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Journal of Human Growth and Development

versión impresa ISSN 0104-1282versión On-line ISSN 2175-3598

J. Hum. Growth Dev. vol.32 no.1 Santo André ene./abr. 2022

http://dx.doi.org/10.36311/jhgd.v32.12969 

ARTIGO ORIGINAL

 

Associação entre excesso de adiposidade periférica, central e geral com pressão alta em adolescentes do Sul do Brasil

 

 

Leandro Narciso Santiago; Priscila Custódio Martins; Diego Augusto Santos Silva

Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Desportos, Núcleo de Cineantropometria e Desempenho Humano, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

INTRODUÇÃO: o excesso de adiposidade é um dos principais fatores de risco para doenças cardiovasculares, incluindo a hipertensão arterial. Crianças e adolescentes com obesidade e hipertensão apresentam maiores riscos de morbidez e mortalidade na vida adulta
OBJETIVO: analisar a associação entre excesso de adiposidade periférica, central e geral com pressão arterial (PA) elevada em adolescentes do Sul do Brasil
MÉTODO: estudo transversal com 1.132 adolescentes (16,50 ±1,14 anos) de ambos os sexos. As mensurações foram por método oscilométrico com esfigmomanômetro digital considerando como PA sistólica (PAS) e PA diastólica (PAD) elevadas, valores acima do percentil 95 para sexo e idade. A adiposidade periférica (dobra cutânea do tríceps) e central (dobra cutânea subescapular) foram classificadas em elevada a partir do percentil 90 da distribuição de referência do Centers for Disease Control and Prevention. Para excesso de adiposidade geral foram consideradas a dobra cutânea tricipital e subescapular acima do percentil 90, simultaneamente. Empregou-se regressão logística com nível de significância de 5%
RESULTADOS: adolescentes do sexo masculino com adiposidade periférica, central e geral elevada apresentaram, respectivamente, 2,43 (IC95%: 1,14; 5,19), 3,50 (IC95%: 1,66; 7,41) e 2,47 (IC95%: 1,01; 6,18) vezes mais chances de PAS elevada. Adolescentes do sexo masculino com adiposidade geral elevada apresentaram maiores chances de desenvolver PAD elevada (OR: 3,31; IC95%: 1,41; 7,70). Adolescentes do sexo feminino com adiposidade central e geral elevada obtiveram 4,15 (IC95%: 1,97; 8,77) e 3,30 (IC95%: 1,41; 7,77) vezes mais chances de desenvolver PAD elevada, respectivamente
CONCLUSÃO: adolescentes do sexo masculino com adiposidade periférica, central e geral elevada tiveram mais chances de pressão arterial sistólica elevada e pressão arterial diastólica elevada quando apresentavam adiposidade geral elevada. Adolescentes do sexo feminino com adiposidade central e geral elevada apresentaram mais chances de pressão arterial diastólica elevada

Palavras-chave: antropometria, doenças cardiovasculares, fatores de risco.


 

 

Síntese dos autores

Por que este estudo foi feito?

O excesso de adiposidade é um fator de risco para doenças crônicas como obesidade e hipertensão arterial sistêmica. Quando iniciada na fase da adolescência, maiores são as chances de complicações cardiovasculares, renais e do sistema nervoso ao longo da vida. Assim, foi possível estimar as chances de hipertensão em adolescentes com excesso de adiposidade.

O que os pesquisadores fizeram e encontraram?

Este estudo transversal de base escolar foi realizado com 1.132 adolescentes. A pressão arterial sistólica e diastólica foi medida considerando-as normais ou elevadas. A adiposidade periférica (dobra cutânea tricipital) e a adiposidade central (dobra cutânea subescapular) foram classificadas como altas a partir do percentil 90. O excesso de adiposidade geral foi verificado quando a dobra cutânea tricipital e subescapular estava acima do percentil 90 simultaneamente. Os principais achados do presente estudo foram: adolescentes do sexo masculino com excesso de adiposidade periférica, central e geral apresentaram maiores chances de hipertensão arterial sistólica e maiores chances de hipertensão diastólica quando apresentavam adiposidade geral excessivamente elevada. Adolescentes do sexo feminino com excesso de adiposidade central e geral têm maior probabilidade de apresentar pressão arterial diastólica elevada.

