SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.23 número2Caracterização dos limiares de detecção do gosto umami em crianças com e sem câncerQualidade da atenção à saúde da criança na estratégia saúde da família índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Journal of Human Growth and Development

versão impressa ISSN 0104-1282versão On-line ISSN 2175-3598

Rev. bras. crescimento desenvolv. hum. vol.23 no.2 São Paulo  2013

 

ORIGINAL RESEARCH

 

Efeito do sedentarismo, perfil nutricional e sexo na flexibilidade de escolares

 

 

Maylli Daiani GraciosaI; Jerusa Jordão CoelhoI; Letícia Miranda Resende da CostaII; Daiane Lazzeri De MedeirosII; Micheli MartinelloIII; Lilian Gerdi Kittel RiesIV

IAluna da graduação em Fisioterapia / Centro de Ciências da Saúde e do Esporte - CEFID / Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC.
IIAluna da graduação em Fisioterapia / Centro de Ciências da Saúde e do Esporte - CEFID / Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC
IIIAluna do mestrado do Programa de Pós-Graduação em Fisioterapia / Centro de Ciências da Saúde e do Esporte - CEFID / Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC
IVAluna do mestrado do Programa de Pós-Graduação em Fisioterapia / Centro de Ciências da Saúde e do Esporte - CEFID / Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC
VMestre em Ciências do Movimento Humano / Centro de Ciências da Saúde e do Esporte - CEFID / Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC
VIProfessora do Programa de Pós-Graduação em Fisioterapia / Centro de Ciências da Saúde e do Esporte - CEFID / Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

INTRODUÇÃO: os hábitos de vida da atualidade têm levado a um estilo de vida mais sedentário, contribuindo para o aumento da obesidade. Desta forma é necessário compreender se estas mudanças influenciam na flexibilidade do indivíduo.
OBJETIVO: verificar se sexo, sedentarismo e perfil nutricional influenciam o nível de flexibilidade de escolares.
MÉTODO: foram avaliados 60 escolares de ambos os sexos com idade entre cinco a 14 anos, divididos em dois grupos: flexibilidade normal (n=21) e flexibilidade reduzida (n=39). A flexibilidade dos escolares foi avaliada por meio da fotogrametria através do teste de elevação dos MMII em extensão considerando o ângulo da perna. O nível de atividade física foi avaliado através do Questionário de Atividade física para Crianças e a classificação do perfil nutricional foi realizada utilizando o Índice de Massa Corporal por idade e com relação ao sexo.
RESULTADOS: os grupos com flexibilidade normal e reduzida, não apresentaram diferenças significativas com relação à idade, peso e altura (p>0,05). Não foi observado diferenças (p>0,05) nos ângulos da perna na comparação entre os grupos sedentários e ativos; obesos e não obesos, e entre os grupos do sexo feminino e masculino.
CONCLUSÕES: o sexo, sedentarismo e o perfil nutricional não influenciaram a flexibilidade dos escolares avaliados.

Palavras-chave: flexibilidade; sexo; índice de massa corporal; atividade física; criança.


 

 

INTRODUÇÃO

 A flexibilidade é definida como uma característica fisiológica que permite a um indivíduo a execução voluntária dos movimentos com amplitude angular máxima das articulações, dentro dos limites morfológicos1, livre de dor e restrições2. Tal qualidade física resulta de uma inter-relação entre ligamentos, músculos, tendões, pele e a própria articulação3. O encurtamento dessas estruturas resulta em uma amplitude de movimento limitada2, e pode provocar diversas consequências na rotina daqueles que apresentam essa limitação.

Bons níveis de flexibilidade possuem grande importância na qualidade de vida de um indivíduo. Dentre inúmeros benefícios pode-se destacar: a melhora do desenvolvimento de habilidades para práticas das atividades cotidianas e esportivas; a redução dos riscos de lesões musculo-tendinosas e de incidência de dores musculares; e também a diminuição do estresse, e melhora da postura3. Além disso, fatores psicossociais e boa aptidão física são determinantes para estimular a prática de atividade física4, a qual é essencial para a promoção da saúde.

