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Revista Brasileira de Psicodrama

Print version ISSN 0104-5393On-line version ISSN 2318-0498

Rev. bras. psicodrama vol.24 no.1 São Paulo June 2016

http://dx.doi.org/10.15329/0104-5393.20160003 

ARTIGOS INÉDITOS

 

Coinconsciente para além do tempo e do espaço1

 

The state of co-unconsciousness beyond time and space

 

Coinconsciente mas allá del tiempo y del espacio

 

 

Anna Maria Knobel

Federação Brasileira de Psicodrama (Febrap) - e-mail: amknobel@uol.com.br

 

 


RESUMO

Este artigo discute como o coinconsciente de Moreno se constitui relacionalmente na primeira etapa da Matriz de Identidade a partir da dinâmica relacional entre o bebê e seus primeiros cuidadores. Essa dinâmica desenvolve esquemas mentais de compreensão das relações e dos modos de funcionamento dos papéis, que passarão a ser usados por toda a vida. Em situações de crise pessoal ou social, esses modelos substituem os relacionamentos télicos. Propõe também que o Sociodrama é um instrumento eficiente para a elaboração desses estados compartilhados.

Palavras-chave: inconsciente, estados coconscientes-coinconscientes, esquemas mentais explicativos, trauma psíquico, relações familiares


ABSTRACT

This article discusses how Moreno's coinconcious state occurs relationally in children, from the first stage of the Identity Matrix deriving from the relational dynamic between a baby and its first caregivers. This dynamic develops mental schemes for understanding relationships and the way roles function that will be used for their entire lives. In situations of personal or social crisis, these models substitute telic relationships. It is also proposed that Sociodrama is an effective tool for the elaboration of these shared states.

Keywords: unconscious, coconcious-coinconcious states, explanatory mental schemes, psychic trauma, family relations


RESUMEN

Este artículo analiza cómo el coinconsciente de Moreno se estructura en la primera etapa de la Matriz de Identidad a partir de la dinámica relacional entre el niño y sus primeros cuidadores. Esta dinámica desarrolla esquemas mentales para entender las relaciones y modos de funcionamiento de los roles que se utilizarán por toda la vida. En situaciones de crisis personal osocial, estos modelos sustituyen a las relaciones télicas. El artículo propone también que elSociodrama es un instrumento eficiente para la elaboración de estos estados compartidos.

Palabras-clave: inconciente, coconsciente-coinconsciente, esquemas mentales explicativos, trauma psiquico, relaciones familiares


 

 

A concepção moreniana acerca do inconsciente é interpessoal e envolve um campo vincular coconstruído e coexperienciado. Já escrevi acerca do tema para a Revista Brasileira de Psicodrama (2011) e, no mesmo ano, com Heloisa Fleury, para o livro editado por Hopper & Weinberg (2011).

Nesses artigos o coinconsciente foi abordado no plano histórico-descritivo, sua concepção foi contextualizada, definida, evidenciada em exemplos vinculares e comparada com oinconsciente social da psicanálise. À época destaquei que:

Por volta de 1937, J. L. Moreno definiu sua proposta acerca do inconsciente na teoria psicodramática considerando-o como uma das dimensões da própria vida relacional. Dizendo de outra forma: para ele, pessoas que têm uma convivência estável e significativa, tais como casais, pais/filhos e parceiros profissionais, acabam desenvolvendo conteúdos psíquicos e formas compartilhadas de subjetividade que constituem os estados coconscientes e coinconscientes. (Fleury & Knobel, 2011, p. 23)

Agora busco entender como o processo de constituição do coinconsciente possa ocorrer. Vale dizer que estamos adentrando um espaço especulativo, na tentativa de compreender a gênese de um processo psíquico. Para tanto, usarei metáforas e modelos psicológicos, em uma reflexão que está além das práticas, fazendo parte do que poderíamos chamar de metateoria2 psicodramática - área que busca pensar abstratamente acerca de como possam se dar os processos de constituição do psiquismo a partir das relações do bebê com o mundo. Esse entendimento é eminentemente teórico, uma vez que a realidade factual acerca do fenômeno nos é inalcançável.

