorrer a diferentes estratégias sociais? Pares pouco responsivos? Características do contexto como possíveis obstáculos ou como possíveis facilitadores?

Toda a complexidade inerente à competência social na relação com pares impele à necessidade de observar ativamente a criança e de interligar diversos fatores que podem estar na base de interações sociais de sucesso ou de dificuldades e até frustrações a este nível5,6. Considera-se, portanto, essencial perspetivar a criança e o contexto como um todo; por um lado, a criança com todas as suas características desenvolvimentais - áreas que se inter relacionam e que de uma forma integrada influenciam a expressão das competências sociais; por outro lado, todos os aspetos e/ ou processos do contexto que também exercem transações constantes e recíprocas com a criança. Esta perspetiva abrangente e interligada é essencial para que se possa efetivamente compreender o desempenho social da criança e encontrar formas de o potenciar valorizando-se, cada vez mais, o papel ativo do meio em todo este processo4,6-10.

A importância da competência social na relação com pares como um precursor do desempenho social futuro remete para a necessidade de avaliar, o mais precocemente possível, crianças que demonstrem dificuldades a este nível8. Contudo, em Portugal existe um número limitado de escalas validadas que avaliem a interação social11.

O estudo em questão foca-se na performance social da criança nos contextos naturais enfatizando tanto a pertinência da observação da interação com os pares, como a importância das informações dadas pelos diversos cuidadores, tal como descrito na - Assessment of Peer Relations - Avaliação das Relações com Pares (ARP)12. Esta escala avalia vários domínios críticos da interação social das crianças entre os 3 e os 5 anos de idade tendo como base a performance nos contextos naturais, aspeto que aumenta a probabilidade de uma avaliação mais realista, essencial para identificar o(s) domínio(s) que necessitam de ser melhorados e, consequentemente, desenvolver objetivos individualizados.

Assim, o objetivo é realizar a adaptação e validação do conteúdo da secção I da escala Assessment of Peer Relations - Avaliação das Relações com Pares para o idioma Português.

 

MÉTODO

CARACTERIZAÇÃO DO INSTRUMENTO

Os itens da Avaliação das Relações com Pares baseiam-se nos princípios do desenvolvimento interacional e visam avaliar todas as crianças que manifestem algum tipo de dificuldade no estabelecimento e manutenção de interações de sucesso com os seus pares 12. O preenchimento é efetuado após alguns dias de observação da criança em interação com os pares nos contextos.

A ARP encontra-se dividida em três secções, cada uma delas é composta por textos de âmbito teórico que visam fundamentar e explicar a base das escalas de avaliação que lhe sucedem. A secção I - cujo preenchimento permite obter os dados necessários para delinear um plano de intervenção - divide-se em quatro componentes: componente A, B, C e considerações especiais.

A componente A remete para uma perspetiva geral e avalia, através de escala de Lickert (EL): nível de envolvimento na interação; propósito e sucesso das iniciações. A componente B avalia, através de EL, os processos base - regulação emocional e compreensão partilhada a nível das regras sociais; da complexidade e diversidade do brincar e dos acontecimentos do dia-a-dia. Na componente C é pedido um resumo acerca do desenvolvimento linguístico, cognitivo, afetivo, motor. Devem referir-se, também, outros fatores que condicionem o desempenho interacional, bem como as áreas fortes.

O preenchimento das considerações especiais é uma forma de resumir e sistematizar toda a informação recolhida de forma a delinear o plano de intervenção.

 

PROCEDIMENTO

TRADUÇÃO E RETRO TRADUÇÃO

Para a tradução, adaptação e validação do conteúdo da secção I, tendo em conta a realidade cultural portuguesa recorreu-se a uma metodologia qualitativa. Esta opção decorreu dos debates de ideias e das sugestões veiculadas pelo autor do instrumento, o Professor Guralnick que concedeu a autorização para o presente estudo.