No entanto, o constante avanço tecnológico5, e o aumento da insegurança dos espaços livres urbanos das últimas décadas, têm influenciado um estilo de vida mais sedentário6 predominando atividades como assistir televisão, jogar vídeos-game e permanecer por horas em frente ao computador7,8. Esse estilo de vida, associado à alimentação inadequada, tem contribuído para o crescimento dos índices de sobrepeso e obesidade infantil. O crescimento desses índices está se tornando um problema de saúde pública, visto que suas consequências afetam a qualidade de vida destes indivíduos de forma global9.

Sendo assim, a compreensão das influências que tais mudanças exercem sobre os níveis de flexibilidade, já que esta qualidade física possui caráter fundamental na vida cotidiana, ainda deve ser mais explorada. Alguns estudos mostram que a flexibilidade é influenciada pelo perfil nutricional10-12, pelos níveis de atividade física3 e pelo sexo3,10,13,14. Por outro lado, estudos apresentaram resultados controversos em relação ao perfil nutricional15-17, nível de atividade física18 e sexo19,20.

Não há consenso se as mudanças decorrentes da transição nutricional, o crescente sedentarismo e o sexo são fatores que podem influenciar a aptidão física de escolares, principalmente, em relação ao parâmetro da flexibilidade. Diante dos importantes benefícios da flexibilidade para a qualidade de vida na infância, torna-se importante investigar as possíveis influências desses fatores nesse parâmetro.

Assim, o objetivo é verificar se sexo, sedentarismo e perfil nutricional influenciam o nível de flexibilidade de escolares.

 

MÉTODO

Sujeitos

Este estudo caracterizou-se como uma pesquisa transversal, cuja amostra foi composta por 60 escolares, de ambos os sexos, com idade entre cinco e 14 anos, matriculados no ensino fundamental da cidade de Florianópolis. Foram excluídos do estudo aqueles que apresentassem necessidades especiais e que participassem de qualquer tratamento ortopédico e/ou fisioterapêutico.

Os escolares foram divididos em dois grupos, de acordo com o ângulo da perna, sendo G1: com flexibilidade normal, composto por 21 sujeitos que obtiveram valores maiores ou iguais a 65°; e G2: com flexibilidade reduzida onde foram incluídos 39 sujeitos que obtiveram valores menores que 65°21.

O Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos aprovou este projeto de pesquisa pelo protocolo 165/2011. Os responsáveis foram informados sobre os objetivos e procedimentos deste estudo, e assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Instrumentos

Os instrumentos utilizados no presente estudo foram: Anamnese, Questionário de atividade física para crianças (PAQ-C) e a fotogrametria. Através da anamnese foi realizada a caracterização amostral, constando o registro de dados antropométricos e critérios de inclusão e exclusão. A massa corporal e a estatura do escolar foram utilizadas para calcular o Índice de Massa Corporal (IMC) que foi utilizado para avaliar o perfil nutricional. A partir do IMC por idade e com relação ao sexo, os escolares foram classificados em baixo peso (percentil menor que cinco), eutróficos (percentil entre cinco e 85), sobrepeso (percentis de 85 a 94) e obeso (percentil maior ou igual a 95)22. De acordo com essa classificação, dicotomizou-se a amostra para a análise dos dados: o grupo obeso (crianças classificadas em obeso e sobrepeso) e o grupo não-obeso (classificadas em baixo peso e eutróficas).

O PAQ-C, validado por Crocker et al23, é um questionário utilizado para avaliar o nível de atividade física praticada por crianças e adolescentes nos sete dias que precedem o preenchimento do questionário. É constituído por nove questões relacionadas à prática de esportes, jogos, as atividades físicas na escola e no tempo de lazer. Cada questão tem valor de um a cinco e o escore final é obtido pela média das questões. O resultado pode se situar no intervalo de muito sedentário (1) a muito ativo (5)24. A partir dessa pontuação os escolares podem ser classificados em ativos quando obtiverem escore maior ou igual a três, enquanto que sedentários são os indivíduos com escore menor que três24, sendo a amostra dicotomizada para a análise dos dados.

