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Journal of Human Growth and Development

versão impressa ISSN 0104-1282versão On-line ISSN 2175-3598

J. Hum. Growth Dev. vol.27 no.2 São Paulo maio/ago. 2017

http://dx.doi.org/10.7322/jhgd.112645 

ARTIGO ORIGINAL

 

Comportamento e práticas sexuais de adolescentes escolares da cidade do Recife, Brasil

 

 

José Flavio de Lima CastroI; Rodrigo Cappato de AraújoII; Ana Carolina Rodarti PitanguiIII

IUniversidade Federal de Pernambuco, Centro Acadêmico de Vitória, Núcleo de Enfermagem, Recife, PE, Brasil. Mestre, Professor Assistente
IIUniversidade de Pernambuco, Programa de Mestrado em Hebiatria, Recife, PE, Brasil. Doutor, Professor Associado
IIIUniversidade de Pernambuco, Programa de Mestrado em Hebiatria e do Programa de Pós-graduação em Enfermagem UPE/UEPB, Recife, PE, Brasil. Doutora, Professora Adjunta

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

INTRODUÇÃO: A sexualidade do adolescente não deve ser compreendida apenas do ponto de vista biológico, sendo necessário considerar todo contexto social.
OBJETIVO: Caracterizar o comportamento e práticas sexuais dos adolescentes, segundo o sexo.
MÉTODO: Estudo transversal com adolescentes de 14 a 19 anos matriculados na rede estadual do Recife-PE. Foi empregado um questionário com dados sociodemográficos e sobre comportamento sexual. Os dados foram analisados no SPSS, sendo empregada análise descritiva e os testes Qui-quadrado e Mann-Whitney.
RESULTADOS: Foram analisados os dados de 674 adolescentes, com média de idade de 16,07 ± 1,46 anos. Foi verificado iniciação sexual em 52,9% dos meninos e 38,7% das meninas. Houve diferença significativa entre o número de parceiros (p=0,001) com maior quantitativo no sexo masculino. O método de barreira foi o mais empregado na primeira (68,8%) e última relação (52,2%). Foi observado diferença significativa na primeira e última relação, no uso (p=0,006; p=0,010) e tipo de método contraceptivo (p=0,001; p=0,001). Em relação a rede social, os amigos foram os mais procurados. Contudo, houve diferença significativa (p=0,026), sendo a figura materna mais prevalente nas meninas. Houve diferença significativa na ausência da iniciação sexual (p=0,001). A falta de oportunidade foi a condição mais relatada pelos meninos (52,2%) e casar virgem pelas meninas (33,9%).
CONCLUSÃO: A maioria dos adolescentes já havia iniciado a vida sexual, com maior prevalência no sexo masculino. Em relação as práticas e condutas foi observado na maior parte das condições analisadas valores distintos entre os sexos, com maior liberdade e permissividade no sexo masculino.

Palavras-chave: adolescência, comportamento sexual, anticoncepção


 

 

INTRODUÇÃO

A adolescência é um período transitório que correspondente à passagem da fase infantil para adulta, caracterizada por alterações emocionais, fisiológicas e psicossociais contribuintes ao amadurecimento mental e corporal do adolescente1. Essa transição se dá de maneira complexa e envolve questões sociais voltadas à classe, etnia e sexo, bem como, institucionais que englobam os sistemas de ensino e mercado de trabalho, e questões relacionadas à singularidade da trajetória de cada indivíduo2.

Dentre as mudanças ocorridas nessa fase, as físicas constituem a puberdade que está relacionada às modificações corporais envolvendo o crescimento físico, a eclosão hormonal e evolução da maturação sexual. Do ponto de vista emocional, há tendências comportamentais voltadas à busca da identidade, desenvolvimento conceitual e evolução da sexualidade3.

A adolescência está vinculada ao início da atividade sexual4, contudo, nem sempre vem acompanhada de conhecimento preparatório voltado à educação sexual, sendo observada nos últimos anos, uma antecipação da atividade sexual, ou seja, esse evento está ocorrendo cada vez mais cedo entre os adolescentes5.

