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Journal of Human Growth and Development

versão impressa ISSN 0104-1282versão On-line ISSN 2175-3598

J. Hum. Growth Dev. vol.30 no.1 São Paulo jan./abr. 2020

http://dx.doi.org/10.7322/jhgd.v30.9960 

ARTIGO ORIGINAL
http://doi.org/10.7322/jhgd.v30.9960

 

Avaliação do crescimento e do estado nutricional de crianças em idade escolar em Escolas Públicas de Florianópolis, Santa Catarina, Brasil

 

 

Cícero Cruz MacêdoI,II; Claudio LeoneIII; Viviane Gabriela NascimentoIII; José Lucas Souza RamosIV; Jane Laner CardosoV; Debora A. Zambrano OleaV; Italla Maria Pinheiro BezerraII,VI,VII; Luiz Carlos de AbreuII,VII

IUniversidade Federal do Cariri, UFCA, Barbalha, CE, Brasil
IIPós-graduação, Pesquisa e Inovação, Centro Universitário Saúde ABC (CUSABC). ciceropediatra@hotmail.com
IIIDepartamento de Saúde Materno Infantil da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. São Paulo (SP), Brasil. leone.claudio@gmail.com;
IVLaboratório de Escrita Científica. Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória (EMESCAM) - Vitória (ES), Brasil; joselucas@usp.br;
VDepartamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) - Florianópolis (SC), Brasil. jane.laner@hotmail.com;
VIBolsista CAPES Brasil
VIIPrograma de Pós-graduação em Políticas Públicas e Desenvolvimento Local, Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória (EMESCAM) - Vitória, (ES), Brasil; italla.bezerra@emescam.br

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

INTRODUÇÃO: A obesidade vem se tornando cada vez mais frequente em crianças, o que pode resultar em agravos à saúde tanto na infância quanto na idade adulta. Considerando que, na idade escolar, os hábitos alimentares podem sofrer influência do contexto em que a criança está inserida, principalmente, estilo de vida, dentro e fora do ambiente escolar, torna-se importante avaliar o crescimento alcançado em estatura, bem como o seu estado nutricional, visto que este pode ser um indicativo de futuros e possíveis distúrbios nutricionais, permitindo direcionar recursos e políticas públicas efetivas nessa faixa etária
OBJETIVO: Avaliar o crescimento em estatura e o estado nutricional de crianças em idade escolar em função do sexo e idade em Florianópolis no primeiro semestre do ano letivo de 2012
MÉTODO: Estudo de corte transversal, realizado com 595 crianças de seis a dez anos de idade, frequentadoras de Escolas Públicas Municipais de Ensino Fundamental I, na cidade de Florianópolis, Estado de Santa Catarina, Brasil. Utilizou-se um questionário para coleta de dados. Os dados foram digitados e armazenados em planilhas, utilizando o programa Microsoft Excel 2007. A análise estatística dos dados foi realizada com o Statistical Package for the Social Science (SPSS), versão 20.0. O peso e a altura foram inicialmente comparados à curva normal, aplicando-se o teste de distância Kolmogorov-Smirnov. Foram utilizados estatística descritiva e o teste de correlação de Pearson
RESULTADOS: Evidenciou-se uma proporção maior de crianças entre os sete e nove anos de idade, e tanto em relação à estatura quanto ao IMC, as medianas estão superiores quando comparadas ao do referencial (Organização Mundial de Saúde), revelando que as crianças estão crescendo bem, inclusive acima da média do referencial, mas que ao mesmo tempo apresentam um IMC acima do esperado, mesmo considerando a elevada estatura. O diagnóstico do estado nutricional entre os meninos e meninas não apresentaram diferenças estatísticas. Contudo, vale destacar que, embora a maior prevalência seja de crianças eutróficas (70,3%), pode-se observar alta prevalência de excesso de peso (sobrepeso, obesidade e obesidade grave), em torno de 28% da amostra
CONCLUSÃO: Embora com prevalência do estado nutricional normal, identificou- se o sobrepeso e a obesidade. Evidenciou-se que o estado nutricional não tem diferença em função do sexo, contudo é influenciado pela idade e estatura

Palavras-chave: estado nutricional, pré-escolares, idade, sexo, Índice de Massa Corporal.


