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Journal of Human Growth and Development

versão impressa ISSN 0104-1282versão On-line ISSN 2175-3598

J. Hum. Growth Dev. vol.27 no.1 São Paulo jan./abr. 2017

http://dx.doi.org/10.7322/jhgd.127686 

ARTIGO ORIGINAL

 

Vulnerabilidade na adolescência: Um relato de caso de tentativa de aborto e violência sexual

 

 

Adna Thaysa Marcial da SilvaI, II; Guilherme Dias de SousaIII; Camila Lohmann MenezesIV; Edson Santos Ferreira FilhoIII; Walter da Silva PinheiroIII; José Maria Soares JúniorIII, Edmund Chada BaracatIII ,IV; Isabel Cristina Esposito SorpresoII, III, IV

INursing. Pos Graduation Obstetric and Gynecology Department, Medicine School, São Paulo University - São Paulo (SP) - Brazil
IILaboratory of Study Design and Scientific Writing, ABC Medical School - São Paulo (SP) - Brazil
IIIMedicine School, São Paulo University - São Paulo (SP) - Brazil
IVDiscipline of Gynecology, Hospital das Clínicas, Medicine School, São Paulo University - São Paulo (SP) - Brazil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

INTRODUÇÃO: O aborto, mesmo quando previsto por lei nos casos de violência sexual, continua a ser praticado de maneira insegura, uma vez que as mulheres que experimentam essa violência não a relatam ou velam por vulnerabilidade social, institucional ou etária, como na adolescência.
OBJETIVOS: Descrever as consequências clínicas do aborto inseguro e relatar essa experiência vivenciada bem como a violência sexual em situações de vulnerabilidade social e etária.
MÉTODO: Trata se de relato de caso clínico, com consentimento da paciente, ocorrido no ano de 2016 de uma adolescente, sexo feminino, 16 anos com antecedente pessoal de violência sexual de agressor íntimo. Admitida em serviço de saúde com diagnóstico de abdome agudo e aborto induzido em uso de antibioticoterapia.
RESULTADOS: Laboratoriais revelaram proteína C reativa alterada e presença de leucocitose, ultrassonografia apresentou massa heterogênica, tomográfica computadorizada evidenciou presença de corpo estranho cilíndrico em cavidade vaginal, intervenções cirúrgicas, infecções generalizadas, complicações clínicas.
CONCLUSÃO: A história de violência retratada nesse estudo revela uma tentativa de aborto com autolesão, desvelando repercussões clínicas negativas e os agravos à saúde da adolescente. Esta que cometeu um aborto que não se insere nos critérios de aborto previsto por lei. Revelou ainda a necessidade de maior discussão sobre o tema, destacando as práticas de promoção da saúde contra o aborto inseguro.

Palavras-chave: aborto, violência sexual, adolescente, aborto séptico.


 

 

INTRODUÇÃO

A Organização Mundial de Saúde (OMS) refere um aumento nas taxas de gravidez indesejada, abortos inseguros, doenças sexualmente transmissíveis e repercussões neonatais em mulheres que são abusadas sexualmente1. Na saúde pública, há um efeito negativo na economia, podendo variar até 2% do PIB (produto interno bruto)2, bem como consequências maternas relacionadas à morbidade e mortalidade de nossas mulheres3-5.

O aborto inseguro aparece como uma alternativa às gestações não desejadas1,6,7, principalmente em casos relacionados à violência física, à violência sexual ou a ambos, geralmente causados por um parceiro íntimo ou conhecido. Nesses casos, o aborto seria assegurado por lei em alguns países3,6, mas as pacientes que sofrem violência não relatam ou se escondem por diversas vulnerabilidades social e etária8-10.

O abuso sexual11 durante a adolescência é uma experiência traumática que complica o desenvolvimento psicossocial das mulheres no limiar da idade adulta2, resultando em consequências associadas a doenças sexualmente transmissíveis, gravidez seguida de violência, gravidez indesejada, repercussões psicossociais7 e sequelas negativas que comprometem saúde reprodutiva e sexual1.

A associação entre violência e aborto inseguro provoca um risco de morte2,5 em mulheres jovens, relacionado a infecções, das quais 40% atingem o trato genital superior12 e sepse3,6. Estudos mostram a importância da intervenção precoce e da abordagem interdisciplinar nos serviços de saúde para reduzir os danos causados13.