A avaliação da flexibilidade através da fotogrametria é considerada um método útil e confiável para o teste de elevação dos MMII em extensão21. Com o uso desta técnica, a flexibilidade foi verificada através de medições angulares. Esta análise aconteceu por meio do software SAPO, um programa que apresenta alta confiabilidade25.

Procedimentos

Foi realizada a anamnese juntamente com preenchimento dos questionários. Os escolares foram orientados a vestir trajes adequados e permanecerem com os pés descalços. As medidas antropométricas foram efetuadas com o escolar na posição ortostática, com os pés voltados para frente e braços relaxados ao longo do corpo. Para verificar a massa corporal foi utilizada uma balança digital da marca Filizola com precisão de 100g. E para medir a estatura, utilizou-se um estadiômetro.

Para a realização da fotogrametria, utilizou-se uma câmera digital da marca SANYO modelo VPC-HD2000, posicionada em solo nivelado, sobre um tripé a uma altura de 85 cm e a uma distância de três metros de uma maca com medidas de 1,82cm de comprimento, 82 cm de altura e 60,5cm de largura. Como eixo de referência vertical foi utilizado um fio de prumo de 100 cm. Para as referências anatômicas foram colocados marcadores esféricos, de coloração branca, com um centímetro de diâmetro, os quais foram fixados com fita dupla face. Foram marcadas as seguintes referências anatômicas, bilateralmente: trocânter maior do fêmur e maléolo lateral.

Após a anamnese foi realizado o teste de elevação dos MMII em extensão. Para a execução deste teste, o escolar foi posicionado na maca em decúbito dorsal, com as pernas estendidas e braços flexionados com as mãos atrás da cabeça. Durante a realização do teste foi realizada a fixação da coxa do membro contralateral para estabilizar o movimento. Em seguida, o avaliador realizou o teste de elevação dos MMII em extensão, em ambas as pernas de cada escolar. A foto foi registrada no momento em que os sujeitos começaram a sentir uma tensão muscular na região posterior da perna, antes que a criança tentasse realizar uma rotação do quadril do membro a ser avaliado.

A marcação anatômica foi realizada por um avaliador e a digitalização das imagens e os cálculos dos ângulos foram feitos por dois avaliadores diferentes para posteriormente verificar a confiabilidade interavaliadores, todos previamente treinados. A análise ocorreu no plano sagital por meio da medida do ângulo da perna (intersecção entre o segmento da perna e a horizontal da maca)21 (Figura 1).

Análise Estatística

Para o tratamento de dados, foi utilizada a estatística descritiva (média e desvio padrão). A confiabilidade interavaliador para as medições da flexibilidade (ângulo da perna) foi avaliada através do Coeficiente de Correlação Intraclasse (ICC). Também foi avaliada a diferença entre as medidas do membro inferior esquerdo e direito para os ângulos da perna por meio do teste t de Student.

Após verificar a normalidade dos dados por meio do teste Kolmogorov - Smirnov, utilizou-se o teste t de Student para amostras independentes, para verificar a diferença entre a média das características antropométricas e ângulos da perna dos grupos com flexibilidade reduzida e normal. O mesmo teste foi utilizado para a comparação das médias dos ângulos da perna entre os grupos ativo e sedentário, entre os grupos com perfil nutricional não obeso e obeso e entre o sexo feminino e masculino. A fim de se verificar a existência de associação entre os grupos com flexibilidade normal e reduzida e os fatores atividade física, perfil nutricional e sexo aplicou-se a análise de regressão logística bivariada. O efeito dos fatores explicativos na ocorrência da flexibilidade reduzida foi avaliado pelo cálculo do Odds Ratio (OR) e seu intervalo de confiança de 95% (IC95%).

