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Revista Brasileira de Psicodrama

versão On-line ISSN 2318-0498

Rev. bras. psicodrama vol.27 no.1 São Paulo jan./jun. 2019

http://dx.doi.org/10.15329/0104-5393.20190013 

DOI: 10.15329/2318-0498.20190013
Comunicações Breves

 

A pedagogia psicodramática como um método facilitador na escolha do tema monográfico

 

Psychodramatic pedagogy as a facilitating method in choosing the monographic theme

 

La pedagogía psicodramática como un método facilitador en la elección deltema monográfico

 

 

Alexandra Sombrio CardosoI*; Ellen Lamberg Carneiro BondII

IUniversidade Federal de Santa Catarina, Programa de Pós-graduação em Psicologia, Departamento de Psicologia – Florianópolis/SC – Brasil ORCID: 0000-0003-0985-5649 
IIAssociação Paranaense de Psicodrama – Curitiba/PR – Brasil ORCID: 0000-0001-8443-0291 

 

 


Resumo

Este artigo tem por objetivo compreender a pedagogia psicodramática como um método facilitador na escolha do tema monográfico. Para isso, foram utilizados o método científico da pesquisa-ação e o estudo de caso, tendo a pedagogia psicodramática como método didático e a fenomenologia existencial como método filosófico. A aplicabilidade aconteceu no primeiro encontro de orientação de monografia. Foi possível perceber que a aluna/orientanda não apenas identificou o tema, mas também desenvolveu a espontaneidade e a criatividade na construção da monografia.

Palavras-chave: educação, pedagogia psicodramática, monografia, tema


Abstract

This article aims to understand psychodramatic pedagogy as a facilitating method in choosing the monographic theme. For this, the scientific method of research-action and case study were   used,   adopting   psychodramatic   pedagogy   as   a   didactic   method   and  existential phenomenology as a philosophical method. Applicability occurred at the first monograph orientation meeting. It was possible to perceive that the student/mentee not only identified the theme, but also developed spontaneity and creativity in the construction of monograph.

Keywords: education, psychodramatic pedagogy, monograph, theme


Resumen

Este artículo tiene por objetivo comprender la pedagogía psicodramática como un método facilitador en la elección del tema monográfico. Para ello, se utilizaron el método científico de la investigación-acción y el estudio de caso, teniendo la pedagogía psicodramática como método didáctico y la fenomenología existencial como método filosófico. La aplicabilidad ocurrió en el primer encuentro de orientación de monografía. Fue posible percibir que la alumna/orientanda no sólo identificó el tema, sino también desarrolló la espontaneidad y la creatividad en la construcción de la monografía.

Palabras clave: educación, pedagogía psicodramática, monografía, tema


 

 

INTRODUÇÃO

A pedagogia psicodramática é uma proposta pedagógica que inclui método e didática educacional e reconhece o valor educativo dos princípios e dos recursos psicodramáticos (Romaña, 2004, 2009).

Como método, a pedagogia psicodramática auxilia no encontro de soluções, nos problemas disciplinares, na prevenção de situações ansiosas (como as avaliações), na sensibilização dos grupos, na elaboração de mudanças (de professores, de classe, de turma, de escola) e na avaliação do trabalho em equipe. Por sua vez, como didática educacional, auxilia na fixação, na explicação, na transmissão e na apreensão do conhecimento (Romaña, 2004, 2009). Nesta pesquisa, a pedagogia psicodramática foi utilizada como método numa tentativa de facilitar a escolha do tema monográfico.

A realização do trabalho de conclusão de curso é uma das exigências de formações acadêmicas. Contudo, é sabido que existem, para alguns alunos, dificuldades envoltas na produção deste trabalho (Brito, 2006; Gulassa, Zylberstajn, Massoni & Nonoya, 2013). Segundo Carboni e Nogueira (2004), as maiores dificuldades são: tempo, custos, procura de um orientador. E o que mais facilita o processo de construção da pesquisa é a existência de um orientador e a possibilidade da escolha do tema.

E essas dificuldades, que na maioria das vezes já se iniciam na graduação, perpassam o tempo e continuam nas formações e nas pós-graduações. Segundo Brito (2006, p. 15), “a pesquisa se reveste de uma aura de impenetrabilidade que muitas vezes dificulta o desenvolvimento de uma reflexão mais sistemática e socialmente compartilhada de nossas práticas”. Quando Brito se refere a nossas práticas, ele está se referindo ao psicodrama. Se já é difícil para alguns alunos o processo de produção de uma monografia, imagine em nossa prática, que acontece por meio da ação! Afinal, como elucidou Almeida (2006, p. 8), “sabemos todos o quanto a escrita esmaece o brilho e a emoção de uma cena dramatizada ainda que coloquemos o sangue das veias e o sal da boca, fazendo a ‘encarnada’ a moda das filosofias da existência”.

