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Revista Brasileira de Psicodrama

versão impressa ISSN 0104-5393versão On-line ISSN 2318-0498

Rev. bras. psicodrama vol.25 no.2 São Paulo dez. 2017

http://dx.doi.org/10.15329/2318-0498.20170021 

ARTIGOS INÉDITOS

 

O jogo dramático na gestão por competência

 

Psychodramatic games as competence-based management

 

El juego dramático en la gestión por competencia

 

 

Saskia Andrade de Vasconcelos

Instituto Mineiro de Psicodrama Jacob Levy Moreno (IMPSI). E-mail: saskia@saskiapsicodrama.com.br

 

 


RESUMO

Este artigo tem como objetivo discutir a aplicabilidade de um instrumento de desenvolvimento e avaliação de aptidões em uma instituição financeira. Visa especificamente validar o jogo dramático na Gestão por Competência, que propiciou a 360 participantes de grupos focais liberar a espontaneidade e a criatividade, essenciais para o aprendizado, o desenvolvimento, a avaliação e o aperfeiçoamento de suas habilidades e atitudes, bem como identificar colaboradores com maior aderência às sete capacidades consideradas mais expressivas para o melhor desempenho institucional. Demonstramos como resultados que esta metodologia permite o aprofundamento das reflexões sobre a inovadora atuação de colaboradores em grupos operacionais, aliado ao aprimoramento do papel de direção em Psicodrama com utilização de jogos dramáticos no âmbito organizacional.

Palavras-chave: psicodrama, jogos, percepção de papel, competência profissional, avaliação de desempenho


ABSTRACT

The purpose of this article is to discuss the applicability of a tool used for the development and evaluation of skills in a financial organization. Specifically, it aims to validate the dramatic game in the Competence-based Management, which provided 360 focus groups participants to express spontaneity and creativity, essentials for learning, development, evaluation and improvement of their skills and behavior, as well as identifying the employees with greater adherence to the seven skills considered the most expressive for great institutional performance. We show as a result that this method allows the deepening of the discussions on the new performance of employees in working groups, together with the improvement of the direction role in Psychodrama using dramatic games in the organizational context.

Keywords: psychodrama, games, role perception, professional competence, performance evaluation


RESUMEN

Este artículo pretende discutir la aplicabilidad de un instrumento de desarrollo y evaluación de competencias en una institución financiera. Se pretende validar específicamente el juego dramático en la Gestión por Competencia, que propició a 360 participantes de grupos focales liberar la espontaneidad y la creatividad esenciales para el aprendizaje, el desarrollo, la evaluación y la mejora de sus habilidades y sus actitudes, así como identificar colaboradores con mayor adherencia a las siete capacidades más expresivas para el mejor rendimiento institucionale. Demostramos como resultados que esta metodología permite la profundización de las reflexiones sobre el desempeño innovador de los colaboradores en grupos operativos, aliado al perfeccionamiento de la función de dirección en Psicodrama con juegos dramáticos en las organizaciones.

Palabras clave: psicodrama, juegos, percepción del rol, competencia profesional, evaluación del rendimiento de empleados


 

 

INTRODUÇÃO

As mudanças e as incertezas que têm ocorrido no setor econômico exigem redefinições conceituais nas organizações privadas e públicas, obrigando-as a se adaptarem, modificando suas estruturas, operações e seus respectivos processos produtivos. Nesse cenário, a efetiva participação dos colaboradores na implantação de processos de autoconhecimento e autodesenvolvimento visa melhorar a qualidade das respostas de suas ações e aprimorar o alcance de seus resultados. Segundo Pontes (2014), "é preciso desenvolver um sistema de gestão que valorize o trabalho humano e ao mesmo tempo promova o aperfeiçoamento e a satisfação dos funcionários" (p. 67).

A Gestão por Competência surge como uma proposta de valorização do colaborador, oferecendo-lhe meios para adequar suas capacidades individuais à cultura, à missão, à visão, aos valores e às metas da organização, aliada à ampliação perceptiva das representações de sua identidade profissional. Nesse sentido, competência é entendida como a combinação de conhecimentos, habilidades e atitudes (CHA) expressas pelo desempenho profissional em determinado contexto ou estratégia organizacional.

