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Nova Perspectiva Sistêmica

versão impressa ISSN 0104-7841versão On-line ISSN 2594-4363

Nova perspect. sist. vol.26 no.59 São Paulo dez. 2017

 

ARTIGOS

 

Intervenção grupal com mulheres cuja gravidez decorreu de violência sexual: uma leitura construcionista social

 

Group intervention with women whose pregnancy is due to sexual violence: a social constructionist view

 

 

 

Silvia Renata Magalhães LordelloI, Liana Fortunato CostaII


 


RESUMO

O artigo aborda uma proposta de intervenção grupal com mulheres que tiveram sua gestação decorrente de violência sexual. Como uma configuração familiar contemporânea, a complexidade das famílias que surgem neste contexto requer um estudo de suas peculiaridades. O referencial Construcionista Social foi adotado na compreensão do conteúdo conversacional surgido no grupo, que abordou temáticas sugeridas pelas participantes para discutir aspectos relacionados à maternidade. A análise desses achados apontou quatro categorias, as quais envolveram: os impactos da violência sobre a gravidez, o processo de se tornar mãe, a separação entre agressor e bebê e o grupo como espaço de compartilhamento. A intervenção grupal foi um espaço coletivo para elaboração de vivências traumáticas e foi visto como positivo pelas participantes. A construção social de gênero possibilitou a crítica ao papel materno estereotipado e a problematização sobre a naturalização da violência sexual como prerrogativa masculina. Concluiu-se que as participantes compreendem a maternidade como um processo em construção, permeado de desafios.

Palavras-chave: gravidez; maternidade; violência sexual; intervenção grupal.


ABSTRACT

The study approaches a group intervention proposal, with women who had their pregnancy due to sexual violence. As a contemporary family configuration, the complexity of the families that come up in this context demands a study of its peculiarities. The Social Constructionist referential was adopted in the comprehension of the conversational contents emerged in the group, which approached themes suggested by the participants to discuss aspects related to maternity. The analysis of the results pointed out four categories which involved: the impacts of violence on pregnancy, the process of becoming a mother, the emotional separation between the aggressor and the baby, and the group as a collective space for sharing. The group intervention was a collective space for the elaboration of traumatic experiences and was seen as positive by the participants.  The gender social construction enabled the criticism to the stereotyped maternal role and the questions about the naturalization of the sexual violence as a masculine prerogative. It was concluded that the participants understand maternity as a process in construction, permeated by challenges.

Key Words: pregnancy; maternity; sexual violence; group intervention.


 

Introdução

Estudar novas configurações familiares tornou-se um desafio na contemporaneidade. Antes as famílias eram estabelecidas pelos laços consanguíneos, mas hoje vão além de aspectos biológicos e legais, sendo essa diversidade a marca do contexto atual (Féres-Carneiro, 2009; Wagner, Tronco & Armani, 2011). As mulheres que decidem ter um filho que é consequência de uma violência sexual podem ter o arranjo familiar descrito como monoparental, Há, entretanto, muitas especificidades na forma como são estabelecidas as relações neste sistema familiar que surge na adversidade (Lordello & Costa, 2014).

O objetivo deste texto é analisar uma proposta terapêutica grupal, voltada para vivências e significados da maternidade em mulheres que engravidaram em decorrência de violência sexual. Embora as gestações que resultem do estupro possam ser interrompidas – como aponta o artigo 128 do Código Penal –, mesmo nessa condição peculiar há gestantes que pretendem criar seus filhos. A literatura tem apontado possibilidades de ressignificação da maternidade e investimento na escuta e compreensão da dinâmica relacional mãe e bebê após a decisão da mulher de não abortar (Cantelmo, Cavalcante & Costa, 2011; Nunes & Morais, 2016).

O presente artigo objetiva sistematizar conteúdos obtidos a partir de uma metodologia de intervenção grupal voltada a mulheres que tiveram sua gravidez decorrente de estupro e que se propuseram a partilhar suas vivências neste período. Para tanto foi adotada a perspectiva construcionista social utilizada na condução do modelo de pesquisa-ação (Barbier, 2007).

A Violência Sexual contra a Mulher

Ao se tratar de violência sexual contra a mulher, é importante contextualizar o quadro no Brasil. Segundo Moreira, Soares, Farias e Vieira (2015), a análise dos registros realizados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) apontam que, no período de 2009 a 2013, foram registradas 21.871 notificações, com maiores taxas de registros no ano de 2013 e na região Norte. Utilizando estatística descritiva, os registros assinalaram predomínio da violência sexual no ciclo de vida de 10 a 19 anos (49,4%), sendo a ocorrência com maior frequência na residência da mulher (60,6%), com agressor conhecido (25,8%). Os resultados ratificaram o aumento no número de notificações e a predominância de violência sexual dirigida a adolescentes no ambiente doméstico e com agressor conhecido. Essa tendência não exclui a existência de violência sexual dirigida a outras idades e por agressores desconhecidos.

A violência sexual está associada à ideia de desigualdade de poder. Os danos psicológicos causados, intra ou extrafamiliar, podem se apresentar mais evidentes ou menos perceptíveis, mas é consenso que estão sempre presentes. As mulheres, que são as maiores vítimas deste tipo de violência, ficam sujeitas à permanência da violência sofrida, por meio de doenças sexualmente transmissíveis, AIDS, gravidez indesejada, transtornos psicológicos e psiquiátricos e, não raro, o suicídio (Lima & Deslandes, 2014; WHO, 2013).