 

 

Síntese dos autores

Por que este estudo foi feito?

O período de crescimento da idade infantil para a adolescência é fundamental para o desenvolvimento do ser humano e de suas funções fisiológicas futuras. Desta forma, acompanhar o estado nutricional nesta etapa é fundamental para se tomarem medidas preventivas e efetivas de saúde pública a fim de se evitar práticas não promotoras de saúde nesta população, sendo esta a justificativa para a realização do estudo.

O que os pesquisadores fizeram e encontraram?

Foi realizado um estudo de coorte transversal em escolas públicas de Santa Catarina e identificou-se que a até então transição nutricional do estado de desnutrição para a eutrofia, está apontando-se para o sobrepeso e a obesidade.

O que essas descobertas significam?

Os resultados implicam na necessidade de reorientação de práticas que promovam hábitos saudáveis neste público a fim de evitar possíveis complicações futuras.

 

INTRODUÇÃO

A obesidade vem se tornando cada vez mais frequente em crianças, o que pode resultar em agravos à saúde tanto na infância quanto na idade adulta1. O escolar encontra-se em processo de transição, em que está constantemente sendo submetido a alterações biopsicossociais que podem levar à maior necessidade nutricional e maior interesse também, por diferentes alimentos, que nem sempre são considerados saudáveis. Existe ainda a influência do hábito alimentar dos pais, familiares e amigos, levando, muitas vezes, a mudanças de comportamento, implicando diretamente no estado nutricional2,3.

Em crianças na fase escolar, ou seja, de 6 a 10 anos de idade, pode-se considerar que o sobrepeso é alteração nutricional em ascensão. Nas últimas duas décadas, inquéritos nacionais demonstram que houve um aumento na prevalência de sobrepeso de 4,9% para 17,4% entre crianças nessa faixa etária4. De acordo com dados do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN), sobrepeso/obesidade correspondem a uma prevalência de 13,1% e o risco de sobrepeso de 16,9%, enquanto que magreza e magreza acentuada equivalem a aproximadamente 4,5%5,6.

As ocorrências do sobrepeso e da obesidade aumentam de forma alarmante. A prevalência de obesidade entre os escolares encontra-se em constante crescimento, independentemente da classe social em que o escolar está inserido7. Em alguns estados e municípios brasileiros, essa prevalência chega a ultrapassar as prevalências americanas, como nos Estados de São Paulo e Rio Grande do Sul, visto que são regiões com maior desenvolvimento, sendo, atualmente, problema de saúde pública que requer maior atenção8,9.

Considerando que, na idade escolar, os hábitos alimentares podem sofrer influência do contexto em que a criança está inserida, principalmente, estilo de vida, dentro e fora do ambiente escolar, torna-se importante avaliar o crescimento alcançado em estatura, bem como o seu estado nutricional, visto que este pode ser um indicativo de futuros e possíveis distúrbios nutricionais, permitindo direcionar recursos e políticas públicas efetivas nessa faixa etária. Sendo assim, o objetivo deste estudo é avaliar o crescimento em estatura e o estado nutricional de crianças em idade escolar em função do sexo e idade em Florianópolis no primeiro semestre do ano letivo de 2012.

 

MÉTODO

Estudo de corte transversal, realizado com crianças de 6 a 10 anos de idade, frequentadoras de Escolas Públicas Municipais de Ensino Fundamental I, na cidade de Florianópolis, Estado de Santa Catarina, Brasil.

Com base na relação das Escolas Públicas do Município, foi feito um sorteio probabilístico e aleatório por conglomerados, tendo, como unidade amostral, as classes de alunos em idade escolar, até que se completasse o lote amostral necessário.

Para o cálculo da amostra, foi considerado um alfa de 0,05 e um poder de teste de 0,80, definindo, como efeito mínimo a ser detectado, uma diferença de ¼ de desvio padrão entre os escores z de Índice de Massa Corpórea (zIMC) de crianças de ambos os sexos, partindo do pressuposto, que a média de zIMC entre os escolares, sem discriminação por sexo, encontra-se ao redor de 0,6 e que o seu desvio padrão corresponde a um valor ao redor de 1,110.