A adaptação transcultural seguiu as linhas orientadoras de Guillemin, Bombardier, & Beaton 13 complementadas com Hill & Hill 14 que referem que o processo de tradução de um instrumento, por si só, pode revelar-se insuficiente devido às diferenças semânticas/ conceptuais e culturais entre as diferentes línguas, razão pela qual se destaca a importância da retro tradução e da adaptação.

A primeira fase consistiu em traduzir a versão americana para a língua portuguesa. Esta tradução foi feita por uma terapeuta da fala - investigadora no Instituto de Educação da Universidade do Minho - que exerce a profissão há seis anos, com experiência em intervenção precoce e interação social e, portanto, conhecedora dos termos inerentes a estas áreas. Apresenta, concomitantemente, um domínio do Inglês dado que frequentou, durante nove anos consecutivos, uma escola com ensino especializado desta língua.

Na segunda fase, efetuou-se a retro tradução. Para isso recorreu-se a uma pessoa bilingue cuja língua nativa é o inglês (americano), com experiência em trabalhos de tradução 14. A versão original americana foi comparada com a retro tradução no sentido de verificar se existiam muitas diferenças e se o significado do instrumento se mantinha e, desta forma, perceber se a versão traduzida avaliaria, de facto, o que seria suposto avaliar15. Entre os tradutores alcançou-se uma versão de consenso14.

De forma paralela, a secção I foi traduzida por duas psicólogas - da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação - Universidade do Porto (FPCEUP) - da área de educação e desenvolvimento da criança, uma delas com alargada experiência em Intervenção Precoce e conhecimentos aprofundados da língua inglesa. Esta tradução foi posteriormente revista, refletida e discutida, na forma de grupo de enfoque, pela equipa do projeto de investigação do Centro de Psicologia da Universidade do Porto (RIPD/CIF/109664/2009), financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia.

Compararam-se as versões finais das duas equipas de trabalho das referidas universidades e alcançou-se uma versão final de consenso. Esta foi utilizada em dois estudos piloto de forma a verificar se causava algum tipo de dúvidas que indicassem a necessidade de melhoramento linguístico16.

ESTUDO PILOTO

No estudo piloto um - realizado no âmbito da dissertação de Mestrado da FPCEUP "Temperamento e participação social com pares em crianças com perturbação do espectro do autismo", defendida por Daniela Maria da Costa Ferreira - a secção I foi administrada sob a forma de reflexão falada com duas educadoras - para avaliar a perceção e compreensão dos itens da mesma. Anotaram-se os comentários destas acerca do conteúdo dos itens, clareza e facilidade de compreensão, bem como sugestões para os melhorar.

No estudo piloto dois o instrumento (escalas e respetivos textos explicativos) foi enviado via e-mail para uma linguista e para outros 20 profissionais de intervenção precoce com experiência no uso de instrumentos de avaliação. Solicitou-se, ainda, que cada participante efetuasse uma apreciação global do instrumento no sentido de perceber se o consideravam pertinente e se, consequentemente, seria vantajoso prosseguir com o estudo. Efetuada a sistematização de todos os dados obtidos e das alterações referidas como necessárias e tendo em conta o feedback positivo em relação à pertinência do instrumento, deu-se início à segunda fase da adaptação e validação do conteúdo da secção I da ARP.

PAINEL DE PERITOS

Para a adaptação linguística - a nível semântico, idiomático e conceptual - e para a validação de conteúdo, constituiu-se um painel de peritos composto por oito profissionais de diferentes áreas 13, 17, todos com uma vasta experiência a nível da intervenção precoce e interações sociais. Sendo o instrumento composto por três secções - e dado o feedback recebido do estudo piloto, no que concerne à extensão - considerou-se necessário reunir o mesmo painel de peritos em três datas diferentes, repetindo-se os mesmos procedimentos.