O programa utilizado para a análise estatística foi o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 17.0 para Windows e, para todos os procedimentos foi adotado o nível de significância de 5% (p < 0.05) com distribuição bi-caudal.

 

RESULTADOS

Dos 60 escolares avaliados, 21 foram classificados com flexibilidade normal e 39 com flexibilidade reduzida. A tabela 1 descreve as características antropométricas e ângulos da perna dos grupos com flexibilidade normal e reduzida. A comparação das médias dos escores obtidos na avaliação do ângulo da perna entre os grupos ativo e sedentário, entre os grupos com perfil nutricional não obeso e obeso e entre os sexos feminino e masculino são mostrados na tabela 2. Os resultados da regressão logística bivariada estão apresentados na tabela 3.

 

DISCUSSÃO

Observou-se que os grupos com flexibilidade normal e reduzida são homogêneos, já que não apresentaram diferenças significativas com relação à idade, peso e altura (p>0,05). Os resultados também mostram que no grupo com flexibilidade reduzida, o ângulo da perna foi significativamente menor (resultado esperado já que os grupos foram divididos de acordo com o ângulo).

Como foi obtida alta confiabilidade nas medidas dos ângulos da perna entre os dois avaliadores (ICC>0,960; p<0,000), foi considerada a média aritmética entre eles. Para as medidas do membro inferior esquerdo e direito não foram observadas diferenças significativas (p>0,05), sendo assim utilizadas as médias entre os dois membros para estes ângulos. Não se observou diferença (p>0,05) nos ângulos da perna na comparação entre os grupos sedentário e ativo, entre os grupos não obeso e obeso e entre os grupos do sexo feminino e masculino. Observou-se associação preditiva com o fator atividade física (odds ratio < 1,00). Escolares sedentários apresentam 2,5 vezes mais chance de apresentar uma flexibilidade normal.

A limitação da amplitude do movimento articular do quadril está relacionada com a diminuição da flexibilidade dos isquiotibiais26. No presente estudo a flexibilidade dos isquiotibiais foi medida por meio do teste de elevação dos MMII em extensão. Como esperado, os ângulos da perna mostraram diferença significativa entre os grupos com flexibilidade normal e reduzida com valores médios de 76° e 53° respectivamente. Apesar de o presente estudo utilizar os mesmos parâmetros de classificação de Carregaro et al21, foi observado que a média de elevação da perna foi maior para os dois grupos. O estudo citado encontrou valores médios de 53º e 33º para elevação da perna do grupo com flexibilidade normal e reduzida. Contudo, foram valores referentes a indivíduos entre 18 e 35 anos e neste estudo foram avaliadas crianças. As diferenças aqui encontradas podem estar relacionadas com a idade cronológica, pois com o avançar da idade ocorre a diminuição da flexibilidade14.

Era esperado que o nível de atividade física influenciasse de forma positiva a flexibilidade da perna. Contudo, os resultados deste estudo não confirmam esta suposição. Escolares ativos apresentaram menor ângulo da perna comparado ao grupo sedentário, porém a diferença não foi significativa. Na análise comparativa dos fatores, entre os escolares com flexibilidade normal e reduzida, o presente estudo encontrou associação entre a atividade física ativa e flexibilidade reduzida.

Outros resultados provenientes de medidas da flexibilidade de adolescentes com mais de 15 anos, por meio do teste sentar-e-alcançar27 e índice relacionado a sete diferentes articulações do corpo humano18, também não mostraram diferença entre os níveis de atividade física. Os resultados do presente estudo demonstraram que nos escolares entre cinco e 14 anos a flexibilidade da perna não pode ser diferenciada conforme o nível de prática de atividade física. A flexibilidade deve ser considerada como um fator independente e não necessariamente pode ser explicada pelos níveis de prática de atividade física habitual27.

