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Journal of Human Growth and Development

Print version ISSN 0104-1282

Rev. bras. crescimento desenvolv. hum. vol.24 no.2 São Paulo  2014

 

ORIGINAL RESEARCH

 

Hábitos e consumo alimentar entre adolescentes eutróficos e com excesso de peso

 

 

Mariana Vilela VieiraI; Ieda Regina Lopes Del CiampoII; Luiz Antonio Del CiampoIII

IMaster's degree in Children's and Adolescents' Health. Departamento de Puericultura e Pediatria da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo
IIDoctor, Assistant Physician. Departamento de Puericultura e Pediatria da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo
IIIProfessor Doctor. Departamento de Puericultura e Pediatria da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo

 

 


RESUMO

OBJETIVO: Avaliar os hábitos e o consumo alimentar de adolescentes matriculados em duas escolas públicas da região oeste da cidade de Ribeirão Preto (SP).
MÉTODO: Estudo tipo caso-controle que analisou o consumo alimentar de adolescentes eutróficos e com excesso de peso, pareados por idade e sexo, utilizando questionários de frequência alimentar e registro alimentar de 3 dias, comparados com o Guia Alimentar para a População Brasileira e analisados pelo Software Virtual Nutri.
RESULTADOS: a média de idade dos 130 adolescentes estudados foi 196,8 meses. As médias de IMC e de porcentagem de gordura corporal foram de 29,5 e 49,4% e 21,0 e 29,1% para os grupos de excesso de peso e eutróficos, respectivamente (p < 0,01). Entre os eutróficos a média de ingestão diária foi 1915,5 calorias, enquanto os adolescentes com excesso de peso ingeriram 1761,8 calorias. A maioria dos adolescentes realizou as três refeições principais: café da manhã (86%), almoço (98,9%) e jantar (96,8%). Para os adolescentes eutróficos os percentuais médios de energia consumidos foram de 56,7% para carboidratos, 15,4% para proteínas, e 27,9% para lipídeos, enquanto que o grupo com excesso de peso consumiu 52,7%, 17,1% e 30,2%, respectivamente.
CONCLUSÕES: o hábito alimentar dos adolescentes vem sendo modificado, com o consumo cada vez maior de alimentos com pequena contribuição nutricional e que podem trazer grandes prejuízos à saúde, daí a necessidade da atuação dos profissionais da saúde no sentido de orientar e sensibilizá-los para a importância de medidas que contribuam para a adoção de um estilo de vida saudável.

Palavras-chave: adolescente, consumo alimentar, comportamento alimentar, obesidade.


 

 

INTRODUÇÃO

A adolescência é uma fase de transformações físicas, emocionais, cognitivas e sociais, caracterizada por aumento nas necessidades nutricionais, sendo o reforço de hábitos alimentares saudáveis de fundamental importância para garantir o pleno potencial de crescimento, desenvolvimento e prevenção de doenças futuras. Trata-se de um período crítico para o desenvolvimento de atividades e comportamentos relacionados à dieta, atividade física e comportamentos de risco, destacadamente no tocante à personalidade, quando as grandes mudanças físicas que ocorrem com o adolescente levam a profunda valorização de sua imagem corporal e da auto-estima, o que muitas vezes afeta os hábitos alimentares1,2.

Entre os diversos fatores relacionados aos hábitos de alimentação ultimamente tem ganhado destaque a internacionalização das práticas alimentares, que propicia mudanças representadas pela incorporação de novos alimentos, preferências, formas de preparo, compra e consumo3.

Em nosso meio existem poucos e isolados estudos de base populacional sobre hábitos alimentares entre adolescentes. Levy-Costa et al.4 ao analisarem a disponibilidade domiciliar de alimentos no Brasil, tendo como principal base de dados a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2002-2003 constataram excesso de consumo de açúcar e presença insuficiente de frutas e hortaliças na dieta. Estudo realizado por Troiano et al.5 mostraram que a porcentagem média de energia proveniente de gorduras totais e saturadas diminuiu, em comparação com o consumo na década de 1970, mas manteve-se acima das recomendações, com 33,5% do total energético proveniente de gorduras, sendo 12,2% de gordura saturada.

Em um estudo que descreveu a freqüência e os fatores associados ao consumo de gorduras e fibras entre adolescentes de 10 a 12 anos na cidade de Pelotas (RS), Neutzling et al.1 encontraram 83,9% dos jovens com consumo de dieta pobre em fibra e 36,6% com dieta rica em gordura, destacando-se diferenças entre os níveis socioeconômicos.