Os danos da violência sexual podem ser primários e secundários. Os danos primários são decorrentes da própria situação de violência, enquanto os danos secundários referem-se aos prejuízos decorrentes de intervenções inadequadas ou de não intervenções da rede de atendimento e proteção. Os impactos da violência são compostos por vários fatores, intrínsecos ou extrínsecos à pessoa, entre eles, vulnerabilidade, resiliência, rede social de apoio, funcionamento familiar, recursos financeiros, entre outros. Tais fatores variam em função de uma complexidade que envolve o tipo de violência, a idade da vítima, duração da situação, importância da relação entre vítima e autor do abuso, ausência de figuras parentais protetoras e de rede de apoio, grau de segredo e de ameaça estabelecidos (Habigzang, Ramos & Koller, 2011; Nunes & Morais, 2016).

Contribuições do Construcionismo Social para a compreensão do fenômeno

A gravidez decorrente de violência sexual exige uma minuciosa investigação dos processos de significação que a mulher que sofreu o estupro é capaz de construir para a maternidade e para a família que se inicia, tendo a monoparentalidade como arranjo. Conforme apontam Moreira, Bedran e Carellos (2011), a família contemporânea encontra o desafio de reinventar-se a si mesma. Esse processo é contínuo e absorve as demandas da sociedade e das relações que as constituem.

Diante deste cenário, adota-se uma perspectiva contextual como um aporte desejável para o estudo, permitindo que as demandas dessas mulheres sejam compreendidas à luz das inovações conceituais sobre o que é família hoje e as intersecções entre família, cultura e a dimensão social dentro da compreensão pós-moderna. No estudo da família, a revisão sobre os conceitos originais – os quais enfatizam a cibernética, a circularidade e os aspectos comunicacionais – tem proporcionado o resgate da dimensão individual e das narrativas como construção da significação pessoal e contextual da experiência (Boscolo & Bertrando, 2012; Costa, 2010; Féres-Carneiro & Ponciano, 2005, Grandesso, 2012).

Nessa direção, elegeu-se o construcionismo social como corrente epistemológica capaz de favorecer o acesso e compreensão das narrativas que qualificam a experiência das mulheres que investem na construção de laços afetivos com seus bebês, ainda que para elas seja um desafio não reeditar a cena de violência da qual foram vítimas (Lordello & Costa, 2014; Nunes & Morais, 2016). De acordo com Barbosa e Guanaes-Lorenzi (2015), o construcionismo social proporciona um olhar favorável aos fenômenos complexos, pois tem como pressupostos a centralidade da linguagem e dos relacionamentos na construção do conhecimento, a ênfase no caráter local e historicamente situado, assim como a compreensão do conhecimento como forma de ação social.

Quando se faz referência ao construcionismo social, algumas derivações são mencionadas, como a abordagem colaborativa, detalhadamente descrita por Anderson e Golishian (1998); a terapia narrativa, originalmente presente nos estudos de White e Epston (1990); os processos reflexivos mencionados nas obras de Andersen (1999). A adoção do referencial da abordagem colaborativa é avaliada positivamente pelos integrantes de grupos atendidos em diferentes estudos, que ressaltam a mudança de uma compreensão individual do problema para uma visão relacional e a construção colaborativa da solução, antes delegada ao terapeuta (Barbosa & Guanaes- Lorenzi, 2015; Marra, 2014; Rasera & Guanaes, 2010). Gergen & Gergen (2010) enfatizam a vinculação entre ação e significados, preconizando que o trabalho construcionista favorece o processo de conscientização sobre o que se está narrando e envolve decisões sobre as escolhas de vida.

Alguns estudos envolvendo grupos com vulnerabilidades pronunciadas apontam a intervenção grupal como modalidade efetiva (Barbosa & Guanaes, 2015; Meneses, Stroher, Setubal, Wolff, & Costa, 2016; Rasera & Japur, 2007). Com relação às mulheres que sofreram violência, Porto e Bucher-Maluske (2012) fazem referência à escassez de atendimento psicológico no país. Os trabalhos grupais devem identificar fatores de risco presentes e enfatizar os fatores de proteção que se referem a recursos e características pessoais que atuam como moderadores de efeitos ou impactos negativos no desenvolvimento (Mayer & Koller, 2012). Na perspectiva adotada por este estudo de intervenção grupal, apoiada numa condução dialógica, o objetivo é analisar as construções discursivas produzidas nas relações das mulheres que tiveram sua gestação decorrente de violência sexual, as quais foram narradas nos encontros.

Método

Este é um estudo de natureza qualitativa, baseado em proposta interventiva preconizada na forma de intervenção grupal, que segue a abordagem da pesquisa-ação de Barbier (2007). A opção pela pesquisa-ação é motivada pelo desejo de realizar um trabalho que seja relevante socialmente para a comunidade. Barbier (2007) considera que a pesquisa-ação é voltada para uma meta de transformação social que envolve uma profunda implicação do pesquisador, que se volta ao trabalho com os outros e não sobre os outros. Os procedimentos visam a propiciar que os participantes entrem em contato com seus próprios recursos e mobilizá-los para o uso instrumental das estratégias que otimizem seu desenvolvimento.

Contexto

A presente pesquisa foi realizada em um programa de atendimento às vítimas de violência sexual oferecido pela saúde pública. O atendimento às vítimas de violência é realizado por uma equipe interdisciplinar que conta com médicos, psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros, técnicos de enfermagem e estagiários de psicologia. O programa de interrupção da gestação previsto em lei conta com algumas peculiaridades do atendimento e acompanhamento, uma vez que envolve processos de decisão e procedimentos específicos, bem como acompanhamento singular de cada caso.

Os casos de gravidez decorrentes de estupro são contemplados no artigo 128 do Código Penal como condição excludente de culpabilidade para o aborto. A mulher em situação de gravidez decorrente de violência sexual, bem como a adolescente e seus representantes legais, devem ser esclarecidos sobre as alternativas legais quanto ao destino da gestação e sobre as possibilidades de atenção nos serviços de saúde. É direito dessas mulheres e adolescentes serem informadas sobre a possibilidade de interrupção da gravidez, conforme Decreto-Lei n.º 2848, de 7 de dezembro de 1940, art. 128, inciso II, do Código Penal (Decreto-Lei 2848, 1940).