Portanto, o valor inicial estimado para amostra foi de 278 crianças de cada sexo, ou seja, 556 crianças no total, que acrescido de 10% por eventuais perdas, acabou resultando em tamanho inicial de amostra de aproximadamente 610 crianças. A amostra final do estudo foi de 595 crianças.

Os valores mensurados de peso e estatura foram transformados em escore z com base nos valores do referencial da Organização Mundial da Saúde11, sendo utilizados, em escores z, o peso (zP); a estatura (zE) e; o Índice de Massa Corpórea (zIMC).

Para diagnóstico do estado nutricional dos escolares utilizou-se o parâmetro de zIMC, segundo o referencial das curvas da OMS para crianças com 5 anos e mais, segundo proposto pelo Ministério da Saúde e Organização Mundial de Saúde: magreza acentuada, medidas menores que -3 escores z; magreza, medidas iguais ou maiores que -3 escore z e menores que -2 escores z; eutrofia, maiores ou iguais a -2 e menor que +1 escores z; sobrepeso, medidas iguais ou maiores que +1 e menores que +2 escores z; obesidade medidas iguais ou maiores que +2 e menores que +3 escores z, obesidade grave quando a criança apresentava zIMC igual ou maior que +3 escores z12,13.

Os dados foram digitados e armazenados em planilhas, utilizando o programa Microsoft Excel 2007. A qualidade da digitação das medidas antropométricas foi verificada a partir de gráficos de dispersão, e crianças com valores muito discrepantes, os dados digitados foram revisados nas planilhas originais. A fim de estabelecer prevalências de estado nutricional, foram utilizados proporções de frequência e os respectivos intervalos de confiança de 95%, de acordo com os pontos de corte empregados. Para verificar eventuais diferenças nas prevalências dos estratos considerados, aplicou-se o teste de significância para comparações de múltiplas proporções, mediante o teste não paramétrico do qui-quadrado.

A análise estatística dos dados foi realizada com o Statistical Package for the Social Science (SPSS), versão 20.0. Os dados antropométricos foram inicialmente comparados à curva normal, aplicando-se o teste de distância Kolmogorov-Smirnov. Foram utilizados estatística descritiva e o teste de correlação de Pearson.

A realização deste estudo obedece aos princípios éticos para pesquisas com seres humanos, conforme resolução CNS 466/12, foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, conforme documento CONEP n° 466/12 aprovado em 15 de fevereiro de 2012.

 

RESULTADOS

Participaram deste estudo 595 crianças, sendo que 51,8% (595/308) eram do sexo masculino com média de idade de 8,0 anos e desvio padrão de 1,24, independente do sexo. Ao comparar meninos e meninas, não houve diferença significante em relação à idade (p=0,8153) (Tabela 1).

A Tabela 1 mostra que o número absoluto de criança com excesso de peso (sobrepeso+obesidade+obesidade grave) nos meninos foi de 87/308 e nas meninas 75/287, essa diferença não foi estatisticamente significante (p=0,8030) (Tabela 2).

O coeficiente de correlação apresentado na Tabela 2 mostra que, com exceção da variável idade e zIMC para meninas e para o grupo como um todo, as demais variáveis são estatisticamente significantes.

A figura 1 mostra que mais de 50% das crianças estudadas têm idade entre 7 e 9 anos incompletos.

A média de estatura dos escolares foi de 0,44 (+-1,11), sendo que o das meninas foi de 0,38 (+- 1,11) e dos meninos 0,50 (+- 1,10) (p=0,2205 ns). A comparação da mediana do grupo como um todo com o valor do referencial foi estatisticamente significante (p<0,0001) (Figura 2).

A média de escore zIMC foi de 0,46 (+-1,25), sendo que o das meninas foi de 0,40 (+- 1,13) e dos meninos 0,51 (+- 1,34) (p=0,2700 ns). A comparação da mediana do grupo como um todo com o valor do referencial foi estatisticamente significante (p<0,0001) (Figura 3).