O interesse na investigação sobre o comportamento alimentar baseia-se na possibilidade de aumentar a efetividade de intervenções nutricionais. Acredita-se que à medida que se conhecem melhor os determinantes do comportamento alimentar sejam maiores as possibilidades de sucesso e o impacto das ações de promoção de práticas alimentares saudáveis6.

O presente estudo visa conhecer o consumo e os hábitos alimentares de adolescentes eutróficos e com excesso de peso, matriculados em duas escolas públicas da cidade de Ribeirão Preto (SP).

 

MÉTODO

Trata-se de um estudo tipo caso-controle que analisou os hábitos e o consumo alimentar, segundo o estado nutricional, de adolescentes matriculados em duas escolas estaduais da região oeste da cidade de Ribeirão Preto (SP), com idades entre 14 e 19 anos. Foram convidados todos os 521 alunos matriculados no ano de 2009, dos quais 435 (83,5%) aceitaram participar do estudo. Na primeira etapa foi realizada uma avaliação antropométrica com o objetivo de identificar os indivíduos com excesso de peso.

Após a determinação do estado nutricional obtido pelo Índice de Massa Corporal (IMC), foram constituídos dois grupos de adolescentes: um composto pelos que foram diagnosticados como sobrepeso e obesidade, e um grupo controle pareado por sexo e idade com o mesmo número de alunos, com estado nutricional normal. Foram excluídos os adolescentes portadores de doenças crônicas que comprometem o estado nutricional e uma gestante. A segunda etapa do estudo consistiu em uma entrevista individual quando foram aplicados os questionários de freqüência alimentar validado para adolescentes7 e preenchido o registro alimentar de 3 dias. O questionário de freqüência semi-quantitativo validado para adolescentes é composto por 76 itens alimentares, divididos em nove grupos: 1) doces, salgadinhos e guloseimas; 2) salgados e preparações; 3) leites e produtos lácteos; 4) cereais, pães e tubérculos; 5) verduras e legumes; 6) frutas; 7) carnes e ovos; 8) feijão; 9) bebidas.

O adolescente informou entre as sete opções de freqüência de consumo: nunca; menos de uma vez ao mês; uma a três vezes ao mês; uma vez por semana; duas a quatro vezes por semana; uma vez ao dia; duas ou mais vezes ao dia. Para auxiliar na informação correta sobre o tamanho das porções referidas foi utilizado um registro de fotografia de alimentos.

Outras informações foram obtidas pelo registro de consumo alimentar durante três dias, sendo dois durante a semana e um no final de semana, em que o adolescente registrou a alimentação do dia inteiro, referente ao consumo dentro e fora de casa. Foram dadas orientações específicas anteriores ao preenchimento sobre o tipo de informação a ser descrita e, para auxiliar no tamanho dos utensílios e medidas caseiras, foi utilizado o registro de fotografia de alimentos.

Todas as medidas antropométricas foram obtidas segundo técnicas padronizadas utilizando-se balança eletrônica digital modelo Acqua, marca Plenna®, com capacidade máxima de 150 kg e graduação mínima de 100 g e estadiômetro de madeira Alturaexata® com escala em centímetros e precisão de 1 mm, para a obtenção de peso e altura, respectivamente. Os dados de peso e altura foram inseridos no programa EpiInfo versão 3.3.2 para geração de um banco de dados e cálculo de IMC, por meio da fórmula:

.

Os resultados foram plotados na curva IMC por idade que definiu a classificação do estado nutricional8.

Para análise qualitativa da alimentação foi realizada comparação dos grupos de alimentos com as recomendações propostas pelo Guia Alimentar para a População Brasileira9 com orientações direcionadas à população brasileira maior de dois anos. Para o cálculo do valor nutritivo dos alimentos consumidos e registrados durante os três dias foi utilizado o Software Virtual Nutri10. Os dados obtidos na avaliação antropométrica foram utilizados para estimativa da gordura corporal por meio das equações de Slaughter et al11, recomendadas para indivíduos de 08 a 17 anos.Para análise da ingestão calórica foram desconsiderados os registros com consumo inferior a 500 Kcal ou superior a 5000 Kcal que poderiam estar sub ou superestimados, não refletindo a realidade25. Com relação à ingestão alimentar foram calculados os valores totais e adequação para macro e micronutrientes de acordo com as recomendações das Dietary Reference Intake (DRI)13. Para verificar a associação entre as variáveis foram aplicados modelos de ANOVA, teste não paramétrico de Wilcoxon e um modelo de efeitos mistos. O nível de significância adotado foi de 0,05.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP e todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

