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Mudanças

versão impressa ISSN 0104-3269versão On-line ISSN 2176-1019

Mudanças vol.27 no.2 São Paulo jul./dez. 2019

 

ARTIGOS EMPÍRICOS

 

Trabalho noturno e seus efeitos na saúde dos trabalhadores da área de segurança

 

Night work and its effects on the health of safety workers

 

 

Robinson Souza de FrançaI; Raquel Pereira BeloII; Luisa Regina da Silva TeixeiraIII; Pollyana Nathercia de Vasconcelos RodriguesIV; Valéria Gomes de ArrudaV; Christian Gabriel Madeira GuimarãesVI

IPsicólogo e mestrando em Psicologia pela UFPI
IIPsicóloga, Mestre e Dra. pela UFPB. Profa. Associada 1 (UFPI)
IIIGraduada em Psicologia (UFPI)
IVPsicóloga pela Universidade Federal do Piauí - (UFPI)
V Psicóloga pela Universidade Federal do Piauí - (UFPI)
VIGraduando em psicologia (UFPI)

 

 


RESUMO

Este estudo empírico e qualitativo teve como objetivo conhecer os efeitos do trabalho noturno na saúde dos trabalhadores da área de segurança, para isto verificou os principais impactos do trabalho na sua saúde e realizou um levantamento dos seus motivos para a escolha da profissão. Vinte trabalhadores da área de Segurança pública e privada responderam entrevista semiestruturada acerca do trabalho noturno e os impactos na saúde dos profissionais e questionário sociodemográfico. Suas respostas foram processadas no software IRAMUTEQ, cuja classificação hierárquica descendente as dividiu em quatro classes, fatores motivadores e desmotivadores para o trabalho noturno, atividades fora do horário de trabalho e repercussões do trabalho na vida pessoal. Os resultados apontam que as queixas de cansaço físico e psíquico, estresse, desregulação do ciclo do sono e impactos nos relacionamentos sociais estão associados aos processos de adoecimento e sofrimento físicos e psíquicos no trabalho noturno.

Palavras-chave: Trabalho Noturno; Saúde; Trabalho na Segurança.


ABSTRACT

This empirical and qualitative study aimed to Know the effects of night work on the health of workers in the safety area, for this it verified the main impacts of the work on their health and conducted a survey of their reasons for choosing the profession.
Twenty public and private security workers answered a semi-structured interviews about night work and the health impacts of professionals and sociodemographic questionnaire.Their answers were processed in the IRAMUTEQ software, whose descending hierarchical classification divided them into four classes, motivating and demotivating factors for night work,activities outside of Working hours and repercussions of work on personal life. The results indicate that complaints of physical and psychic tiredness, stress, sleep cycle dysregulation and impacts on social relationships are associated with the processes of physical and mental illness and suffering at night work.

Keywords: Night work; Health; Security Work.


 

 

Introdução

O trabalho rege a vida, a organização do tempo, das relações interpessoais e dos grupos sociais. A humanidade se estrutura, histórica e politicamente, quase em sua totalidade, em função do conceito de trabalho, desde os caçadores da era paleolítica aos fazendeiros, artesãos medievais, operários da linha de montagem do século XX e profissionais da área técnico-científica informacional atual (Araújo & Sachuk, 2007).

O trabalho humano por muito tempo não foi pensado como parte significativa da vida das pessoas, ainda que aspectos como a saúde do trabalhador seja influenciada pelo trabalho que ele desempenha. O trabalho começa a fazer parte da vida das pessoas e se torna significativo a ponto de ser equivalente às relações amorosas que elas constroem e tão necessário quanto o sono, podendo satisfazer as suas necessidades básicas. Entretanto, no campo da saúde mental, o trabalho foi tardiamente integrado como fator de atenção nos estudos, vindo, então, a ser pesquisado efetivamente em décadas recentes (Borsoi, 2007).

A concepção de que o trabalho não influencia o ser humano dificultou o conhecimento e compreensão de como ele lida com elementos da atividade profissional que realiza e quais os efeitos que lhe são causados devido ao tempo que passa trabalhando, às condições que lhe são oferecidas no trabalho, às relações que estabelece com outros profissionais com quem divide suas atividades.

A busca de conforto material em conjunto com a busca incessante de lucratividade por parte das organizações fez surgir a "Sociedade 24 horas", na qual o trabalho é realizado em turnos alternados durante as 24 horas do dia, havendo a necessidade dos trabalhadores permanecerem acordados e alertas em áreas como a de Segurança (Silva, Chaffin, Silva Neto & Siqueira Júnior, 2010).