Contudo, a associação encontrada entre escolares ativos e flexibilidade reduzida é, no mínimo, preocupante. Sabe-se que a prática regular de atividade física proporciona benefícios fisiológicos e psicológicos; e os componentes aeróbios, sobrecarga muscular e flexibilidade devem ser respeitados28. Sendo assim, deve-se considerar a importância da inclusão de exercícios que contemplam a aptidão física durante as aulas de educação física escolar. Vale ressaltar, que essa disciplina escolar, na grande maioria das vezes, tem se limitado ao ensino de técnicas, regras e histórico de desportos, onde os temas preferencialmente desenvolvidos pelos professores seriam o handebol, basquete, vôlei e futebol29.

Mais do que o nível de atividade física, a flexibilidade pode ser influenciada pelo padrão que o exercício é realizado, ou seja, o tipo de movimento mais empregado em determinada atividade pode ocasionar melhor eficiência mecânica e desempenho específico18. Todavia, a metodologia utilizada para avaliação no presente estudo, possui a limitação de não discriminar o padrão de atividade física praticado. Desta forma, sugere-se que ao avaliar tal influência, é necessário que se leve em consideração o tipo de atividade física praticado, assim como as categorias de movimentos específicas e as articulações mais requisitadas por esta atividade. Como no presente estudo, o método utilizado para avaliação da flexibilidade obteve a limitação de avaliar somente a amplitude de flexão de quadril com a perna estendida, presume-se que obtiveram maior desempenho no teste, aqueles escolares que praticavam atividades que utilizassem com frequência movimentos amplos dessa articulação.

Concordando com outros estudos19,20, não foi encontrada diferença nos ângulos da perna entre o sexo feminino e masculino. Apesar de alguns autores afirmarem alguma diferença10,13,14, tais resultados são controversos. Bim e Nardo10 ao avaliarem a flexibilidade de adolescentes com 16 e 17 anos por meio do teste sentar-e-alcançar concluíram que o desempenho foi maior no sexo masculino. Penha e João13 encontraram o mesmo resultado ao avaliar crianças entre sete e oito anos pelo teste do terceiro dedo ao solo. Já Pagnussat e Paganotto14 relataram que dos seis aos 13 anos a flexibilidade avaliada através do teste de comprimento dos isquiotibiais, é mais pronunciada no sexo feminino. Acredita-se que mais estudos são necessários para determinar se o sexo influencia a flexibilidade. Outros fatores relacionados ao sexo dos escolares devem afetar este parâmetro e necessitam ser considerados. As diferenças entre os sexos podem ser determinadas por diferenças anatômicas e fisiológicas2, por variação genética e fatores socioculturais19.

Não foi encontrada diferença dos valores dos ângulos da perna entre escolares obesos e não obesos, corroborando Contel et al, Kim et al e Minato et al15-17. Por outro lado, outros estudos utilizando o teste de sentar-e-alcançar encontraram resultados diferentes11,12,30. Foi observado que nos casos de sobrepeso e obesidade, o acúmulo de gordura nas articulações poderia aumentar o atrito entre elas, diminuindo a capacidade de estiramento mio-articular19.

Como neste estudo foi utilizado como metodologia de classificação para o perfil nutricional somente o IMC com relação à idade e ao sexo, o qual não possui a capacidade de discriminar a massa magra da massa gorda, não foi possível determinar percentuais de gordura. Desta forma, alguns escolares que se classificaram em flexibilidade reduzida podem ter obtido IMC semelhante àqueles que se classificaram em flexibilidade normal, contudo obtendo diferentes percentuais de gordura. No entanto, é impossível confirmar tal hipótese, visto que este componente não foi avaliado no presente estudo.

Além disso, sabe-se que a flexibilidade pode sofrer influência de fatores como a individualidade biológica, o somatótipo17, o tipo de atividade física praticado e a idade3. Presume-se, então, que a flexibilidade seja influenciada pelo conjunto entre todos os fatores. Sendo assim, sugere-se que ao verificar a real existência dessas influências, é necessário obter controle de todas as variáveis que possam interferir nos níveis de flexibilidade.

