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Nova Perspectiva Sistêmica

Print version ISSN 0104-7841On-line version ISSN 2594-4363

Nova perspect. sist. vol.29 no.66 São Paulo Jan./Apr. 2020

 

ESTANTE DE LIVROS

 

Novis, A. L. (Org). (2019). Dando Asas às Narrativas – O encontro das histórias de vida com as narrativas literárias em diferentes contextos. Rio de Janeiro: Editora Jaguatirica.

 

 

Marilene A. GrandessoI

 

 


 

 

A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.

(Eduardo Galeano)

Ao ler este livro organizado por Ana Luiza Novis, versando sobre narrativas e recheado de histórias, fui transportada a vários mundos e caminhei nas utopias. A começar pelas memórias de minha infância, quando os livros eram meus companheiros com poderes mágicos, apresentando-me histórias fantásticas cheias de emoção e ternura, histórias prospectivas transportando-me para diferentes mundos, lugares onde eu jamais poderia estar, dadas as condições em que vivia na época. Ali, com esses amigos textuais, comecei a viver as minhas utopias. Mais que isso, já naquela tenra idade, as histórias que lia me convidavam a criar mundos, fertilizando minha imaginação. Inspirada, eu inventava cenários e enredos em torno de tramas narrativas instigadoras, onde tudo era possível.

A fascinação por ler histórias nas suas mais diversas tramas narrativas começou muito cedo em minha vida. Sempre havia espaço para a surpresa e as emoções que elas provocavam em meu coração. E assim foi, pela vida afora. As histórias românticas da adolescente sonhadora, os filósofos existencialistas de minha mocidade e os livros que me ajudaram a construir meu ser enquanto profissional e pessoa no mundo somam-se às emocionantes histórias que escuto de meus clientes, livros vivos escritos nas narrativas da vida.

O livro de Ana Luiza Novis, conforme ela mesma metaforicamente o descreve, apresenta-se como um encantador jardim em que cada capítulo se insere como um lindo canteiro de flores de múltiplas cores e inebriantes perfumes. Tal como a borboleta do conto Sintonia Quântica, de Ana Luiza e Kim Billington (neste Livro página 15), sobrevoei esse jardim e me encantei com a beleza das flores, com suas cores e fragrâncias. Muita emoção ao revisitar meu passado e projetar meu futuro. Que privilégio! Sou grata à autora por me presentear com este fascinante jardim. Seu livro convidou-me a reencontrar e refletir sobre minhas narrativas como mulher, mãe, avó e psicoterapeuta. E, mais ainda, as narrativas bem formadas que pude ler neste livro me inspiraram novas histórias instigadoras e esperançosas, construindo possibilidades para meu mundo futuro, provocada que fui por esse multicolorido jardim.

Cada autor desses dezesseis capítulos, conforme compartilham aspectos importantes do multiverso de suas experiências como profissionais e pessoas no mundo, inspiram e provocam ressonâncias no(a) leitor(a), criando um contexto reflexivo que possibilita enriquecer as suas próprias histórias e caminhar no seu horizonte em direção a novas possibilidades.

São variados os convites que este livro oferece. Como histórias bem contadas, as narrativas de cada capítulo promovem um diálogo com o(a) leitor(a). Terapeutas, educadores, literários, artistas, amantes das teorias e das práticas, viventes neste multifacetado mundo terão neste livro uma inspiração para o futuro, num movimento contínuo para alimentar a esperança e construir mundos.

Um livro percorre distâncias que os próprios autores não conseguem cobrir no cotidiano de suas vidas. E, mais do que vencer distâncias, Dando asas às narrativas, ao longo de seus dezesseis capítulos e no coro das diferentes vozes dos autores presentes, incentiva cada leitor ou leitora a juntar também suas vozes, em diferentes estilos narrativos – da prosa à poesia, do cotidiano da vida à literatura, educação, terapia e filosofia...

Nas páginas do livro podemos testemunhar que as narrativas não têm limites de idade e gêneros literários. Assim como Belmino (neste livro, página 240) considera que “o lirismo e beleza de alguns poemas é capaz de sensibilizar qualquer criança”, posso dizer que a beleza multivariada deste livro pode sensibilizar qualquer leitor(a), nos seus tempos e espaços. Os diferentes relatos aqui apresentados não têm restrições de usos, tamanhos são os contextos possíveis para criar e oportunizar.

Admiração e surpresa foram minhas companheiras ao longo da leitura deste livro.

Quantas e quão variadas possibilidades de construir mundos com histórias e narrativas, em seus mais criativos usos. A sensibilidade de Ana Luiza Novis em colocar juntos gêneros literários tão distintos e encantadoras práticas oferece aqui uma singular e ímpar contribuição. Termino minha leitura e essas poucas palavras tomando emprestada a poesia de Roseana Murray, compartilhada por Paula Belmino (no capítulo 14, página 240).

Quero asa de borboleta azul
Para que eu encontre
O caminho do vento
O caminho da noite
A janela do tempo
O caminho de mim.

Obrigada, Ana Luiza; obrigada a cada autor desses capítulos. Já me sinto com asas azuis. Convido o(a) leitor(a) a se emocionar, se encantar e dar asas às (suas) narrativas.

 

 

* Este texto foi também publicado como prefácio do livro em questão, intitulado: Dando Asas às Narrativas – O encontro das histórias de vida com as narrativas literárias em diferentes contextos.

 

I Marilene A. Grandesso: Possui Graduação em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1975), Pós-Graduação em nível de mestrado em Psicologia Experimental pela Universidade de São Paulo (1978), Doutorado em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1999). Professora e Supervisora de Terapia Familiar e de Casal do Núcleo de Família e Comunidade da PUC-SP. Psicoterapeuta de famílias, casais e indivíduos. Fundadora e presidente do Instituto Interfaci: família, casal, e indivíduo e INTERFACI: Instituto de Desenvolvimento Profissional. Coordenadora do Certificado Internacional em Práticas Colaborativas e Dialógicas-ICCP (INTERFACI / Taos Institute / Houston Galveston Institute desde 2011). Faculty do Houston Galveston Institute. Facilitadora de conversações colaborativo-dialógicas em famílias e organizações. Coordenadora de Grupos de Estudos em Práticas Narrativas (desde 2006). Coordenadora, professora e supervisora do Curso de Capacitação em Terapia Comunitária (desde 2003). Tem experiência na área de Psicologia, com ênfase em Intervenção Terapêutica, atuando principalmente nas seguintes áreas: terapia individual (crianças, adolescentes e adultos), terapia familiar e de casais e terapia comunitária. Especialista nas abordagens sistêmica, colaborativo-dialógica, e narrativa. E-mail: marilenegrandesso@gmail.com

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