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Journal of Human Growth and Development

Print version ISSN 0104-1282On-line version ISSN 2175-3598

J. Hum. Growth Dev. vol.30 no.3 São Paulo Sept./Dec. 2020

http://dx.doi.org/10.7322/jhgd.v30.11069 

ARTIGO ORIGINAL

 

Prontidão para a mudança do comportamento alimentar e atividade física entre adolescentes com excesso de peso: impacto no perfil metabólico

 

 

Marciele Alves BologneseI; Danilo Fernandes da SilvaI, II; Josiane Aparecida Alves BianchiniI, III; Rose Mari BenemmammI, IV; Nelson Nardo JuniorI

IUniversidade Estadual de Maringá, Núcleo de Estudos Multiprofissional da Obesidade (NEMO/UEM)/Núcleo de Pesquisa Clínica do Hospital Universitário de Maringá, Maringá, Paraná, Brasil
IISchool of Human Kinetics, Faculty of Health Sciences, University of Ottawa, Ottawa, Ontario, Canada
IIIDepartamento de Educação Física, Faculdade de Filosofia, Ciência e Letras de Mandaguari (FAFIMAN), Mandaguari, Paraná, Brasil
IVDepartamento de Nutrição, Universidade Cesumar (UNICESUMAR), Maringá, Paraná, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

INTRODUÇÃO: A obesidade em crianças e adolescentes geralmente está relacionada com alterações metabólicas, sendo os programas de intervenção uma das estratégias para o tratamento da obesidade e das comorbidades associadas. Ao iniciar a intervenção, os estágios de prontidão para mudança do comportamento indicam hábitos específicos que o adolescente planeja ou não mudar e em quanto tempo ele pretende realizar a mudança
OBJETIVO: Avaliar o perfil metabólico e sua associação com os estágios de prontidão para mudança do comportamento alimentar e atividade física em adolescentes com excesso de peso
MÉTODO: Foram avaliados 83 adolescentes com excesso de peso. Os adolescentes foram avaliados em relação à variáveis antropométricas e perfil metabólico (glicemia, colesterol total, colesterol LDL, HDL, não-HDL, VLDL, triglicerídeos, insulina). Além disso, foram avaliados os estágios de prontidão para mudança do comportamento para os domínios "tamanho e quantidade das porções", "quantidade de gordura na dieta", "consumo de frutas e vegetais" e "prática de atividade física". Foi feita comparação das variáveis antropométricas e perfil metabólico de acordo com os estágios de prontidão
RESULTADOS: Em relação ao domínio "Consumo de Frutas e Vegetais", os adolescentes do grupo Manutenção apresentaram peso menor que os do grupo Ação e Preparação. O grupo Ação apresentou peso maior que o Contemplação, e o grupo Contemplação apresentou colesterol não-HDL maior que os grupos Pré-contemplação e Preparação. No domínio "Prática de Atividade Física", o grupo Manutenção apresentou peso, IMC e gordura corporal (em kg) menores que os grupos Ação, Preparação e Contemplação. A prevalência de alteração do colesterol HDL foi progressivamente menor conforme progrediram os estágios de prontidão para mudança do comportamento para o domínio "prática de atividade física"
CONCLUSÃO: Os estágios de prontidão para mudança do comportamento têm impacto sobre variáveis antropométricas e perfil metabólico de adolescentes com excesso de peso, sendo um instrumento recomendado para o monitoramento de programas de intervenção

Palavras-chave: comportamento do adolescente, hábitos alimentares, obesidade pediátrica, síndrome metabólica.


 

 

Síntese dos autores

Por que este estudo foi feito?

Alterações em parâmetros metabólicos são comumente observadas em adolescentes com excesso de peso ingressando em um programa multiprofissional de tratamento. No entanto, não se sabia se essas alterações metabólicas eram associadas ao estágio de prontidão de mudança do comportamento alimentar e de atividade física. Essa informação tem potencial para auxiliar a equipe multidisciplinar a compreender como a abertura à mudanças pode se associar a um perfil metabólico mais ou menos favorável.

O que os pesquisadores fizeram e encontraram?