Admitir nossa incapacidade de observar diretamente como se dá o processo de desenvolvimento psíquico do bebê é um ponto fundamental, pois muito frequentemente confundimos hipóteses teóricas com descrições factuais. As etapas de desenvolvimento da Matriz de Identidade, por exemplo, constituem uma reflexão teórica para sistematizar socionomicamente, de forma coerente e conceitualmente sólida, o que foi evidenciado pela observação da relação mãe-bebê. A Matriz de Identidade é, assim, um modelo teórico que descreve hipóteses sobre o desenvolvimento infantil, ou seja, "uma expressão imaginativa atribuída a um processo desconhecido e incognoscível que estabelece analogias entre propriedades semelhantes de um objeto e de outro" (Grotstein, 2010, p. 58) e resulta da observação e da percepção de padrões repetitivos em situações parecidas.

Entretanto, não basta a observação. Para que se constitua um modelo, é necessária certa ruptura com os dados concretos da pesquisa, criando-se generalizações compreensivas que se apliquem aos elementos repetidamente análogos. O processo de elaboração de um modelo começa então com a organização dos fatos observados e, em seguida pela construção tanto de representações imaginárias análogas (metáforas) como de constructos teóricos (plano conceitual).

Vejamos como o próprio Moreno (1923/1984) transita por esses dois planos. Referindo-se à Teoria do Momento, ele afirma que o locus de uma flor está no canteiro onde cresce, o status nascendi é o de uma coisa em crescimento, tal como brota a semente e a matriz é a semente fecundada (p. 105). Essas afirmações se dão em plano analógico-metafórico. Seus constructos teóricos sobre o mesmo tema definem que: o locus é o local primário do nascimento, o status nascendi é o momento primário da criação (p. 105) e a matriz [do Teatro Espontâneo] é a alma do autor (p. 62). Vemos duas formas diferentes de descrever o mesmo conceito.

Alguns exemplos de modelos complexos da Psicanálise são: as instâncias do Ego de Freud, a identificação projetiva de Klein e o desenvolvimento espiralado de Piaget, que servem para explicitar a compreensão teórica desses autores em relação à constituição psíquica.

Com esses dados em mente, pensemos agora nos estados coconscientes/coinconscientes. Nossa primeira missão é determinar a importância desses estados na teoria psicodramática. Diferentemente da Psicanálise, que tem seu eixo no inconsciente e em seu desvendamento, a pedra angular do Psicodrama assenta-se na interdependência de todos os seres em um universo uno e vivo; na existência de uma partícula interior espontânea facilitadora da compreensão mútua, a tele; na possibilidade de cada um ser agente terapêutico do outro; na transformação relacional via ação cênica.

Temos aqui uma questão: nesse contexto os fenômenos coinconscientes têm pouca importância na teoria psicodramática?

Creio que não, pois o eixo teletransferência sempre é revestido de elementos coconscientes/coinconscientes, que conferem certo colorido atemporal à vida psíquica, conectando as práticas espontâneas, as escolhas sociométricas e as ações dramáticas ao lá então dos processos transgeracionais. Vejamos o que Moreno diz em 1961:

A primeira vez que suspeitei da existência dos estados coconscientes/coinconscientes, foi no meu trabalho com atores espontâneos (1921 e 1923). Um elenco de atores trabalhava rotineiramente junto e tinham que desenvolver uma percepção intuitiva de como cada um dos vários atores poderiam pensar, sentir ou atuar, em uma "nova" situação completamente não ensaiada, de forma que pudessem produzir em conjunto uma cena significativa. Postulei então que os coatores nas produções do Impromptu tinham que desenvolver uma espécie de talento comunicacional que eu chamei de "mediale Verständigung"3. O conceito de uma compreensão entre eles foi o precursor do que eu chamo atualmente de estados coconscientes/coinconscientes.