A sexualidade na adolescência se relaciona a descobertas e experiências que implicam a tomada de decisões, demandando responsabilidade e autonomia. A inserção de adolescentes nas políticas de saúde exige uma compreensão ampliada do contexto sócio-histórico em que estão inseridos e das especificidades dessa fase de desenvolvimento6.

Ao se relacionar sexualidade e sexo, fica nítida a diferenciação entre meninos e meninas, pois enquanto para elas a sexualidade deve ter relação com a função reprodutiva e biológica, sendo a virgindade uma qualidade a ser preservada, para eles iniciar a vida sexual cedo é sinal de virilidade e garantia de status diante da sociedade e família7.

De acordo com o Censo Demográfico de 20108, os adolescentes com idade entre 15 a 19 anos representam 17,9% da população brasileira. Em Recife- PE, essa faixa etária ocupa 16% da população total da capital pernambucana, sendo um representativo populacional expressivo que necessita de cuidado especial, em decorrência de seus comportamentos e problemas em saúde servirem para projetar expectativas para idades mais avançadas. Além disso, ainda são escassos os estudos que buscam avaliar os comportamentos e práticas sexuais de adolescentes, especificamente na região Nordeste, justificando assim o desenvolvimento deste estudo.

Assim, o objetivo do presente estudo foi analisar o comportamento e práticas sexuais dos adolescentes da cidade do Recife-PE, Brasil.

 

MÉTODO

Trata-se de um estudo epidemiológico de base escolar com delineamento transversal e caráter descritivo realizado com adolescentes com idade de 14 e 19 anos, matriculados no ensino médio em escolas da rede pública estadual da cidade do Recife-PE, Brasil, no período de Abril a Julho de 2013. A distribuição das escolas foi feita pela divisão em região geográfica, porte das escolas e período de matrícula dos estudantes (manhã, tarde e integral), visando garantir a proporcionalidade amostral. A distribuição regional foi dividida pelo número de escolas existentes nas regiões do Recife Norte e Recife Sul. A fim de subsidiar o planejamento amostral, as escolas foram classificadas em três categorias: pequeno porte (200 ou menos alunos); médio porte (201 a 499 alunos); e grande porte (500 alunos ou mais). Todas as escolas da rede pública estadual de Recife foram consideradas elegíveis para inclusão no estudo.

Incluíram-se no estudo, estudantes que atingiam os seguintes critérios: ser estudante do ensino médio regularmente matriculado na rede pública estadual de educação na regional Recife nos turnos diurno (manhã, tarde ou integral); ter idade de 14 a 19 anos; entregar o Termo de Assentimento e de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) devidamente datado e assinado respectivamente pelo aluno e responsável. Foram excluídos aqueles que se enquadravam nos seguintes critérios: apresentar diagnóstico médico de patologia física ou psicológica que impossibilitassem o preenchimento dos instrumentos de coleta; presença de questionários contendo erros de preenchimentos; e descontinuidade do sujeito na pesquisa, que ocorreu nos casos no qual foram feitas duas tentativas de entrega de TCLE sem sucesso. Todos os procedimentos foram pautados na Resolução n. 466/12 do Conselho nacional de Saúde e o estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Pernambuco sob CAAE n.13374513.9.0000.5207.

Para seleção da amostra, recorreu-se ao procedimento de amostragem aleatória em conglomerados sendo dividido em dois estágios, escola e turma. Após as etapas, chegou-se ao número total de 26 escolas e 95 turmas, o que representou 24% das escolas estaduais da cidade do Recife- PE, Brasil. Para quantificação da amostra utilizou-se o programa WinPepi, considerou-se uma população de 55.058 estudantes, intervalo de confiança de 95%; erro máximo tolerável de 5 pontos percentuais; perda de 20%, e, por se tratar de estudo abrangendo a análise de múltiplos comportamentos de risco e com diferentes frequências de ocorrência, prevalência estimada de 50%, totalizando o quantitativo de 477 adolescentes. Foi realizada a multiplicação do tamanho mínimo da amostra por 1.4 (efeito do delineamento de amostragem), totalizando 667 adolescentes.