Ao ingressaram em um programa multiprofissional de tratamento da obesidade, adolescentes foram avaliados em relação ao seu perfil metabólico (i.e., níveis de glicemia, perfil lipídico e insulina) e o estágio de prontidão para mudanças alimentares (i.e., quantidade de gordura na dieta, consumo de frutas e vegetais e tamanho das porções) e na prática de atividades físicas. Nosso estudo identificou que a frequência de adolescentes com colesterol HDL alterado foi progressivamente menor conforme avançavam os estágios de prontidão para mudança do comportamento para prática de atividade física. Em outras palavras, adolescentes com menor prontidão para aderirem à prática de atividades físicas apresentaram também mais alterações no colesterol HDL.

O que essas descobertas significam?

Os estágios de prontidão para mudança do comportamento são importantes ferramentas de avaliação antes do início de uma intervenção comportamental envolvendo atividades físicas e reeducação alimentar. Adolescentes em estágios de menor prontidão para mudanças precisam receber atenção especial da equipe, pois, além de menor propensão à alterações em seus hábitos, esses adolescentes também apresentam perfil metabólico de maior risco.

 

INTRODUÇÃO

A relação entre alterações metabólicas e obesidade em crianças e adolescentes já foi demonstrada previamente1,2, assim como um perfil pró-inflamatório parece também ser mais comum em crianças e adolescentes com excesso de peso3,4. Vários estudos demonstraram que a prevalência de síndrome metabólica entre uma população de adolescentes obesos (variação entre 10 e 52%) é maior do que na população pediátrica como um todo (variação entre 4 a 10%)5-9.

Entretanto, no cenário clínico/ambulatorial, programas de tratamento do sobrepeso e obesidade se deparam com adolescentes que apresentam diferentes graus de excesso de peso10,11. Os estudos10,12,13 que comparam as alterações em fatores de risco para síndrome metabólica em adolescentes com diferentes graus de excesso de peso (i.e., sobrepeso, obesidade e obesidade grave) são escassos e apresentam resultados conflitantes no sentido de haver ou não aumento das alterações metabólicas10,12,13.

Adicionalmente, não se sabe se ao iniciar um programa de intervenção (ex.: com equipes multiprofissionais) adolescentes que apresentam alterações metabólicas estão em diferentes estágios de prontidão para mudança de comportamentos alimentares.

Os estágios de prontidão para mudança do comportamento ao se iniciar um programa de intervenção fornecem uma informação importante, pois podem contribuir com a equipe de intervenção indicando comportamentos específicos que o adolescente planeja ou não mudar e em quanto tempo ele pretende realizar essa mudança14,15.

Até onde se tem conhecimento, não se sabe especificamente se os estágios de prontidão para mudanças tem relação com o perfil metabólico (ex.: fatores de risco para síndrome metabólica) de adolescentes com excesso de peso ingressantes em um programa multiprofissional de tratamento da obesidade (PMTO).

Assim, o objetivo foi avaliar o perfil metabólico e sua associação com os estágios de prontidão para mudança do comportamento alimentar e atividade física em adolescentes com excesso de peso.

 

MÉTODO

Desenho experimental e sujeitos do estudo

Trata-se de um estudo descritivo, com análise comparativa e associativa e de corte transversal. Foi feita uma divulgação na imprensa local, com o objetivo de selecionar os interessados com idade entre 16 e 18 anos em participar do PMTO. Esse programa de intervenção multiprofissional teve duração de 16 semanas, foi realizado duas vezes no ano e contou com uma equipe multiprofissional composta por profissionais de educação física, nutricionistas, uma psicóloga e um médico pediatra.

O principal objetivo da equipe foi contribuir com mudanças positivas no peso e em variáveis da composição corporal, em médio prazo, a partir do incentivo e prática de atividade física e orientação de hábitos saudáveis relacionados à alimentação, com base na terapia cognitivo comportamental.

Os adolescentes frequentaram o PMTO três vezes na semana, segundas, quartas e sextas das 16h às 18h. Na primeira hora (16h às 17h) das segundas-feiras foram realizadas as intervenções teóricas da educação física. Neste mesmo horário nas quartas-feiras os adolescentes participaram das intervenções da nutrição e nas sextas-feiras das intervenções da psicologia. A segunda hora (17h às 18h) dos três dias da semana foi destinada à intervenção prática da educação física. A descrição completa das intervenções pode ser encontrada em Da Silva et al.16.

Para esse estudo, foram selecionados 83 adolescentes, tendo sido utilizados como critérios de inclusão, apresentar sobrepeso ou obesidade, a partir de pontos de corte do índice de massa corporal (IMC) para a idade e sexo, segundo proposto por Cole e Lobstein17, ser residente em Maringá ou região metropolitana e ter disponibilidade para participar do programa de maneira integral.