A secção I foi enviada via e-mail para cada perito para que pudessem ter um primeiro contacto com o instrumento e refletir sobre ele, tendo em conta os objetivos explicitados no que concerne à adequabilidade e pertinência dos itens. Considerou-se importante que a secção I fosse enviada na sua globalidade - textos e escalas - salientava-se, contudo, que as reuniões incidiriam só sobre as escalas.

O painel de peritos tornou-se essencial para verificar se os termos e as estruturas gramaticais da versão traduzida - quando comparados com os da original - eram equivalentes entre si no sentido de terem, efetivamente, o mesmo significado referencial e se eram, ao mesmo tempo, culturalmente relevantes e apropriados. Resulta daqui a equivalência semântica, conceptual e a validação do conteúdo 13. Tendo em conta que existem expressões próprias do inglês americano, dificilmente traduzíveis para o português, tornou-se necessário também proceder à equivalência idiomática e, portanto, encontrar outras expressões que pudessem transmitir a ideia original13.

 

RESULTADOS

As diferenças entre a versão original e a retro-tradução permitiram encontrar discrepâncias de significado tornando-se necessário melhorar aspetos específicos da tradução. A convergência e comparação das versões das duas equipas resultou numa versão de consenso que se considerou ser a que transparecia melhor as intenções de avaliação do documento original.

Das 21 escalas enviadas, no estudo piloto dois, obtiveram-se dez respostas. As análises das escalas - tal como se pretendia nesta fase do estudo - remeteram para questões de português - a nível de erros ortográficos e morfo-sintáticos. Dos estudos piloto emergiram outros dados, inesperados, mas que se considera relevante referir. De uma forma geral, os participantes sugeriram que seria importante delimitar o significado de alguns dos conceitos da escala e que são considerados de âmbito mais teórico.

A nível da aplicação destacaram a importância de à escala de Lickert que, no caso deste instrumento, varia entre o "raramente" e o "quase sempre" fosse acrescentado o "não observado". Realçaram, tal como refere o autor, que é necessário que as pessoas que aplicam a escala estejam familiarizadas com o instrumento.

Todos os participantes fizeram alusão à extensão da escala como uma possível condicionante à sua aplicação - neste caso deve salientar-se que esta perceção se poderá dever ao facto das três secções terem sido enviadas simultaneamente. De facto, a extensão da escala parece surgir como uma das principais razões para taxa de participação verificada no estudo piloto dois.

Na primeira reunião do painel estiveram presentes todos os peritos referidos. Alguns deles já se conheciam pois haviam estado envolvidos em projetos comuns. No caso de outros foi o primeiro dia de contacto. O grupo estabeleceu, logo desde o início, uma discussão dinâmica acerca da secção I em geral e dos itens em particular constatando-se uma participação equilibrada dos vários elementos.

Tal como se pode verificar na Tabela 1, muitos dos itens da versão de consenso permaneceram inalterados; noutros foram realizadas alterações morfo-sintáticas com o intuito de facilitar a compreensão dos mesmos. Em muitos deles foram também substituídas algumas palavras por se considerarem linguisticamente mais adequadas em relação a outras.

De seguida destacam-se os pontos mais importantes de discussão que influenciaram a validação e a adaptação do conteúdo da dita secção.

O item um (local dois - consultar Tabela 1 ) - "Tende a estar desocupado" - suscitou algumas dúvidas semânticas e conceptuais uma vez que a palavra "desocupado" pode levar a diferentes interpretações como sejam: sem fazer nada, efetivamente, ou com um interesse diferente, em relação ao grande grupo (brincar com as mãos, por exemplo). Surgiu, assim, a necessidade de perceber o que realmente o autor quereria avaliar. A pesquisa bibliográfica posterior permitiu definir este e outros conceitos considerados necessários. Iniciou-se, desta forma - e por sugestão dos peritos, complementada com a opinião dos participantes dos estudos piloto - a construção de um glossário complementar para facilitar e uniformizar a aplicação.