Mas com dificuldade ou não, existe a necessidade da realização da monografia para os alunos em formação no psicodrama, seja por uma exigência da Federação Brasileira de Psicodrama (Febrap), seja como um aprofundamento teórico psicodramático necessário ao aluno e proporcionado pela realização da monografia.

 

METODOLOGIA

Para uma delimitação metodológica, esta pesquisa foi didaticamente organizada e classificada em: 1) método científico (pesquisa-ação e estudo de caso), 2) método didático (pedagogia psicodramática) e 3) método filosófico (fenomenologia existencial).

1. Método científico: a pesquisa-ação é uma possibilidade de investigação adequada à metodologia sociopsicodramática por ser uma investigação socionômica e que se dá em cocriação (Fleury & Marra, 2012). Por sua vez, o estudo de caso é propício para a pesquisa das ciências humanas, num desenho qualitativo de um caso detalhado especificamente (Goldenberg, 2004).

2. Método didático: a pedagogia psicodramática, sendo uma proposta educacional de caráter construtivista, “procura vincular o saber adquirido na aprendizagem formal com a experiência vivida” (Romaña, 2004, p. 23).

3. Método filosófico: para Moreno, todo o método psicodramático deveria ser uma experiência existencial. E por meio do discurso moreniano, encontram-se algumas referências à fenomenologia existencial, como: existência, ser, temporalidade (“aqui e agora”), espaço, encontro, liberdade, projeto, percepção, corpo, imaginário, linguagem, sonhos, vivência (Ramalho, 1994).

Ainda cabe reiterar que, para a construção dessa análise, ela será dividida nas etapas da sessão de psicodrama: aquecimento, dramatização e compartilhar; e nos três planos de vivência ou realização dramática, destacados por Romaña: real, simbólico e imaginário.

A descrição da ação – o encontro – corresponde à primeira orientação, quando a aluna orientanda ainda apresenta dúvidas em relação ao tema monográfico. Houve, inicialmente, uma explicação e uma clarificação das funções dos papéis de orientação (orientador e orientando) e, posteriormente, a tentativa de delimitação do tema monográfico. Nessa descrição, a aluna orientanda será chamada de Joana (nome fictício), aluna em formação e pós-graduação em psicodrama há um ano e três meses. A aluna assinou o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE).

 

DESCRIÇÃO E ANÁLISE 

Na etapa do aquecimento e no plano de vivência real, a orientadora explica a finalidade do encontro, que é uma tentativa de delimitação do tema monográfico e, se assim for, uma pequena estruturação do projeto de pesquisa. Por sua vez, a aluna orientanda começa relatando seu desejo de aprofundar-se na teoria do psicodrama, mesmo que ainda não consiga pensar nada em específico.

Segundo Nery (2012), a etapa do aquecimento é a preparação para o encontro, a ação, o incentivo à comunicação e à reflexão. Por sua vez, o plano de vivência real, segundo Romaña (2009), acontece com situações vividas, em que o objeto é parcial ou tolamente conhecido e se relaciona com um nível de compreensão lógico-analítica.

Como dramatização e já no plano de vivência simbólico, a diretora instrui a aluna/orientanda quanto à construção de um caminho, que é sua trajetória no psicodrama.

Segundo Menegazzo, Tomasini e Zuretti (1995), a dramatização realiza-se na ação, expressada por meio do como se psicodramático, vivenciada no espaço delimitado (palco). Enquanto no plano de vivência simbólico ocorre uma aproximação racional e conceitual, em que são expressados os sentimentos, as expectativas e as sensações (Romaña, 1985, 2009).

A diretora inicia a dramatização colocando uma almofada para assinalar o começo do caminho que fora gradativamente preenchido pela orientanda. A aluna começa relatando que conhecera o psicodrama, ainda quando era universitária, numa vivência com o psicodramatista Sérgio Perazzo, e destaca ter ficado “super fã da Psicologia que ele usava”.

Ainda na construção de seu caminho, a orientanda assinala o início da formação em psicodrama e enfatiza as muitas possibilidades interventivas que visualiza com o método psicodramático e a empolgação de estar cursando uma pós-graduação. A aluna coloca mais uma almofada demarcando o momento atual de sua formação e reconhece a necessidade de estudar mais e de buscar mais conhecimentos.

