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Revista Brasileira de Psicodrama

versão On-line ISSN 2318-0498

Rev. bras. psicodrama vol.21 no.2 São Paulo  2013

 

COMUNICAÇÕES BREVES
Brief Communications

 

 

Psicodrama na supervisão de alunos em formação – impacto na aplicação de intervenções verbais e dramatização na aprendizagem1

 

Psychodrama in the supervision of trainees – the impact of verbal interventions and dramatization on learning

 

 

Krall HannesI; Jutta FürstII

IProfessor do Instituto de Ciências da Educação e Pesquisa da Universidade de Klagenfurt (Áustria), pedagogo, psicólogo, psicoterapeuta, supervisor e docente da Sociedade Austríaca de Dinâmicas de Grupo e Terapia de Grupo. Docente da Universidade de Innsbruck (Áustria) e coordenador do Comitê de Pesquisa da Federação das Organizações Europeias de Formação em Psicodrama (FEPTO).
II
Psicóloga, psicoterapeuta, docente e supervisora de Psicodrama. Diretora científica do Programa de Formação em Psicoterapia Psicodramática na Universidade de Innsbruck (Áustria).

Endereço para Correspondência

 

 


RESUMO

Neste artigo, uma reflexão sistemática sobre a supervisão na formação do psicodramatista esclarece, na perspectiva dos alunos, se os objetivos são cumpridos, quais os métodos mais úteis e a diferença entre a reflexão verbal e os métodos de ação. O intuito é o de investigar se a reflexão verbal e a dramatização na supervisão: (1) levam a um resultado melhor; (2) ajudam a reduzir o sofrimento causado por desafios na prática; e (3) se a dramatização leva à melhor transposição para a prática do que apenas a reflexão verbal.

Palavras-chave: Supervisão. Formação. Psicodrama. Técnicas de ação. Intervenções verbais.


ABSTRACT

In this article a systematic reflection on supervision in psychodrama training will give insight to the perspectives of the trainees how well the objectives in supervision are met, what supervisory methods have been helpful, and the difference between verbal reflection in comparison with reflection based on action methods. Therefore, the goals of the current study is to investigate whether verbal reflection and dramatization in supervision leads (1) to a better outcome regarding the objectives, (2) helps reducing distress of trainees caused by challenges in their practice, and (3) whether dramatization leads to a better transfer into practice than only verbal reflection.

Keywords: Supervision. Training. Psychodrama. Action techniques. Verbal interventions.


 

 

INTRODUÇÃO

Apesar da longa tradição da supervisão na formação de psicoterapeutas, ainda há dúvidas se ela provoca mudanças nos supervisionandos ou se contribui para um efeito positivo nos clientes (Strauss , Wheeler , Nodop, 2010). Na última década, muito esforço foi feito para sanar essas dúvidas, mas ainda é maior o número de artigos teóricos do que os baseados em pesquisas (Inman , Ladany , 2008). Há amplo consenso de que "... o objetivo principal da supervisão é promover o desenvolvimento profissional do supervisando (função de apoio e ensino) e assegurar o bem-estar do cliente" (Bernard , Goodyear , 2009, p. 12). Para avaliar esses efeitos, os objetivos devem ser operacionalizados. Os estudos existentes concentram-se no "efeito positivo geral da supervisão" ou em diferentes aspectos dos objetivos da supervisão como competências e habilidades, conhecimento teórico, desenvolvimento pessoal e aspectos relacionais e de fortalecimento. A Sociedade Alemã de Supervisão solicitou uma revisão sistemática de 58 estudos científicos e avaliações de supervisão realizados na Alemanha entre 1989 e 2008 (Hausinger , 2008). Treze desses estudos referem-se ao campo da Psiquiatria, da Psicoterapia, do aconselhamento e do serviço social. A maioria deles concentra-se no benefício geral da supervisão, na perspectiva dos supervisionandos, e sugere um efeito positivo (por exemplo, Petitjean , 2005; Orth , Siegele , 2006; Gottfried , Petitjean , Petzold , 2003).