No contexto deste estudo, primeiramente analisamos as capacidades técnicas (conhecimentos, habilidades e atitudes) que favorecem um alto desempenho institucional; em segundo lugar, são discutidas as aderências profissionais dos colaboradores aos CHAs disponibilizados em um programa de qualificação e certificação, partindo dos resultados de testes de domínio de temas anteriormente estabelecidos pela organização; e, por fim, validamos o jogo dramático como uma ferramenta de aperfeiçoamento das competências em um processo de desenvolvimento e avaliação das habilidades e atitudes dos colaboradores.

A utilização do jogo dramático foi solicitada pela própria instituição, por entender a necessidade não só de avaliar as habilidades e as atitudes propostas, mas também de criar um ambiente propício para que as seguintes capacidades se manifestassem e se desenvolvessem: cooperativa, produtiva, de inovação, iniciativa, interesse em aprender, agente de mudanças e defesa de interesses da instituição.

Foi bastante surpreendente a proposta apresentada pela instituição estudada de utilização específica dos jogos dramáticos no desenvolvimento e na avaliação das sete capacidades referidas, pois ela atende às prerrogativas da "visão de mundo moreniana". Para J. L. Moreno (1975), a resposta a uma nova situação requer senso de oportunidade, imaginação para a escolha adequada, originalidade de impulso próprio em emergências, aptidão plástica de adaptação, mobilidade e flexibilidade do eu (pp. 143-144); enfim, são estes os talentos indispensáveis a qualquer organização que apresente vertiginosa evolução em meio às rápidas mudanças. Diante das tendências atuais de intensa transformação pelas quais estão inseridas as relações entre colaboradores em instituições financeiras, surge a necessidade de um modelo de Gestão por Competência que alie seus recursos humanos de maneira inovadora e criativa.

Foram trabalhados 360 colaboradores, subdivididos em 30 grupos de 12 participantes; as ações se deram entre junho/2015 e maio/2016 e cada grupo passou por uma média de 12 horas/atividades. Ao final do processo, receberam feedback individual, o que possibilitou a autoavaliação com identificação de pontos fortes a serem potencializados e orientações para seu desenvolvimento.

 

GESTÃO POR COMPETÊNCIA E CHA

Fundamentados pelo modelo de gestão de pessoas, entendemos a competência como o estoque de recursos adquiridos em ambientes formais e informais, que o indivíduo constrói e detém ao longo de sua vida, gerando alto desempenho e grande satisfação pessoal e profissional.

Segundo Dutra (2017), as competências profissionais são construídas e desenvolvidas por meio de processos de aprendizagem influenciados por três conjuntos de capacidades humanas. No primeiro, são representados os conhecimentos, como grupos de informações obtidas por meio dos estudos que possibilitam o domínio do saber, o desenvolvimento da capacidade de tomar decisões e solucionar problemas; no segundo, são evidenciadas as habilidades, como somatória de experiências obtidas por meio de repetições que fornecem o domínio do fazer bem feito; no terceiro, são retratadas as atitudes, como conjunto de comportamentos adquiridos pela observação que confere o domínio ético e afetivo de ser e conviver adequadamente.

A Gestão por Competência surge como alternativa aos modelos gerenciais tradicionalmente utilizados pelas organizações, visando orientar seus esforços para planejar, captar, desenvolver e avaliar, em nível corporativo, coletivo e individual, as capacidades necessárias à consecução de seus objetivos. Com esse propósito, o CHA requerido é estabelecido de acordo com o desempenho das atividades; do ponto de vista dos colaboradores, esse recurso surge como um fator motivacional de incentivo ao desenvolvimento pessoal e profissional, oferecendo sustentabilidade aos conhecimentos, às habilidades e às atitudes positivas no trabalho.

Diante do panorama de mudanças e transformações com o qual o mundo corporativo se depara, a instituição financeira, percebendo a necessidade de aplicar seus recursos não somente na identificação das competências como também no aperfeiçoamento das aprendizagens de seus colaboradores, propõe o desenvolvimento e a avaliação das sete habilidades e atitudes mais expressivas para o desempenho institucional.