A diretora continua a construção da trajetória numa projeção para o futuro, colocando uma almofada para representar o término da formação. A projeção para o futuro é um recurso psicodramático que direciona o protagonista ao futuro, no papel que está sendo investigado (Menegazzo et al., 1995).

Você está pegando seu diploma de psicodramatista”. Nesse momento, a aluna vibra feliz com a conclusão do curso. A diretora continua: “Você já estudou todas as disciplinas e inclusive já defendeu a monografia. A aluna comenta o quão satisfeita está e que já está se sentindo com mais apropriação da teoria e do método psicodramático.

A diretora pede para a aluna orientanda olhar para a frente e, quando assim o fizer, estará em seu ambiente de trabalho realizando atos socionômicos. Nesse momento, ocorre a transição do nível de vivência simbólico para a fantasia ou o imaginário. Segundo Romaña (2004), quando este é alcançado, existe um manejo mais espontâneo, criado pelo próprio aluno, quando a espontaneidade e a criatividade são elevadas, e os projetos e as ideias imaginados são facilitados.

A orientanda relata visualizar um lindo consultório, com muitos pacientes, no qual realiza atendimento individual e em grupo. Nesse momento, a diretora pede que Joana saia da cena e, por meio da técnica do espelho, visualize o que ela precisa para ser a tal profissional. O objetivo da técnica do espelho é que o protagonista olhe para si, de fora da cena, conseguindo dar-se conta, entre outros aspectos, de suas necessidades (Cukier, 1992).

A aluna relata que necessita estudar mais as teorias psicodramáticas que fornecem embasamento para a clínica, como mais resolutividade no tratamento. A diretora questiona o que se sobressai da frase proferida e a aluna destaca: 1) aprofundamento, 2) atendimento clínico e 3) resolutividade. A diretora fecha a cena e propõe a concretização dos itens. Sobre o 1) aprofundamento, a aluna trouxe a necessidade de estudar a matriz de identidade e o núcleo do eu; o 2) atendimento clínico, a aluna destaca que poderia eleger pacientes com algum transtorno psiquiátrico e ressalta a ansiedade; a 3) resolutividade, relata querer visualizar melhorias de seus pacientes. Nesse momento, a aluna olha atentamente os itens concretizados, e a diretora questiona o que a orientanda vê. Aluna: “Estou vendo uma luz (risos)”. E continua: “Quando me aprofundo aqui (aponta o dedo para o aprofundamento), aqui (resolução) flui mais. No momento em que tiver clareza das teorias do núcleo do eu e da matriz de identidade, já saberei qual técnica é a mais adequada, e isso gerará maior resolução. Diante da construção, a diretora questiona: Então, como fica o tema?”. Aluna: “A teoria núcleo do eu e a matriz de identidade dentro de atendimentos clínicos de pacientes ansiosos e o tratamento mais adequado.

Ainda dando continuidade, a aluna e a orientadora refletem sobre a definição e a viabilidade da pesquisa, destacando: título, introdução, justificativa, fundamentação teórica e metodologia (para cada item a diretora concretizou). Por fim, a aluna relatou que o título seria: “A ansiedade sob o olhar do psicodrama: matriz de identidade e núcleo do eu. Quando a aluna falou o título, ela estava com um sorriso; quando questionada sobre o motivo desse sorriso pela diretora, a aluna relatou estar satisfeita e muito feliz com o tema. “Estou achando o máximo o meu tema (risos)”.

A orientanda, ao compartilhar, disse: “Não adianta fazer sobre algo que foge da minha prática. Uma vez, a Rosa (referindo-se a Rosa Cukier) falou que devíamos estudar alguma coisa que tivesse a ver conosco. Eu também sou ansiosa (risos). Foi muito bom, clareou bastante. Vim hoje com a sensação de que não sabia nada. E essa atividade me mostrou que não, eu sei (risos). Esse tema é o que quero estudar, me aprofundar. O que vai contribuir muito para a minha prática profissional e para minha vida.

