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Journal of Human Growth and Development

versão impressa ISSN 0104-1282versão On-line ISSN 2175-3598

J. Hum. Growth Dev. vol.29 no.3 São Paulo set./dez. 2019

http://dx.doi.org/10.7322/jhgd.v29.9522 

EDITORIAL

 

Imunoprevenção: um percurso de décadas e o desafio no enfrentamento às falsas informações

 

 

Cristina Ribeiro Macedo

Professora da Escola de Ciências da Escola Superior de Saúde da Santa Casa de Misericórdia de Vitória - EMESCAM. Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Espírito Santo

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RESUMO

Apesar da estruturação crescente do Programa Nacional de Imunização, foi possível testemunhar o ressurgimento de doenças imunopreviníveis que supostamente estariam controladas. Tal fenômeno motiva a inquietação e a discussão no âmbito da saúde coletiva, instigando a comunidade acadêmica e científica a buscarem respostas, pois claramente existem fatores interferindo na qualidade do produto final pretendido, que se trata da proteção imunogênica das populações. Nesse percurso, foi evidenciado que a mídia tem favorecido a circulação de informações dúbias e falsamente articuladas, provocando na população um temor que dificulta a adesão ao recebimento das vacinas; atitudes sedimentadas, em muitos casos, em conceitos, valores, convicções filosóficas e religiosas que dificultam a comunicação efetiva dos profissionais de saúde e a população elegível ao recebimento do imunobiológico.No cenário apresentado, onde falsas notícias podem provocar agravos à saúde, destaca-se a importância das informações científicas. Publicações falsas foram determinantes para a expansão mundial do movimento anti-vacina. Indicadores de morbidade e mortalidade são importantes no delineamento de prioridade de enfrentamento no âmbito da saúde, mas entender os fenômenos que permeiam a tomada de decisão das populações é de suma importância para o delineamento de estratégias, as metodologias de pesquisas se complementam na medida que proporcionam um olhar diferenciado para a mesma discussão, não basta quantificar o problema, igualmente se faz necessário buscar as mudanças sociais que ocorrem no grupo e determinar a diversificação dos comportamento na sociedade, metodologias de pesquisas mistas muitas vezes propões resultados que ampliam o entendimento. Ressalta-se que prover informações falsas implica na desconstrução da ciência, considerando que as informações científicas subsidiam decisões que envolvem a saúde da população nos diferentes contextos e respaldam a elaboração de políticas públicas de saúde.

Palavras-chave: imunização, vacinas, pesquisas.


 

 

A história da humanidade ao longo dos milênios foi permeada por episódios que se relacionaram com doenças infecciosas, não raro, assolando comunidades, alterando padrões de comportamento, determinando o insulamento de populações, como ocorreu com as epidemias da febre amarela que representaram alta mortalidade no século XVIII no oeste da África, Caribe, América Central e Europa, no decurso da história o fenômeno se repetiu com considerável sazonalidade1,2, naquele momento a vulnerabilidade dos povos consistia na falta de ferramentas para o enfrentamento das graves epidemias1.

Na história recente do Brasil, foi observado o pânico provocado pelo ressurgimento de doenças imunopreveníveis como sarampo, febre amarela e caxumba, seguido pelo temor das autoridades sanitárias em vivenciar situações de difícil controle.Corroborando com essa possibilidade e atendendo a expectativa da Organização Mundial de Saúde (OMS),houve aumento dos casos de sarampo no ano de 2019 em torno de 300%3.

Na sociedade contemporânea, vislumbrou-se um grande avanço tecnológico com larga abrangência, impactando de maneira positiva na qualidade de vida das pessoas, tal tecnologia se expandiu até a indústria farmacêutica propiciando a produção de imunobiológicos com crescente propriedade imunogênica, particularmente, a biotecnologia provocou uma importante mudança de paradigma no desenvolvimento de vacinas representado por utilização de diferentes antígenos, novos adjuvantes, vetores e melhoria na logística de distribuição4.