Até agora havia entre os psicodramatistas brasileiros certo entendimento de que a descrição dessa intuição comunicacional se referisse à tele, pois em uma nota de rodapé no livro O teatro da espontaneidade Moreno (1923/1984) diz que "na literatura psicodramática recente, este fenômeno tornou-se conhecido como tele, o fator que opera e determina a ação interpessoal" (p. 84).

Entretanto, em 1961 ele mesmo afirma que essa intuição perceptiva entre os atores é a expressão dos estados coinconscientes. Pode ser que em suas conferências pela Europa tenha querido mostrar sua capacidade visionária, usando suas primeiras observações acerca da função tele como referidas aos estados coconscientes/coinconscientes. Nunca saberemos, pois entender cronologicamente o pensamento caleidoscópico de Moreno é missão impossível.

Independentemente da época em que os conceitos tenham sido cunhados, podemos verificar que tanto a tele como os estados coconscientes/coinconscientes se constituem pela comunicação bilateral entre o bebê e seus cuidadores, em um momento pré-simbólico no qual as vivências ainda não têm representação mental, não estão nominadas, nem se organizaram em função da causalidade ou da lógica formal.

Em texto de 1944, Moreno (1946/1997, pp.126-128) havia chamado essa etapa de dependência total da criança de Primeiro Universo Infantil, no qual tudo poderia acontecer, visto que é um locus relacional infinito e aberto, em que não há diferenciação entre fantasia e realidade. Nesse Universo há apenas registros emocionais (prazer, sofrimento, satisfação, angústia) e sensório-corporais (fome, sede, necessidade de evacuação), resultantes da relação do bebê, totalmente dependente, com seus cuidadores.

Hoje, começa-se a compreender que esse funcionamento empático assenta-se em processos neurofisiológicos. Fleury e Hug (2008), no texto Moreno's co-unconscious: contributions from neuroscience, mostram, de forma meticulosa, as correspondências preliminares entre a interpsique e o coinconsciente morenianos a fatos neurológicos como: a preponderância do hemisfério direito do cérebro nas primeiras etapas da vida, a importância dos neurônios espelho4 e da capacidade de ressonância neurológica entre organismos vivos.

Na teoria psicodramática, a origem desses estados ocorre desde a formação do EU, a partir dos papéis e das dinâmicas afetivas nele presentes, que conferem um colorido particular ao papel. Por exemplo: o mesmo papel de amigo pode ter características de confiabilidade, de empreendedorismo, de afetividade, de criatividade, de exigência etc.

A Sociometria nos mostra que cada um de nós tende a se aproximar do que imagina que possa complementar de forma mais acurada às próprias necessidades. Não há unanimidade objetiva nas escolhas, pois são as combinações dessas tonalidades afetivas que definem as aproximações e os afastamentos nas escolhas relacionais. Em trabalho de credenciamento para Didata-Terapeuta de Alunos pela SOPSP-Febrap, chamei essas tonalidades de atributos dos papéis (Knobel, 1981, p. 60).

Esses modus operandi dos papéis se originam na relação parental que modela diferentes dinâmicas de funcionamento do EU. Conforme a qualidade da tradução e do atendimento das necessidades da criança nessa fase de total dependência, definem-se individualidades mais saudáveis e adaptativas ou mais bizarras e caóticas.

Bateman e Fonagy (2006), discípulos de Bolwby5, estudaram essa função dos pais dentro da Teoria do Apego, chamando-a de Mentalizing6, expressão que em português pode ser traduzida livremente como a capacidade mental do cuidador de imaginar, entender e interpretar as necessidades orgânicas e psíquicas do bebê, expressas de forma indiscriminada por meio de choro, agitação, sono etc., para poder supri-las.

Segundo Fonseca (1980), nessa fase de indiferenciação "a criança é regida pelos mecanismos interoceptivos". Quando sente frio, fome ou dor, chora. O "mundo encarrega-se de cuidar dela. Está misturada com o 'mundo', sossega em seu berço cósmico. Não distingue o Eu do TU" (p. 84). Nessa primeira etapa da Matriz de Identidade, a criança só sobrevive graças à função duplo dos pais, que atuam como seus ego-auxiliares, realizando o que ela não pode fazer por si só.