Assim, reforçando a importância das práticas de promoção em saúde, o artigo demonstra relato de caso de adolescente com antecedente pessoal de violência sexual que realizou um aborto inseguro e tem o objetivo de descrever as consequências clínicas do aborto inseguro e relatar essa experiência vivenciada bem como a violência sexual em situações de vulnerabilidade social e etária.

 

RELATO DE CASO

Identificação: Paciente de 16 anos, sexo feminino, natural e procedente de São Paulo - SP, ensino médio incompleto, solteira e reside com a mãe.

Queixa principal e duração: Encaminhada ao Serviço de Assistência à Vítima de Violência Sexual na Disciplina de Ginecologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo por quadro de dor abdominal há 10 dias.

História pregressa da Moléstia atual: Paciente relatando dor abdominal na região hipogástrica por 10 dias, dor ao urinar e com fezes pastosa e amolecida sem alteração de cor e sem sangramento associado. No momento do atendimento inicial, paciente em uso de antibioticoterapia (norfloxacina) por 6 dias, sem melhora clínica. Negava febre, náusea e vômito.

Antecedentes familiares: Nega cardiopatias, neoplasias, ginecopatias e doenças crônicas e infecto contagiosa.

Antecedentes pessoais: Nega realização de cirurgias, internações clínicas, doenças pré-existentes, cardiopatias, neoplasias, ginecopatias, doenças crônicas, infecciosas e doenças sexualmente transmissíveis.

Hábitos: Nega tabagismo, etilismo, uso de drogas e medicamentos.

Antecedentes Ginecológicos: Menarca aos 11 anos. Primeira relação sexual aos 12 anos. Refere abuso sexual do padrasto (marido de sua mãe) aos 13 anos de idade, acompanhando em serviço especializado com abordagem interdisciplinar com psicólogos e infectologistas. Nega uso de método contraceptivo. Atualmente, refere apenas relação sexual consentida, última relação sexual há 2 anos.

Exame físico geral admissional: Apresentava-se em regular estado geral, corada, hidratada, febril (temperatura axilar: 37,8ºC), taquicárdica (frequência cardíaca: 124 batimentos por minuto - bpm), normotensa, eupneica. Auscultas cardíaca e pulmonar sem achados relevantes. Abdome discretamente distendido, difusamente doloroso, sobretudo em fossa ilíaca esquerda, sem piora da dor à descompressão brusca (sinal de Blumberg negativo).

Exame ginecológico: Genitália com aparência feminina, trofismo e desenvolvimento dos pelos pubianos adequados para a idade, sem lesões. O exame especular foi dificultado pela dor do paciente, identificando apenas secreção amarelada e fétida com presença de lesão no terço proximal da vagina impedindo a visualização do colo uterino. No exame vaginal bimanual, observou-se uma lesão no terço proximal da vagina, estenosante, que impediu a palpação do colo do útero. Houve dor importante na palpação dos fórnices, mobilização cervical e avaliação anexial.

Testes de diagnóstico complementar: Hemograma completo, proteína C reativa, sorologia para sífilis, hepatite B e C e HIV, exame de urina, exame urinário da gravidez, ultrassonografia pélvica e tomografia pélvica.

Hipótese diagnóstica: Abdome agudo infeccioso e aborto auto-induzido e inseguro.

Plano terapêutico: Devido à sepse e ao abdome inflamatório agudo, a paciente foi hospitalizada para tratamento intravenoso com antibiótico de amplo espectro (clindamicina e gentamicina) por 10 dias, suporte clínico e elucidação diagnóstica.

Resultados dos testes laboratoriais: Os exames mostraram leucocitose e presença de granulações tóxicas, proteína C reativa elevada. Os testes sorológicos para sífilis, HIV, hepatite B e C foram negativos. O exame urinário foi negativo para a gravidez.

Resultados de exames de imagem: A ultrassonografia pélvica (técnica transabdominal, uma vez que o estudo transvaginal não foi possível devido à dor do paciente) mostrou uma grande massa heterogênea, contendo áreas císticas com debris de permeio, ocupando hipogástrio e fossa ilíaca esquerda, medindo cerca de 8,6 x 5,5 x 9,2 cm (volume de 227 cm3); útero e ovários não caracterizados (Figura 1), com vascularização periférica ao estudo com Doppler (Figura 2).