No presente estudo, verificou-se que mais da metade dos escolares avaliados classificaram-se em flexibilidade reduzida, de acordo com os parâmetros de classificação de Carregaro et al.21. Pelegrini et al.31 ao avaliar 7.507 escolares, de todas as regiões geográficas do Brasil, com idade de sete a 10 anos, também verificou que a maioria dos sujeitos avaliados pelo teste sentar-e-alcançar não atenderam aos critérios mínimos de flexibilidade estabelecidos para a saúde. Outros estudos10,32,33 encontraram os mesmos resultados, de forma que se pode especular uma possível tendência atual de crianças e adolescentes brasileiros a apresentarem baixos níveis de aptidão física.

Alguns autores afirmam que essa tendência pode estar relacionada à inatividade física crescente na população infantil31,33, todavia o presente estudo verificou que o sedentarismo não pode ser considerado um fator de risco associado a flexibilidade. Apesar disso, o que se pode levar em conta são os tipos de atividades que têm predominado na rotina desses indivíduos.

Sabe-se que com o constante avanço tecnológico, os escolares têm permanecido sentados por um tempo prolongado em frente a computadores, televisão e jogos eletrônicos7,8. Além disso, a postura sentada geralmente é adotada por um extenso tempo durante o período escolar. Um estudo verificou que indivíduos que despendem predominantemente seu tempo mantendo-se sentados, apresentam menor flexibilidade global da cadeia posterior34. Isso acontece, visto que esta postura posiciona a musculatura posterior dos membros inferiores em encurtamento, principalmente os gastrocnêmios e isquiotibiais34. Dessa forma presume-se que os sujeitos avaliados por este estudo, que apresentaram baixo nível de flexibilidade, podem estar permanecendo por tempo demasiado nesta posição.

Os resultados de flexibilidade apresentados nesse estudo merecem atenção, visto que tal componente é importante para promover um melhor bem-estar reduzindo níveis de dor, riscos de lesões e estresse3. Além disso, quando há limitação da amplitude articular pode haver comprometimento do desempenho esportivo e das atividades cotidianas35. Ainda sim, níveis inferiores de aptidão física podem contribuir para a inatividade, fazendo com que o escolar reduza sua participação em inúmeras atividades físicas e brincadeiras infantis36, adotando um estilo de vida menos saudável.

Deste modo, é importante ressaltar a necessidade da inclusão da aptidão física como componente essencial durante as aulas de educação física escolar. É necessário que o programa de atividades além de contemplar os aspectos sociais e as capacidades motoras exclusivamente coordenativas, inclua também exercícios que visem melhorar a flexibilidade, força muscular e resistência cardiorrespiratória. Ao promover uma melhora das habilidades motoras fundamentais, é provável que o escolar sinta mais vontade de participar de atividades que envolvam os componentes da aptidão física36. Assim, ao elaborar um programa de exercícios para esta população, devem ser incluídas atividades que promovam melhora dos níveis de todos os componentes da aptidão física, com o intuito de estimular os escolares a adquirirem um estilo de vida fisicamente mais ativo e saudável37.

Assim, o sexo, sedentarismo e o perfil nutricional não influenciaram a flexibilidade dos escolares avaliados. Houve predomínio dos escolares que apresentaram flexibilidade reduzida.

