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Revista Brasileira de Psicodrama

versão On-line ISSN 2318-0498

Rev. bras. psicodrama vol.18 no.2 São Paulo  2010

 

RESENHA

Book reviews

 

Psychotherapie Psychodramatisch

 

 

1 Antonio Carlos Cesarino

Fac. de Medicina da USP

Endereço para correspondência

 

 

Klaus Jensen (org .) Alemanha : Editora Shaker Verlag , 2001

É frequente ouvirmos a afirmação de que é muito grande a produtividade dos psicodramatistas brasileiros. Sabemos que aqui se produzem mais artigos e livros sobre psicodrama, sociodrama e sua utilização terapêutica, educacional, institucional e até política do que em qualquer outro lugar do mundo. Mas como escrevemos em português, grande parte desse labor fica por aqui mesmo. O movimento psicodramático mundial seguramente sairia enriquecido se muitas das criações de nossos patrícios fossem conhecidas mais amplamente. Por isso é sempre bom saber que contribuições nossas tenham sido publicadas em outros países.

É o caso do livro Psychotherapie psychodramatisch, organizado por Klaus Jensen, editora Shaker Verlag, de Aachen, Alemanha, de 2001. Trata- se de uma coletânea de comunicações de 5 países; do Brasil: Moyses Aguiar, Maria Amália Faller, José Fonseca e Miriam Tassinari; da Espanha: Marisol Filgueira; dos Estados Unidos: Sallyann Roth e Richard Chasin; da Argentina: Carlos Calvente, e da Alemanha, o organizador e autor, Klaus Jensen. Não se trata de um livro recém-publicado, mas, como dificilmente algum leitor desta resenha irá procurá-lo, vale como notícia.