 

 

Tomografia computadorizada de abdome e pelve evidenciou corpo estranho cilíndrico situado na cavidade vaginal, de baixa atenuação e componente com atenuação metálica interna que apresenta íntimo contato com o colo do útero, com cerca de 5,0 cm de extensão e 3,0 cm de diâmetro máximo; volumosa coleção multisseptada com paredes que sofrem realce pós-contraste, localizada na região anexial esquerda, que se estende até a cicatriz umbilical, em contato com a vagina, útero, ovários e bexiga urinária, deslocando-os, medindo cerca de 12,2 x 11,6 x 9,7 cm; achados que poderiam representar piossalpinge e abscesso tubo-ovariano esquerdo (Figura 3A, 3B, 3C, 3D, 3E e 3F).

A paciente apresentava-se com temperatura de 37,7ºC e ligeiramente taquicárdica (até 115 bpm); devido à resposta clínica insatisfatória, o esquema antimicrobiano foi modificado para ceftriaxona e metronidazol e uma abordagem cirúrgica foi indicada.

Abordagem cirúrgica: Paciente foi submetido à dissecção da estenose vaginal e remoção de tecido estranho (Figura 4) por via vaginal, em sala cirúrgica, no terceiro dia de internação, sob anestesia raquidiana, sem intercorrências. Todo o material removido foi encaminhado para análise histopatológica. A análise patológica revelou mucosa malpighiana com extenso infiltrado inflamatório agudo, ulcerado, estendendo - se à submucosa, associado com tecido de granulação, fibrina e necrose.

 

 

Devido à idade do paciente e, até então,ausência de piora clínica, realizado tentativa de conduta conservadoraeprogramado drenagem percutânea de abscesso pélvico através de radiologia intervencionista. No entanto, no primeiro dia pós-operatório houve piora da taquicardia (125 bpm) e rebaixamento do nível de consciência, caracterizando em infecção generalizada grave, além de sinais de peritonite (sinal positivo de Blumberg) (Figura 4).

Os antibióticos foram modificados para piperacilina/tazobactam e vancomicina e indicada laparotomia exploradora. Realizou-se laparotomia mediana infraumbilical sob anestesia geral no quarto dia de internação hospitalar.

Inventário da cavidade: líquido livre purulento na cavidade abdomino-pélvica, onde se encontraram aglomerados de pus, o maior em topografia tubo-ovariana, à esquerda, com múltiplas aderências entre as dobras do peritônio, intestino delgado, cólon e ovários. Os abscessos foram drenados, as cápsulas foram ressecadas e a cavidade abodominal foi repetidamente lavada com solução salina. Devido ao grau de comprometimento, foi necessário ressecar parte das dobras do peritônio contíguo às aglomerações de pus. Ao final da cirurgia, inserido dreno de sucção de sistema fechado (Portovac).

Todo o material removido foi encaminhado para estudo histopatológico, identificando-se: em cápsula de abscesso, processo inflamatório agudo supurativo com tecido de granulação exuberante em tecido conjuntivo e adiposo; no omento, processo inflamatório agudo supurativo exuberante em tecido adiposo.

Pós-operatório imediato: A paciente foi encaminhada para unidade de terapia intensiva, devido à possibilidade de instabilidade hemodinâmica e necessidade de drogas vasoativas, sendo colocado um cateter venoso central na veia subclávia esquerda.

Unidade de Terapia Intensiva: A paciente evoluiu com presença de sangue na cavidade pulmonar, drenado sem intercorrências e insuficiência renal aguda. A dose foi corrigida de acordo com os níveis de vancomicina. Ela necessitou de norepinefrina e hemotransfusão (glóbulos vermelhos) para manter a estabilidade hemodinâmica por um dia, progredindo com melhora clínica parcial.

Drenos abdominal e torácico evoluíram com redução do débito, sacado dreno torácico após três dias, a aceitação da dieta e os parâmetros laboratoriais para a infecção melhoraram. Após oito dias na Unidade de Terapia Intensiva, foi encaminhada à enfermaria.