 

REFERÊNCIAS

1. Dantas EHM. Alongamento & flexionamento. 4ª ed. Rio de Janeiro: Shape; 1998. 33p.         [ Links ]

2. Polachini LO, Fuzasaki L, Tamaso M, Tellini GG, Masieiro D. Comparative study between three methods for evaluating of hamstring shortening. Rev. bras. fisioter. 2005;9(2):187-93.         [ Links ]

3. Glaner MF. The importance of health-related physical fitness. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2003;5(2):75-85.         [ Links ]

4. Juzwiak CR, Paschoal V, Lopez FA. Nutrition and physical activity. J. pediatr. 2000; 76(3): 349-358.         [ Links ]

5. Giugliano R, Carneiro EC. Factors associated with obesity in school children. J. pediatr. 2004; 80(1): 17-22.         [ Links ]

6. Reilly JJ. Physical activity, sedentary behaviour and energy balance in the preschool child: opportunities for early obesity prevention. Proc Nutr Soc. 2008;67:317 - 325.         [ Links ]

7. Lazzoli JK, Nóbrega ACL, Carvalho T, Oliveira MAB, Teixeira Jac, Leitão MB et al. Position statement of the Brazilian Society of Sports Medicine: physical activity and health in children and adolescents. Rev. bras. med. esporte. 1998;4(4):107-109.         [ Links ]

8. Cardon G, Van Cauwenberghe E, De Bourdeaudhuij I. What do we know about physical activity in infants and toddlers: a review of the literature and future research directions. Sci. sports. 2011;26:127-130.         [ Links ]

9. Pereira LO, Francischi RP, Lancha AH. Obesity: Dietary Intake, Sedentarism and Insulin Resistance. Arq Bras Endocrinol Metab. 2003;47(2):111-127.         [ Links ]

10. Bim RH, Junior NN. Fitness related to health of the adolescent trainees of the State University of Maringá. Acta Sci Health Sci. 2005;27(1): 77- 85.         [ Links ]

11. Deforche B, Lefevre J, Bourdeaudhuij I, Hills AP, Duquet W, Bouckaert J. Physical Fitness and Physical Activity in Obese and Nonobese Flemish Youth. Obes Res. 2003;11(3):434-441.         [ Links ]

12. Gouveia ER, Freitas DL, Maia JA, Beunen GP, Claessens AL, Marques AT, Thomis MA, Almeida SM, Sousa AM, Lefevre JA. Physical activity, fitness and overweight in children and adolescents: the Madeira Growth Study. Rev Bras de Educ Fís Esp. 2007;21(2):95-106.         [ Links ]

13. Penha PJ, João SMA. Muscle flexibility assessment among boys and girls aged 7 and 8 years old. Fisioter e Pesq. 2008; 15(4): 387-91.         [ Links ]

14. Pagnussat AS, Paganotto KM. Study of lumbar curvature in the structural development phase. Fisioter Mov. 2008;21(1):39-46.         [ Links ]

15. Contel M, Gonçalvez A, Aragon F, Padovani CR. Influence of body weight on fitness in adolescents: study in high school students in Sorocaba/SP. Rev. bras. med. esporte. 2000;6(2):44-49.         [ Links ]

16. Kim J, Aviva M, Garrett MF, Matthew WG, Virginia C, Ellen K, Robert M, Karen EP. Relationship of physical fitness to prevalence and incidence of overweight among schoolchildren. Obes Res. 2005;13:1246 - 1254.         [ Links ]

17. Minatto G, Ribeiro RR, Junior AA, Santos KD.  Influence of age, sexual maturation, anthropometric variables and body composition on flexibility. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2010;12(3):151-158.         [ Links ]

18. Melo FAP, Oliveira MF, Almeida MB. Physical activity level does note identify flexibility level. Rev Bras Ativ Fis Saúde. 2009;14(1):48-54.         [ Links ]

19. Silva DJL, Santos JAR, Oliveira BMPM. Flexibility among adolescents - A contribution to global evaluation. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2006;8(1):72-79.         [ Links ]

20. Okano AH, Altimari LR, Dodero SR, Coelho CF, Almeida PBL, Cyrino ES. Comparisons between the motor performance of children of different sex and ethnic groups. Rev. Bras. Ciên. e Mov. 2001;9(3):39-44.         [ Links ]