Como Inovação, entende-se a capacidade que o colaborador tem para propor soluções que gerem resultados positivos nos processos ou produtos, de adaptação rápida às situações, sugestão de alternativas para alcançar resultados, contribuição para um ambiente favorável a novas ideias e disposição para aplicar soluções inovadoras às suas atividades. Por meio da Capacidade Produtiva, analisam-se sua capacidade e disposição para planejar, organizar, priorizar demandas, conferir ritmo de trabalho com vistas ao cumprimento de cronogramas e compromissos, mensurar eficácia e qualidade do trabalho em execução com foco no que foi contratado e finalizá-lo com êxito. Quanto à Iniciativa, observa-se sua predisposição a fazer algo sem ser solicitado, se o colaborador demonstra estar atento às oportunidades de agir e com qual frequência entrega resultados além do acordado, superando expectativas. No contexto do Interesse em Aprender, examina-se a busca proativa pelo autodesenvolvimento, a troca de experiências com os demais, a definição de responsabilidades e a disposição para reflexões sobre seu desempenho para um constante aprimoramento. Pela Defesa dos Interesses da Instituição, avaliam-se decisões e demandas com foco no alcance de objetivos da empresa em detrimento de benefícios pessoais e se o colaborador age de forma que fortaleça a imagem, a visão e a missão corporativa. Na condição de Agente de Mudanças, se ele se percebe como protagonista das ações, focando em seus benefícios, se enfrenta os obstáculos em prol de sua realização com resiliência e se ele se apresenta empático às pessoas resistentes, capaz de tranquilizá-las. Percebe-se a Capacidade Cooperativa, quando o colaborador se atenta às necessidades ao seu redor, aproveita as oportunidades para ajudar no alcance dos objetivos das atividades, presta suporte nos assuntos que domina, dissemina conhecimentos, tem bom relacionamento interpessoal e empatia com a equipe e clientes e se envolve com responsabilidade nos processos em que atua.

Percebendo que em todo processo avaliativo o participante se predispõe a apresentar uma imagem positiva de si mesmo, tornou-se necessário indicar um método em que a abordagem estivesse ancorada no "como se" e propiciasse a criação de um campo relaxado para que os colaboradores se mostrassem como são.

 

PSICODRAMA NAS ORGANIZAÇÕES: OS JOGOS DRAMÁTICOS

No processo de Gestão por Competência, o Psicodrama fornece importantes recursos que propiciam a liberação da espontaneidade e da criatividade dos participantes, essenciais para a demonstração das habilidades e das atitudes a serem percebidas, desenvolvidas e avaliadas; implementa momentos de aprendizagem e desenvolvimento pessoal e profissional com métodos de ação que facilitam a expressão de recursos físicos, mentais, emocionais, de movimento e de interação. Tem como objetivos: primeiro, liberar a espontaneidade, romper padrões de respostas cristalizadas e repetitivas, agilizar as dinâmicas interpessoais e rever o papel profissional à luz de suas competências, momento de vida e relacionamentos; em segundo lugar, incorporar criativamente o sentir, o falar e o agir dos indivíduos; em terceiro, processar a percepção e a comunicação de novas formas de atuação profissional; em quarto lugar, valorizar o "aqui-agora" das relações horizontalizadas e do compartilhamento das experiências vivenciadas.

O Psicodrama na Gestão por Competência oferece uma das principais ferramentas de desenvolvimento e avaliação dos vínculos interpessoais. Os jogos dramáticos, de acordo com Yozo (1996), são

atividades inseridas em um contexto delimitado por regras e valores que permitem avaliar e desenvolver o grau de espontaneidade e criatividade dos indivíduos através de suas características, estados de ânimo e/ou emoções na obtenção e resolução de conflitos ligados aos objetivos propostos. (p. 17)

Assim, através dos jogos dramáticos são permitidas vivências semelhantes às da vida real, possibilitando-se reflexões sobre o desempenho dos papéis psicossociais e a descoberta de novas formas de atuação.

Característicos do contexto avaliativo, em que há forte tendência a gerar tensão nos participantes, em razão da imprevisibilidade, do desconhecimento e da surpresa do que se processará, os jogos dramáticos1 reduzem sensivelmente as angústias próprias das conservas culturais, em que as situações antigas, prontas e estereotipadas podem ser substituídas por espontâneas e criativas formas de preparo para inovar-se.

Segundo Monteiro (1994), "o jogo no Psicodrama propicia ao indivíduo expressar livremente as criações do seu mundo interno, realizando-as na forma de representação de um papel, pela produção mental de uma fantasia ou por uma determinada atividade corporal" (p. 21). Assim, facilita um relaxamento das tensões para que seja possível uma exploração sutil, um profundo aprendizado e autêntico desenvolvimento de suas habilidades e atitudes.