Procedimentos

Foi realizado estudo piloto com 35 adolescentes para testar a aplicabilidade do instrumento, possíveis vieses, correções e limitações nos procedimentos da pesquisa e treinamento dos pesquisadores. Ao todo participaram 13 pesquisadores devidamente treinados.

Para apresentação e familiarização com o estudo, ocorreu inicialmente à divulgação nas escolas públicas estaduais do Recife selecionadas e foi feita a entrega do TCLE aos alunos para que os mesmos entregassem aos responsáveis para conhecimento e aprovação da pesquisa. Em seguida, a coleta de dados foi iniciada e os voluntários foram submetidos ao inquérito sociodemográfico e sobre o comportamento sexual por meio de questionário autoexplicativo, de caráter anônimo, o qual respondeu na ausência do professor. Esses procedimentos tiveram o intuito de que os adolescentes não tivessem a interferência do professor, minimizando possíveis induções ou constrangimentos no preenchimento dos instrumentos de coleta.

Os adolescentes foram continuamente assistidos pelos aplicadores que foram orientados a esclarecer possíveis dúvidas sem interferência nas respostas e a seguirem as padronizações da pesquisa. Ao final, os estudantes foram orientados a depositar o questionário em uma urna localizada dentro da sala de aula e após, foram convidados a sair da sala.

Inquérito Socioeconômico e de Comportamento Sexual

Foi estabelecido por meio de questionário estruturado que constou com questões sobre características sociodemográficas e comportamento sexual. O inquérito do comportamento sexual foi feito por meio do questionário empregado nos estudos de Borges et al.4,9-11. As perguntas foram formuladas de forma direta e as respostas classificadas como fechadas.

O questionário constou com 74 questões, contendo os seguintes domínios: dados sóciodemograficos (composto por dez questões), estrutura familiar (composto por duas questões), informações sobre mãe/madrasta (composto por sete questões), informações sobre e pai/padrasto (composto por sete questões), valores e relação familiar (composto por doze questões), preferências reprodutivas (composto por quatro questões), namoro (composto por quatro questões), comportamento reprodutivo (composto por vinte e seis questões) e ausência de iniciação sexual (composto por duas questões).

Análise dos dados

Os dados foram processados no programa Microsoft Excel, através de digitação dupla e analisados utilizando o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 20, sendo empregada a estatística descritiva para as variáveis categóricas com a distribuição de frequência (relativa e absoluta) e para as variáveis numéricas foram calculados valores de média, desvio-padrão, máximo e mínimo. Na análise inferencial, foram utilizados os testes de Qui-quadrado de Pearson e Mann-Whitney a fim de analisar as diferenças existentes entre os adolescentes, segundo o sexo. Em todos os testes foi considerado nível de significância de p ˂ 0,05.

 

RESULTADOS

Avaliou-se 744 adolescentes, sendo excluídos 70 por apresentarem questionários contendo erros de preenchimentos. Portanto, a amostra final foi composta por 674 adolescentes, com média de idade de 16,07 ± 1,46 anos, com o mínimo de 13 e máximo de 19 anos. Desses, 251 (37,2%) eram do sexo masculino e 423 (62,8%) eram do sexo feminino. Em relação ao período escolar, 356 (52,8%) adolescentes estudavam no turno da manhã, 177 (26,3%) à tarde e 141 (20,9%) em período integral. Não se verificou diferença estatística significativa entre o período estudado e a variável sexo (p=0,142). Os dados da amostra referentes ao namoro e vida sexual podem ser vistos na tabela 1.

Em relação à idade da primeira relação sexual, os escolares relataram apresentar mínimo de oito e máximo de 19 anos. Quanto à idade do parceiro na primeira relação sexual foi referido o mínimo de oito e máximo de 55 anos. Outras variáveis relacionadas à iniciação sexual dos adolescentes podem ser visualizadas na tabela 2.