O que essas descobertas significam?

O sobrepeso e a obesidade podem ser os principais fatores de risco para hipertensão arterial sistólica e diastólica em adolescentes de ambos os sexos. Esses resultados expõem o excesso de adiposidade e a hipertensão arterial como problema de saúde pública entre adolescentes e a presente pesquisa pode ser útil para identificar subgrupos de risco e aprimorar o planejamento de tecnologias voltadas ao combate e prevenção de agravos à saúde.

 

INTRODUÇÃO

De 1975 a 2016, o número de crianças e adolescentes obesos no mundo aumentou oito vezes no sexo feminino e 8,6 vezes no masculino e a previsão é que até 2022 haja mais jovens obesos do que desnutridos1. No Brasil, a prevalência de excesso de peso (sobrepeso e obesidade) em adolescentes aumentou de 6,2% entre 1974 e 1985 para 25% entre 2008 e 2009 em adolescentes de 10 a 19 anos, mostrando um cenário alarmante para essa população no país2. O ganho de peso na infância e adolescência possivelmente levará ao excesso de adiposidade na vida adulta, aumentando o risco de desenvolver doenças como dislipidemia, diabetes e doenças cardiovasculares como aterosclerose e hipertensão arterial sistêmica em todas as fases da vida3.

A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é o aumento dos níveis de tensão dos vasos sanguíneos, levando a alterações da pressão arterial4. Por ser uma doença assintomática em seus estágios iniciais, a prevalência da HAS vem aumentando em todo o mundo5. Se não controlada, pode causar acidente vascular cerebral, infarto do miocárdio, insuficiência cardíaca, demência, insuficiência renal, apresentando maiores riscos de morbimortalidade na vida adulta. O diagnóstico e o tratamento precoces estão diretamente associados à redução desses riscos6.

Estudos têm demonstrado prevalência de hipertensão de aproximadamente 10% em adolescentes com excesso de peso em diversos países entre 2007 e 20137,8. No Brasil, em 2013, a prevalência de pressão arterial elevada em adolescentes com excesso de adiposidade foi de 9,6%, sendo a menor encontrada na região Norte (8,4%) e a maior na região Sul do Brasil (12,5%)7.

A maioria desses estudos utilizou o índice de massa corporal (IMC) para medir o excesso de adiposidade em adolescentes7,8. Há escassez de estudos utilizando o método antropométrico de dobras cutâneas, o que possibilita investigar a adiposidade corporal em diferentes regiões do corpo separadamente, por apresentarem diferentes padrões de predição. Assim, podem ser identificados subgrupos de maior risco, contribuindo para o planejamento de intervenções de prevenção e tratamento desse agravo9. A dobra cutânea subescapular é um indicador de adiposidade central e está diretamente associada a outros desfechos de saúde, como síndrome metabólica e eventos cardiovasculares10. A adiposidade periférica pode ser verificada por meio da dobra cutânea tricipital e está diretamente associada a outros fatores de risco à saúde, como baixa aptidão cardiorrespiratória e hiperglicemia11.

Existem estudos que associam a pressão arterial ao excesso de adiposidade, considerando o excesso de adiposidade geral como a soma das duas dobras cutâneas12. No entanto, o presente estudo analisou essa variável quando ambas as dobras cutâneas se mantiveram acima do percentil 90 da distribuição de referência para sexo e idade da curva do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC )11, permitindo inferências mais precisas sobre o assunto. Assim, o objetivo do presente estudo foi analisar a associação do excesso de adiposidade periférica, central e geral com a pressão arterial elevada em adolescentes de um município do sul do Brasil.

 

MÉTODO

Desenho do estudo

Este estudo transversal de base escolar fez parte do macroprojeto "Guia Brasileiro para Avaliação da Aptidão Física Relacionada à Saúde e Hábitos de Vida - Estágio I", aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina sob o Protocolo nº 746.536 e desenvolvido entre agosto e novembro de 2014. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento. Para adolescentes <18 anos, os pais / responsáveis assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e adolescentes com idade 18 anos assinaram eles próprios o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Participantes

O processo de amostragem foi realizado em duas etapas: a primeira formada pela estratificação da densidade escolar (tamanho: pequena, com menos de 200 alunos; média, com 200-499 alunos; e grande, com 500 ou mais alunos) e a segunda considerando a turno de estudo e a série escolar. Considerou-se elegibilidade estar matriculado na rede estadual de ensino, ter idade entre 14 e 19 anos, estar em sala de aula no momento da coleta de dados e concordar em participar do estudo.