O efeito da supervisão foi revisto em metanálise por Wheeler e Richards (2007). A maioria dos participantes dos estudos era composta por estagiários em programas de Psicoterapia. Nove, dos 25 estudos, trataram do desenvolvimento de competências, dos efeitos sobre a autoeficácia (7), o autoconhecimento (3) e sobre a transposição da teoria para a prática. O resultado sugere que há um efeito positivo na autoeficácia e na autorreflexão, observando-se que parte dos outros estudos eram muito limitados por problemas metodológicos.

Considerando os vários objetivos da supervisão, como aprofundar o conhecimento teórico e desenvolver competências técnicas (Hess, 2008), refletir sobre transposição e contratransferência, "ajudar no movimento do supervisionando para sua identidade profissional" (Lerner , 2008) e ajudar a melhorar o estilo de interação do supervisionando, a supervisão também deveria reduzir o sofrimento causado pelo confronto com casos difíceis. Deve ser também de grande interesse para os institutos de formação e para os empregadores identificar se a supervisão contribui para reduzir o sofrimento de supervisionandos e profissionais sobrecarregados pelo trabalho psicoterápico. Infelizmente, não há muitos estudos voltados para a redução do sofrimento. Eichert (2005) descobriu, por meio de questionários para 110 supervisionandos de enfermaria de psiquiatria, que 49,6% deles conseguiram um controle muito maior sobre o desconforto profissional. A redução do sofrimento pela supervisão também é relatada por Oeltze, Ebert e Petzold (2009), que avaliaram os supervisionandos com questionários padronizados. Um percentual de 88,1 deles consideram a supervisão útil para reduzir sua angústia. Nenhum desses estudos examinou o efeito de um método específico em relação ao efeito relatado.

Outra questão importante é a transposição da supervisão para a prática. Temos pouca informação sobre quais fatores são úteis nesse processo. Quatro estudos da metanálise realizada por Wheeler e Richards (2007) focaram a transposição da supervisão para a terapia. Cada um deles escolheu fatores diferentes dos demais. Guest e Beutler (1988, cit. in Wheeler, Richards, 2007) examinaram a relação entre mudanças na orientação teórica de supervisionandos e supervisores. Milne, Pilkington, Gracie, e James (2003, cit. in Wheeler, Richards, 2007) investigaram a transposição de temas da supervisão para a terapia. Patton e Kivlighan (1997, cit. in Wheeler, Richards, 2007) avaliaram a percepção da aliança na supervisão e no aconselhamento. Steinhelber, Patterson, Cliffe e LeGoullon (1984) focaram a congruência da orientação teórica entre supervisionado e supervisor e o efeito na mudança dos clientes. Goetz- Kluth e Dettmer (2006) examinaram 162 supervisionandos através de métodos quantitativos e qualitativos (questionários padronizados e entrevistas estruturadas) perguntando como avaliam a supervisão em relação à transposição da teoria para a prática: 38,1% consideraram a supervisão muito útil, 34,4% bastante útil, enquanto 25,6% não a consideraram nem útil nem prejudicial e 1,9%, prejudicial. Não foi encontrada nenhuma pesquisa que compare o efeito de métodos verbais e de ação na transposição da supervisão para a prática.

Em relação aos aspectos úteis da supervisão em relação ao método utilizado, há ainda menos estudos.

Milne, Sheikh, Pattison e Wilkinson (2011) revisaram 11 estudos controlados de forma sistemática para saber mais sobre os elementos de desenvolvimento do supervisor que deveriam ser identificados, a fim de conhecer e especificar direções de pesquisa relacionadas à formação de supervisores. Esses estudos ajudam também a saber quais métodos ou "atividades educacionais" são usados na supervisão. Os resultados mostram que "a atividade educacional mais ensinada na supervisão foi feedback, citado em todos os 11 estudos" (p. 9). Na sequência, são citadas: definição de agenda – incluindo definição de metas –, avaliação das necessidades educacionais, avaliação, modelagem, observação, sugestões e manejo do tempo, classificado na terceira posição. Ensinar e role-play educacional' foram citados duas vezes. Outras atividades, como ensaio comportamental, discussão, sessões de perguntas e respostas, apoio, solução de problemas, justificar e promover generalização, foram mencionadas uma vez. Nos estudos revisados, foi utilizada uma mistura de métodos, de 4 a 5 em média. A mistura de métodos torna difícil identificar que atividade de supervisão gerou determinado efeito. Nenhum estudo sobre o efeito da dramatização em comparação aos métodos verbais foi encontrado.