 

OS JOGOS DRAMÁTICOS NA GESTÃO POR COMPETÊNCIA

No contexto deste estudo, foram criados sete jogos dramáticos2, tanto de desenvolvimento quanto de avaliação simultânea das habilidades e das atitudes do colaborador que porventura alternasse sua participação em mais de um grupo.

Como eixo integrador dos grupos, levamos em consideração as fases da Matriz de Identidade combinadas com as sete habilidades e atitudes concernentes à Gestão por Competência; na primeira fase grupal, denominada indiferenciação ou amorfa (Eu-Eu), utilizamos dois jogos de autoapresentação, proporcionando aberturas e espaços de expressão em que o acolhimento e a confiança balizaram as atuações e permitiram iniciar a formação dos vínculos inter-relacionais; na segunda e na terceira fases, distinguidas, respectivamente, como diferenciação (Eu-Tu) e triangulação (Eu-Tu-Ele), utilizamos outros dois jogos de integração, permitindo os movimentos de aproximação, contatos e trocas em prol da formação das redes de relacionamentos; na última fase, de socialização ou relações mútuas (Eu-Nós), utilizamos três jogos de exploração das relações grupais e desempenho de papéis. Em consonância com as sete habilidades e atitudes representativas da Gestão por Competência, cada grupo vivenciou quatro jogos assim distribuídos: no primeiro foram focadas as capacidades de Inovação, Iniciativa e Interesse em Aprender; no segundo e no terceiro foram acrescidas Capacidade Cooperativa, Capacidade Produtiva e Agente de Mudanças; no quarto, privilegiou-se trabalhar a capacidade de Defesa dos Interesses da Instituição.

Esse conjunto de ações faz coro à visão moreniana de homem, em que a espontaneidade e a criatividade como recursos inatos do indivíduo que favorecem a vida e o seu autodesenvolvimento precisam estar presentes no ambiente organizacional, possibilitando aos profissionais descobrir autênticas formas de atuação e inovadoras alternativas em que interatuarão com satisfação e atingirão metas, objetivos e desejados resultados. Nesse sentido, segundo Moreno (1975), a espontaneidade e a criatividade estão intimamente relacionadas ao conceito de liberdade e consideradas matéria-prima do processo de criação.

Criatividade é a disponibilidade para o ato criador - considerado qualquer ação geradora de uma transformação tanto naquele que a realiza como também no ambiente que o rodeia, em virtude da inerência de crescimento e desenvolvimento. Espontaneidade é a capacidade de o indivíduo agir de modo adequado, criando uma resposta inédita ou inovadora diante de antigas ações ou novas situações. Segundo Gonçalves (1988),

a possibilidade de modificar uma dada situação ou de estabelecer uma nova situação implica em criar: produzir, a partir de algo que já é dado, alguma coisa nova; a criatividade é indissociável da espontaneidade; a espontaneidade é um fator que permite ao potencial criativo atualizar-se e manifestar-se. (p. 47)

Entretanto, observamos que os indivíduos não são dotados de um reservatório de criatividade e espontaneidade de onde podem retirá-las sempre que se fizerem necessárias, e ambas podem estar ou não disponíveis e somente em graus bastante variáveis; para acessá-las de forma contumaz, são necessárias algumas condições especiais, como aquecimento adequado e campo de conduta relaxado, e elas também são liberadas através do contato espontâneo-criativo entre dois ou mais indivíduos. Metaforicamente, a espontaneidade pode ser comparada com a lâmpada que acende e ilumina tudo à sua volta; quando a luz se apaga, as coisas permanecem no mesmo lugar, mas desapareceu a condição essencial de ver e lidar com as coisas ao seu redor.

 

ANÁLISE DOS JOGOS DRAMÁTICOS NA GESTÃO POR COMPETÊNCIA

No decorrer deste estudo, conseguimos visualizar várias lâmpadas que se acenderam no campo relaxado que construímos; a espontaneidade e a criatividade se fizeram presentes, tanto de forma individual quanto grupal.