 

DISCUSSÃO

As figuras 1, 2 e 3 apresentam as informações relativas às medidas de idade, estatura e Índice de Massa Corpórea (IMC), caracterizando a amostra estudada, mostrando uma proporção maior de crianças entre os 7 e 9 anos de idade, e tanto em relação à estatura quanto ao IMC, as medianas estão superiores quando comparadas ao do referencial (Organização Mundial de Saúde)11, revelando que as crianças estão crescendo bem, inclusive acima da média do referencial, mas que, ao mesmo tempo, apresentam um IMC acima do esperado, mesmo considerando a elevada estatura.

O diagnóstico do estado nutricional entre os meninos e meninas não apresentou diferenças estatísticas (p=0,8030). Contudo, vale destacar que, embora a maior prevalência seja de crianças eutróficas (70,3%), pode-se observar alta prevalência de excesso de peso (sobrepeso, obesidade e obesidade grave), em torno de 28% da amostra. Diversos estudos corroboram com este3,8,14,15, indicando principalmente o número maior de escolares com IMC adequado, porém, Nobre et al.16 demonstram que a maioria de sua amostra apresentou estado nutricional adequado para idade, entretanto, vem a divergir quando relata que o estado de magreza ou magreza acentuada foi maior do que os estados de sobrepeso e obesidade.

Em Florianópolis, a transição nutricional, já descrita em pesquisa realizada em 2002 por Soar et al.17, evidencia prevalências de sobrepeso e obesidade de 17,9% e 6,7%, respectivamente, em escolares de escolas públicas. Na última Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar - PeNSE 2012 -, realizada com alunos do 9º ano do Ensino Fundamental, nas capitais brasileiras, Florianópolis é o segundo local do País, em que a maior parcela dos escolares se percebiam gordos ou muito gordos (21,9%), sendo que, na pesquisa de 2009, os percentuais já eram semelhantes18.

Na cidade de Niterói, Rio de Janeiro, Brasil, pesquisa realizada com amostra de 328 escolares demonstra que a grande parte apresenta sobrepeso e obesidade, relacionando esse resultado principalmente ao tempo de tela (tempo exposto a diversas formas de vídeo, televisão, computador, video-game)3.

Entre a idade das crianças estudadas e o escore z de estatura existe diferença significativa (p=0,004), revelando que crianças mais velhas são proporcionalmente mais baixas. Ao serem comparadas por sexos, as diferenças estatísticas também foram significativas, apresentando correlação mais forte para os meninos. (p<0,0001).

A estatura pode ser considerada um fator de risco para o excesso de peso, uma vez que as crianças mais altas são também as que apresentam maior IMC. Quando comparadas por sexo, quanto mais alto o menino maior o IMC, assim como nas meninas, embora essa correlação seja mais forte para o sexo masculino, resultados convergentes com estudos que realizaram este comparativo entre sexos, identificando que o valor de IMC é equivalente a altura de cada criança, sem diferir entre os sexos, resultado convergente com o presente estudo19,20.

Diversos estudos têm demonstrado que a estatura é fator de risco e que o IMC, associado à estatura, pode ser um bom indicador antropométrico para a saúde de crianças e adolescentes. É importante também considerar-se que existem modificações normais na composição corporal durante o processo de desenvolvimento, o que tende a alterar os pontos de corte para algumas das medidas antropométricas9,19,20.

Os dados mostram não haver diferenças estatísticas entre a idade e o IMC das crianças (p=0,1594), no entanto, quando comparadas por sexo, observa-se uma diferença significativa nas meninas (p=0,0418), revelando que elas, com o passar da idade, tendem a ter IMC maior do que os meninos.

Tal acontecimento pode estar relacionado a uma maior carga hormonal presente nas meninas do que nos meninos no período de puberdade, principalmente para o estímulo da menstruação, formação dos órgãos femininos, bem como da maturação sexual19.

Diversos estudos vêm a concordar com essa análise, indicando que a média de IMC, a partir dos dez anos de idade, é substancialmente maior em meninas comparadas ao seu sexo oposto, confirmando a tendência nutricional apontada no estudo20,21.