Dramatização é uma atividade frequentemente utilizada na supervisão psicodramática. Inclui várias técnicas de ação como a reencenação de uma cena terapêutica, role-play, inversão de papéis, entre o papel do terapeuta e o do cliente, espelhamento (que permite ao supervisionando perceber determinada constelação relacional e interação sob uma perspectiva externa) e escultura (o supervisionando cria uma imagem visível de uma relação ou processo) (Buer , 2001; Chesner , 2007; Krall , Fürst , Fontaine , 2013).

Ainda em 1992, Putney, Worthington e McCullough apontaram que havia poucos estudos com foco no impacto de diferentes orientações teóricas do supervisor. A terapia cognitivo-comportamental e a abordagem psicodinâmica foram comparadas em estudo de Ögren e Sundin (2009). Eles investigaram a percepção de supervisores e supervisionandos de como o grupo (como uma ferramenta) foi usado para apoiar o processo de supervisão e não encontrou diferenças entre as duas abordagens. "Independentemente da abordagem, a supervisão em grupo, no geral, havia sido percebida como tendo o caráter de ‘supervisão individual em formato de grupo’" (p. 132). Embora o estudo sugira que não há muita diferença entre a supervisão em grupo e a individual, nessas duas abordagens, o impacto do grupo no Psicodrama pode ser completamente diferente.

Milne, Sheikh, Pattison e Wilkinson (2011, p. 13) investigaram quais elementos da supervisão foram eficazes e relataram todas as limitações: "... há uma sugestão de que apenas feedback, role-play educacional e modelagem (ao vivo ou por demonstração em vídeo) devem ser considerados provisoriamente como métodos de apoio." Esses resultados podem revelar que o role-play poderia ser visto como um aspecto útil na supervisão. No entanto, isso não significa que, em geral, a dramatização é útil na supervisão. Para que técnicas de ação sejam parte essencial da supervisão no Psicodrama, é fundamental investigar os efeitos dessas técnicas.

 

SUPERVISÃO DA PRÁTICA DO PSICODRAMA

Psicoterapia psicodramática é complexa, sendo, portanto, supervisionada em diferentes níveis. O supervisionando deve estar ciente de como se relaciona com o cliente e de como estabelece uma relação de trabalho. A ampla base de conhecimento e experiência técnicometodológica é de grande importância também. A sessão de supervisão que se segue pode ilustrar a complexidade decorrente da aplicação de técnicas verbais e dramatização.

O supervisionando – chamado David nesta vinheta – é um psicoterapeuta que conduz um grupo de Psicodrama. Nessa supervisão, traz a dificuldade em trabalhar com uma cliente deprimida. Tudo o que propôs não atende às necessidades dela. Fica preso e não sabe como continuar com ela no grupo. Ouvindo o caso, os colegas fazem uma associação entreessa mulher deprimida e um pássaro com as asas quebradas. O supervisor sugere a David assumir o papel dessa ave e o entrevista sobre como se sente por estar assim e do que precisa. David – a partir da perspectiva da ave – responde que não sabe se poderá voar novamente porque se sente ferida.

Como terapeuta, David fica preso com essa cliente. No papel do "pássaro ferido" David está dizendo em um solilóquio: "Estou sozinho e assustado nesse papel e não sei o que fazer. Sinto-me impotente."