Não vamos comentar com detalhe os trabalhos dos brasileiros que fazem parte do livro. Todos eles, talvez exatamente iguais, ou com pequenas modificações acham-se publicados em português e até já foram resenhados em alguma publicação por aqui. O mesmo ocorre com Calvente, bastante presente entre nós e sobejamente conhecido pelos psicodramatistas brasileiros. Fonseca fala de suas marcas registradas, a “psicoterapia da relação” e “psicodrama interno”, fazendo antes um grande apanhado de sua forma de ver o psicodrama, contando trechos de sua evolução profissional. Moysés brinda os alemães que vão ler (ou já leram) esse livro, com um brilhante relato da “passagem” do teatro espontâneo para a terapia de grupo psicodramática. Faz um “inventário” provisório das alternativas do movimento psicodramático e do teatro espontâneo. Maria Amália traz o psicodrama com genograma na terapia de casal; mostra como a dramatização de aspectos definidos dos genogramas: os genodramas, podem enriquecer o sociodrama familiar e, a partir dele, o sociodrama do casal. Miriam Tassinari trabalha com crianças, como todos sabem. Conta como caminhou da informação psicanalítica inicial (que era a mais abundante em seus começos) para a postura atual, psicodramática. Não exclui os pais, que também são trabalhados dramaticamente, quando necessário, e refere como a sua vivência de atuar papéis permite com facilidade trabalhar com leveza e alegria, ao que as crianças respondem com fantasia e participação genuína. Calvente oferece uma interessante discussão e descrição de um trabalho clínico, a partir de considerações sobre narcisismo, via Kohut. Traz um interessante caso de “transtorno narcisístico” para cujo tratamento, que relata em seu capítulo, utilizou formas advindas de suas duas origens: psicanálise e psicodrama. É um pouco frustrante para mim, relatar de forma tão abreviada (tão injusta?) escritos tão interessantes. Marisol Filgueira Bouza faz um longo relato de sua forma de ver o trabalho com psicodrama. Fala das indicações que aceita, e aí exclui psicopatas, pessoas com personalidades histriônicas e grandes depressivos. Fala da utilização institucional, quando raciocina sobre como a saída de pacientes pode ser dolorosa para o grupo que fica, deve-se atentar para o efeito dessa perda de companheiros e avaliar as vantagens ou prejuízos antes de iniciar essa prática. Fala de psicodrama focal, quando faz no máximo três sessões; trabalha sobre um problema concreto, que “pode estar bloqueando” uma melhora clínica. Entretanto, não para aí o tratamento. Continua, já com outra abordagem, não psicodramática. Fala também em terapia para perdas pesadas (morte, trauma, separação etc.) Nesse momento, faz uma pequena digressão teórica sobre o assunto. Lembra que Freud dizia que entre melancolia e reação a perdas pesadas há muito poucas diferenças. Entretanto, propõe um trabalho psicodramático que se orienta em três fases: reconstituir o passado, revendo as relações e vínculos que se perderam; o presente, com suas atuais dificuldades e sofrimentos e, por fim, o futuro, quando tenta fazê-lo presente, lidando com o ambiente atual e os novos vínculos que podem vir a ser criados. Descreve resumidamente alguns casos clínicos, dividindo-os entre os bem e os malsucedidos, discutindo sua evolução. Klaus Jensen, o organizador deste livro, escreve um longo e interessante artigo. De início traz uma instigante citação de Confúcio: “Conte-me e eu esqueço; mostre-me e eu me recordo; deixe-me fazer e eu entenderei”. Para ele, o trabalho psicodramático individual está para se estabelecer, e este é seu tema neste livro. Os artigos selecionados por ele abordam o trabalho psicoterápico individual (ou em pequeno grupo familiar ou conjugal). O mesmo é tratado pelos autores. Entre grande número de interessantes comentários e citações (refere ideias de Yalom, Zerka, Winnicott, Moreno e outros), fala de pesquisas modernas de neurofisiologia que provaram que através de ver e atuar as imagens pessoais, novas sinapses são facilitadas. Refere grande número de trabalhos psicodramáticos em psicoterapia, supervisão, treinamento e aconselhamento. Trabalha principalmente com objetos como símbolos. Situa o valor de objetos evocativos que levam a possibilitar uma sensação de permanência; relações podem se apresentar visíveis; ideias e sentimentos podem revelar-se visualmente. Dificilmente podem ser disfarçadas emoções na relação com objetos significativos. Discute antigos objetos familiares e seu significado: a animação de objetos sem vida pode fazer com que lados “rachados-quebrados” do paciente sejam contactados e reintegrados. Citando Freud, diz que a utilização de símbolos reduz angústia e censura. Sallyann Roth e Richard Chasin falam de terapia de casal. De início, dizem que vivemos um “pequeno tempo” e um futuro sem perspectiva, que nos distanciam dos frutos da verdadeira criatividade, e não conseguimos entrar num diálogo criativo com o parceiro. Quando pares se encontram numa situação sem saída, suas histórias se tornam histórias de limites de antigas relações. Como poderia o tal diálogo criativo substituir uma história rotineira (e sem esperanças)? Propõem um modelo de trabalho que pode ser usado no início ou durante a terapia de casal. Numa entrevista estruturada, cada um dos membros apresenta uma série de dramatizações (que serão registradas). Algumas devem evitar lembranças e conteúdos, enquanto outras deverão revisitar lembranças e fantasias. Todas serão representadas pelo parceiro (não pelo produtor). Há uma ordem: primeiramente sonhos individuais sobre o futuro do par; a seguir cenas do passado: uma cena dolorosa da infância ou da família de origem. O companheiro refaz as cenas: como elas deveriam ter sido (ou deveriam ser). A indicação é feita para casais com longas dificuldades que querem trabalhar juntos e, no geral, são abertos para coisas importantes. Não se indica quando parece haver uma grande decepção com o parceiro, quando não há engajamento de um dos dois, quando há uma doença grave ou quando há notícia de caso extraconjugal. O artigo é grande, e há relato detalhado da prática, que não cabe aqui.

 

 

Endereço para correspondência Rua Hawai, 78 CEP 13090-653, São Paulo SP e-mail: daimon.cer@uol.com.br

 

1 Médico (Fac. de Medicina da USP); doutor em Medicina (Psiquiatria) pela Universidade de Heidelberg (Alemanha); psicodramatista (SOPSP)