O campo de trabalho de garantia de segurança às pessoas ou patrimônios demonstra ser de alto nível de responsabilidade, fazendo com que o trabalhador deposite cargas de energia física e mental para atender às responsabilidades que lhe foram atribuídas. Neste sentido, Silva, Teles, Araújo, Brito e Silva (2013) concluem que os impactos na vida pessoal e profissional do trabalhador da área de segurança são preocupantes, desencadeiam outras questões como o estresse e a fadiga, e que o trabalho em turnos torna-se desgastante por apresentar intensidade no serviço, agravando a saúde e causando diversos impactos, desde problemas físicos até sociais.

Diante da relevância do tema e da escassez de informações em nível local, este estudo empírico e qualitativo teve como objetivo conhecer os efeitos do trabalho noturno na saúde dos trabalhadores da área de segurança pública e privada de uma cidade do Piauí. Ainda, verificou-se os principais impactos do trabalho e realizou um levantamento dos motivos para a escolha da profissão.

 

Material e método

Participaram vinte profissionais que trabalham nas áreas de Segurança Pública e Privada, selecionados de acordo com a sua disponibilidade de serem entrevistados, com idades entre 22 e 59 anos. Todos são do gênero masculino, com tempo de trabalho noturno variando entre quatro meses a 31 anos, contabilizando entre 28 e 56 horas de sono por semana.

Como instrumentos, responderam questionário sociodemográfico e roteiro de entrevista semiestruturada com perguntas elaboradas pelos pesquisadores e relacionadas ao tema pesquisado, abordando o trabalho noturno e seus efeitos na saúde do profissional da área de segurança, a escolha profissional, a conciliação do horário de trabalho com as relações sociais, mudanças na vida e na saúde após a inserção no mercado de trabalho, atividades fora do trabalho, acidentes de trabalho, aspectos positivos e negativos em trabalhar no horário noturno e expectativas em relação à carreira na área.

Quanto aos procedimentos, as entrevistas foram realizadas dentro dos locais de trabalho dos participantes. Independentemente da situação, durante a abordagem foi perguntado a cada um deles se poderia participar da pesquisa e, quando de acordo, teve acesso ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, contendo informações detalhadas sobre a pesquisa.

Foram seguidas as normas e procedimentos éticos conforme a Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, que estabelece as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Piauí, com o número CAAE 56409716.1.0000.5214.

Para a análise dos dados foi utilizado o programa IRAMUTEQ que realiza diferentes tipos de análises de textos e questionários (Marchand & Ratinaud, 2012), contribuindo para estudos nos campos das ciências sociais e humanas, possuindo rigor estatístico no uso de recursos técnicos de análise lexical (Camargo & Justo, 2013).

Para ser incluído no corpus de dados, o respondente deveria trabalhar no ramo da segurança e no horário noturno. Todos os entrevistados, policiais militares, policiais federais, bombeiros militares e agentes de segurança patrimonial, contribuíram com a pesquisa respondendo o questionário sociodemográfico e a entrevista semiestruturada.

 

Resultados

A Classificação Hierárquica Descendente (CHD) levantou os segmentos de texto e os classificou em função da frequência, foram transformados em 250 segmentos de texto, com 4584 ocorrências, 1119 formas e 659 hapax, que são palavras que aparecem apenas uma vez no texto.

O programa considerou 77,37% dos segmentos de texto para a análise, satisfazendo o critério mínimo apontado pela literatura de 75% de aproveitamento do corpus (Camargo & Justo, 2013). Realizou-se divisões sequenciais no corpus até se originarem quatro classes. A primeira divisão deu origem a dois subcorpus. O primeiro subcorpus divide-se gerando as Classes 3 e 4, enquanto o segundo subcorpus divide-se gerando as Classes 1 e 2. A divisão do corpus em quatro classes elaborada pelo software pode ser observada na Figura 1.

 

 

Cada uma das classes resultantes da CHD é composta pelas palavras mais significativas (maior frequência dentro da classe) e pelas respectivas associações com a classe (chi-quadrado). Dessa forma, a Figura 2, elaborada pelos autores, apresenta as 15 palavras que melhor caracterizam cada uma das classes, de acordo com a Figura 1.