Em seguida, o supervisor pergunta a David, no papel da ave, se há algo em torno. David descobre um velho simpático que está passando. Escolhe Frederick – um colega no grupo de supervisão – para ser esse velho amigável. Nesse papel, Frederick olha para o pássaro, fala com ele e cuida dele. O supervisor pede a David para tomar o papel do velho. Nesse papel, coloca o pássaro em uma caixa aberta e leva-o a um médico onde as asas são tratadas. No papel do pássaro sente-se melhor e calmo porque sabe que será capaz de voar novamente. Também sabe que o velho vai cuidar dele.

O supervisor pede a David para escolher alguém no grupo para ser um duplo do pássaro nessa cena. David se afasta e olha para o pássaro de uma posição de espelhamento. De repente, lembrase de que estava sempre atento às expectativas de seus pais, às quais não conseguia atender. Compartilha essa experiência com o grupo de supervisão e fala sobre como é não ser capaz de cumprir as expectativas colocadas sobre ele. Ficou preso de uma maneira similar como terapeuta no grupo, quando não foi capaz de atender às expectativas da sua cliente.

Esse pequeno exemplo ilustra a complexidade do trabalho de supervisão com diferentes intervenções psicodramáticas (por exemplo, inversão de papéis, solilóquio e espelhamento). Um fator impeditivo para o terapeuta continuar com sua cliente parece ter sido desencadeado pelo fato de que a interação terapêutica evocou sentimentos da biografia dele como criança. A encenação de uma metáfora, que era uma associação do grupo de supervisão sobre a Psicoterapia com um paciente deprimido, levou o terapeuta a uma reflexão biográfica sobre a relação com seus pais no passado. Na supervisão, essas conexões podem se tornar visíveis e um ponto de partida para recuperar a criatividade e a flexibilidade no papel de terapeuta.

Na supervisão psicodramática há muitas abordagens diferentes para refletir sobre as práticas psicoterapêuticas. Portanto, um procedimento comum para avaliar essas intervenções não é facil. O exemplo de reflexão sistemática sobre a supervisão na formação de psicodrama, a seguir, vai propor algumas possibilidades para avaliar o resultado da supervisão e investigar os aspectos úteis na aprendizagem com a prática.

 

EFEITOS DA SUPERVISÃO PSICODRAMÁTICA

OS PARTICIPANTES E O MÉTODO

Supervisores e supervisionandos de diferentes grupos e países participaram deste estudo. Três grupos da Áustria, 1 da Alemanha, 1 de Portugal e outro da Grécia. Sete supervisores (3 homens e 4 mulheres), em 6 grupos (um grupo de supervisão foi liderado por uma mulher e um coorientador homem), realizaram as sessões de supervisão. Oitenta e cinco supervisionandos (20% do sexo masculino/80% feminino) responderam aos questionários após cada sessão. Como alguns participaram regularmente das sessões, enquanto outros apenas uma ou duas vezes, houve uma variação de 1 a 14 questionários devolvidos por cada um (média 3,6; DP 3,1).

Todas as sessões de supervisão foram realizadas com grupos de alunos em formação e profissionais psicodramatistas. Os feedbacks foram coletados após cada sessão. A maioria dos casos supervisionados (n = 302) refere-se a uma configuração psicoterapêutica diádica (51,7%) ou Psicoterapia de grupo (41,3%). Alguns referem-se a terapia familiar (3,5%), terapia de casal (0,3%) e houve algumas sessões de supervisão com questões gerais (3,1%).

Os supervisionandos preencheram um questionário depois de cada sessão, no qual podiam reportar quanto atingiram os objetivos na supervisão e quais os aspectos metodológicos úteis. Finalmente, deram um feedback relativo ao grau com que podiam aplicar o que ganharam na supervisão em sua prática psicodramática.