Outro direito relevante é que as mulheres devem ser esclarecidas sobre a possibilidade de manterem a gestação até o seu término, garantindo-se os cuidados pré-natais apropriados para a situação. A presente intervenção grupal foi realizada após o processo de tomada de decisão das participantes, evitando influências na opção pela manutenção da gravidez. A intervenção grupal foi realizada em três encontros, com cerca de 1h30 de duração, dentro de uma sala da unidade hospitalar propícia ao trabalho de grupos.

Participantes

As participantes foram três mulheres que frequentavam o programa de atendimento às vítimas de violência de um hospital público. Essas mulheres resolveram não interromper a gravidez e foram convidadas, a partir dessa decisão, a participarem de um grupo para discutirem as temáticas relativas à gestação e à maternidade. Amanda , 15 anos, não pôde interromper a gestação por estar além das vinte semanas preconizadas como limite para o procedimento. Assim, decidiu ter o bebê e, com isso, aceitou o convite para frequentar o grupo, sendo assídua em duas das três sessões realizadas. Samira, 25 anos, havia ganhado seu bebê e estava em acompanhamento pós-parto. Foi frequente nas três sessões realizadas. Danusa, 30 anos, mãe pela quarta vez, tivera seu bebê decorrente de uma violência sexual e iria encaminhá-la para adoção, porém mudou de ideia na hora do parto e foi convidada a integrar o grupo, levando sua filha de quinze dias a dois dos três encontros realizados, conforme aponta a tabela 1.

Tabela 1: Informações sobre Participantes 
Nome fictício Idade Ofensor Idade do bebê no início do grupo Pessoas com quem mora
Amanda 15 Avô materno 27a  semana de gestação Mãe, irmã e irmão
Samira 25 Conhecido 6 meses Pai, mãe, irmã, sobrinho
Danusa 30 Patrão 15 dias Filho

Instrumentos

Foram realizadas três sessões grupais, com cerca de 1 hora e 30 minutos de duração, para as quais foi obtida a autorização para gravação integral. O grupo se formou a partir do momento em que estas três participantes mantinham processos paralelos de acompanhamento psicossocial na instituição. Por se tratar de uma sala de um hospital público, não foi possível contar com muitos outros instrumentos e equipamentos, ficando a ação centrada na oportunidade de conversação. Entende-se que essas histórias de violência sexual são verdadeiras histórias de horror (Grattagliano et al., 2012), que trazem grandes dificuldades para serem narradas, mais ainda compartilhadas. A oportunidade para o diálogo desmistifica essa condição e oferece um espaço e tempo para conhecer e cuidar do sofrimento subjacente.



Procedimentos

O primeiro momento de acesso ao campo foi a articulação entre as pesquisadoras e os psicólogos responsáveis pelo programa de atendimento a vítimas de violência. Houve autorização institucional para entrar no serviço e para convidar as mulheres que optaram por ter o filho, incluindo as pacientes que já haviam realizado o parto. A intervenção grupal foi realizada em três encontros, com periodicidade quinzenal e conduzida por uma psicóloga integrante dessa equipe. Os encontros abordaram conteúdos diversos, como revelações pessoais de sua história de violência e gravidez indesejada, desenvolvimento do feto, desvinculação do bebê da imagem do agressor, relações afetivas com o bebê, comunicação intrauterina, inseguranças e medos do período gravídico, relacionamento com mãe, parceiro e familiares, propostas de criação de filhos, aspectos transgeracionais, emoções no parto e puerpério, entre outros temas apontados pelas grávidas como necessários para uma vivência saudável de sua gravidez. A intervenção grupal fez parte das ações oferecidas às participantes e, após seu término, foram incorporadas a outras ações já em andamento, como acompanhamento ginecológico e outras.



Cuidados Éticos

O projeto foi apresentado à diretoria do hospital onde foi realizada a investigação, que autorizou por escrito a realização do trabalho. Posteriormente, foi submetido ao Comitê de Ética do Instituto de Humanidades da UnB, recebendo a aprovação, e foi identificado pelo protocolo 02/03. O sigilo foi garantido utilizando-se nomes fictícios em todo o artigo e evitando qualquer trecho que permita identificações. Outro aspecto fundamental diante da temática complexa dessa pesquisa-ação foi o acompanhamento psicológico das participantes – que permaneceu após a finalização do grupo – como ação contínua do programa ao qual eram vinculadas.



Análise das Informações

A análise de informações foi realizada com base no método hermenêutico-dialético de Minayo (2010). Essa escolha mostrou-se coerente com o objetivo da pesquisa-ação por considerar a fala dos atores sociais situada no contexto e pelo dinamismo preconizado na produção do conhecimento. Seus pressupostos apresentam adequação com a base teórica do construcionismo social, uma vez que o primeiro nível interpretativo se dá no contexto sócio-histórico e o segundo nível da interpretação nas informações obtidas na investigação.

Seguiram-se os passos propostos para a operacionalização da análise: inicialmente, a organização dos dados, com as gravações, transcrições e registros das sessões; posteriormente, a classificação dos dados, com a criação das categorias após leituras repetidas e exaustivas dos textos, com a formulação de questões sobre o conjunto de informações relevantes e, por último, a análise final, quando foram articulados os resultados com os referenciais teóricos e objetivos da pesquisa. Um destaque do método hermenêutico-dialético é a clareza sobre a provisoriedade do conhecimento produzido, que sempre será aproximado e nunca irrefutável, lembrando que a realidade estudada sempre se apresentará articulada com o seu caráter histórico.