A respeito dos conteúdos lexicais das análises textuais, a classe 1 representou 18,62% dos segmentos de texto, denominada "Fatores motivadores para o trabalho noturno".

 

Quadro 1

 

A Classe 2, "Fatores desmotivadores para o trabalho noturno", representa 16,49% dos segmentos de texto e as palavras que melhor se relacionam a esta classe fazem menção ao perder sono devido ao horário de trabalho e as suas consequências.

 

Quadro 2

 

A Classe 3, "Repercussões do trabalho na vida pessoal", representa 30,32% dos segmentos de texto, o segundo maior percentual, e seu conteúdo indica a entrada da vida profissional na vida pessoal havendo choque e repercutindo nas relações com família e amigos.

 

Quadro 3

 

A Classe 4, "Atividades fora do horário de trabalho", representa 34,57% dos segmentos de texto, o maior percentual, havendo nesta classe menção a estudar para concurso, ajudar em casa em atividades domésticas, não estar realizando no momento atividades físicas que gostaria de fazer.

 

Quadro 4

 

Discussão

Pesquisar o trabalho noturno e seus efeitos na saúde do trabalhador da área de segurança, a compreendendo envolvida em elementos sociais, tecnológicos, econômicos e organizacionais e aqueles que permeiam os processos de trabalho (Benites, Camargo, Goulart Júnior & Camargo, 2013), ainda, os psicológicos, possibilita entendimento abrangente dos fatores influenciadores da saúde do profissional em razão do trabalho.

Na Classe 1 constam palavras que fazem menção a trabalhar à noite ser bom devido à folga durante o dia. Existem menções à escala do trabalho em plantão, a conciliar os períodos dentro e fora do trabalho e achar o período noturno como tranquilo para trabalhar.

Nesse contexto de motivações para o trabalho, salienta-se o entendimento de Spector (2012) que as explica como estado interno indutor de uma pessoa a se envolver em determinados comportamentos, envolvendo o direcionamento, a escolha de comportamentos específicos a partir de um grande número de comportamentos possíveis, à intensidade do empenho de uma pessoa ao realizar uma tarefa e à persistência no envolvimento continuado em um comportamento ao longo do tempo.

Os participantes encontraram motivação para se envolverem no trabalho à noite em elementos subjetivos, persistindo neste trabalho ao conceber o período noturno como mais tranquilo para trabalhar por haver menos pessoas nas ruas, ou conseguir folga durante o dia, este período entendido como possível de se resolver problemas burocráticos, por exemplo.

Além disto, outros participantes mencionaram o ganho salarial maior devido aos adicionais noturnos e de periculosidade e/ou insalubridade, a sensação de dever prestar os serviços de segurança para a comunidade e de cumpri-lo, enfatizando a importância da sociedade na colaboração com o trabalho e a característica pessoal de gostar do horário da noite, de sentir-se mais ativo para trabalhar conseguindo melhor rendimento como elementos motivadores para o trabalho. Nesta dimensão, Spector (2012) comenta que o senso de realização proveniente da conclusão bem-sucedida de um importante projeto tem probabilidade de resultar em sentimentos positivos, como orgulho e alegria, conectando-se ao resultado levantado.

A Classe 2, caracterizada como "fatores desmotivadores para o trabalho noturno" faz menção a ser necessário ficar acordado, o que é entendido como algo ruim para alguns dos respondentes. Há menção, também, a "não fico de saco cheio, eu furo o saco", quando o respondente trata dos problemas em seu trabalho como enfrentados, não tolerados.

Tomando a concepção de motivação de Spector (2012) citada anteriormente, os fatores desmotivadores seriam, então, aqueles que imobilizam a trajetória do profissional em suas atividades laborais, empecilhos que dificultam o alcance, ou mesmo o estabelecimento de metas.

Nessa classe foram encontrados efeitos negativos, na saúde do profissional em diferentes formas, constituindo-se em elementos desmotivadores, como expresso em: à noite o estresse é maior, é mais fácil pela manhã. Visibilidade, a criminalidade prefere agir mais à noite, é mais complicado", "na realidade aumentei alguns quilos", e "a alteração do relógio biológico". Ressalta-se que apesar de ser uma classe específica, esses fatores desmotivadores emergiram na fala dos entrevistados nas demais, visto que para eles o trabalho influencia a vida fora do serviço, nas relações estabelecidas nas folgas, "acho que a pessoa que trabalha à noite tem mais tendência de adquirir doença", "primeiro pela questão do sono, problemas no estômago que eu tinha antes que piorou porque tomo muito café e Coca-Cola e salgados, é o que a gente encontra à noite pra comer. Agora tenho problemas de concentração, porque o trabalho te deixa alerta e pela perda de sono não consigo mais me concentrar facilmente, então qualquer barulho distrai".