Aqueles que não se encaixaram nesses critérios, que relataram estar sob efeito de algum outro tipo de tratamento da obesidade convencional ou não convencional (medicamentoso ou cirúrgico), que apresentaram consumo em longo prazo de álcool, uso de glicocorticoides ou outras drogas que pudessem afetar o apetite foram excluídos.

Aos pais e adolescentes, durante uma reunião realizada no processo de seleção, foi apresentada a proposta do estudo e firmado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade local, com base no documento n° 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), visando o consentimento dos mesmos.

Avaliações

Na semana anterior ao início da intervenção os adolescentes passaram por uma bateria de avaliações no período da tarde, as quais incluíram a medida do peso, altura e Índice de Massa Corporal (IMC). O peso foi medido com os adolescentes portando roupas leves por meio de uma balança da marca Welmy com capacidade para medir até 300 kg e precisão de 0,05 kg. A altura foi medida em um estadiômetro acoplado a parede com capacidade de medir até dois metros e precisão de 0,1 cm. O IMC foi calculado a partir da divisão do peso dos adolescentes pela sua altura ao quadrado.

A gordura corporal (absoluta e relativa) foi avaliada utilizando uma bioimpedância octapolar multifrequencial, da marca InBody, modelo 520. Os sujeitos foram avaliados com roupas leves, sem portarem nenhum objeto metálico, e seguindo como recomendações: jejum de no mínimo 2 horas inclusive de água, urinar cerca de 30 minutos antes da avaliação; abster-se do consumo de bebidas cafeinadas ao longo das últimas 48 horas; evitar esforços físicos vigorosos ao longo das últimas 24 horas, não utilizar diuréticos ao longo dos últimos sete dias; e para o sexo feminino não estar no período menstrual.

O perfil metabólico foi avaliado por meio das análises sanguíneas de glicemia, colesterol total, colesterol LDL, HDL, não-HDL, VLDL, triglicerídeos, insulina feitas por laboratório especializado após 12 horas de jejum no período da manhã (Carlos Chagas, Paraná, Brasil). As variáveis, colesterol total, colesterol LDL, HDL e triglicerídeos foram classificadas em alteradas e não alteradas de acordo com os pontos de corte de Back et al.18, sendo considerada alteração: o colesterol total170 mg/dL, o HDL-c<45 mg/dL, o LDL-c130 mg/dL e os triglicerídeos130 mg/dL. A glicemia 100 mg/dL foi considerada alterada19.

Para a avaliação dos estágios de prontidão para mudança do comportamento alimentar foi aplicado o questionário stage of change (SOC), proposto por Sutton et al.15, validado para o contexto brasileiro por Cattai et al.20, que seguiu rigorosamente a metodologia internacional para tradução e adaptação cultural, com uma amostra de adolescentes obesos. Esses autores concluíram que o instrumento é adequado para a população de adolescentes obesos, visto que apresentou boa confiabilidade e validade interna.

As principais vantagens da utilização desse instrumento é que ele pode ser autoadministrado e contempla os estágios de prontidão para mudança do comportamento, baseado em um conjunto de itens relacionados ao processo de perda de peso15-20.

O instrumento é composto por 38 afirmações distribuídas em quatro domínios denominados: "tamanho e quantidade das porções" (nove afirmações); "quantidade de gordura na dieta" (11 afirmações); "consumo de frutas e vegetais" (nove afirmações); e "prática de atividade física" (nove afirmações). As respostas para cada afirmação variam em uma escala Likert, de 1 a 5, sendo 1 a pré-contemplação, 2 a contemplação, 3 a preparação, 4 a ação e 5 a manutenção.

Para a obtenção dos estágios referentes a cada um dos domínios, foi feito o escore médio para cada um deles. Para fins de análise, foi utilizada a seguinte classificação: 1 a 1,4 - pré-contemplação; 1,5 a 2,4 - contemplação; 2,5 a 3,4 - preparação; 3,5 a 4,4 - ação; 4,5 a 5 - manutenção16,20.

Análise estatística

Os dados foram analisados por meio da estatística descritiva e inferencial, com base na análise de normalidade feita a partir do teste de Shapiro-Wilk. Os dados foram apresentados em mediana (amplitude interquartílica) e a análise de comparação entre os valores numéricos das variáveis metabólicas de acordo com os estágios de prontidão para mudança do comportamento (quatro domínios) foram feitas por meio do teste não-paramétrico de Kruskal-Wallis e o teste de Mann-Whitney quando necessário (como post hoc). Foram também feitas análise de associação a partir do teste de Qui-quadrado. Foi considerado um nível de significância de p<0,05.