Resultados e Discussão

Após a leitura dos diálogos ocorridos durante a realização do grupo, procedeu-se à identificação das informações obtidas no grupo. Notou-se que as histórias de vida das participantes diferiam muito, mas se entrecruzavam em vários aspectos ligados à experiência de se ter um filho cuja gravidez tenha sido decorrente de violência sexual. Diante desse critério que as uniu, como fio condutor da proposta grupal emergiram quatro categorias, que serão aqui expostas e discutidas.
 
1. Nominando os efeitos da violência sexual no curso de vida: Saio da cena, mas a cena não sai de mim – A violência da cena de estupro não deixou de acompanhar as mulheres que a sofreram e produziu efeitos que precisam ser compreendidos de forma contextual. Marcas da violência que sofreram são perpetuadas pelo julgamento ao qual se submetem na esfera da cultura.

White (2012) coloca que toda formulação que postule significado é interpretativa. Estas formulações são o resultado de uma indagação permanente sobre a compreensão do mundo e dos fenômenos. As participantes narraram seus questionamentos diante da situação de violência vivida, mostrando indignação diante das cobranças da sua própria família e das ideias preconcebidas presentes nas representações sociais. Amanda retratou a necessidade de falar de sua história compulsoriamente, para evitar a rejeição social: “... preciso (falar)  para eles me conhecerem ... para não dizer: Tantos métodos aí e ela tá grávida desse jeito...”. Samira legitima o discurso de Amanda: “Minha tia mesmo chegou para mim e falou: por que você não tomou anticoncepcional, por que você não usou camisinha?... Eu falei: como eu ia usar camisinha se eu fui estuprada?”.

As narrativas permitiram que as participantes entrassem em contato com as contradições presentes no que White (2002) denomina como condição de vida que revela, dentro do processo de conectar significados às experiências, a dimensão política da desigualdade e marginalização por elas sentida no seu dia a dia. O fato de necessitarem constantemente de se defenderem por terem sido responsabilizadas pela violência que sofreram fez com que internalizassem a culpa pelo episódio e vivenciassem de forma ambivalente esse papel.

“... de vez em quando eu me sinto culpada ... se eu não tivesse estudando, se eu não tivesse saído cinco horas, não teria acontecido... Se eu não tivesse ido para a parada (de ônibus)... ” (Samira).
“Minha culpa é ... porque eu não vi que o perigo estava ali do lado... de eu não ter percebido o jeito da pessoa me olhar diferente ...” (Danusa).

Samira e Danusa, ao se responsabilizarem pela violência, demonstraram o quanto a opressão ocorre além da dimensão física, afetando as normas e interdições. De acordo com Zanello (2014), a legitimação social da violência passa pelas construções sociais de feminino e masculino que foram internalizadas a partir dos modelos impostos pela cultura patriarcal. As mulheres internalizam que a violência sexual pode ser decorrente de uma falha sua por despertarem os homens em seus desejos incontroláveis. Numa leitura construcionista, Nogueira (2001) desafia o caráter natural da diferença de gênero, pois todas as características sociais significativas são ativamente criadas e não biologicamente inerentes, como pregam os discursos patriarcais. Para Cantelmo, Cavalcante e Costa (2011), a subordinação feminina decorre da estereotipia criada e mantida pelas práticas educativas, o que leva, inclusive, à institucionalização das relações violentas.

Samira e Danusa protagonizam o que Bandeira (2014) permite constatar: a violência contra mulheres é apreendida no decorrer dos processos primários de socialização e se desloca para a esfera da sociedade em momentos secundários da socialização e na vida adulta. O patriarcado que ainda vigora mantém as mulheres ocupando o lugar de presas numa sociedade que treina o homem para ser predatório, sobretudo no plano da sexualidade e a mulher para ser objeto sexual (Machado, 2010). O sistema dominação-exploração aponta que o perpetrador adotará uma visão utilitarista da confiança e do vínculo afetivo e a vítima aceita, por medo da retaliação que a denúncia pode promover, uma resignação que a impede de agir.

De acordo com Costa, Grossi e Macarro (2016), o estupro desencadeia a desestruturação do eu identitário. A imagem do corpo, vista como fundamento da identidade do indivíduo que assume relações e desempenha papéis sociais, fica abalada a partir da experiência de situações de violência sexual.

“... A gente vai entristecendo,  ficando mais calada, eu era mais extrovertida, brincalhona, sorridente, e agora eu vivo numa tristeza ...” (Danusa).
“Porque às vezes eu volto bem no passado... eu era alegre, né? Eu poderia ter sido mais cuidadosa comigo mesma ...” (Samira).

A reedição da cena de violência foi um indicador significativo dessa categoria por se tratarem de narrativas que se construíram em um espaço de sofrimento e dor e ficaram silenciadas. O grupo representou espaço de troca sobre detalhes presentes no dia a dia que conduziam à rememoração do fato. Embora inicialmente representassem narrativas saturadas pelo problema, foram validadas pelas vítimas, que mostravam total compreensão ao fato, deslocando-se da dimensão individual para a perspectiva relacional. Processos terapêuticos que se baseiam nos pressupostos das práticas conversacionais e dialógicas apontam resultados animadores no que tange às ressignificações possíveis (Barbosa & Guanaes- Lorenzi, 2015; Paschoal & Grandesso, 2014; Rasera & Guanaes, 2010).

“... eu tava dormindo e senti uma pessoa me tocando, pegando em mim... Eu acordei assustada ... Meu Deus do Céu, tira isso de perto de mim, tira esse monstro de perto de mim.” (Samira).
“Eu vivi uma situação parecida com essa sua aí. Eu estava dentro do ônibus e aí passou um coroa com aquele perfume. Exatamente o perfume que ele usava ... Porque já me veio a pessoa, eu já fiquei pensando que era ele...” (Amanda).