Estudos contemporâneos (Fonagy, 2014, p. 38) comprovam que práticas familiares coerentes associadas a cuidados seguros ajudam a constituir os chamados esquemas mentais explicativos, por meio dos quais a criança aprende a compreender e predizer o comportamento humano. Vemos que também para esse autor, é na família que as primeiras lições acerca do "deciframento" emocional dos outros ocorre (Fonagy, 2014, p. 36).

Acredito que esses conceitos possam ser muito esclarecedores para a teoria psicodramática, pois possibilitam entender minuciosamente o processo de criação e de desenvolvimento da capacidade télica no desempenho dos papéis psicodramáticos e sociais.

Entretanto, algumas vezes essa capacidade parental é insuficiente ou equivocada e leva à desorganização do Eu infantil pela falta de aquisição de repertórios mentais socialmente compartilháveis, que permitam ancorar as emoções que o bebê experimenta.

Vemos então que é a qualidade desse entendimento/atendimento que define o marco divisório entre saúde (cuidados empáticos) e doença (cuidados transferenciais). Quando há distorções nessa bilateralidade afetiva, criam-se expectativas relacionais distorcidas, que Perazzo (1994) chama de equivalentes transferenciais no vínculo, Nery (2003) fala das lógicas afetivas de conduta e Bustos (2005) do papel complementar interno. Vemos que são diferentes nomenclaturas teóricas que descrevem a mesma dificuldade oriunda da relação assimétrica entre a criança e seus cuidadores.

No entanto, a existência de alguma interferência subjetiva dos pais é um processo inerente à subjetividade, não sendo necessariamente patológica, pois a brecha entre fantasia e realidade também abre espaço para a transferência, uma vez que as situações vinculares concretas são sempre carregadas de distorções pessoais.

O que conta é a tonalidade afetiva da díade e seus padrões de ligação. Quando eles são pouco adaptativos e excêntricos, tendem a promover dificuldades e desacertos vinculares persistentes por toda a vida do indivíduo (Fonagy, 2014, p. 33).

Até aqui, esse percurso nos permitiu compreender como o inconsciente da mãe tende a definir os estados coconscientes/coinconscientes do filho, por meio da transmissão despercebida de valores, usos e costumes, medos e mitos da família e do grupo social.

Assim, como afirmei anteriormente, o coinconsciente não abarca somente conteúdos impedidos socialmente de chegar à consciência, ele evidencia também sistemas de funcionamento que muitas vezes podem substituir a realidade exterior pela psíquica. Esses sistemas independem do tempo cronológico, estão além do princípio da contradição (Gondin, 1991, p. 95) e são infinitos em suas possibilidades de configuração e de expressão.

Além dessa dinâmica relacional precoce, Moreno (1961) acrescenta elementos socioculturais à gênese do coinconsciente:

Entende-se que os estados coinconscientes são resultados diretos da experiência íntima entre conjuntos de indivíduos. Mas ele pode ser também resultado de experiências que ocorrem nos planos social ou cultural. O contado pessoal íntimo é substituído pelo contato indireto, transpessoal ou social. A interpsique familiar é substituída pela interpsique cultural. (p. 4)

Esta afirmação o aproxima dos teóricos contemporâneos da Grupanálise7, que trabalham com o inconsciente social. Segundo Penna (2014), Bion, em 1970, referiu-se à existência de uma mentalidade grupal e a pressupostos básicos que regiam sua vida inconsciente, e Dalal, em textos de 1989 e 2011 citados por Penna (2014), afirmou que "as relações de poder são partes constitutivas do inconsciente social que se encontra, portanto, permeado por ideologias e discursos que acabam legitimando um senso comum absorvido do social" (pp. 400-401). Hopper & Weinberg (2011) afirmam que "existem nas culturas e sociedades padrões de comunicação e interação específicos que são inconscientes para seus membros, mas foram coconstruídos, internalizados, compartilhados, herdados e transmitidos por eles mesmos".