 

RESULTADOS

Dos 83 adolescentes ingressantes, três (3,6%) apresentaram dados incompletos e não foram incluídos nas análises. Dos 80 adolescentes analisados, para o domínio "tamanho e quantidade das porções", quatro (5%) adolescentes foram classificados no estágio pré-contemplação, 16 (20%) contemplação, 35 (43,8%) preparação, 21 (26,3%) ação e quatro (5%) manutenção. No domínio "quantidade de gordura na dieta", três (3,8%) apresentaram escore de pré-contemplação, 12 (15%) contemplação, 27 (33,8%) preparação, 30 (37,5%) ação e oito (10%) manutenção.

Já no domínio "consumo de frutas e vegetais", houve dois (2,5%) no estágio pré-contemplação, 13 (16,3%) contemplação, 32 (40%) preparação, 24 (30%) ação e nove (11,3%) manutenção. No domínio "prática de atividade física", um (1,3%) foi classificado no estágio pré-contemplação, 22 (27,5%) contemplação, 38 (47,5%) preparação, 15 (18,8%) ação e quatro (5%) manutenção.

As comparações entre os cinco estágios de prontidão para mudança do comportamento para as variáveis metabólicas estão apresentadas nas Tabelas 1, 2, 3 e 4, de acordo com cada domínio.

Diferenças estatisticamente significativas foram observadas nos domínios "Consumo de Frutas e Vegetais" e "Prática de Atividade Física". Em relação ao domínio "Consumo de Frutas e Vegetais", os adolescentes do grupo Manutenção apresentaram peso menor que os do grupo Ação e Preparação. Além disso, o grupo Ação apresentou peso maior que o Contemplação, e o grupo Contemplação apresentou colesterol não-HDL maior que os grupos Pré-contemplação e Preparação.

No domínio "Prática de Atividade Física", o grupo Manutenção apresentou peso, IMC e gordura corporal (em kg) menores que os grupos Ação, Preparação e Contemplação.

Não houve nenhuma associação entre os estágios de prontidão para mudança do comportamento e a presença de alterações dos parâmetros metabólicos, exceto para a alteração de HDL que foi menor conforme progrediam os estágios de prontidão para mudança do comportamento para o domínio "prática de atividade física" (Pré-contemplação: 100%; Contemplação: 81,8%; Preparação: 60,5%; Ação: 46,7%; Manutenção: 25%) (Figura 1).

 

DISCUSSÃO

Os domínios "tamanho e quantidade das porções" e "quantidade de gordura na dieta" não apresentaram diferenças entre os estágios para nenhuma das variáveis analisadas (i.e., antropométricas ou perfil metabólico), ou seja, o estágio em que o adolescente foi avaliado não teve impacto nessas variáveis. Por outro lado, em relação ao domínio "Consumo de Frutas e Vegetais", os adolescentes do grupo Manutenção apresentaram peso menor que os do grupo Ação e Preparação. Além disso, o grupo Ação apresentou peso maior que o Contemplação, e o grupo Contemplação apresentou colesterol não-HDL maior que os grupos Pré-contemplação e Preparação.

No domínio "Prática de Atividade Física", o grupo Manutenção apresentou peso, IMC e gordura corporal (em kg) menores que os grupos Ação, Preparação e Contemplação. Sendo assim, adolescentes que entraram no PMTO em estágios mais avançados para o consumo de frutas e vegetais e para a prática de atividade física apresentaram valores mais favoráveis, sobretudo os grupos/estágios ação e manutenção. A prevalência de alteração do colesterol HDL foi menor conforme progrediram os estágios de prontidão para mudança do comportamento para o domínio "prática de atividade física".

O fato de ter mais adolescentes, praticamente em todos os domínios do questionário SOC, no estágio preparação é um bom sinal para a equipe de intervenção, pois esse grupo tende a ser mais aberto ao tratamento e, consequentemente, ter mais facilidade em apresentar resultados satisfatórios21,22. Segundo Toral et al.23, muitas pessoas tem uma interpretação errônea sobre a alimentação, acreditando não ser necessária a adesão a hábitos saudáveis, ou então acreditando que eles já são adequados, quando na verdade podem ser prejudiciais a sua saúde.