Para determinar o tamanho da amostra, foi adotado nível de confiança de 1,96 (intervalo de confiança de 95% - IC 95%), erro tolerável de cinco pontos percentuais, prevalência de 50% e efeito de delineamento de 1,5, somando 20% para perdas e recusas e outros 20% para controlar possíveis variáveis de confusão. Como 5.182 alunos estavam matriculados no ensino médio da cidade de São José / SC em 2014, o tamanho da amostra foi estimado em 751 adolescentes. Porém, devido à amostragem por conglomerados, todos os alunos presentes foram convidados a participar da pesquisa, resultando em 1.132 alunos.

Variável Dependente

As variáveis dependentes foram: pressão arterial, pressão arterial sistólica e pressão arterial diastólica medidas pelo método oscilométrico digital com aparelho Omron (Kyoto, Japão) modelo HEM 742, validado para uso em adolescentes brasileiros12. Após serem informados sobre os procedimentos, os adolescentes foram orientados a permanecer em repouso por cinco minutos, com a bexiga vazia, sem realizar atividade física 90 minutos antes do teste e sem comer, ingerir álcool ou bebidas à base de cafeína pelo menos 30 minutos antes da coleta de dados. Duas medidas com intervalo de cinco minutos foram realizadas utilizando-se a média das duas medidas seguindo o protocolo das Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial4. A pressão arterial elevada é definida quando adolescentes até 18 anos apresentam Pressão arterial sistolica / diastólica percentil 95 de acordo com a tabela de referência do "Quarto Relatório de Diagnóstico, Avaliação e Tratamento da Hipertensão Arterial em Crianças e Adolescentes"13. Para adolescentes com idade igual ou superior a 18 e 19 anos, considerou-se hipertensão arterial para pressão arterial sistolica 140 mmHg e / ou diastólica 90 mmHg.

Variáveis independentes

Foi avaliada a adiposidade periférica (dobra cutânea tricipital), central (dobra cutânea subescapular) e geral (dobra cutânea tricipital e subescapular). As dobras cutâneas do tríceps e subescapular foram coletadas com o adipômetro científico Cescorf® (Porto Alegre, Brasil). As medidas foram realizadas por avaliadores certificados pela International Society for the Advancement of Kinanthropometry (ISAK) utilizando o mesmo protocolo14.

A adiposidade periférica e central foi classificada como alta a partir do valor correspondente ao percentil 90 da distribuição de referência para sexo e idade da curva do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC)11. Valores abaixo do percentile 90 foram considerados adiposidade normal. As curvas do CDC não têm valores de referência para a adiposidade corporal geral através das dobras cutâneas. No entanto, este estudo analisou essa variável de acordo com Silva et al.15, considerando com alta adiposidade corporal geral adolescentes que apresentaram simultaneamente valores de dobras cutâneas no tríceps e subescapular acima do percentil 9011.

Variáveis de controle

A maturação sexual foi autoavaliada segundo critérios propostos por Tanner, composta por cinco estágios de desenvolvimento para cada característica sexual secundária (mama e desenvolvimento genital)16. A indicação das etapas foi realizada por autoavaliação após explicação individual e prévia do instrumento pela pesquisadora, sempre do mesmo sexo do adolescente. Os alunos marcaram o número correspondente ao estágio em que se encontravam em relação ao desenvolvimento das mamas (sexo feminino) e desenvolvimento genital (sexo masculino) após a observação das fotografias correspondentes. O estágio 1 representa o estágio infantil caracterizado como pré-púbere. Os estágios 2, 3 e 4 representam o processo de maturação, categorizado neste estudo como "púbere" e o estágio 5 indica o estágio adulto maduro, classificado como "pós-púbere"16. Devido à baixa frequência de adolescentes que se autodeclararam pré-púberes (0,2%), essa variável foi categorizada em: "pré-púbere / púbere" e "pós-púbere".