As reedições são acompanhadas de sensações corporais que as participantes descreveram com intensidade e sofrimento, como formigamentos, hipervigilância e respostas de sobressalto: “Me dá uma coceira no corpo, uma vontade louca de tomar banho, de sair correndo...” (Danusa). “Ontem mesmo meu corpo tava todo formigando” (Samira).

Na família de origem, há uma violência psicológica sutil, mas permanente, seja na ausência nos cuidados pré-natais ou na desqualificação da capacidade de maternagem das participantes. A mãe apresenta dificuldade para perceber que a filha grávida pode desenvolver habilidades de cuidado para o bebê e passa então a assumir o papel de mãe, e não de avó, deixando clara a mensagem de que vê a gestante como incapaz. Há ressentimento pelas participantes por se verem subtraídas deste desafio que representa uma oportunidade de visibilidade e status social.

“... porque minha mãe não foi fazer os exames comigo, né? Ela tava muito
cansada e eu acabei indo, mas aí eu não podia porque era menor ...” (Amanda).
“Eu tô com ele no colo, minha mãe tira ele do meu colo e eu fico tiririca. Eu beijo ele, ela fala que eu deixo fedendo a cabeça dele ...” (Samira).
“É engraçado que algumas avós criticam a mãe porque a mãe não dá atenção pro filho ...  como se a gente fosse incapaz de ...” (Amanda).

Percebe-se que quando o episódio violento se estende além do estupro, na forma de perseguições, a rede familiar também é contagiada pelo medo e progressivamente vai desistindo de apoiar. No caso de Danusa, isso é bem visível em sua peregrinação pela casa de parentes. “Cheguei, dei de cara com ele no portão, de manhã cedo eu botando ela para tomar sol”. “Minha tia que queria me abrigar lá na casa dela falou que não vai porque ele fica ameaçando”.

Como se constata, os efeitos da violência estão presentes na vida de Amanda, Danusa e Samira de forma inquestionável. São marcas e cicatrizes deixadas pela violência sexual, pelas cenas do abuso sexual incestuoso e do estupro que parecem fazer parte de suas vidas. Adotando a concepção de Anderson e Goolishian (1998), na qual o cliente é o especialista, dar voz às mulheres para que traduzissem com suas palavras, suas emoções e seus recursos linguísticos a sua vivência de violência foi libertador e promoveu intersecções que o construcionismo social preconiza como desdobramentos em conversações que permitem criar novas ligações e conexões (Gergen & Gergen, 2010; Marra, 2014; Rasera & Japur, 2007).

Entretanto, essa categoria se configura no alerta de que há outras violências que tangenciam a cena e que há, sim, reversibilidade ou redução de danos possível. É preciso acionar os fatores de proteção e promover intervenções que potencializem recursos saudáveis nas pessoas que foram acometidas, evitando a revitimização.

2. Não desejado, nem planejado, o bebê veio... E agora, como me tornar mãe? – A segunda categoria referenciou o processo de construção progressiva do papel de mãe. Embora a gestação tenha sido decorrente de violência sexual, as mães empreendem uma difícil tarefa, mas não a consideram impossível: construir uma relação afetiva com seu bebê. Inicialmente a rejeição fez parte das reações maternas. Elas associavam a gestação à violência sofrida e não se conformavam com o fato.

“Eu não tava (grávida), eu me olhava assim e dizia: isso aqui é gordurinha, mas eu não tô ...” (Amanda).
“... o dia que eu fiquei sabendo que tava grávida, eu tinha feito aquilo (ideia de acabar com a vida)” (Samira).
“... não foi desejada ... foi de uma maneira meio que difícil” (Danusa).

Novamente, ao tratar da rejeição ao bebê, as narrativas de sofrimento tomam lugar. A intervenção grupal foi determinante para que tais diálogos internos e privados pudessem ser revelados. A cultura proíbe e estigmatiza esse tipo de verbalização. Foi corroborado o conceito de responsabilidade relacional abordado por McNamee (2001), no qual a atitude do terapeuta favorece a flexibilidade para a partilha e promove a atualização da narrativa que envolve processos reflexivos identificados no passado, presente e futuro das histórias contadas por meio da linguagem.

As participantes mostraram que, após o período inicial da rejeição, resolveram enfrentar o desafio da gestação. Sabe-se que essa decisão de interromper ou manter a gestação envolve muito sofrimento e deve ser respeitada integralmente. Assim, Samira e Amanda decidiram que teriam seus bebês e iriam criá-los e Danusa optou por ter e doá-lo, mas desistiu ao nascimento. Diante da tônica sobre a preparação emocional para a maternidade, construída coletivamente ao longo das sessões grupais, as participantes passaram a notar cada conquista desse processo de aceitação apontando atitudes simples, como conversar com o bebê e preparar sua chegada, dando-lhe nome ou arrumando suas roupas.

“Minha irmã tira foto, coloca o nome na minha barriga... tá bom demais ... Minha mãe comprou algumas coisas...” (Amanda).
“Eu passava a mão na minha barriga, conversava com ele ... o tanto que ela tava grande, o tanto que ele tava se mexendo” (Samira).

A relação da mãe com seu bebê progride, se constituindo desde o período pré-natal, e é influenciada pelas expectativas que ela tem sobre o bebê e pela interação que estabelece com ele. As mães, também neste estudo, mesmo diante da adversidade, buscaram, desde a gestação, oferecer identidade ao bebê, atribuindo-lhe expectativas e sentimentos quanto ao seu sexo, nome e características psicológicas, personalizando sua interação com ele. Esse investimento afetivo costuma favorecer a constituição psíquica do bebê e permite avançar no exercício da maternidade, ainda desafiador para essas mães pela condição da violência sexual (Piccinini, Gomes, Moreira, & Lopes, 2004).