 

RESULTADOS

A avaliação antropométrica pelo IMC identificou 36 (8,3%) adolescentes com sobrepeso e 42 (9,7%) obesos, que compuseram o grupo de estudo. Um grupo controle, com 78 estudantes, pareados por sexo e idade, com diagnóstico de eutrofia, também foi constituído. Após iniciada a segunda fase do estudo, porém, houve 25 recusas em continuar participando, além de ser excluída uma adolescente que estava grávida no momento da avaliação física, resultando em 130 adolescentes que efetivamente participaram de todas as etapas do estudo. Desse modo, os grupos ficaram constituídos por 56 (43%) adolescentes com excesso de peso e 74 (57%) eutróficos. A média de idade foi de 196,8 meses (dp = 11 meses), ou seja, aproximadamente 16 anos e 5 meses e em ambos os grupos houve maior participação do sexo feminino, conforme pode ser observado na tabela 1.

A distribuição do IMC e da porcentagem de gordura corporal está apresentada na tabela 2. O questionário de freqüência representa um panorama da alimentação habitual dos adolescentes e possibilitou observar, por meio da média de porções diárias consumidas, quais foram os alimentos mais consumidos pelos integrantes dos dois grupos, conforme pode ser observado na tabela 3. Na tabela 4 estão apresentados os alimentos mais consumidos pelos adolescentes dos dois grupos, por meio das médias de porções diárias. Não foi observada diferença estatisticamente significativa.

Com o registro de três dias também foi possível verificar a distribuição das refeições durante o dia. A maioria dos adolescentes realizou as três refeições principais: café da manhã (86%), almoço (98,9%) e jantar (96,8%). Após análise dos três registros, realizada pelo software Virtual Nutri, foi possível verificar a ingestão média de cada nutriente de acordo com o estado nutricional, conforme descrito na tabela 5.

 

DISCUSSÃO

A prevalência de excesso de peso observada neste estudo foi de 18% (masculino 8,3%, feminino 11%). Dados recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística mostram que a prevalência de excesso de peso aumentou em todas as idades, classes sócio-econômicas e regiões do país. Especificamente entre adolescentes de 10 a 19 anos, o sobrepeso alcançou 21,7% no sexo masculino e 19,4% entre as meninas, enquanto que a obesidade atingiu prevalências de 5,9% e 4%, respectivamente14.

A média de porcentagem de gordura corporal para os adolescentes eutróficos foi de 29,1%, porém não foram encontradas diferenças consideráveis entre os sexos. Fato preocupante encontrado no presente estudo foi que, para o grupo dos adolescentes eutróficos, 95,2% das meninas e 47,6% dos rapazes apresentaram percentual de gordura corporal acima dos limites da normalidade15. Por outro lado, 11,1% dos adolescentes com excesso de peso apresentaram gordura corporal inferior a 20%, representando um peso elevado devido a excesso de massa muscular, e não de massa gorda.

A análise estatística por ANOVA mostrou existir associação entre o percentual de gordura e o estado nutricional (p < 0,01) notando-se diferença entre os grupos eutróficos e com excesso de peso. Não foi encontrada diferença estatística para a ingestão de energia entre os dois grupos. Além disso, pode-se observar que o grupo dos eutróficos apresentou média de consumo calórico superior ao grupo dos alunos com excesso de peso.

A justificativa mais provável seria que os estudantes com excesso de peso sub-relataram seu real consumo, ou por não se sentirem à vontade em descrever com detalhes sua alimentação, sabendo que a mesma contém falhas, ou por não estarem atentos à quantidade de alimentos ingerida, conseqüência da forma mecânica de se alimentar. Também o viés da natureza da pesquisa deve ser considerado, uma vez que em estudos transversais indivíduos acima do peso podem restringir o consumo de alimentos com o objetivo de emagrecer, informando no momento da coleta um consumo de energia reduzido.

Resultados semelhantes foram encontrados por Manios et al16 com adolescentes de 12 e 13 anos, no qual o consumo energético foi avaliado por meio do recordatório de 24 horas por três dias consecutivos. Os adolescentes com excesso de peso, quando comparados com seus pares eutróficos, não apresentaram diferença no consumo de energia e de macronutrientes. Além disso, os estudantes com sobrepeso apresentavam ingestão calórica menor que os eutróficos. Já Santos et al.17, em estudo realizado com 96 adolescentes com média de idade de 16 anos, compararam a ingestão avaliada por meio de registro alimentar de três dias com a taxa metabólica basal e verificaram que 64,6% dos entrevistados sub-notificaram seu consumo alimentar, sendo que os obesos apresentaram cinco vezes mais chance de sub-notificar a ingestão energética que os participantes com peso normal. Os autores relataram ainda que os sub-notificadores apresentaram taxas mais baixas de ingestão de carboidratos, de gordura total e saturada e de colesterol, mostrando que na teoria seus hábitos alimentares se aproximam mais das diretrizes alimentares.