A tradução do termo "play" tornou-se dúbia. Alguns peritos sugeriram que se deveria optar pela palavra "jogo". Contudo, outros peritos referiram que "play" devia ser traduzido como "brincar" justificando que este conceito é mais abrangente pois engloba não só as interações orientadas por regras - jogo - como as interações livres, sem regras explicitamente definidas, o que se enquadra melhor em todos os contextos em que a palavra "play" é utilizada ao longo da escala, pelo que esta foi a opção final.

Numa abordagem inicial, considerou-se que seria benéfico acrescentar exemplos a diversos itens, mas depois concluiu-se que ao fazê-lo poder-se-ia condicionar as perspetivas das pessoas que, no futuro, preencherão as escalas.

"Initiation" - aparece, pela primeira vez, no item seis (local sete), mas depois repete-se ao longo da escala. Inicialmente foi traduzida como iniciativa e, consequentemente, a retro tradução conduzia a "initiative". Neste sentido, o painel de peritos sugeriu que se deveria optar pela palavra "iniciação" até porque existem diferenças conceptuais entre "iniciativa" e "iniciação"18. A primeira remete para a «ação daquele que é o primeiro a pôr em prática uma ideia, a propor ou a empreender uma coisa» 18 p2107. Por outro lado, "iniciação" define-se como «ação ou resultado de iniciar»18 p2107. Depreende-se, portanto, que o nível de exigência, em termos de comportamentos sociais, é superior na "iniciativa", comparativamente à "iniciação".

O item oito (local dez) suscitou um grande debate em torno do significado conceptual da palavra "simples". Alguns peritos perspetivaram este termo do ponto de vista da qualidade da interação - interações simples, como por exemplo, uma troca de olhares. Outro conjunto de peritos perspetivou-o de um ponto de vista relacionado com a quantidade e, por isso, encontravam um contra senso dentro do próprio item pois se, por um lado, diz "envolve-se em respostas ou trocas simples"; por outro ainda acrescenta "não mais do que duas por criança". Os peritos argumentaram que se é mais do que uma interação por criança, então, sob a perspetiva da quantidade, já não é uma troca simples. Para contornar esta situação e para que esta dúvida não surja no futuro considerou-se, por consenso, que seria necessário acrescentar a seguinte nota explicativa de rodapé: «O conceito "simples" refere-se à qualidade da interação.».

No item dez (local 12) surgem as palavras "diversidade" e "caráter". O painel de peritos considerou que "diversidade" é - tendo em conta a Língua Portuguesa e o contexto específico em que se encontra inserida - uma palavra abrangente pelo que se retirou a palavra "caráter" para evitar redundâncias e, concomitantemente, facilitar a compreensão do item.

No item cinco (local 35) salienta-se a opção de utilização das palavras "vacilando" ou "hesitando" por se considerar que a primeira remete mais para o Português utilizado no Brasil e a segunda a que melhor se adequa à realidade cultural de Portugal.

Em relação ao item sete (local 37) foi necessária uma alteração morfo sintática no sentido de tornar o item mais claro e compreensível. O painel substituiu também os termos utilizados para outros considerados mais adequados em termos conceptuais. Referiu-se, assim, que a palavra "muda" deveria ser substituída por "silenciosa", dado o cariz negativo que está associado à primeira e que a palavra "atrasada" não expressava explicitamente o que se pretendia avaliar pelo que se optou pelo uso de "retardada".

A componente "Complexidade e diversidade do brincar ao de faz de conta" levantou muitas dúvidas aos peritos pois referiram que a semelhança dos itens e o conteúdo teórico a eles subjacente poderia dificultar a compreensão dos mesmos e, consequentemente, condicionar a aplicação da escala. À semelhança do que já tinha sucedido e como uma forma de contornar esta situação, ressalvou-se, mais uma vez, a necessidade de uma pesquisa teórica no sentido de esclarecer o significado dos itens referidos explicitando-o no glossário.