Seguindo as etapas do jogo dramático, o aquecimento inespecífico se deu ao caminhar pela sala e movimentar o corpo; no início, eram perceptíveis a tensão e a ansiedade de todos, os participantes se entreolhavam assustados e se perguntavam se estariam no local correto; aos poucos, ternos, gravatas e saltos altos eram postos de lado, dando lugar ao ser humano escondido atrás do crachá funcional. No aquecimento específico, jogando balões uns com os outros, já estavam completamente à vontade, interagindo de forma espontânea e participativa. No momento da dramatização, o ápice de envolvimento, foco e empenho nas atividades propostas. No compartilhamento, apareceram sentimentos inusitados em um processo avaliativo convencional: alegria, felicidade, leveza, curiosidade, volta à infância, entre outros. No processamento, ao serem questionados sobre o que aquele "jogo" tinha em comum com suas atividades profissionais, começaram a relatar, após a perplexidade inicial, as semelhanças, bem como a refletir sobre seus comportamentos, ampliando a percepção sobre si mesmo e sobre as possibilidades de novas respostas. Ao final de todas as atividades, ao receber o feedback individual, o participante expressou sentimentos, expectativas e angústias.

Tendo em vista os aspectos abordados, observamos que os procedimentos referentes às competências organizacionais fazem parte de um processo de aprendizado contínuo, necessário a um desempenho diferenciado e mais competitivo; evidencia-se a necessidade de mudanças na estrutura organizacional, compartilhada com o alinhamento entre pessoas, organizações, tecnologia e ambiente.

A proposta da Gestão por Competência representa uma alternativa para refletir sobre as relações interpessoais no contexto do trabalho, considerando o papel fundamental representado pelo colaborador. Para tanto, foram utilizados métodos e técnicas eficientes e eficazes de avaliação e de desenvolvimento das competências.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste estudo, comprovamos que os jogos dramáticos utilizados foram ferramentas adequadas e eficazes, tanto para realizar o mapeamento do nível de aderência das habilidades e das atitudes dos participantes, quanto para proporcionar oportunidades de autoconhecimento e autodesenvolvimento. Esse processo ocorreu por meio de dois momentos: o primeiro, no processamento dos jogos dramáticos, os participantes fizeram uma ponte entre o que foi ludicamente sentido e experienciado e o seu dia a dia pessoal e profissional, gerando um paralelo imediato, que os levou a reflexões sobre mudanças de comportamento e aprimoramento de capacidades; o segundo, no momento do feedback individual, cada participante pôde falar sobre a metodologia vivenciada.

O resultado foi amplamente gratificante tanto para a equipe técnica como para os participantes, na elaboração das reflexões pessoais e profissionais, e contemplou em especial a capacidade de Interesse em Aprender, quando agiram como Agentes de Mudanças e participaram ativamente das atividades com foco em seus benefícios, defendendo os Interesses da Instituição, ao elaborarem novas respostas às demandas que necessitavam de resoluções; exercitaram amplamente a Iniciativa e a Inovação, durante todo o processo; além da Capacidade Cooperativa e Produtiva, que, apesar de já serem bem desenvolvidas, puderam ser reelaboradas e incrementadas.

A Gestão por Competência representa uma mudança na cultura organizacional e na gestão dos funcionários, proporcionando vantagens em termos de simplicidade, flexibilidade e transparência dos processos, além de ser um método de planejamento, captação, desenvolvimento e avaliação das capacidades profissionais, de autoconhecimento e de autodesenvolvimento. Também é uma proposta incentivadora para os psicodramatistas organizacionais que buscam referência de trabalhos que utilizam a metodologia dos jogos dramáticos.

Foi recompensador comprovar que nossos objetivos foram alcançados. Vários participantes agradeceram a oportunidade de vivências dessa natureza, pois só assim conseguiram relaxar e estar inteiros, conseguindo ser eles mesmos; relataram surpresa e satisfação e gostaram da metodologia utilizada, pois nunca haviam participado de algo igual e até esqueceram que estavam inseridos em um processo de avaliação, mesmo sendo observados por três pessoas. Não imaginavam que caminhar numa sala faria com que se sentissem tão bem, nunca pensaram que a "forma de caminhar aqui" tinha relação com a "forma de caminhar lá fora", que estar com o colega e ajustar o ritmo dos seus passos se relaciona com a maneira de interatuar na vida. Sugeriram que todos os processos avaliativos deveriam ser como este, pois não foi traumático, superou as expectativas e fez com que se saíssem melhores do que esperavam. Um participante agradeceu especialmente por ter resgatado um sentimento que nunca esperava encontrar ali "a esperança", e outro reconheceu que o trabalho superou expectativas em relação a seu desempenho, finalizando sua apresentação com a criação da estátua "Fortalecido", pois era assim que estava saindo do processo. Diante destes comentários, ficamos muito gratos por percebermos que a metodologia empregada havia não só quebrado as resistências, mas também proporcionado momentos de autoconhecimento e autodesenvolvimento.