Enfermaria: Seguiu em antibioticoterapia intravenosa e com suporte de fisioterapia. Após quatro dias, progrediu com piora progressiva do padrão respiratório e realizou angiotomografia de tórax, que evidenciou: falha no preenchimento da artéria lobar inferior direita e em seus ramos segmentares basais proximais, compatível com tromboembolismo pulmonar agudo, além de atelectasias laminares e subsegmentares nos lobos pulmonares inferiores. A anticoagulação completa foi realizada com enoxaparina e varfarina até o ajuste de INR. Finalmente, evoluiu com melhora clínica importante.

Alta hospitalar: Após 42 dias de internação, a paciente recebeu alta hospitalar assintomática, em uso de varfarina e com seguimento ambulatorial (ginecologia e psiquiatria) programado.

Acompanhamento Ambulatorial: Retornou no ambulatório de Ginecologia após 20 dias de alta hospitalar, em boas condições clínicas, com adequada adesão ao tratamento anticoagulante, para seguimento. Discutido opções de contracepção reversível de longa duração, paciente recusa quaisquer opções no momento.

Em particular, sozinha no consultório, a paciente informou à equipe médica que ela própria inseriu o corpo estranho para indução de abortamento, pois apresentou atraso menstrual e receou estar grávida. Porém refere ausência de atividade sexual. Retornará para reavaliações clínicas e psicológicas periódicas.

 

DISCUSSÃO

O artigo relata caso clínico de adolescente com histórico de violência sexual, onde a adolescente realizou um aborto inseguro ocasionando danos e agravos em sua saúde. As conseqüências foram intervenções cirúrgicas, infecções generalizadas (sepse), intercorrências clínicas como tromboembolismo pulmonar e período de hospitalização prolongada.

As taxas de internação hospitalar pós-aborto são elevados e colocam o aborto inseguro como um problema de saúde pública no Brasil14,15 e relaciona-se à 13% da mortalidade materna em todo o mundo5,9. Cerca de metade das mulheres que fizeram aborto tiveram atendimento no sistema de saúde e foram internadas por complicações16,17.

Considerado mundialmente uma pandemia persistente e evitável6,15,16, o aborto inseguro17 coloca em risco principalmente as mulheres nos países em desenvolvimento onde o aborto é altamente restrito por lei e embora legalmente permitido como no Brasil em casos de gravidez resultante de estupro, se não há outro meio de salvar a vida da mãe18, o aborto seguro não é facilmente acessível6.

Em uma situação de gravidez indesejada, muitas mulheres induzem o abortamento ou obtêm abortos clandestinos de médicos, paramédicos, ou curandeiros tradicionais1. No relato de caso clínico em questão, por exemplo, a inserção do corpo estranho através do colo do útero teve como objetivo interromper uma gravidez indesejada, onde somente no serviço de saúde foram realizados exames que não confirmaram a gestação.

Estudos em saúde pública no Brasil, mostrou que 15% das mulheres induziram aborto ao longo da vida reprodutiva, sendo o período de vida da adolescência o mais frequente15,16,18. As adolescentes têm prioridade nas políticas de saúde pública no Brasil12,17 e são considerados vulneráveis pela faixa etária (menor de 14 anos) e também por dependência social e emocional2,19,20, sendo de responsabilidade conjunta dos gestores em saúde2,7, facilitarem o acesso a serviços de aborto seguro nos casos de gravidez resultante de estupro, quando não há outro meio de salvar a vida da mãe18, bem como aumentar a consciência social4,16.

A violência sexual11,20 velada na infância e adolescência relaciona-se com o abortamento inseguro7,17. No Brasil, há relato de violência sexual contra crianças e adolescentes do sexo feminino12,16,17 com consequentes gestações não desejadas20 seguida de violência. O aborto7,15 permanece sendo uma prática clandestina, especialmente no contexto da América Latina21,22.

A redução da incidência de abortos inseguros está associada à redução da incidência de violência sexual, especialmente do parceiro íntimo17,23. No relato de caso, a paciente possui antecedente pessoal de violência sexual do parceiro íntimo da mãe. Além disso, a situação de vulnerabilidade2,6,9,10 é perpetuada pois mulheres que sofreram qualquer forma de abuso sexual durante a vida têm um aumento significativo nas chances de vir a ter uma gravidez indesejada24 por não se prevenirem.