O conceito "guião" emergiu dúvidas entre alguns dos peritos pois referiram que em certos contextos de jardim-de-infância não é muito comum a utilização desta palavra. O grupo tentou encontrar outra palavra de substituição. Contudo, todas as sugeridas não eram suficientemente abrangentes - decidiu-se, então, que se manteria a palavra "guião" com a definição correspondente no glossário.

No decorrer desta componente - acontecimentos do dia a dia (local 54) - optou-se por estabelecer alguma relação entre os itens através da utilização do pronome demonstrativo "estes", considerando-se que contribuiria para uma melhor compreensão.

 

DISCUSSÃO

Os passos metodológicos referidos na bibliografia em relação aos processos qualitativos de tradução, adaptação e validação do conteúdo de instrumentos de avaliação revelaram-se essenciais pois só assim foi possível enquadrar o instrumento original, tendo em conta as especificidades culturais das crianças portuguesas e adaptá-lo tendo em conta estes aspetos e os que se relacionam diretamente com facilitação e consequente operacionalização da sua aplicação por parte dos cuidadores 14.

Todo o processo inerente a este estudo conduziu também a outras reflexões que permitiram captar visões mais abrangentes, para além daquelas especificamente relacionadas com a escala. A perceção dos peritos de que antes do preenchimento da secção I é importante observar a criança durante vários dias e em várias situações de interação realça a importância de ter a consciência de que o desempenho da criança poderá variar, tendo em conta o facto das atividades serem mais ou menos estruturadas, serem realizadas no interior ou no exterior da sala, serem de grande ou de pequeno grupo, o que se coaduna com a perspetiva de diversos autores que sublinham que os fatores contextuais se podem repercutir no perfil de interação da criança 19, 20.

A análise da secção I permitiu-lhes perceber também que o preenchimento desta requer uma grande capacidade de observação, pois avalia aspetos da interação que se podem revelar muito subtis. Consideram, assim, que estas características da escala podem ser uma vantagem uma vez que alertam para a importância da observação destes pormenores o que, em si mesmo, pode conduzir a uma mudança de atitude e de perspetiva em relação à importância da observação das diferentes situações de interação. Esta perceção, por sua vez, poderá conduzir, consequentemente, ao aumento da consciência em relação à importância de potenciar, ao máximo, as oportunidades de interação com os pares no jardim-de-infância 1, 3.

A subjetividade, inerente a alguns dos termos utilizados ao longo da secção e na própria cotação, pode conduzir a perfis diferentes da mesma criança, razão pela qual se sublinhou, mais uma vez, a necessidade do preenchimento ser também fundamentado nas observações e informações daqueles que melhor a conhecem, como os cuidadores.

A valorização do contexto como uma fonte indispensável de informação; a incitação a uma observação ativa da criança; a reflexão que daí pode decorrer e que permite verificar quais as características da criança e/ou do contexto que podem surgir como facilitadores e/ou obstáculos à potenciação da interação e a oportunidade de conhecer a criança mais aprofundadamente, encontrando as competências específicas que necessitam de ser potenciadas, surgem como algumas das mais-valias referidas em relação a esta secção 1, 3. Decorre daqui a convergência desta secção com as perspetivas contemporâneas ao centrar-se não só na criança, mas ao valorizar e ao permitir estabelecer uma ponte entre os fatores relacionadas com a criança e com aqueles relacionados com o contexto sugerindo-se, portanto, que pode surgir como um recurso complementar a nível da avaliação e do planeamento da intervenção 3, 4, 6.

Todo o processo inerente a este estudo conduziu à necessidade de um estudo aprofundado das dinâmicas adotadas nos jardins-de-infância e quais as suas implicações na potenciação da competência social nas relações com pares.

Agradecimentos

À Fundação para a Ciência e a Tecnologia - SFRH / BD / 70351 / 2010 e ao Fundo Social Europeu.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência:
elsamartasoares@gmail.com

Manuscript submitted Aug 01 2012
Accepted for publication Dec 20 2012