Os dados dos adolescentes relacionados ao emprego e tipo de métodos contraceptivos utilizados na primeira e última relação sexual podem ser vistos na tabela 3.

Na tabela 4 podem ser visualizados os motivos relatados pelos adolescentes para a ausência de vida sexual ativa.

 

DISCUSSÃO

A média de idade dos adolescentes foi de 16,07 ± 1,46 anos, estando semelhante ao encontrado por outros autores10, que verificaram médias de 16,8 ± 1,3 e de 15,3 ± 1,09. Médias de idade superior foram apresentadas pelos parceiros das meninas, inclusive em relação à própria idade da adolescente, fato que não foi observado entre os meninos, que possuíam idade próxima a das parceiras. Maior prevalência de meninas estava namorando ou casadas atualmente do que meninos.

Dados similares foram encontrados por Borges, Latorre e Schor11, em São Paulo, no qual foi evidenciado que as meninas estavam namorando com pessoas mais experientes. No entanto, mesmo sendo considerada comum essa condição ela deve ser vista com cautela, pois pode acabar levando a uma situação de vulnerabilidade, visto que quanto maior a diferença de idade entre a adolescente e seu namorado, mais difícil será a liberdade de decisão na negociação do momento ideal para iniciação sexual, como também na escolha e emprego do método contraceptivo11.

Quanto ao momento ideal para iniciação sexual, maior prevalência foi verificada no período marital para as meninas e no namoro para os meninos, indo ao encontro de outros autores12. Além disso, os meninos referiram com maior frequência o descritor "tanto faz", evidenciando que não existe um momento ideal. Essa condição pode ser elucidada em razão das distintas concepções de iniciação sexual existentes entre os sexos, no qual para as meninas vem agregada a adjetivos como estabilidade, compromisso mútuo do casal e afetividade, diferente da realidade masculina, que se relaciona à necessidade corporal e imposição social de se iniciar sua sexualidade o mais cedo possível, a fim de demarcar características relacionadas à masculinidade e vigor11,13,14. Ratificando tal dado, não se observou diferença em relação à idade certa para iniciar a vida sexual, confirmando mais uma vez, que esse evento está relacionado a um marco social, como por exemplo, o casamento e o namoro, e não a uma idade específica.

Maior parcela dos adolescentes mencionou já ter iniciado a vida sexual, com maior prevalência nos meninos em relação às meninas. São frequentes as variações em relação a essas prevalências, sendo encontrado percentuais gerais de 44,9%15 e de 39% nos meninos e 17% nas meninas13. Estudos internacionais também apontam essa divergência, demonstrado percentuais de iniciação sexual de 35,8% em Portugal5, de 62% no sul da Etiópia16, de 41,5% em Hong Kong17 e de 54,1% nos Estados Unidos18.

Neste sentido, fatores como diferenças metodológicas, diversidades nas faixas etárias e aspectos culturais e demográficos podem justificar essa variação. Entretanto, um fato tornou-se presente entre os estudos, a maior prevalência de iniciação sexual no sexo masculino, demarcando assim que mesmo em países diferentes ocorre a existência de valores sociais distintos entre os sexos.

Em relação aos pais saberem sobre a vida sexual dos filhos, foi evidenciado que para as meninas essa situação ainda é menos frequente. Esse distanciamento entre pai e filha ocorre devido as adolescentes perceberem a figura paterna como fiscalizadora e disciplinadora levando a falta de confiança em abordar assuntos sobre sexualidade19. Mesmo nos dias atuais, falar sobre sexualidade ainda é compreendido como algo permeado de conflitos, tabus, mitos e proibições, levando os pais a se sentirem constrangidos, principalmente pelo fato de serem de uma geração diferente, alicerçada em valores e normas mais repressoras20.