Este é um dos maiores obstáculos para a obtenção de mudanças na dieta23. Para que ela ocorra, é fundamental o reconhecimento de que essas melhorias são necessárias, não apenas para alimentação, mas também para prática de atividade física24.

Os estágios de prontidão para mudança do comportamento são parte do modelo transteorético, inicialmente proposto como componente de programas para cessação do tabagismo25, contudo, este foi adaptado para avaliação de pacientes que buscam mudanças alimentares23 e na prática de atividades físicas24.

Da Silva et al.16 estudaram o impacto dos estágios de prontidão para mudança do comportamento relacionado à atividade física sobre os efeitos de um PMTO na aptidão física e composição corporal. Foi identificado que adolescentes que iniciaram a intervenção em estágios mais avançados (e.g., manutenção) obtiveram resultados mais expressivos sobre variáveis antropométricas, pressão arterial diastólica, e aptidão cardiorrespiratória. Mas ressaltaram um ponto importante: um programa de intervenção com base na terapia cognitivo comportamental pode promover também melhoras em adolescentes em estágios de prontidão mais precoces (e.g., pré-contemplação ou manutenção)16.

Segundo o modelo transteorético25, indivíduos em estágios mais avançados tendem a apresentar um número maior de atitudes positivas relacionadas à nutrição e atividade física, o que permitirá que eles apresentem melhor status de saúde (neste caso evidenciado pelo melhor controle do colesterol HDL). Esses resultados positivos refletem a inter-relação existente entre os estágios de prontidão para mudanças do comportamento e os processos de mudança (i.e., fatores que facilitam a mudança de comportamento), sobretudo ao maior controle de estímulo26,27, fator este que pode já estar presente antes da intervenção iniciar (antes da avaliação no baseline), o que explicaria os melhores resultados dos estágios mais avançados.

Por outro lado, adolescentes em estágios menos avançados também podem apresentar essa inter-relação entre seus estágios de prontidão (seja por exemplo, pré-contemplação e contemplação) e os processos de mudança, porém em menor grau. Além disso, segundo Prochaska28 e Prochaska e Di Clemente27, as melhoras ao longo da intervenção podem ocorrer especialmente devido ao aumento do conhecimento e capacidade de auto reavaliação que pode ser enfocada ao longo do tratamento pela equipe de Psicologia16.

Do ponto de vista prático, a associação entre o avanço nos estágios de prontidão para mudança do comportamento no domínio "prática de atividade física" com a redução na frequência de colesterol HDL alterado era esperada, tendo em vista o potencial do exercício físico sozinho no controle dessa fração de colesterol29. O estudo de Chen et al.30 não identificou mudanças no colesterol HDL de crianças com excesso de peso e uma das hipóteses para esse resultado é que os níveis de atividade física na amostra já era relativamente alto.

Esse estudo apresenta interessantes achados com potencial aplicação prática, no entanto, há limitações. Não foi estabelecido um cálculo mínimo para o tamanho da amostra, tendo em vista que esse estudo analisou adolescentes ingressantes em um programa de intervenção para o tratamento do sobrepeso/obesidade. Nesse caso é de se esperar um número amostral baixo para os estágios extremos (pré-contemplação e manutenção). Ainda assim, a determinação dos estágios de prontidão para mudança de comportamento e seu impacto em variáveis metabólicas é fundamental para compreender as características iniciais dos adolescentes que procuram esse tipo de serviço.

Desse modo, o estudo traz o aspecto inédito de associar os estágios de prontidão para mudança do comportamento alimentar e de atividade física com o perfil metabólico e observar que mesmo antes de iniciar a intervenção já existe uma relação entre o quão aberto o adolescente está para promover mudanças alimentares e de atividade física e alterações antropométricas e metabólicas. Esses resultados são avanços ao campo de conhecimento servindo de subsídios para a equipe multidisciplinar intervir com esses adolescentes e as comorbidades por eles apresentadas.

 

CONCLUSÃO

Nos domínios "Consumo de Frutas e Vegetais" e "Prática de atividade física" houve impacto dos estágios de prontidão para mudança do comportamento sobre variáveis antropométricas e perfil metabólico. A alteração do colesterol HDL se associou com os estágios de prontidão para mudança do comportamento para o domínio "prática de atividade física".

 

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Endereço para correspondência:
Josiane Aparecida Alves Bianchini
josianeaabianchini@gmail.com

Recebido: Agosto 2020
Analisado: Setembro 2020
Aceito: Setembro 2020

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