Policial militar entrevistado comentou, ao tratar dos fatores desmotivadores de sua profissão, que "a vida militar acaba com a gente, tenho artrose, má circulação nas pernas, "o cara sai sugado". O militar morre psicologicamente e emocionalmente, é uma morte antecipada, não é só de tiro. Quando a gente está fora do serviço continua alerta. Qualquer coisa a gente está em alerta". Ele percebeu o envolvimento do sofrimento acarretado pela sua atividade laboral militar em aspectos biológicos e emocionais, o morrer psicologicamente e emocionalmente e a permanência no trabalho demonstram o contraste entre a carga de motivação e desmotivação que o trabalho impõe ao trabalhador. A sua formação militar e o seu juramento o envolve em todos os aspectos da vida, ou seja, o militar o é dentro e fora da corporação, com ou sem a farda.

O salário, a falta de estrutura e de equipamentos também surgiram no discurso de profissionais da segurança pública como fatores desmotivadores e que geram adoecimento. Sobre o adoecimento do policial militar, Paulino e Lourinho (2014) corroboram o argumento dos entrevistados quando afirmam que não apenas as condições como a organização do trabalho são determinantes no processo saúde/doença do profissional da segurança pública, pois existem fatores secundários, investimento ineficaz ou mesmo a total falta dele, que podem aumentar a velocidade do processo de adoecimento desses trabalhadores. Ainda, explicam que tanto o cansaço físico, quanto a falta de equilíbrio emocional podem levar esse profissional a se comportar de forma irracional no decorrer das crises e das situações caóticas, com a morte pairando constantemente em sua vida.

Dessa forma, o trabalho militar é concebido como em constante estado de vigilância, a exigência de responsabilidade sobre si e sobre os companheiros nas ocorrências, com atenção aos procedimentos, aos envolvidos nas situações em que atuam, vítimas e infratores e população curiosa que se aglomera nos casos que atendem. Sobrecarga de funções que pode culminar no surgimento ou acentuação de sintomas e de predisposições ao adoecimento físico e psicológico, sobretudo quando atuam em horário em que o corpo requer descanso.

A Classe 3 agrupou palavras em torno das repercussões do trabalho noturno na vida pessoal dos trabalhadores, envolvendo efeitos na saúde e os impactos na vida do profissional, com referências ao esgotamento que o trabalho acarreta e a entrada da vida profissional na vida pessoal, bem como ao choque que pode acontecer nesse encontro.

Alguns participantes reclamaram sobre o trabalho influenciar nas relações pessoais - "atrapalha muito é com meus irmãos, quase não vejo eles. Antes eu ia para a igreja, agora não vou mais, eu fico cansado", "com a minha esposa é um pouco complicado. Eu passo o dia com minha filha, mas na noite que estou trabalhando eu não vejo ela", ou sobre o trabalho surgir entre os assuntos conversados nos momentos fora dele, momentos de lazer - "você não pode levar o trabalho para dentro de casa, eu procuro ocupar essa ausência dentro de casa. Mas quando a roda de amigos é da polícia, o assunto é polícia, é ocorrência", e, contrariamente, outros participantes afirmaram que conseguem administrar o tempo de forma satisfatória entre as obrigações do trabalho e os momentos com família e amigos, aproveitando para o lazer, com passeios, viagens, conforme fala um dos entrevistados - "uma das coisas boas do meu serviço é que dá para conciliar família, amigos".

Stepansky e França (2008) lançam luz ao tema equilíbrio entre trabalho e vida pessoal ao proporem que é papel da organização buscar estratégias para que o trabalho seja realizado de forma mais agradável, reduzindo o estresse e flexibilizando o tempo do trabalhador. Trata-se de possibilidade para a transformação das relações com o trabalho e dentro dele, promovendo alternativas para que seja realizado em condições suportáveis e com qualidade de vida, favorecendo a participação do trabalhador em atividades que viabilizem seu bem-estar e saúde.