As meninas apresentaram menor número de parceiros sexuais quando comparadas aos meninos. E apesar desse padrão ser explicado em decorrência da diferença de sexo, alguns autores não evidenciam essa diferença21-23. Resultados semelhantes aos nossos foram relatados por Silva et al.24 que além de terem verificado esse mesmo padrão, ainda inferem que as chances de estar exposto as doenças sexualmente transmissíveis (DST) e ao vírus da imunodeficiência humana/síndrome da imunodeficiência adquirida (HIV/AIDS) é maior nos adolescentes que apresentam maior número de parceiros sexuais, ocorrendo o aumento do risco a cada novo parceiro.

Geralmente, a iniciação sexual nos adolescentes ocorre entre 14 a 19 anos, porém um padrão vem sendo notado nos últimos anos, a redução da idade, especialmente para os adolescentes do sexo masculino25. No entanto, quanto mais precoce ocorrer a primeira relação sexual, o uso inconsistente do preservativo é maior gerando uma atitude menos positiva em relação ao seu emprego e a capacidade de recusar sexo inseguro e de se comunicar sobre o uso do preservativo com seus parceiros25.

A média da idade dos adolescentes na primeira relação sexual neste estudo foi de 14,70 ± 1,82 anos, com as meninas apresentando idade superior aos meninos. Valores distintos são observados na literatura em relação a essa variável, sendo constatado em países como a Etiópia médias superiores de 17,07 anos16 e 16,8 anos26. No Brasil, observam-se resultados próximos ao nosso, apresentando médias de 13,9 anos15, 14,5 anos26 e 15,714 com os meninos apresentando iniciação sexual mais precoce em até seis meses quando comparado as meninas15.

Quanto a idade do parceiro na primeira relação sexual, observou-se média de 17,70 ± 4,62 anos, sendo verificado maior diferença de idade entre as meninas. A maioria dos parceiros apresentou experiência sexual prévia, no entanto, foi maior a prevalência de meninos tendo sua primeira relação sexual com parceiras sem experiência anterior do que de meninas. Esses resultados ilustram a realidade brasileira e reforçam o padrão das meninas se envolverem com parceiros mais velhos e experientes11,14.

Maior parcela dos adolescentes respondeu que o relacionamento com o parceiro na primeira relação sexual era estável, seja com namorado, noivo ou companheiro, porém, essa condição foi mais evidente nas meninas do que nos meninos, demonstrando que a primeira vez das meninas normalmente acontece com uma pessoa com quem se tenha vínculo afetivo11. Reforçando esse perfil, bem como a diferença entre os sexos, maior percentual de meninas referiu que o motivo da primeira relação sexual foi em razão da paixão e amor, enquanto para os meninos foi à curiosidade e atração física. E, apesar de ambos os sexos relatarem sensações diversas, nas meninas os sentimentos estavam mais relacionados ao medo e nervosismo, enquanto nos meninos, a excitação e prazer.

A relação sexual pode possui diferentes significados entre os sexos, uma vez que as meninas possuem uma relação com romantismo e sentimentalidade demonstrando paixão e/ou amor, ou seja, para elas deve existir um vínculo com o parceiro, que faz com que sentimentos de medo e nervosismo surjam relacionados à expectativa do momento, diferente dos meninos que se relacionam a partir do instintivo, não havendo necessidade do vínculo11. Normalmente, os pares são as pessoas nas quais os adolescentes se sentem mais confortáveis para falarem de sua sexualidade27, fato também observado no nosso estudo, no entanto, para as meninas a mãe também exerceu esse papel.

Assim como encontrado por outros autores6,21, no nosso estudo o método de barreira também foi o mais utilizado pelos adolescentes, tanto na primeira quanto na última relação sexual, seguido dos métodos hormonais. Constatou-se maior prevalência de métodos de barreira entre os meninos na primeira e última relação sexual do que quando comparados às meninas, apesar disso, as meninas apresentaram maior percentual em usar métodos contraceptivos.

