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Revista Brasileira de Psicodrama

versão On-line ISSN 2318-0498

Rev. bras. psicodrama vol.20 no.1 São Paulo jun. 2012

 

Notas Bio-Bibliográfica

Bio-bibliographical notes

 

Carmen Lenci Lamas

 

 

Ana Maria Tarabai

Psicóloga e psicanalista pela Universidade de São Paulo (USP), especialista em clínica de crianças pelo Instituto Sedes Sapientiae, psicodramatista pelo Instituto de Psicodrama de La Plata – Dr. Dalmiro Bustos, sócia fundadora da Sociedade de Psicodrama de São Paulo (SOPSP)

Endereço para correspondência

 

Ontem estive em seu consultório, sua sala, seus objetos, seus vasos, você estava em tudo e não estava mais... os "banquinhos" de nossa primeira sala de psicodrama – 1970 – ainda estão intactos. A lembrança de sua voz, seus gestos, a forma amorosa de nos abraçar passaram como imagens coloridas, porque você era colorida. Que saudade! Você está dentro de nós... você faz muita falta.

Carmen, uma de nossas amigas, Regina, procurou o significado de seu nome, e o que encontramos é você, tudo combina com você: "Carmen, poema, poesia, versos. Mulher que persegue com dedicação e doçura seus elevados ideais. Mulher de muita energia, que dificilmente desiste de algo que tenha começado. Mulher que vive tudo com muita paixão!"

Desde nosso primeiro encontro como profissionais, na Clínica do Sedes, onde fui buscar o conhecimento de psicologia clínica de crianças, sabia que seríamos amigas, e assim o foi, irmãs sempre fomos e seremos. Saí da USP, formada em Psicologia em 1961, e para o Sedes fui em 1965, pelas mãos de Vera K, que foi minha caloura na USP e me convidou para um grupo de ludoterapia, que dirigia no Sedes. Acompanhei esse grupo e a conheci – Carmen – a grande e querida aquisição, amiga para a vida.

Você, coordenadora da equipe à qual pertenci na Psicologia de Crianças, recebeu as "estrangeiras", eu da USP e outras duas mineiras, com o maior afeto, com sua alegria, firmeza, exemplo de simplicidade e ética. Formamos um time, durante dois anos, sob a firme batuta de Madre Cristina.

Crescemos juntas profissionalmente, na formação psicodramática com os argentinos, na psicanálise infantil com o Di Loreto, nosso amado amigo e mestre, e assim continuamos com Dalmiro Bustos e outros. Sempre juntas na vida e na profissão, com consultório desde 1970; uma colcha de retalhos, consistente, de sabedoria, aprendizagem e muitas alegrias.

Você sempre foi uma pedra firme, circular, multifacetada, com as mil cores da força e do amor. Os "palavrões" saiam engraçados, como música de sua boca, na hora certa, com uma "ironia" rica e delicada.

Comprometida com sua família, seus netos, seus filhos e seus amigos, sua dedicação foi enérgica e doce. Protetora e cheia de amor, as noras eram suas filhas e ainda o são. Perderam uma mãe, nós perdemos a grande amiga-irmã. Ainda estamos vivendo o luto.

Tivemos filhos na mesma época, vivemos festas, viagens, momentos intensos de alegria, tanto com os filhos como só nós, os adultos, "milhões de amigos".

E os carnavais, as fantasias, Caçapava, nossos sítios, abrigo de quem chegasse... A confecção das fantasias era uma farra, na fazenda da Helenita, para todos, crianças e adultos. As saídas nos blocos de rua da cidade, saudosas emoções. Fomos "festeiras"... inesquecível sua fantasia de uma festa da Maria, no nosso consultório "A dialética da moral" – o bem e o mal. Era uma roupa preta, justa de "puta", meias rendadas, salto alto, piteira, "asas de anjo" e coroa de "santa". Aliás, as asas feitas pelo seu filho, Alexandre. Um de nossos amigos brincava que você "tinha cara de puta" e alma de "santa", esse era o Márcio. E outro amigo, o Fernando que lhe deu uma placa de rua gravada "Carmen – Mulher de Verdade".

Claro, a vida não é para amador, houve momentos muito difíceis, mais tristes, depressivos mesmo.

Nos últimos anos, você se recolheu muito, passava horas noturnas fazendo lindo artesanato, só saindo para o trabalho ou para o sítio, com os netos. Às vezes, Leila e eu conseguíamos arrancá-la para um cinema ou um café. Então, era bom, sentíamos que o seu brilho existia dentro de você, e seu jeito maroto de dizer as verdades. Minha casa, porta aberta e de passagem, era por vezes local de encontro, às quintas-feiras para um jantarzinho, desculpa para longas conversas, você, eu e Luiz, nosso sempre presente amigo, irmão, clínico. Quantas lembranças...

Aí veio o turbilhão, o tsunami e o sofrimento de seis meses. O duro é que não havia luz no fim do túnel, mas tentávamos acompanhá-la de perto, passar a "esperança" que não tínhamos, mas inventávamos, esse era nosso papel, continuarmos unidas e próximas, carinhosas, Naísa, Silvia, Vívian, Mírian e todos os já citados e muitos mais.

A última "festa", reunião pelos seus 68 anos, foi um encontro muito bom. Fizemos com sua autorização a reunião de amigos queridos. Cada qual foi com um prato de carinho e doces, uma garrafa de amor e vinho. Tudo saiu bem, era um domingo de sol. Você estava feliz, firme ao lado de Cristina, sua primeira neta, "única filha mulher", queridíssima, seu xodó, já que você só teve irmãos homens, filhos homens e todos os outros netos homens. Todos amadíssimos e carinhosos, como você – são meus queridos sobrinhos Alexandre, André e Guilherme.

Carmen, continue linda e em paz, como na nossa lembrança, de imagem doce, de beleza infinita. Você deixou rastros, teve "um caso de amor com a vida", isso nos inclui a todos, com muito orgulho. Obrigada por você ter existido.

 

 

Endereço para correspondência
Ana Maria Tarabai

Rua Bandeira Paulista, 192 ap. 142
São Paulo, SP

e-mail: ana.tarabay@hotmail.com