Sobre os objetivos e os aspectos úteis, puderam indicar quanto concordam com certas declarações. Responderam em uma escala de sete pontos (1 = muito baixo; 7 = muito forte). Respostas relativas a objetivos gerais (por exemplo, "Eu me sinto pessoalmente fortalecido pela supervisão") e objetivos específicos (por exemplo, "Eu compreedo melhor os aspectos psicossociais dos clientes", "Pude aprofundar o meu conhecimento teórico"). Da mesma forma, puderam avaliar quais as abordagens verbais úteis (por exemplo, "para contar e analisar o caso", "associações a um caso" etc.) e que métodos de dramatização/sociometria foram úteis (por exemplo, "preparando o palco/uma constelação sociométrica", "inversão de papéis/um novo papel em uma cena").

No questionário, foram convidados a se referir ao próprio caso ou a escolher um significativo de outro participante do grupo. Além disso, falaram sobre a configuração da prática supervisionada (configuração do grupo, trabalho individual, familiar etc.) e o tempo gasto no caso. Relataram também se a supervisão foi apenas verbal ou se houve dramatização ou atividades sociométricas.

As respostas dos questionários (n = 302) referem-se a supervisão apenas com métodos verbais (n = 63) ou com dramatização (n = 237; 2 casos não relataram qual foi o método utilizado). Em média, o tempo gasto em cada caso é diferente, dependendo do método. Em geral, a dramatização exige mais tempo que a supervisão apenas verbal.

 

 

OS RESULTADOS

OBJETIVOS ALCANÇADOS NA SUPERVISÃO

Hipótese 1: A dramatização leva a um melhor cumprimento das metas na supervisão

Dramatização e reflexão verbal levam a melhores resultados na supervisão. Supervisionandos alcançam melhor os objetivos da supervisão em comparação com os casos em supervisão apenas verbal. No entanto, a diferença é menor do que os autores esperavam.

Os 4 grupos têm um perfil semelhante quanto aos objetivos alcançados. Em todos eles, a supervisão é vista como muito útil, fotalecendo pessoalmente os supervisionandos (entre 5 e 6 em escala de 7 pontos). Os padrões de resposta mostram que "aprofundar o conhecimento teórico com base no caso supervisionado" está entre os níveis médio e alto nos vários grupos. Melhorar "Métodos, técnicas e intervenções" está ligeiramente inferior, mas ainda na faixa entre média e alta, exceto no grupo português.

 

 

Todas as pontuações relativas a diferentes objetivos estão fortemente correlacionadas. Com todos os escores em relação aos diferentes objetivos (exceto processos e dinâmicas em grupo terapêutico) uma escala de "objetivos cumpridos na supervisão" pode ser computada (α=.824; 6 itens; M=5,39; DP=1,097).

Em geral, a supervisão com dramatização (M = 5,47; DP = 1,044; n = 237) atinge os objetivos em nível um pouco mais elevado do que apenas com a aplicação de técnicas verbais (M = 5,10; DP = 1258; n = 63). Embora as diferenças não sejam tão grandes, são estatisticamente significativas (teste t independente: t = 2,073; gl = 298; p = 0,041; variâncias desiguais).

REDUÇÃO DA ANGÚSTIA

Hipótese 2: A dramatização reduz mais efetivamente a angústia de supervisionandos

Supervisionandos experimentam angústia quando trabalham com clientes em sua prática. Para todos (n = 189) que trouxeram um caso próprio para a supervisão, observou-se uma redução significativa do sofrimento (M = 2,20; amostras pareadas teste t: t = 21.883, gl = 188; p <. 001).

No entanto, não há diferença significativa entre os casos supervisionados apenas verbalmente e aqueles com dramatização. Desse modo, a hipótese acima não é confirmada pelas avaliações em nossa amostra. Embora não haja uma redução significativa do sofrimento através de supervisão, nenhuma diferença pode ser encontrada na comparação entre os métodos verbais e a dramatização.

TRANSPOSIÇÃO DA APRENDIZAGEM NA SUPERVIS ÃO PARA A PRÁTICA

Hipótese 3: A dramatização leva a uma melhor transposição para a prática psicodramática

Supervisionandos (n = 181) relatam que transferem sua experiência de aprendizagem na supervisão de seu próprio caso para a prática psicodramática. Em relação à afirmação "No meu trabalho psicoterapêutico posso aplicar o que eu ganhei na supervisão", eles confirmam um nível muito elevado (M = 6,06; DP = 1,168).