Contudo, evidenciou-se um modelo preocupante, a diminuição no uso de métodos contraceptivos na última relação sexual. Acredita-se que essa redução se deva ao fato do casal com o passar do tempo começar a sentir confiança mútua e estabilidade na relação amorosa deixando de lado o uso dos métodos contraceptivos, sobretudo de barreiras. O inverso ocorreu com os métodos hormonais, sendo maior seu uso na última relação sexual, condição que pode ser esclarecida em razão das meninas estarem mais preocupadas com a gravidez. Outro ponto que pode ser associado são os fatores sociais, que muitas vezes geram a subordinação da mulher as atitudes masculinas de desaprovação ao uso do preservativo, assim, elas não conseguem exercer o poder na negociação e acabam realizando o ato sexual sem proteção, aumentando o risco de aquisição das DST/AIDS, gravidez na adolescência e abortos provocados21.

Dentre os adolescentes que responderam não ter vida sexual, constatou-se que para as meninas questões como querer casar virgem e ser muito nova contribuíram para a não ocorrência da relação sexual, enquanto para os meninos foi não ter encontrado a pessoa certa ou não ter tido oportunidade. Assim, mais uma vez fica evidente a influência dos valores sociais machistas, no qual a iniciação das atividades sexuais nos meninos é mais aceita6,11.

Algumas limitações devem ser feitas em relação ao presente estudo, como a amostra específica de uma região do Brasil, não podendo deduzir que as conclusões encontradas sejam aplicáveis em outras regiões brasileiras ou mesmo mundialmente; todas as respostas foram baseadas no autorrelato dos adolescentes por meio de questionários autoaplicáveis, o que poderia ocasionar um viés de memória, fragilidade essa intrínseca de estudos transversais retrospectivos28. Também se devem considerar as dificuldades inerentes de se trabalhar com o público de adolescentes, uma vez que as meninas tendem a subestimar as experiências sexuais, enquanto os meninos tendem a superestimá-los11.

Concluindo, os resultados evidenciaram que a maioria dos adolescentes já havia iniciado a vida sexual, com maior prevalência no sexo masculino. Em relação as práticas e condutas sexuais foi verificado que na maioria das condições analisadas foi observado valores distintos entre os sexos, com maior liberdade e permissividade no sexo masculino.

Desse modo, esses aspectos do comportamento sexual dos adolescentes trazem importantes contribuições para saúde pública e devem ser considerados tanto na assistência quanto na promoção da saúde sexual e reprodutiva. Neste contexto, os programas de saúde sexual e reprodutiva voltados para o público jovem exigem um novo olhar, ampliando o foco de propostas generalistas para condutas distintas para homens e mulheres em relação ao vínculo com o parceiro, início da atividade sexual e emprego de métodos contraceptivos9, uma vez que essas práticas irão influenciar diretamente na efetividade de condutas e comportamentos sexuais seguros.

E embora, se tenha na literatura outros estudos que tenham abordados aspectos semelhantes ao nosso, a maioria é realizada com população do Sudeste. Assim, acredita-se que o nosso estudo possa ter contribuído para avaliação de um perfil de condutas sexuais de uma parcela distinta de adolescentes. Uma vez que a região Nordeste pode apresentar especificidades em relação a aspectos culturais, econômicos e de valores que irão influenciar nas práticas e comportamentos desse grupo.

Diante das condições evidenciadas, observa-se que as atitudes dos adolescentes são construídas a partir do comparativo do que é tradicional e do que é moderno nas relações humanas, diante do processo de individualização11. Pode-se inferir com os nossos resultados que mesmo com o passar dos tempos e com mudanças na sociedade em relação aos papéis de homens e mulheres, que ainda há distinção entre os sexos no comportamento sexual dos adolescentes. Avaliar o comportamento e práticas sexuais entre adolescentes é uma condição complexa, em razão das distintas concepções existentes, podendo-se concluir que ainda é grande a influência sociocultural nas condutas e práticas adotadas.

 

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Endereço para correspondência:
carolina.pitangui@upe.br

Manuscript received: 25 January 2017
Manuscript accepted: 12 May 2017
Version of record online: 06 September 2017

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