Passemos agora para uma segunda questão: o coinconsciente é sempre constituído por elementos transferenciais?

Creio que sim, pois, no momento em que conteúdos e formas de subjetivação não podem ser assumidos pela consciência, deslizam do campo télico, referindo-se ao lá então dos traumas familiares ou sociais. Sempre escondem temas proibidos que continuam pulsando de forma não voluntária e autônoma. Por promover desacertos vinculares e pessoais, faz-se necessário um método de trabalho terapêutico específico com o coinconsciente.

Na segunda palestra que proferiu em sua viagem pela Europa em maio-junho de 1954, Moreno (1959/1983, p. 17) revela que foi a partir do atendimento de casais (Robert e Mary) e de triângulos amorosos (Ann, Bill e Ruth), na década de 1930, que se deu conta da existência de uma área localizada entre o indivíduo singular e os agrupamentos estáveis, dotada de uma privacidade peculiar, possibilitadora do que chamou de neurose interpessoal.

Nesses atendimentos vinculares, diz ter alcançado bons resultados para o vínculo e para cada pessoa integrante dele, usando as técnicas psicodramáticas básicas: solilóquio, função duplo, espelho, inversão de papéis, realizadas alternadamente por um e por outro participante do vínculo. A partir desse tipo de intervenção, convenceu-se de que a explicitação e o manejo das próprias características não percebidas refinavam a compreensão das necessidades do outro e das próprias, promovendo respeito e ajustamento entre ambos (Moreno, 1946, p. VI).

Além dessa ação psicodramática com casais e famílias, Moreno propõe o Sociodrama como um trabalho grupal capaz de evidenciar os temas e as dinâmicas coletivas ocultos que emperram e desvitalizam a potência télica. A experiência contemporânea em relação à compreensão do coinconsciente vem validando a eficácia do Sociodrama como método.

Atualmente, outras propostas inovadoras vêm sendo desenvolvidas: a psicodramatista portuguesa, M. Maciel (2014) afirma que "provas empíricas nos levam à conclusão de que modelos não funcionais que se repetem de geração em geração derivam de acontecimentos traumáticos das gerações anteriores, os quais as gerações seguintes tentam resolver por meio da repetição compulsiva desses modelos"8 (p. 94). Defende a necessidade de um trabalho psicogenealógico, com a utilização do método gráfico de Anne Ancelin-Schützenberger9: o genossociograma10, que representa, por meio de símbolos, os constituintes de pelo menos três gerações do paciente em questão, desvelando as lealdades invisíveis a pessoas importantes de gerações anteriores, envolvidas em eventos traumáticos ocultos.

A partir de junho de 2015 nasce o projeto Polos de Atendimento - Serviço e Pesquisa, uma parceria entre o DPSedes e o Setor de Saúde Mental do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), coordenados, respectivamente pela doutora Mariângela Pinto da Fonseca Wechsler e pelo Prof. Dr. Rudolf Wechsler. Esse projeto nasce da confluência entre o Departamento de Psicodrama do Instituto Sedes Sapientiae (DPSedes), que se sintoniza com as transformações sociais, por intermédio de intervenções com as demandas espontâneas, e os princípios do próprio Instituto Sedes, aliado às suas necessidade em ter projetos voluntários para conseguir se enquadrar na lei de filantropia. Desde então vêm sendo realizados grupos com os familiares das crianças em hemodiálise e com os funcionários responsáveis pelo atendimento desses pacientes.

Mariângela Wechsler, Catarina Barbosa e Mariana Couri vêm trabalhando com o grupo de funcionários da hemodiálise pediátrica da Unifesp, visando criar um espaço de subjetivação para esses profissionais diante de suas dificuldades relacionais intraequipe e com os cuidadores das crianças doentes. Nesse contexto, estão sendo utilizados jogos dramáticos, sociodramas, psicodramas, princípio da retramatização, teatro espontâneo e rodas de conversa para definição e elaboração dos conteúdos coinconscientes do grupo.