O nível de atividade física foi verificado por meio do questionário Youth Risk Behavior Surveillance System (YRBSS), desenvolvido nos Estados Unidos, traduzido e validado para o Brasil17. Foi realizada a seguinte pergunta: "Nos últimos 7 dias, em quantos dias você esteve fisicamente ativo por pelo menos 60 minutos por dia? (Considere o tempo que você despendeu em qualquer tipo de atividade física que aumente sua freqüência cardíaca e torne sua respiração mais rápida por um tempo). As opções de resposta foram: "Nenhum dia"; "Um dia"; "Dois dias"; "Três dias"; "Quatro dias"; "Cinco dias"; "Seis dias"; "Sete dias". Adolescentes que praticavam atividade física moderada a vigorosa sete dias por semana durante 60 minutos ou mais foram classificados como "fisicamente ativos" e os demais adolescentes que não alcançaram essa recomendação foram classificados como "pouco ativos fisicamente"18. A idade foi coletada como uma variável quantitativa discreta (anos completos) e utilizada continuamente, garantindo a identificação de aspectos específicos de cada idade devido às transformações da fase da adolescência. Para definir o nível econômico, foi utilizado o questionário proposto pela Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa, que estima o poder de compra das famílias19. O nível econômico foi caracterizado de forma decrescente de acordo com o poder aquisitivo, acúmulo de bens materiais, condições de moradia, número de empregados domésticos e escolaridade do chefe da família. Essa variável foi dicotomizada em nível econômico "Alto" ("A1"; "A2"; "B1"; "B2") e "Baixo" ("C1"; "C2"; "D").

Análise estatística

As análises foram realizadas estratificadas por sexo. Estatísticas descritivas (média, desvio padrão, frequência absoluta e relativa) foram utilizadas para caracterização da amostra. Na estatística inferencial, o teste T independente foi usado para variáveis contínuas e o teste Qui-quadrado para variáveis categóricas com análise do tamanho do efeito de Cohen'D e Cramérs. A regressão logística binária foi usada para examinar as associações entre o desfecho (pressão arterial, pressão arterial sistólica e diastólica) e a exposição (adiposidade periférica, central e geral) estimando o odds ratio (OR) e intervalo de confiança de 95%. Na análise ajustada, todas as variáveis (idade, nível econômico, maturidade sexual, nível de atividade física) foram introduzidas no modelo, independentemente do valor de p na análise bruta. O nível de significância adotado foi de 5%. As análises foram realizadas por meio do software Statistical Package for the Social Sciences (IBM SPSS Statistics, Chicago, Estados Unidos), versão 22.0.

 

RESULTADOS

Dos 1.132 alunos analisados, 202 foram excluídos da análise por não realizarem as medidas antropométricas, resultando em 930 alunos. Adolescentes do sexo feminino apresentaram valores médios de pressão arterial sistolica superiores aos do sexo masculino (p <0,01). Em relação às dobras cutâneas, as adolescentes do sexo feminino apresentaram maiores valores médios das dobras cutâneas tricipital e subescapular em comparação aos adolescentes do sexo masculino (p <0,01). Adolescentes do sexo masculino apresentaram maior prevalência de pressão arterial sistólica elevada quando comparados às adolescentes do sexo feminino (p <0,01). Para a prevalência de adiposidade central, não foi observada diferença significativa entre os gêneros; entretanto, adolescentes do sexo feminino apresentaram maior prevalência de adiposidade periférica (p <0,04) e geral (p <0,01) quando comparados aos adolescentes do sexo masculino (Tabela 1).

A análise bruta demonstrou que os adolescentes do sexo masculino com excesso de adiposidade periférica (OR: 1,37; IC95%: 1,40; 4,71), excesso de adiposidade central (OR: 1,82; IC95%: 1,23; 2,83) e excesso de adiposidade geral (OR: 1,37; IC95%: 1,04; 2,88) apresentaram maiores chances de pressão arterial elevada. Na análise ajustada por idade, os adolescentes do sexo masculino também apresentaram maiores chances de pressão arterial elevada quando possuíam excesso de adiposidade periférica (OR: 1,51; IC95%: 1,22; 4,66), excesso de adiposidade central (OR: 1,81; IC95%: 1,22; 2,93) e excesso de adiposidade geral (OR: 1,37; IC95%: 1,47; 2,93). Na análise bruta, as adolescentes do sexo feminino com excesso de adiposidade periférica (OR: 1,02; IC95%: 1,38; 2,75), excesso de adiposidade central (OR: 1,13: IC95%: 1,45; 2,84) e excesso de adiposidade geral (OR: 1,47; IC95%: 1,54; 4,02) apresentaram maiores chances de pressão arterial elevada. Na análise ajustada, as adolescentes do sexo feminino com excesso de adiposidade periférica (OR: 1,03; IC95%: 1,37; 2,82), central (OR: 1,04; IC95%: 1,40; 2,69) e geral elevada (OR: 1,41; IC95%: 1,50; 3,93) apresentaram maiores chances de pressão arterial elevada (Tabela 2).