As curvas da OMS são atualmente preconizadas pelo Ministério da Saúde para avaliar o crescimento infantil, já fazendo parte inclusive da caderneta da criança na atenção básica à saúde de Florianópolis.

Esse crescimento elevado de estatura e IMC podem acontecer por uma transição nutricional, em que as crianças de novas gerações tendem a crescer de forma mais elevada devido às constantes adaptações a que o ser humano vem sendo submetido nos últimos anos, entre elas, a nutrição22.

A urbanização pode ser um fator contribuinte para o crescimento rápido em termos de IMC, uma vez que nos últimos anos acentuou-se até mesmo em pequenos centros, refletindo no acesso à área alimentícia, ao propiciar a substituição dos alimentos saudáveis, gerando um desequilíbrio no consumo energético e prevalência dos índices de sobrepeso e/ou obesidade4,23,24.

Porém, apesar desse crescimento, dentre os países do sul da América, o Brasil está entre os que mais diversificam sua alimentação, bem como se posicionando entre aqueles que mais se preocupam com o bem-estar fisiológico24.

Esse crescimento acelerado se dá, principalmente, pelas condições de saúde nos dois primeiros anos de vida da criança, classificando esse período como primordial para o crescimento saudável dela, enfatizando o elevado número de recém-nascidos com peso acima do considerado normal. Além disso, a duração do aleitamento materno bem como a alimentação complementar são considerados essenciais e podem interferir diretamente no crescimento, refletindo no IMC em idades futuras14.

Observa-se que as causas do aumento da obesidade ainda não estão suficientemente esclarecidas. Uma hipótese é a possibilidade de apresentarem-se grupos geneticamente mais suscetíveis à obesidade, por transição nutricional, que, de certa forma, associados a determinados fatores ambientais, como a urbanização, potencializariam esse evento.

Em outra lógica de raciocínio, o consumo versus o gasto calórico, o comportamento em termos de padrões de atividade física da população ainda não é bastante conhecido, principalmente em relação aos determinantes do equilíbrio energético.

No Brasil, a permanência dos alunos nas escolas públicas de tempo integral nem sempre está associada a práticas que demandam atividades de gasto energético. O que, de certa forma, poderia explicar uma associação com a ascensão da obesidade.

Também parece bastante provável que, nos últimos tempos, a redução de atividade física, associada ao lazer, na população seja um dos determinantes do perfil nutricional, que tenha implicado um maior IMC em crianças e adolescentes. É possível que as dificuldades na comprovação dos determinantes da obesidade devam-se, em parte, à variabilidade do gasto energético individual, e à forma de se avaliar a relação entre o consumo alimentar e a obesidade e a associação ou não com a atividade física.

Ressalta-se também que, no contexto escolar, hábitos alimentares, gostos e aversões que podem ser estabelecidos durante essa fase, formam a base para toda a vida. A criança já tem mais interesse pelos alimentos e suas necessidades nutricionais são maiores, assim como, está predisposta a mudanças de comportamento, dada sua inserção nesse ambiente, podendo, assim, implicar alterações no estado nutricional, seja de forma positiva ou negativa2,3.

Contudo, o ambiente escolar é propício para o estímulo a hábitos saudáveis de vida, uma vez que as crianças passam grande parte de seu tempo nesse local, o qual passa a ser importante para a implementação de políticas de saúde como a prevenção da obesidade e a redução do excesso de peso. Além disso, possui ferramentas pedagógicas que podem permitir a inserção dessas temáticas no currículo, exercendo desse modo, influência direta no desenvolvimento infantil, contribuindo para que ocorram mudanças nos hábitos alimentares das famílias e até na comunidade escolar25.

Ações voltadas para prevenção e controle da obesidade são as mais importantes como primeiros passos em uma política de alimentação que pretende ser eficiente. A obesidade precisa e deve ser encarada como um evento de controle prioritário.

A escola é um lugar que, embora já seja inserida como cenário para implantação de ações de saúde, ainda precisa ser mais bem aproveitada. É necessário que os profissionais de saúde comecem a compor parcerias com as instituições e organismos educacionais, para que possam incluir, nos currículos, ações de promoção da Alimentação Adequada e Peso Saudável, conhecimento de incentivo a hábitos de vida e alimentação saudável e atividades de promoção da saúde.