Gloria Hazan, Anna Maria Knobel e Andrea Suplicy, também nessa parceria, vêm realizando um grupo de mães/pais. Inicialmente pretendiam utilizar o método da Matriz do Sonhar Social associado ao Sociodrama (Hazan, Knobel e Fernandes, 2014), entretanto as dificuldades desses cuidadores de contar seus sonhos mostraram que o modelo possível era um trabalho verbal com uso pontual de imagens e técnicas básicas do psicodrama (função duplo, espelho e tomada de papel). Aos poucos vem ocorrendo a potencialização desses pais, com maior segurança para expor ideias/sentimentos, para compreensão dos limites do tratamento e para o apoio mútuo no manejo de uma situação existencial muito sofrida.

Fica evidente nesse trabalho que tanto o grupo de pais como o de funcionários são atravessados pelo coinconsciente grupal, em que pulsam principalmente medo da morte, persecutoriedade, grande sofrimento, processos de negação, pavor de errar para não prejudicar os filhos, pensamento mágico negativo (certeza de que tudo vai dar errado), abandono de si para cuidar das crianças, entre outros.

Encerrando este percurso gostaria de afirmar a grande potencialização dos participantes desses grupos graças ao aumento de sua capacidade para decifrar e lidar com a origem coinconsciente de suas angústias psicossociais.

 

REFERÊNCIAS

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Recebido: 24/05/2016
Aceito: 19/07/2016

 

 

Anna Maria Knobel. Psicodramatista Didata Supervisora pela Federação Brasileira de Psicodrama (Febrap). Mestre em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Docente do Departamento de Psicodrama do Instituto Sedes Sapientiae - Níveis I, II e III. Autora de Moreno em ato: a construção do psicodrama a partir das práticas e também de vários artigos publicados em livros de psicodrama e na Revista Brasileira de Psicodrama. Rua Pará, 65, conjunto 41, CEP 01243 020. São Paulo, SP. Tel.: (11) 3256-4244.

 

 

1 Texto apresentado no 20º Congresso Brasileiro de Psicodrama - 2016.
2 O termo metapsicologia designa o conjunto de proposições hipotéticas que visam sustentar o discurso freudiano....Metapsicologia refere-se a um tipo de psicologia que, por meio de recursos da linguagem - como imagens, comparações, figuras, metáforas etc. -, versa sobre os fenômenos psíquicos inconscientes constatados na clínica, mas que não são verificados materialmente enquanto entidades substanciais (Silva, 2011, p. 5).
3 Compreensão intermediária.
4 No início dos anos de 1990, cientistas da Universidade de Parma identificaram em macacos uma nova classe deneurônios, que chamaram de neurônios espelho, os quais eram ativados não apenas quando esses animais realizavam alguma tarefa, mas também quando observavam outro macaco realizando a mesma tarefa (Fleury & Hug, 2008, p. 2).
5 Psiquiatra inglês que, em 1973, propôs a Teoria do Apego, segundo a qual o recém-nascido precisa de um bomrelacionamento com seus cuidadores primários para que seu desenvolvimento social e emocional ocorra normalmente. Os modelos internos de apego consistem em representações acerca da disponibilidade do cuidador, associadas às representações de si mesmo como merecedor da afeição do cuidador (Maier et al., 2004, pp. 180-189).
6 Em uma tradução literal, mentalizar designa a capacidade de operar, imaginar ou fantasiar algo na mente (Houaiss,2001).
7 Movimento psicanalítico acerca dos pequenos grupos, que foi liderado por Foulkes por volta de 1950, em Londres, seguido, em 1970, pelo estudo dos Grandes Grupos, por Turquet, Kreeger, Anzieu e Kaës (Penna, 2014, p. 26).
8 Tradução da autora com base em publicação em espanhol.
9 Psicodramatista francesa, discípula direta de J. L. Moreno.
10 Método gráfico que, desde a década de 1950, vem sendo usado pela terapia familiar sistêmica. Só em 1970 foi chamado por Guerin de genograma. Representa, por meio de símbolos, os constituintes de pelo menos três gerações do paciente. Por analogia ao sociograma, Schützenberger o chama de genossociograma.

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