A análise bruta demonstrou que os adolescentes do sexo masculino com adiposidade periférica elevada, apresentaram maiores chances de pressão arterial sistólica elevada (OR: 2,39; IC95%: 1,22;4,66). Na análise ajustada os adolescentes do sexo masculino apresentaram 2,43 (IC95%: 1,14; 5,19), vezes mais chances de desenvolver pressão arterial sistolica elevada (Tabela 3).

Adolescentes do sexo masculino com adiposidade central elevada apresentaram maiores chances de pressão arterial sistólica elevada na análise bruta (OR: 3,89; IC95%: 2,01; 7,55) e ajustada (OR: 3,51; IC95%: 1,66; 7,41). Adolescentes do sexo masculino com adiposidade geral elevada tiveram mais chances de pressão arterial sistólica elevada na análise bruta (OR: 2,51; IC95%: 1,12; 5,61) e ajustada (OR: 2,47; IC95%: 1,01; 6,18). Os adolescentes do sexo masculino com adiposidade geral elevada apresentaram maiores chances de desenvolver pressão arterial diastólica elevada na análise ajustada (OR: 3,31; IC95%: 1,41; 7,70) (Tabela 3).

Adolescentes do sexo feminino com adiposidade central elevada obtiveram maiores chances de pressão arterial diastólica elevada na análise bruta (OR: 3,06; IC95%: 1,56; 5,98) e ajustada (OR: 4,15; IC95%: 1,97; 8,77). Adolescentes do sexo feminino com adiposidade geral elevada tiveram maiores chances de pressão arterial diastólica elevada na análise bruta (OR: 2,86; IC95%: 1,26; 6,49) e ajustada (OR: 3,30; IC95%: 1,41; 7,77) (Tabela 4).

 

DISCUSSÃO

Os principais achados do presente estudo foram: 1) Adolescentes do sexo masculino com excesso de adiposidade periférica, central e geral apresentaram maiores chances de pressão arterial elevada; 2) Adolescentes do sexo masculino com excesso de adiposidade geral apresentaram maiores chances de pressão arterial diastólica elevada; 3) Adolescentes do sexo feminino com excesso de adiposidade central e geral possuíam maiores chances de pressão arterial diastólica elevada.

Esta pesquisa mostra que adolescentes do sexo masculino com excesso de adiposidade periférica, central e geral têm maior probabilidade de apresentar pressão arterial sistólica elevada. Adolescentes do sexo masculino com excesso de adiposidade geral eram mais propensos a apresentar pressão arterial diastólica elevada. Esses resultados corroboram outros estudos que associaram o sexo masculino a indicadores antropométricos de obesidade e hipertensão5,7. Uma possível explicação está relacionada ao excesso de adiposidade central. Os principais aspectos fisiológicos envolvidos são: a gordura intra-abdominal aumenta a quantidade de citocinas pró-inflamatórias que podem levar à hipertensão; excesso de atividade simpática levando ao aumento da reabsorção de sódio, causando aumento da resistência vascular periférica e, consequentemente, da pressão arterial20. Durante a maturação sexual, níveis elevados de testosterona plasmática podem contribuir para um efeito pró-hipertensivo21.