Apesar da estruturação crescente do Programa Nacional de Imunização (PNI), foi possível testemunhar o ressurgimento de doenças imunopreveníveis que supostamente estariam controladas, tal fenômeno motiva a inquietação e a discussão no âmbito da saúde coletiva, instigando a comunidade acadêmica e científica a buscar respostas, pois claramente existem fatores interferindo na qualidade do produto final pretendido, que se refere da proteção imunogênica das populações5-7.

Nesse percurso, foi evidenciado que a mídia tem favorecido a circulação de informações dúbias e falsamente articuladas, provocando na população um temor que dificulta a adesão ao recebimento das vacinas, são atitudes sedimentadas, em muitos casos, em conceitos, valores, convicções filosóficas e religiosas que dificultam a comunicação efetiva dos profissionais de saúde e a população elegível ao recebimento do imunibiológico8,9.

A partir da década de 1970, surgiu o movimento anti-vacinação na Europa e nos Estados Unidos, intensificando em 1982, com o documentário intitulado "DPT: Vaccine Roulette" associando a vacina tríplice bacteriana a inflamações crônicas cerebrais. Posteriormente, em 1998 o britâncio Andrew Wakefield, publicou um artigo afirmando que crianças diagnosticadas com autismos apresentaram os sintomas duas semanas após receberem a vacina tríplice viral, essa publicação foi anulada por falta de comprovação científica. Notícias falsas foram determinantes para a expansão mundial do movimento anti-vacina, que se apresenta sob a argumentação dos pais de que não vacinar traduz o cuidado com a prole, conferindo proteção a iatrogenias, argumentos que se contrapõe ao referencial teórico que respalda as ações do PNI9-12.

Nesse contexto a interlocução entre a comunidade científica e as instituições de saúde tem sido essencial no desvelamento do cenário nacional perpassando o problema das doenças imunopreveníveis, estudos epidemiológicos dimensionam, ao longo das décadas o comportamento dos agravos a saúde, na medida que estudam quantitativamente o fenômeno saúde e doença nas populações, através de medidas de associação13,14.

Os ensaios clínicos, devidamente monitorados pela Agência Nacional de Vigilância (ANVISA), se mostram essenciais na produção das vacinas. Estimativas recentes indicam que no mundo ocorram 390 milhões de infecções por dengue por ano, sendo que 96 milhões são infecções sintomáticas de qualquer gravidade. O objetivo da Organização Mundial de Saúde (OMS) é reduzir esse quantitativo em 50%, atualmente existe apenas de uma formulação disponível no Brasil da vacina da dengue desenvolvida pela Sanofi Pasteur, algumas outras encontra-se em vários estágios de desenvolvimento, portanto, a produção do conhecimento deve ser um processo contínuo que irá corroborar com a melhoria da qualidade de vida da população15.

Indicadores de morbidade e mortalidade são importantes no delineamento de prioridade de enfrentamento no âmbito da saúde, mas entender os fenômenos que permeiam a tomada de decisão das populações é de suma importância para o delineamento de estratégias, as metodologias de pesquisas se complementam na medida que proporcionam um olhar diferenciado para a mesma discussão, não basta quantificar o problema, igualmente se faz necessário buscar as mudanças sociais que ocorrem no grupo e determinar a diversificação dos comportamento na sociedade, metodologias de pesquisas mistas muitas vezes propões resultados que ampliam o entendimento15.

No cenário apresentado, onde falsas notícias podem provocar agravos à saúde, destaca-se a importância das informações científicas. Estas são divulgadas em periódicos como o Journal of Human Growth and Development que todo ano aborda temáticas importantes em práticas baseadas em evidências. Nessa última edição traz assuntos como atenção à saúde da criança no contexto social e institucional16-26, agravos de saúde associados aos ciclos de vida27-29, métodos de pesquisa30 e outros.

Ressalta-se que prover informações falsas implica na desconstrução da ciência, considerando que as informações científicas subsidiam decisões que envolvem a saúde da população nos diferentes contextos, e respaldam a elaboração de políticas públicas de saúde.

 

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Endereço para correspondência:
cristina.ribeiro@emescam.br

Manuscrito recebido: Janeiro 2019
Manuscrito aceito: Abril 2019
Versão online: Abril 2019

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