A adolescente no referido relato clínico não estava usando nenhum método contraceptivo e se negou ao uso de métodos reversíveis de longa duração durante o atendimento ambulatorial, mesmo sob orientação multiprofissional. Sabe-se que a promoção em saúde reprodutiva16 após o abortamento traz resultados satisfatórios tanto em redução do abortamento inseguro17 quanto ao número de gestação não planejada e indesejada em casos de violência.

A informação e conscientização19 sobre métodos de contracepção16 pós-aborto eficazes e facilitação a serviços especializados em saúde da mulher deve ser promovidos9,21.

Os benefícios da legalização do aborto no Brasil nos casos previstos por lei18,20 mostram uma redução dos números de internações em hospitais públicos por complicações de aborto ao longo dos anos e uma redução da mortalidade materna7,25,26. Isso ocorre em países desenvolvidos e em desenvolvimento, principalmente quando associada com um conjunto de medidas16 que garantem o conhecimento sobre a legalização na população.

A legalização do aborto no Brasil18 é assunto controverso e vinculado a aspectos da religião e da cultura27, trazendo obstáculos na busca aos serviços de saúde17 e consequências deletérias à saúde do adolescente2,3,7,28,29. Ainda, a vulnerabilidade social é presente neste contexto, onde os níveis econômico e educacional interferem no acesso ao aborto seguro e previsto por lei18,30-32.

A incidência de aborto séptico varia amplamente entre os países em desenvolvimento e desenvolvidos6,7 sendo também relacionada à adolescência7,20. Infecções graves resultantes de práticas inseguras de aborto com consequente sepse3,4,6,7,9 ou hemorragias graves3 podem repercutir definitivamente na vida reprodutiva, como no caso de histerectomia3,4,6 e infecções generalizadas por inserção de corpo estranho3,13. No relato de caso, a paciente evoluiu com infecção pélvica grave, abscesso pélvico, sepse grave e necessidade de cuidados intensivos.

A conduta conservadora - preservação do útero - foi oportuna, baseada na idade e na história obstétrica da paciente, visando preservar fertilidade e, no futuro, proporcionar uma oportunidade de gravidez devidamente planejada.

Perfuração do útero, hemorragia, lesão visceral, infecção generalizada e choque séptico após aborto inseguro podem levar à morte devido ao atraso na apresentação para tratamento médico adequado9. Em nosso relato de caso, o desfecho foi favorável para a paciente devido à estrutura de atendimento em ambiente especializado em saúde da mulher e nível de alta complexidade do serviço de saúde.

Este relato de caso ajuda a guiar a prática clínica e traz reflexões sobre o impacto da violência sexual velada e o aborto inseguro sobre a vida das adolescentes e sobre o sistema de saúde.

 

CONCLUSÃO

A história de violência retratada nesse estudo revela uma tentativa de aborto com autolesão, desvelando repercussões clínicas negativas e os agravos à saúde da adolescente. Esta que cometeu um aborto que não se insere nos critérios de aborto previsto por lei. Revelou ainda a necessidade de maior discussão sobre o tema, destacando as práticas de promoção da saúde contra o aborto inseguro.

Conflito de Interesse

Os autores declaram não haver conflito de interesse.

Agradecimentos

Agradeço ao setor de ginecologia do Hospital das Clínicas de São Paulo e aos profissionais que auxiliaram neste relato de caso.

Contribuição dos Autores

ATMS, ESFF, GDS, CML, WSP, JMSJ, ECB e ICES participou na aquisição de dados e revisão do manuscrito.

ATMS, GDS e ICES redigiu o manuscrito e realizou levantamento bibliográfico.

ESFF e ICES determinaram o desenho do estudo.

GDS e ATMS tradução para língua inglesa.

WSP, JMSJ, ECB e ICES revisão na língua inglesa.

Todos os autores leram e deram a aprovação na versão submetida para publicação.

 

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Endereço para correspondência:
Adna Thaysa Marcial da Silva
E-mail: adnathaysa@hotmail.com

Manuscript submitted in 2016
Accepted for publication in Jan 2017

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