Na direção de um processo psicodramático desta envergadura, acompanhando 30 grupos, num total de 360 pessoas, foi um trabalho com dupla responsabilidade, tanto profissional quanto como representante da teoria psicodramática na criação dos jogos dramáticos e de toda uma sistemática de desenvolvimento e avaliação que impactou positivamente a carreira e a vida de cada participante. Desde o planejamento, passando pela execução até o levantamento dos resultados, a cada passo dado percebíamos o aprimoramento das mesmas habilidades e atitudes que estávamos avaliando e desenvolvendo com os grupos de participantes. Precisávamos ser Inovadores ao implementar um trabalho tão inusitado para aquela instituição; apresentar boa Capacidade Produtiva, buscando sempre a eficácia e a qualidade do trabalho com foco no que havia sido contratado e como finalizá-lo com êxito; disponibilizar Iniciativa antevendo obstáculos, buscando soluções e estando atento às oportunidades para superar as expectativas; a cada etapa, refletíamos sobre nosso desempenho, buscando formas de nos aperfeiçoar e amadurecemos tanto profissional quanto pessoalmente, o que demonstra nosso constante Interesse em Aprender; empunhando a bandeira da quebra de paradigmas, Defendemos os Interesses da Instituição e fortalecemos sua imagem; agimos como Agentes de Mudanças quando reforçamos a necessidade de foco nos benefícios e no enfrentamento dos obstáculos com resiliência; por fim, percebemos que todos estávamos imbuídos de grande Capacidade Cooperativa, cada um prestando suporte nos assuntos que dominava, disseminando conhecimentos e gerando grande sintonia interpessoal.

Dessa forma, muito além de desenvolver e avaliar pessoas, este estudo demonstrou o caráter transformador dos colaboradores, das relações e dos processos organizacionais, contemplando o desejo de Moreno de realizar a Revolução Criadora, na qual cada um possa ser espontaneamente protagonista de sua história, ser senhor e senhora de seu destino, romper com padrões de comportamento estereotipados, superar valores deturpados e dar sua verdadeira contribuição na sociedade.

 

REFERÊNCIAS

Dutra, J. S. (2017). Competências: Conceitos, instrumentos e experiências (2a. ed.). São Paulo: Atlas.         [ Links ]

Gonçalves, C. S., Almeida, W. C., & Wolff, J. R. (1988). Lições de psicodrama: Introdução ao pensamento de J. L. Moreno (11a. ed.). São Paulo. Ágora.         [ Links ]

Monteiro, R. F. (1994). Jogos dramáticos. São Paulo: Ágora.         [ Links ]

Moreno, J. L. (1975). Psicodrama. São Paulo: Cultrix.         [ Links ]

Pontes, B. R. (2014). Planejamento, recrutamento e seleção de pessoal (7a. ed.). São Paulo: LTR.         [ Links ]

Yozo, R. Y. K. (1996). 100 jogos para grupos. São Paulo: Ágora.         [ Links ]

 

 

Recebido: 09/10/2016
Aceito: 14/12/2017

 

 

Saskia Andrade de Vasconcelos. Psicóloga formada pela Universidade de Brasília (UnB). Especialista em Psicodrama pelo Instituto Mineiro de Psicodrama Jacob Levy Moreno (IMPSI). Psicodramatista Didata Supervisora pela Federação Brasileira de Psicodrama (Febrap).

 

 

1 Com a predisposição de campo relaxado em que o jogo dramático se desenvolve, o participante descobre e experimenta formas alternativas de atuação, favorecendo o treino e a inclusão de inúmeras respostas espontâneas e criativas para dada situação e fazendo crescer as possibilidades de vínculos interpessoais. Observa-se, em contraposição, que em campo tenso a conduta do indivíduo se encontra fortemente marcada pela concentração unicamente dirigida às metas e aos objetivos, impossibilitando as ampliações relacionais.
2 Seguindo as etapas de aquecimento inespecífico e específico, dramatização, compartilhamento e processamento.

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