Dramatização e reflexão verbal na supervisão resultam em melhor transposição de aprendizagem para a prática psicodramática. Os casos em que foram utilizados técnicas verbais e métodos de dramatização (n = 128; M = 6,27; DP = 0,808) foram significativamente mais bem classificados do que aqueles apenas com técnicas verbais (n = 53; M = 5,55; DP = 1,659; teste t independente: gl = 62,48; t = 3.008; p = 0,004; variâncias desiguais).

ASPECTOS ÚTEIS NA SUPERVISÃO

Dependendo do método de supervisão (apenas verbal ou com dramatização), observam-se algumas diferenças no que foi útil, o que aponta para um foco diferente na supervisão.

Os resultados mostram que o aspecto mais útil na supervisão é o feedback do supervisor tanto com um caso supervisionado verbalmente quanto com dramatização/trabalho sociométrico.

Com dramatização ou métodos sociométricos, as técnicas verbais são menos importantes como um aspecto útil. É óbvio que a dramatização muda o foco do supervisor para uma análise mais experiencial do trabalho do supervisionando. A dramatização também coloca mais ênfase na reflexão de metáforas, imagens e símbolos. Os resultados indicam que a reflexão de metáforas, imagens ou símbolos é mais bem classificada como um aspecto útil (t = 2,467; gl = 86,3; p = 0,016) com a aplicação de técnicas verbais e dramatizações.

Além disso, a supervisão que inclui formas de dramatização aumenta a reflexão de questões pessoais e biográficas implicadas ou estimuladas pela prática psicodramática com os clientes. A questão do envolvimento pessoal do supervisionando refere-se ao fato de que seu trabalho psicoterapêutico com clientes muitas vezes evoca certos pensamentos e sentimentos que estão relacionados com a sua biografia. Em geral, supervisionandos que refletem sobre o seu caso (n = 190) reportam que a reflexão sobre seu envolvimento é útil em um nível médio (M = 4,06; DP = 1,98).

No entanto, se a comparação for entre abordagens apenas verbais e as que incluem métodos de ação e dramatização, observa-se uma diferença significativa. A aplicação de técnicas verbais e dramatizações passa a avaliação da reflexão pessoal e biográfica para um nível superior (n = 133; M = 4,41; DP = 1,86). Se forem usadas apenas técnicas verbais, a reflexão biográfica, como um fator útil, é avaliada significativamente em nível inferior (n = 57; M = 3,25; DP=2,02; teste t independente: t = 3,835; gl = 188; p <.001).

Quando a dramatização é aplicada, o supervisionando fica obviamente mais envolvido na reflexão pessoal e biográfica, o que leva a uma classificação superior e mais frequente desse aspecto como um fator útil (t = 3,835; gl = 188; p <.001).

A dramatização é associada com níveis superiores de reflexão sobre questões pessoais e biográficas. A supervisão com dramatização favorece essas reflexões em questões envolvidas ou estimuladas pela prática psicodramática.

 

DISCUSSÃO

Este estudo examina como supervisandos avaliam o efeito da dramatização na supervisão. O cumprimento das metas propostas foi um dos aspectos investigados. Os objetivos foram atingidos em um nível um pouco mais elevado quando os métodos de ação foram utilizados, em contraposição a técnicas verbais, em todos os grupos (Áustria, Alemanha, Grécia e Portugal). Os resultados estão de acordo com estudos anteriores de Krall e Fürst (2011, 2013).

Os resultados exigem uma explicação. Tem de ser levado em conta que os supervisionandos que receberam formação em Psicodrama podem se sentir mais atraídos por métodos de ação do que aqueles de outras abordagens, pois escolheram um método psicoterapêutico que inclui técnicas de ação. A atitude positiva em relação à dramatização influencia a avaliação da supervisão que inclui técnicas de ação. Além disso, Milne, Sheikh, Pattison, e Wilkinson (2011) relataram em outros estudos que o role-play pode ser eficaz na supervisão, independentemente do treinamento básico do supervisionando. Esses resultados sugerem que pode haver um efeito dos métodos de ação, mesmo sem uma atitude positiva em relação à abordagem. Ainda são necessárias mais pesquisas para obter esclarecimentos.