Danusa, em particular, desistiu de doar sua filha ao nascer e observou sua evolução, comparando-se a si mesma quanto aos sentimentos progressivos que desenvolveu pelo bebê. “Eu digo que não tô cem por cento, porque tem horas que vem a lembrança ... ela já começou a ganhar caminho do meu coração.” “Eu jurava que eu não ia ter esse amor todo ... é uma criança, um anjinho, inocente, não tem nada a ver como que a gente passou.”

As mães mostraram-se conscientes sobre o afeto que sentem pelo bebê, compreendendo que o amor materno não é instintivo, mas construído, não fantasiando nem romantizando esse amor. As participantes mostraram clareza quanto ao processo penoso de aceitar a condição em que os filhos foram concebidos e investem diariamente nesse exercício de superar a imagem da violência, dando a oportunidade de serem conquistadas pelos bebês e por suas manifestações espontâneas de vinculação emocional. De acordo com Azevedo e Arrais (2006), é preciso desculpabilizar as mães quando não correspondem ao mito do amor materno, que é decorrente de uma construção cultural e da idealização da maternidade. Samira, Amanda e Danusa não hesitam em estampar seu desespero, medo, falta de paciência e preocupação com o futuro.

Ao serem questionadas sobre como o desenvolvimento do afeto ocorre na relação mãe/bebê, as participantes mencionaram os próprios filhos como responsáveis por cativá-las. Isso encontra respaldo na literatura, quando as mães apresentam os indicadores de reciprocidade do vínculo nas respostas que os próprios bebês oferecem, como sorrisos e olhares (Aquino & Salomão, 2011). Ações da maternagem como amamentação, banho e cuidados diários também foram apontadas pelas participantes como momentos que oportunizam um contato afetivo no qual se veem com o importante papel de proverem ações indispensáveis aos bebês. A compreensão sobre a importância desse processo, além de lhes conferir status e competência social para exercer esse papel, eleva sua autoestima por conseguirem lograr êxito nessa tarefa. Estes aspectos positivos experienciados na gestação são também encontrados em alguns estudos (Joffily & Costa, 2006 Pantoja, 2003) que ressaltam que a gravidez e o exercício da maternidade podem trazer visibilidade e respeito social e motivarem as próprias mães a investirem em seus papéis parentais.

“É bom saber, é bom ver o seu bebê tendo o seu leite, ele puxando ...” (Samira).
“Ela mama e ri no peito, vaza para tudo quanto é lado” (Danusa).

Entretanto, esse processo paulatino encontra vários obstáculos. Um dos principais mobilizadores de sofrimento nas mães é a angústia da reedição do autor da violência na semelhança física com os filhos. As mães retrataram o quanto é perturbador olhar para o filho e pensar em seus ofensores, pois reconhecem no bebê características físicas hereditárias inevitáveis do progenitor. O investimento afetivo no bebê, que para as participantes é um exercício diário, torna-se ameaçado por essa revivescência da cena de violência e pode ter repercussões na vinculação que se encontra em processo.

“...Como é que eu ia olhar para ele, sendo que ele poderia parecer comigo ou com o pai?” (Samira).
“Meu Deus do Céu, e agora? ... quando ele nasceu ele era a cara do pai dele” (Amanda).
“... eu fico olhando para ela e vem tudo na minha mente ...” (Danusa).

As participantes relataram a angústia de ver, no bebê, o pai, com intensa carga de sofrimento. A reedição da cena de violência promove uma espécie de paralisia na mãe, que interrompe os cuidados do bebê quando se vê acometida pela reedição do abuso sexual. Dentro de um quadro provável de alguma semelhança física, urge que o grupo terapêutico promova intencionalmente intervenções que favoreçam a elaboração emocional desta vivência.

É preciso reconhecer que, no caso das participantes deste estudo, o agravo pelas condições adversas que impediram qualquer projeto de maternidade não inviabilizou o investimento afetivo dedicado aos seus bebês. As narrações, carregadas de afetos e sentimentos ambíguos, possibilitaram entrar em conexão com seus sentidos, apontando pausas, lágrimas e diálogos. Segundo White (2002) é na contradição que as narrativas se enriquecem, permitindo uma visão protagônica da pessoa, como agente ativo de sua própria vida, saindo da paralisia e empreendendo ações aos seus significados e sentidos construídos na multiplicidade de interpretações do campo relacional.

3.  O bebê é filho do monstro: como separar e superar? – O sentido subjetivo conferido pelas mães ao projeto de maternidade e de vida que precisam desenvolver compôs essa categoria. As participantes relataram que há muito a ser superado para desvincular os efeitos da violência sexual sobre os projetos pessoais, que incluem a maternidade, a construção de novos relacionamentos, o empreendimento profissional e tantos outros.

Há um desafio unânime no discurso das mães: separar, no plano emocional, o agressor do bebê. Os bebês reeditam seus pais biológicos nas características físicas e isso afeta inclusive os cuidados maternos. O maior desafio para elas é conseguir distinguir isso, não se deixando afetar ou encontrando recursos que as auxiliem a amenizar as reações decorrentes desta realidade da qual não conseguem se desvincular.

“E aí você dá de mamar e você olha para a carinha mais linda de mamãe ... Dá vontade é de enforcar, né? Mas não é ele, é ela. Não é ela que eu quero enforcar, eu quero enforcar é ele” (Danusa).
“... É difícil ... às vezes ele (filho) fica nervoso, fica do jeito que aquele nojento ficou no dia ... fico olhando para a cara dele ... aí eu entrego para a minha mãe e saio de perto ... Às vezes me dá vontade de explodir, sabe?” (Samira).

As consequências da associação entre o bebê e o autor da violência atingem as participantes produzindo nelas a culpa pela potencial negligência que podem vir a cometer com seus filhos. Embora não tenham apresentado no grupo vergonha em compartilhar a repulsa que o bebê lhes provocava em determinados momentos, uma ambivalência as consome: ora se veem amando seus filhos, ora se veem os odiando. No momento da raiva, a repulsa é incontrolável e a falta de paciência é convertida numa espécie de proteção excessiva, compensatória e hipervigilante para que nada ocorra à criança, temendo que essa acusação recaia sobre o fato de serem pouco cuidadosas.