21. Carregaro RL, Silva LCCB, Gil Coury HJC. Comparison between two clinical tests for evaluating the flexibility of the posterior muscles of the thigh. Rev. bras. fisioter. 2007;11(2):139-145.         [ Links ]

22. Center for Disease Control and Prevention - CDC. National Center for Chronic Disease Prevention and Health Promotion - Nutrition and Physical Activity. Body mass index-for-age (children). Disponível em: <http://www.cdc.gov/nccdphp/dnpa/bmi-for-age.htm> Acesso em: 08/5/2012.         [ Links ]

23. Kowalski KC, Crocker PRE, Faulkner RR. Validation of the Physical Activity Questionnaire for Older Children. Pediatr Exerc Sci. 1997;9:174-186.         [ Links ]

24. Silva RCR, Malina, RM. Level of physical activity in adolescents from Niterói, Rio de Janeiro, Brazil. Cad Saúde Pública. 2000; 16(4): 1091-1097.         [ Links ]

25. Guariglia DA, Pereira LM, Pereira HM, Cardoso JR. Reliability and usability assessment of three different softwares for photogrammetric analysis of hip flexion angle. Fisioter e Pesq. 2011;18(3):247-251.         [ Links ]

26. Magnusson SP, Simonsen EB, Aagaard P, Boesen J, Johannsen F, Kjaer M. Determinants of musculoskeletal flexibility: Viscoelastic properties, cross-sectional area, EMG and stretch tolerance. Scand J Med Sci Sports. 1997;7:195 - 202.         [ Links ]

27. Guedes DP, Guedes JERP, Barbosa DS, Oliveira JA. Habitual physical activity and health-related physical fitness in adolescents. Rev. Bras. Ciên. e Mov. 2002;10(1):13-21.         [ Links ]

28. Carvalho T, Nóbrega ACL, Lazzoli JK, Magni JRT, Rezende L, Drummond FA, et al. Position statement of the Brazilian Society of Sports Medicine: physical activity and health. Rev. bras. med. esporte. 1996;2:79-81.         [ Links ]

29. Ferreira MS. Fitness and health in physical education: enlarging the focus. Rev. Bras. de Ciênc. Esporte. 2001; 22(2):41-54.         [ Links ]

30. Andreasi, Michelin E, Rinaldi AEM, Burini RC. Physical fitness and association with anthropometric measurements in 7 to 15 year-old school children. J. pediatr. 2010; 86: 497-502.         [ Links ]

31. Pelegrini A, Silva DAS, Petroski EL, Glaner MF. Health-Related Physical Fitness in Brasilian Schoolchildren: Data From The Brazil Sport Pro-gram. Rev Bras Med Esporte 2011;17(2):92-6.         [ Links ]

32. Bergmann GG, Araújo MLB, Garlipp DC, Lorenzi TDC, Gaya A. Annual alteration in the growth and health-related physical fitness of the school children. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum 2005;7(2):55-61.         [ Links ]

33. Burgos MS, R CP, Tornquist L, Piccin AS, Reckziegel MB, Pohl HH, Burgos LT. Health-related physical fitness profile of children and adolescents aged 7-17. J Health Sci Inst. 2012; 30(2): 171-5.         [ Links ]

34. SACCO, I. C. N. et al. The influence of occupation on overall flexibility and lower limb and lumbar range of motion. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2009; 11(1): 51-58.         [ Links ]

35. Almeida TT, Jabur NM. Myths and trues about flexibility: reflections about the stretch training in the health of human being. Motricidade. 2007; 3(1): 337-344.         [ Links ]

36. Berleze A, Haeffner LSB, Valentini NC. Motor performance of obese children: An investigation of the process anda product of basic motor abilities. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2007; 9(2): 134-144.         [ Links ]

37. Greguol M, Rose Júnior DD. Health physical fitness of blind adolescents in regular and special schools. Rev Bras Crescimento Desenvolvimento Hum. 2009; 19(1):42-53.         [ Links ]