Pode-se observar, dessa maneira, que a pedagogia psicodramática pode auxiliar a aluna no processo de escolha e na identificação do tema da monografia, além de visualizar e refletir sua formação no psicodrama. Ainda é pertinente destacar a importância de inserir o aluno orientando como sujeito construtor do conhecimento e da pesquisa, ensinando-o a aprender a aprender continuamente, como ser humano produtivo, ativo e criativo (Corrêa, 2007), e a pedagogia facilitou esse reconhecimento e o processo de construção.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo abordou o método da pedagogia psicodramática na tentativa de facilitar a escolha do tema monográfico. Como resultado, foi possível perceber que o método não apenas facilitou a identificação do tema, como também a fez vivenciar sua formação em psicodrama, por meio de recursos ideativos, imaginação e fantasia. Dessa forma, as etapas e os níveis de vivência destacados por Romaña permitiram a ela refletir sobre seus anseios e suas vontades como psicodramatista, por meio da projeção de seu papel profissional. A pedagogia psicodramática também colocou a aluna como autora e construtora do tema monográfico e na prévia estruturação do projeto.

A pedagogia psicodramática, além da proposta inicial, possibilitou uma prévia estruturação do projeto de pesquisa (claro que serão necessárias outras orientações). Também permitiu a visualização pela aluna orientanda como um todo e enfatizou a importância da realização desta para o desenvolvimento do papel de psicodramatista.

Ainda permite-se destacar que a ação realizada nesta pesquisa não tem por finalidade oferecer um roteiro a ser seguido, e sim fomentar ideias nos orientadores e nos orientandos das possiblidades e das facilidades do método.

Por fim, sugere-se outras pesquisas que utilizem o método da pedagogia psicodramática, com outras demandas interventivas e ainda os métodos do psicodrama no desenvolvimento dos papéis de orientador e orientando.

 

 REFERÊNCIAS

Almeida, W. C. (2006). Apresentação. In A. M. Monteiro, D. Merengué, & V. Brito (Org.). Pesquisa qualitativa e psicodrama (pp. 13-56). São Paulo, SP: Ágora.

Brito, V. (2006). Um convite à pesquisa: epistemologia qualitativa e psicodrama. In A. M. Monteiro, D. Merengué, & V. Brito (Org.). Pesquisa qualitativa e psicodrama (pp. 13-56). São Paulo, SP: Ágora.

Carboni, M. R., & Nogueira, O. V. (2004). Facilidades e dificuldades na elaboração de trabalhos de conclusão de curso. ConScientiae Saúde, 3, 65-72.         [ Links ]

Corrêa, A. R. M. (2007). Psicodramatista: pesquisador?! Rev. bras. psicodrama, 15(2), 93-102.         [ Links ] Cukier, R (1992). Psicodrama bipessoal: sua técnica, seu terapeuta e seu paciente (4a. ed.). São Paulo, SP: Ágora.

Fleury, H. J., & Marra, M. I. G. C. (2012). Aplicações dos métodos sociátricos. In M. P. Nery, & M. I. G. Conceição (Org.). Intervenções grupais: o psicodrama e seus métodos. São Paulo, SP: Ágora.

Goldenberg, M. (2004). A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em ciências sociais (8a. ed.). Rio de Janeiro, RJ: Record.

Gulassa, D. C. R., Zylberstajn, C., Massoni, C. G., & Nonoya, D. S. (2013). Considerações sobre o processo de orientação de monografia em Psicodrama. Rev. bras. psicodrama, 21(1), 81-94.         [ Links ]

Menegazzo, C. M., Tomasini, M. A., & Zureti, M. M. (1995). Dicionário de psicodrama e sociodrama. São Paulo, SP: Ágora.

Nery, M. P. (2012). Sociodrama. In: M. P. Nery, & M. I. G. Conceição (Org.). Intervenções grupais: O psicodrama e seus métodos (pp. 95-123). São Paulo, SP: Ágora.

Ramalho, C. M. R. (1994). O psicodrama pedagógico: Um exemplo da concepção fenomenológica-existencial da aprendizagem. Sociedade de Psicodrama da Bahia. Bahia, Brasil.

Romaña, M. A. (1985). Psicodrama pedagógico: método educacional psicodramático. Campinas, SP: Papirus.

Romaña, M. A. (2004). Pedagogia do drama: 8 perguntas & 3 relatos. São Paulo, SP: Casa do Psicólogo.

Romaña, M. A. (2009). Pedagogía psicodramática y educación conciente. Buenos Aires, Argentina: Lugar editorial.         [ Links ]

 

Recebido: 26/6/2018
Aceito: 14/5/2019

 

*Autora correspondente: alexandra.sombrio@gmail.com

 

Alexandra Sombrio Cardoso. Doutoranda em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Mestra em Engenharia e Gestão do Conhecimento pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Psicodramatista didata supervisora. (Locus Patrner/APP).

Ellen Lamberg Carneiro Bond. Psicóloga. Psicodramatista didata supervisora com foco psicoterápico e socioeducacional pela Associação Paranaense de Psicodrama (APP).

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