É necessário também que os serviços de saúde comecem a se organizar para implantar propostas e estratégias de atenção primária para a prevenção da obesidade.

Com o avanço da tecnologia e do processo de globalização que envolve a mudança da educação e cultura familiar, adquirindo espaço para o entretenimento em tempos de tela, o estado nutricional, principalmente de crianças, tende a diferir, levando ao sedentarismo, pois estas são os que passam mais tempo em seus lares, influindo diretamente nos índices de seus estados nutricionais26.

O fácil acesso aos alimentos de alta densidade energética, a diminuição de atividade física, a exposição a alimentos processados e de baixo custo que contêm grandes quantidades de gordura, sal e açúcar, embalados ou vendidos em grandes porções, em associação com o sedentarismo, decorrente de um maior acesso aos meios de transporte, e o aumento de atividades de lazer passivas, incluindo a TV e jogos de computador são descritos como motivos para a importante elevação da prevalência da obesidade que está sendo observada desde o século passado como um agravo à saúde da população27-30.

Ainda, considerando que o risco de obesidade é maior para crianças, quando pelo menos um dos pais tem excesso de peso, é concebível imaginar que também, um ambiente familiar mais adequado pode fazer diferença na determinação desse agravo. É inegável a influência parental no consumo de determinados alimentos27-30.

Nesse sentido, visto que o crescimento de crianças com sobrepeso ou obesidade está aumentando de forma significante, tornando-se necessário o incentivo à reeducação alimentar principalmente em escolas, acompanhado por profissionais nutricionistas, visando diminuir esses índices antropométricos, bem como, a correlação deles, de forma preventiva, com doenças crônicas, como a hipertensão e o diabetes31.

É possível que a oferta de alimentos mais saudáveis na alimentação do escolar e nas cantinas, bem como, o reforço em reuniões com pais sobre o assunto, encarando a problemática da obesidade e suas consequências, possam representar uma estratégia importante. Outras estratégias poderão ser discutidas com os pais, tais como, proporcionar mais atividades interativas, evitando-se a ociosidade das crianças, que, na maioria das vezes, está associada ao hábito de assistir a TV, estando expostas à mídia de consumo.

O movimento relacionado a padrões alimentares mais saudáveis em níveis individual e populacional pode ajudar a melhorar os programas de prevenção de sobrepeso e obesidade em crianças e adolescentes31.

O mundo está enfrentando características da doença da era moderna, incluindo a obesidade. Muitas vezes, coexistindo em países com desnutrição em desenvolvimento, a obesidade é uma condição complexa com dimensões sociais e psicológicas graves, que afetam praticamente todas as idades e grupos socioeconômicos32.

Por fim, vários países estão passando por um período de transição epidemiológica, com redução da incidência de doenças infecciosas, mortalidade infantil e taxas de natalidade, associado à alta prevalência de doenças crônicas e aumento da expectativa de vida ao nascer.

 

CONCLUSÃO

Na análise do crescimento em estatura e o estado nutricional de crianças em idade escolar em função do sexo e idade, mostrou presença de sobrepeso e obesidade em escolares, embora o estado nutricional não apresente diferença em função do sexo, porém é influenciado pela idade e pela estatura da criança.

Uma atitude que corroborar para o desenvolvimento de um estado nutricional adequado entre crianças e adolescentes, pode caber ao auxilio dos profissionais atuantes no âmbito escolar (professores, coordenadores, diretores, professores, educadores físicos, entre outros) que nesse caso, podem promover a promoção da alimentação saudável e a realização de atividades físicas dentro e fora da escola.

Também, o acompanhamento criterioso do estado nutricional desses jovens, realizado periodicamente na escola, objetivando o controle do agravamento relacionado a qualquer déficit nutricional, à pré-obesidade ou à obesidade, seriam medidas estratégicas de grande impacto no enfrentamento do problema da prevenção da obesidade infanto-juvenil.

 

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Endereço para correspondência:
italla.bezerra@emescam.br

Manuscrito recebido: Setembro 2019
Manuscrito aceito: Fevereiro 2020
Versão online: Março 2020

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