Adolescentes do sexo feminino com excesso de adiposidade central e geral apresentaram maior probabilidade de apresentar pressão arterial diastólica elevada no presente estudo. Um estudo realizado nos Estados Unidos da América em 2008 com crianças de 7 a 12 anos, que analisou associações transversais entre adição de açúcar e sal, mostrou que o alto consumo de açúcares estava associado a pressão arterial diastólica elevada, bem como alto percentual de gordura em adolescents do sexo feminino22. Outra hipótese é a idade dos sujeitos, visto que a hipertensão diastólica isolada é muito mais comum em mais jovens, principalmente em se tratando de adolescentes com sobrepeso23. Níveis elevados de pressão arterial diastólica representam um fator de risco para doenças cardiovasculares quando a pressão arterial sistólica elevada existe simultaneamente23.

Embora já seja conhecida a causa da hipertensão arterial sistólica e diastólica ser multifatorial, o sobrepeso e a obesidade são os principais fatores de risco para essa doença na adolescência, idade adulta e idosa3. A distribuição da gordura corporal é mais importante do que a massa gorda total para determinar os perigos do excesso de adiposidade para a saúde. Outros estudos no sudeste do Brasil mostraram prevalência de hipertensão e excesso de adiposidade central em adolecentes24,25. O excesso de adiposidade central conota gordura acumulada intra-abdominal ao redor e dentro dos órgãos vitais e é prejudicial à saúde em geral. Atividade física, hábitos alimentares saudáveis e horas de sono suficientes parecem ser a chave para a prevenção e tratamento de fatores de risco como sobrepeso e consequentemente hipertensão e doenças cardiovasculares24,25,26.

O presente estudo apresenta as seguintes limitações: os níveis pressóricos foram medidos em uma única ocasião. Seguindo as recomendações das Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial, estudos nacionais e internacionais que utilizaram duas ou mais medidas mostraram redução dos níveis pressóricos entre a primeira e a terceira medida4. A justificativa pode ser o efeito da regressão à média devido à familiarização com os procedimentos de coleta, reduzindo a ansiedade no segundo momento7. Embora os valores de pressão arterial sistólica e diastólica observados no presente estudo sejam suscetíveis de superestimação, são análogos à maioria dos estudos epidemiológicos que utilizaram o mesmo método, permitindo seu uso como referência de hipertensão arterial sistêmica em adolescentes.

O método duplamente indireto de dobras cutâneas é outra limitação a ser considerada. Como havia uma equipe de avaliadores e não apenas um para todas as coletas, existe a possibilidade de erros sistemáticos e aleatórios, subestimando ou superestimando os resultados. A técnica de absorciometria de raio-X de dupla energia (DXA) mostra-se acurada para estimar a gordura corporal de todo o corpo ou de segmentos27. Uma pesquisa com adolescentes americanos de 11 a 17 anos comparou IMC e dobras cutâneas vs DXA e a relação com fatores de risco cardiovascular, mostrando resultados semelhantes entre as duas técnicas (antropometria e DXA)28. Além disso, o método de dobras cutâneas é validado para esse tipo de estudo e é de fácil aplicação, com custo operacional relativamente baixo se comparado às outras técnicas.

A característica transversal do estudo, que não permite estabelecer relações de causa-efeito, resultando em possíveis causalidades reversas entre associações. Consequentemente, torna impossível confirmar se a hipertensão foi antes ou depois da exposição ao excesso de fator de adiposidade. Pontos positivos como a coleta de dados em escolas diferentes devem ser destacados, proporcionando maior representatividade, bem como procedimentos padronizados e treinamento da equipe de pesquisadores para a coleta de dados. Nesse sentido, ações relevantes para hábitos saudáveis na adolescência podem ser implementadas nas escolas, reduzindo o risco de hipertensão na vida adulta.

 

CONCLUSÃO

Pode-se concluir que adolescentes com excesso de adiposidade periférica, central e geral têm maior probabilidade de apresentar hipertensão. Ao apresentar excesso de adiposidade central, periférica e geral, os homens apresentaram maior probabilidade de apresentar pressão arterial sistólica elevada e maior probabilidade de apresentar pressão arterial diastólica elevada na presença de excesso de adiposidade geral. Adolescentes do sexo feminino com excesso de adiposidade central e geral têm maior probabilidade de apresentar pressão arterial diastólica elevada.

 

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Endereço para correspondência:
Diego Augusto Santos Silva
diegoaugustoss@yahoo.com.br

Manuscrito recebido: maio 2020
Manuscrito aceito: Maio 2020
Versão online: Janeiro 2022

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