O arroz e o feijão foram os dois alimentos mais consumidos entre todos os adolescentes, mesmo quando separados por grupos. Quando comparado com a recomendação proposta, o feijão apresenta média de consumo superior ao indicado pelo Guia Alimentar para a População Brasileira em ambos os grupos. Esse resultado é positivo e deve continuar sendo estimulado, pois o feijão é característico do hábito alimentar brasileiro18, além de ser um alimento de bom valor nutritivo, contendo elevado teor de fibras, proteínas, ferro e ácido fólico constituindo importante fonte de ferro e proteínas para os adolescentes de baixa renda19,20.

Um dado que preocupante observado foi a presença de "bala" entre os alimentos mais consumidos tanto no geral quato separados por grupos. O relato dos eutróficos mostra consumo de 1,7 porções diárias de "balas", enquanto que os estudantes com excesso de peso referiram ingestão de 1,6 porções diárias. A porção descrita no questionário de freqüência do item "bala" corresponde a 2 unidades. O aporte calórico calculado para 1,7 porções diárias corresponde a 59 kcal, e 56 kcal para 1,6 porções. Considerando o consumo acumulado, em uma semana, a ingestão de balas poderia contribuir com aproximadamente 400 kcal, e 1700 kcal em um mês. Deve-se considerar que a fonte calórica seria somente de açúcar simples.

O açúcar foi consumido com freqüência maior entre os eutróficos (1,2 porções diárias) que entre os alunos com excesso de peso (1,1 porções diárias). Deve-se lembrar que o açúcar aqui considerado é o que é adicionado propositalmente pelo adolescente. Para uma avaliação completa da ingestão de açúcares, é necessário também avaliar a ingestão de bebidas prontas adoçadas e demais preparações doces. Segundo Berkey et al.21 observa-se que o consumo excessivo de leite e sucos de frutas pode contribuir também para uma elevada ingestão energética, mas tais bebidas apresentam composição nutricional mais adequada e, portanto, superior em comparação à observada em refrigerantes, tendo em vista que os últimos fornecem baixo conteúdo de micronutrientes e elevado teor calórico.

Nos Estados Unidos, acredita-se que a ingestão de alimentos pobres em nutrientes represente mais de 30% da ingestão diária. Entre os principais participantes dessa proporção, são citados os refrigerantes, as balas, o açúcar adicionado e as sobremesas22.

No Rio de Janeiro, em estudo com 387 adolescentes com idades entre 12 e 18 anos, Andrade et al.23 perceberam que os alimentos de alta densidade energética que mais contribuíram para o consumo total de energia foram açúcar, batata-frita, e refrigerante. Dalla Costa et al.24 referiram que do grupo dos açúcares e doces, o açúcar foi o alimento mais consumido, com freqüência diária relatada por 78,2% dos entrevistados, seguido das balas e doces, com 59,5%, e do achocolatado e chocolate (40,7%).

A ingestão acima do limite também foi notada em pesquisas com jovens em vários países. Segundo estudo realizado com adolescentes dinamarqueses de 14 a 19 anos, foi observado que 75% dos entrevistados consumiam açúcares de adição acima do limite recomendado pelos países nórdicos, de 10% de energia proveniente desse componente alimentar25. Também em Madrid, na Espanha, verificou-se que os açúcares correspondiam a aproximadamente 16% do total de energia consumida entre adolescentes26.

Mesmo sendo consideradas somente as fontes diretas de gorduras, os dois grupos apresentaram consumo superior às porções recomendadas pelo Guia da População Brasileira. Os indivíduos com excesso de peso excederam em 79% a quantidade de porções diárias recomendada e os eutróficos em 88%.

Com relação à distribuição calórica dos lipídeos, os adolescentes com excesso de peso excederam a recomendação, apresentando 30,2% de calorias provenientes de gorduras. Já as DRIs sugerem uma distribuição diferente do Guia, permitindo uma ingestão de até 35% do total calórico, valor no qual os dois grupos se adéquam13.