Deve-se notar que a utilização de técnicas de ação incluem também atividades verbais. O supervisor faz perguntas, explica as técnicas, dá instruções a respeito da encenação, faz resumos e dá feedback. Também os supervisandos no grupo contribuem verbalmente com o caso. Às vezes, pode ser difícil distinguir entre a influência de técnicas verbais puras e as de ação que incluem a reflexão verbal.

Os resultados do estudo sugerem que a supervisão reduz o sofrimento e o fardo profissional significativamente. Parece ser um efeito que também é relatado em outros estudos (Oeltze , Ebert & Petzold , 2009; Eichert , 2005) e observado em supervisão verbal ou com técnicas de ação. Os efeitos podem decorrer do compartilhamento de experiências ou do sentimento de ser compreendido pelo supervisor e pelos colegas. Eles também podem ser causados pelo insight ou metaperspectiva que os supervisandos obtém durante o processo de supervisão. É um resultado interessante considerar que a carga emocional provocada pelo trabalho terapêutico é elevada, mas não demasiadamente elevada, e pode ser reduzida pela supervisão. Os resultados mostram que o sofrimento dos supervisandos em todos os países é reduzido pela supervisão.

Em relação à terceira pergunta (se dramatização leva à melhor transposição de aprendizagem para a prática do que os métodos verbais), os resultados sugerem que sim.

Os supervisionandos foram questionados se poderiam aplicar o que ganharam na supervisão em sua prática. No Psicodrama, determinadas cenas terapêuticas desafiadoras podem ser reencenadas. Pensamentos e sentimentos podem ser explorados por inversão de papéis com todas as partes envolvidas. Assim, o supervisionando ganha uma imagem clara do que está acontecendo e do que tem de fazer a seguir. Também pode ser que as imagens sejam mais fáceis de lembrar do que as sentenças e condensem muito mais informações do que frases verbais.

Nesse estudo, supervisionandos e supervisor tiveram a mesma orientação teórica e estavam familiarizados com os métodos de ação. Os resultados também podem ser vistos como um efeito de congruência na orientação teórica. Steinhelber, Patterson, Cliffe e Legoullon (1984) descobriram que a congruência entre supervisor e supervisionando quanto à orientação teórica foi relacionada à mudança dos pacientes quando a quantidade de supervisão foi baixa.

A Psicoterapia é um processo relacional entre o cliente e o terapeuta. A dramatização ajuda a desenvolver uma imagem mais clara dessa relação, não só cognitiva, mas também emocional e fisicamente. Experiências de estar no papel do cliente e se sentir como ele permitem que os supervisionandos identifiquem seu envolvimento pessoal biográfico e encontrem soluções por si mesmos.

Os resultados sugerem, considerando todas as limitações, que técnicas de dramatização e de ação como as que são usadas na supervisão psicodramática podem ter uma vantagem no cumprimento dos objetivos gerais em matéria de supervisão. Parecem aumentar ainda mais a transposição da supervisão para a prática, em comparação com as técnicas verbais puras.

 

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Endereço para correspondência
Krall Hannes
Instituto de Ciências e Pesquisa da Educação (IfEB)
Alpen-Adria-Universität Klagenfurt | Wien | Graz
Universitaetsstr. 65-67
A-9020 Klagenfurt - Áustria
E-mail: hannes.krall@aau.at

Jutta Fürst
Salvatorgasse 2a
A-6060 Municipal - Áustria
E-mail: jutta.fuerst@uibk.ac.at

Recebido: 19/7/2013
Aceito: 25/10/2013

 

 

NOTA:

1. Excepcionalmente, em virtude do teor da pesquisa multicultural, este texto foi publicado com número maior de páginas, que o usual.