“Eu fico me perguntando: será que eu tô deixando ela chorar muito? Preocupada com ela, mas ao mesmo tempo com repulsa, de pegar ela, porque lembra aqueles momentos, tem hora que eu já olho para ela com olhar de mais amor, de mais carinho” (Danusa).
Eu fico de olho pra não acontecer nada com ele, porque se eu deixar acontecer, a culpa vai ser minha e eu não quero ter culpa de nada” (Samira).

Segundo Anderson (2010), problemas e dilemas são vividos em sistemas interativos e contextuais e a conversação permite a legitimidade dos sofrimentos, mas impulsiona novas interpretações. Segundo White (2012), as narrativas possibilitam reescrever discursos constitutivos que são reformuladores de ações. As participantes, ao narrarem seus traumas e persecutoriedades que a violência sexual promoveu à maternidade, passavam a reconhecer os próprios recursos de superação que já utilizavam estrategicamente para chegarem ao estágio onde se encontravam.

As participantes mencionaram aspectos ligados à religiosidade e espiritualidade como um auxílio nos momentos de desespero.

“Uma coisa que me ajudou muito foi a questão da religião, acho que me ajudou muito mesmo...” (Amanda).
“Quando vinha essa tristeza eu pensava primeiramente em Deus, porque Ele que dá ajuda pra você” (Samira).

A rede de apoio social e afetiva também foi indicada pelas participantes como importante na superação dos momentos mais difíceis.

“ ... tem vezes que eu entrego para minha mãe assim, aí vem esse negócio, eu entrego para minha mãe aí eu vou lá fora, pego um ar” (Samira).
Isso aqui me lembra quando eu e Rui (atual namorado) fomos para uma festa ... todos olhavam daquele jeito... (risos) ... Tá de quantos meses? Ele falava bem assim: eu sou o pai ... eu não sabia o que fazer ... ele falando lá, como se fosse o pai mesmo” (risos) (Amanda).

De forma pertinente à intervenção grupal, quando se trabalha com pessoas que sofreram violência sexual, necessita-se de um adequado mapeamento não só das constatações de adversidades, mas um olhar voltado para as potencialidades presentes. Habigzang, Ramos e Koller (2011) identificaram que a confiança da família na revelação e a denúncia de violência configuram-se em fatores de proteção. Outro recurso decisivo de proteção é a rede de apoio social e afetiva, conforme apontado pelas participantes.

Dentre as superações apontadas como necessárias, está a de viver experiências pessoais exitosas. Mas os projetos se diferem: Amanda pensa em empreender um novo relacionamento com o atual namorado; ver-se como namorada de alguém de sua faixa etária parece libertá-la da amarra de um abuso sexual incestuoso crônico. Samira recusa-se a incluir casamento em seu projeto, mas projeta no filho sua felicidade. Danusa ainda se limita à sobrevivência dos riscos que seu ofensor lhe impõe, pensando em como agir para sua proteção e de seus filhos, que precisa abrigar e criar. Os desafios da violência sexual estão presentes na maternidade, porém as mães apontaram estar atentas às possibilidades que a cultura e o ambiente oferecem para fortalecê-las e auxiliá-las a descobrir recursos para minimizar os efeitos adversos que essa experiência dolorosa promoveu.

De acordo com Marra (2016), em seu trabalho voltado à compreensão dos significados de violência e percepção de sentidos do abuso sexual sofrido, as conversações permitiram um processo de desconstrução - compreensão - reconstrução, no qual antigas narrativas dominantes saturadas de problemas deram lugar às novas narrativas, contendo um convite à autoria de sua existência, utilizando seus próprios recursos para o enfrentamento da vida. Essa categoria reuniu várias possibilidades de superação presentes nas narrativas nas quais as participantes procuram ressignificar a dor em propostas de criação dos filhos.

4. Você já passou pelo que passei? Compartilhando dores e progressos – Essa categoria refere-se à experiência grupal vivenciada pelas participantes como um recurso que auxilia na superação. Ao serem convidadas a participar de um grupo, não houve uma adesão imediata. Entretanto, o que se obteve como processo foi significativo quanto ao papel do grupo no acolhimento dos sentimentos e na importância da verbalização da violência para um grupo capaz de compreender seu significado.

“Às vezes quando eu falo eu me sinto melhor, por mais que aquilo me doa, em lembrar em tocar no assunto, eu me sinto mais leve, eu tô dividindo minha dor” (Danusa).
“... Quando vocês ajudam a gente é como se fosse um alívio, pra gente tá falando tudo que tá passando, não só na relação sobre o estupro, mas também dentro de casa, fora de casa” (Samira).
“Eu gostei muito. Foi bom falar, foi bom conhecer histórias diferentes” (Danusa).

As falas fazem menção à dimensão dialógica estabelecida no grupo, inclusive no que se refere ao terapeuta. Autores da área clínica esclarecem que a visão construcionista social vê o terapeuta como parte integrante do sistema terapêutico e em lugar de diagnosticar e intervir, passa a uma posição de coconstrutor do processo dialógico, adotando uma postura de não saber que revela um interesse autêntico pela forma como cada qual expressa seu mundo e as situações que vivenciam (Anderson, 2011; Carrijo & Rasera, 2010; Grandesso, 2009; Marra, 2016;  Paula-Ravagnani, McNamee, Rasera, & Guanaes-Lorenzi, 2016; Rasera & Guanaes, 2010 ).