Com relação à quantidade obtida nos registros diários de gorduras totais, saturadas, monoinsaturadas, poliinsaturadas e de colesterol, a recomendação para colesterol e gorduras saturadas é a de que seja atingido o menor valor possível em uma dieta nutricionalmente adequada, embora alguns autores defendam que a ingestão de gorduras saturadas não exceda 10% do valor calórico da dieta, e que o consumo de colesterol não ultrapasse 300 mg/dia27. Dados de consumo alimentar de norte-americanos com idades entre 2 e 19 anos mostram que o percentual médio de gorduras na alimentação dos jovens foi de 33,5% do valor calórico, com 12,2% proveniente de ácidos graxos saturados, sendo encontrado valor superior para negros não hispânicos28. Verificou-se ainda que em adolescentes de 12 a 15 anos, as gorduras saturadas contribuíram com 11,6%, sendo encontrado um percentual de 12,8% em crianças de 6 a 8 anos. Esse mesmo estudo mostrou que para a faixa etária de 16 a 19 anos, as gorduras monoin-saturadas contribuíram com 12,7% do valor energético, as poliinsaturadas com 6,8%, e a ingestão média de colesterol foi de 293 mg6.

Adolescentes dinamarqueses com 14 a 19 anos de idade apresentaram 34% de sua ingestão calórica proveniente de lipídeos. Já na Suécia, vários estudos dietéticos mostraram uma alteração na alimentação de indivíduos entre 14 e 17 anos. A contribuição calórica dos lipídeos passou de 44% em 1967 para 33% em 1993, sendo explicada pelo aumento no consumo de cereais e pelo uso de leite desnatado. Entretanto, a ingestão de gorduras saturadas não se alterou, sendo responsável por 15% das calorias consumidas26.

No Brasil, Levy-Costa et al.4 relatam que as calorias provenientes de gorduras crescem com a renda, sendo que para as gorduras saturadas esse aumento é mais intenso.

De acordo com esse inquérito, a distribuição calórica dos lipídeos da região Sudeste, na qual se localiza Ribeirão Preto, corresponde a 30,2 % das calorias provenientes de lipídeos, sendo 9,3% dos saturados, 9,8% dos monoinsaturados, e 7,9% dos poliinsaturados. Nota-se que tanto no grupo dos alunos com excesso de peso quanto nos eutróficos, a ingestão de lipídeos saturados está superior aos dados da POF. Por outro lado, a ingestão de gorduras monoinsaturadas e poliinsaturadas do presente estudo se mostrou inferior aos da literatura.

Em estudo de Garcia et al.29 com adolescentes paulistanos, observou-se uma participação média de 31,3% de gorduras na dieta dos adolescentes, sendo que 53,3% dos meninos e 41% das meninas apresentaram consumo elevado de colesterol.

Pode-se levantar a hipótese de que a omissão do café da manhã (14%), assim como dos lanches da manhã (54,8%) e da tarde (16,1%), auxiliou na baixa ingestão do grupo das frutas e de leite e derivados, contribuindo para o baixo consumo de fibras, vitaminas e minerais. Segundo Nicklas et al.30 o consumo do café da manhã vem diminuindo entre os adolescentes norte-americanos nos últimos 25 anos.

Outra possibilidade seria a troca do grupo dos leites e derivados e das frutas nos lanches intermediários por alimentos pertencentes ao grupo dos doces e gorduras. O fato de 54,8% dos adolescentes não tomarem lanche da manhã pode ser atribuído à escola oferecer como lanche uma refeição semelhante ao almoço.

Os dados do presente estudo mostram que o hábito alimentar do adolescente vem passando por modificações, com a presença cada vez maior de alimentos com pequena contribuição nutricional. O excesso de produtos industrializados torna a alimentação mais rica em açúcares simples, gorduras saturadas, gorduras trans e colesterol, elementos que em excesso podem trazer grandes prejuízos à saúde.

Todos esses fatos reforçam a importância de maior atenção a ser dada por profissionais da saúde quanto a alimentação e demais hábitos saudáveis, como atividade física, no sentido de orientar os adolescentes e sensibilizá-los para adotar de medidas que contribuam para um estilo de vida saudável.

Embora tenha avaliado um pequeno número de participantes em cada grupo, este estudo tem como pontos fortes a exploração de informações relativas aos hábitos e consumo alimentares de uma faixa etária importante na população brasileira, que é a dos adolescentes. O conhecimento do comportamento alimentar propicia a discussão e estimula o desenvolvimento de novos estudos que possam subsidiar ações individuais e coletivas.

 

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Manuscript submitted Aug 01 2013
Accepted for publication Dec 28 2013

 

 

There is no conflict of interest.
Corresponding author: delciamp@fmrp.usp.br