Como importante componente da vida, o trabalho proporciona recursos que ultrapassam aqueles para o sustento, como salário e benefícios trabalhistas - ele supre necessidades da vida, senso de propósito e contato social, sendo inevitável que as pessoas reajam emocionalmente aos eventos e situações de trabalho (Spector, 2012), logo deve ser repensado e pautado no conhecimento sobre o trabalhador, reconhecimento de deficiências e potencialidades e da importância das suas relações e afetos não restritos à produtividade.

A Classe 4 foi denominada como atividades fora do horário do trabalho, a classe com a maior significância, contendo palavras que se relacionam a estudar para concurso, ajudar em casa em atividades domésticas, não ter no momento atividades físicas que gostariam de fazer.

Algumas das falas a respeito das atividades extras ao trabalho demonstram que os momentos de folga são organizados em função de atividades esportivas e contato com familiares e amigos - "só faço atividade física, encontro os amigos de forma esporádica", "a minha folga eu tiro para família, por isso não faço serviço extra, pra ter tempo pra essas pessoas, pra família, amigos, é a função da folga", "futebol, academia, na hora que eu chego eu levo logo minha filha para a escola, aí durmo e acordo para buscar ela", "quando eu estou de folga vou à casa da minha namorada", "no fim de semana saio, vou à piscina e à praia", "saio para caminhar, espairecer mesmo, também gosto de fazer visita aos familiares e irmãos da igreja".

As atividades fora do trabalho na segurança foram demonstradas pelos participantes como oportunidades de lazer, de estabelecimento de relações sociais e de práticas de exercícios. Silva, Souza, Rossi Filho, Silva e Rigoni (2017) informam que as atividades físicas ao serem consideradas do ponto de vista do lazer, devem ter para os sujeitos um sentido de satisfação pela própria atividade, além de lhes proporcionarem a construção de valores em prol de uma vida melhor. Ou seja, não devem confundir a prática de atividades físicas no tempo disponível como forma de minimizar ou evitar doenças.

Além desse aspecto, houve participante que compreendeu o exercício e o condicionamento físico como uma atividade que gostaria de realizar, para o relaxamento das tensões do trabalho, do estresse e cansaço - "rúgbi é meu esporte, ando de moto para relaxar porque ando muito estressado, eu faço o almoço lá em casa, fazer trilhas".

Sobre o estresse relatado pelo participante, Silva (2019) explica que se trata de um termo ao qual que tem sido conferido pluralidade de significados. Goulart Junior e Lipp (2008), considerando o ser humano numa visão biopsicossocial, entendem que ele está submetido a mudanças rápidas e significativas em diferentes setores de sua vida e precisa desenvolver capacidade adaptativa, mobilizando energia física, mental e social para que se adapte a elas. No entanto, pode acontecer demasiada incongruência entre a sua capacidade de adaptação em relação à velocidade das transformações, resultando em situações de conflito e desequilíbrio, se instaurando as situações de estresse.

Diante dos resultados, conclui-se que o trabalho noturno repercute na saúde dos profissionais da área de Segurança pública e privada de uma cidade do Piauí.. As queixas sobre efeitos como o cansaço físico, o cansaço psíquico, o estresse, a desregulação do ciclo do sono e os impactos gerados nos relacionamentos sociais, representados pela dificuldade em encontrar familiares, amigos, grupos de convivência como a igreja, falta de energia para aproveitar as folgas em momentos de lazer, possuem relação com o desempenho laboral. Este está relacionado com as queixas, sendo consequências das relações estabelecidas entre profissional e trabalho.

O trabalho figura, para a maioria dos profissionais entrevistados, como fundamental, algo pelo qual tem paixão e dedicam-se com afinco. Todavia, não é possível considerar tais características como suficientes para os trabalhadores superarem as dificuldades que lhes são impostas pelo trabalho noturno, seria depositar neles absoluta responsabilidade em desvencilharem-se dos fatores que os afetam negativamente. O trabalho pode ser gerador de sofrimentos e de adoecimentos, mas pode ser um lugar onde se proporciona qualidade no exercício das tarefas devidas, evitando, ou tornando menos frequente os problemas à saúde.

Estudos a respeito do trabalho noturno e as suas consequências para a saúde e outras dimensões vitais com a categoria profissional investigada e demais que laborem naquele turno são recomendadas, de modo a constituírem fontes de informação capazes de implementar ações voltadas à prevenção e promoção de saúde dos profissionais e nas organizações.

 

Referências

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Submetido em: 30-6-2019
Aceito em: 17-12-2019

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