De acordo com White (2012), a subjetividade se organiza e se traduz em narrativas, compreendendo-se que a linguagem tem um papel essencial como expressão da identidade e como constitutiva da experiência que se tem no mundo. As participantes revelavam-se ao grupo fazendo o difícil exercício de tornar pública a sua experiência privada, trazendo em sua narrativa valores e ideologias presentes no contexto sociocultural. Outro aspecto identificado nas verbalizações é o reconhecimento de si, em sua narrativa, porém numa perspectiva transformadora, na qual estabelece novas significações e posicionamentos.

Yalom e Leszcz (2006), ao estudar fatores terapêuticos presentes no grupo, apontam a catarse, entendida neste contexto como expressão emocional que habilita o membro do grupo a compartilhar seus sentimentos de forma a libertar-se de algo que o incomoda. Como também há manifestação de acolhimento pelos demais, a participação no grupo passa a ser vista como benefício não só pelo apoio recebido, mas também pelo apoio oferecido, isto é, o membro do grupo entende que também pode ajudar o outro a sentir que tenha algo de valor para oferecer.

“Foi ótimo, você não sabe o quanto você me ajudou, não imagina” (Amanda).
“Foi importante para mim, não só para mim como para o meu filho também” (Samira).

Para Porto e Bucher-Maluske (2012), ainda é incipiente no país o atendimento psicológico a mulheres vítimas de violência. Segundo as autoras, há experiências grupais no Norte, como Rodas de Conversas, e também em São Paulo. Entretanto as próprias autoras advertem que essas atuações merecem ser mais bem avaliadas. Com relação à gestação, há grupos de Pré-Natal Psicológico que tencionam a construção de projetos de maternidade avaliados por Arrais e Araujo (2016), nos quais se observam vantagens no trabalho preventivo envolvendo questões psicológicas que emergem no ciclo gravídico puerperal.

Embora não se tenha encontrado na literatura grupos de grávidas e puérperas cujas gestações decorreram de violência sexual, o compartilhamento de informações e o aconselhamento direto, provido pelas experiências, também encontra lugar nas intervenções de cunho psicoeducativo empreendidas por seus membros. “Quando não tiver mais leite você ó, deixa te mostrar. Não tem esse bico do peito? Quando não tiver, você primeiro faz a massagem, e vai apertando assim, que vai saindo leite” (Samira).

Durante todo o processo grupal, as participantes legitimavam a experiência das demais em relação à maternidade. A forma como as participantes construíram seu discurso sobre a violência e a maternidade nessa condição peculiar permitiu, ao longo do trabalho, que se desenvolvessem novas formas de ver o problema, novos modos de reescrevê-los, novas atribuições de significados e negociação de sentidos (Gergen & Gergen, 2010; Marra, Omer, & Costa, 2015). O conceito de autoagenciamento de Anderson (2012) também pode ser identificado na vivência da maternidade, pois está diretamente relacionado à percepção pessoal de autocompetência, direcionando novos comportamentos e compreensões que viabilizem formas mais libertadoras de viver.

Considerações finais

O campo da violência sexual e da gestação dela decorrente é permeado pelo segredo e as dificuldades para inserir investigações científicas neste cenário demandam um esforço hercúleo de todos os envolvidos. A análise dentro de uma perspectiva construcionista social leva em conta os aspectos recursivos presentes nas narrações como forças propulsoras de desenvolvimento e encontra muita esperança na intervenção psicológica. Os resultados deste estudo mostraram reorganização das experiências, ressignificações e reautoria de narrativas que ressaltam o potencial do espaço dialógico como um lugar de produção de sentido. Mesmo diante das condições adversas foi possível identificar o investimento na construção da maternidade e, sobretudo, delinear um projeto para a criação dos filhos.
 
A proposta da pesquisa-ação contribuiu sobremaneira para a atenção aos conteúdos demandados pelas grávidas e puérperas. Dispositivos de garantia de direitos acionados por elas ou mesmo desconhecidos serviram de alerta para que o pesquisador responsável e comprometido com o sofrimento apontado pudesse inserir, na forma de intervenção psicoeducativa, orientações e esclarecimentos sobre aspectos presentes nas políticas públicas que eram ignorados ou mesmo subutilizados pelas pessoas que sofrem violações.

O grupo mostrou-se viável como espaço coletivo e pôde apresentar uma atuação na qualidade de fator de proteção, como moderador dos efeitos ou impactos negativos no desenvolvimento, dentre os quais figuram os dispositivos encontrados na rede de apoio social e afetiva (Mayer & Koller, 2012). Foi possível notar que, mesmo com impactos da violência sofrida, houve legitimação da expressão de sofrimento pela fala. A realização do grupo permitiu que uma iniciativa rara e audaciosa no campo da saúde pública fosse viabilizada e fornecesse uma série de contribuições para este campo complexo.

Os limites do estudo se revelaram nos campos conceitual e metodológico. A escassez de estudos em gravidez decorrente de violência sexual mostrou o quanto o tema ainda é envolvido pelo secretismo e requer estudos futuros que permitam maior apropriação conceitual. As limitações metodológicas referem-se aos constantes ajustes no delineamento em virtude das dificuldades das participantes, sejam emocionais ou operacionais. Embora tenham concordado em compor o grupo, as participantes não esconderam a mobilização emocional provocada. A cada revelação, ainda que consentida e até desejada, era preciso cautelosamente verificar a possibilidade do próximo passo, o que também representou um desafio à pesquisadora em sua postura dialógica e responsabilidade relacional.


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Recebido em: 11/05/2017
Aprovado em: 26/09/2017
 


I Psicóloga, Doutora em Psicologia Clínica e Cultura, Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica e Cultura (PPGPSICC/UnB). E-mail: srmlordello@gmail.com

II Psicóloga, Doutora em Psicologia Clínica, Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica e Cultura (PPGPSICC/UnB). E-mail: lianaf@terra.com.br

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