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Acta Comportamentalia

versão impressa ISSN 0188-8145

Acta comport. v.14 n.1 Guadalajara jun. 2006

 

 

Variabilidade comportamental: uma taxonomia estrutural

 

Behavioral variability: a structural taxonomy

 

 

Lourenço de Souza Barba1

Universidade Ibirapuera

 

 


RESUMO

A expressão "variabilidade comportamental" não apresenta uniformidade conceituai. Analisando estudos empíricos, identificamos quatro diferentes grupos conceituais relacionados ao termo "variabilidade". O primeiro grupo inclui estudos que associam variabilidade a grau de dispersão. O segundo grupo reúne trabalhos que associam variabilidade a uniformidade distributiva. O terceiro grupo abrange trabalhos que associam variabilidade a recência. O quarto grupo inclui estudos que associam variabilidade a independência sequencial, são encontradas às vezes mim mesmo trabalho. Desenvolvemos então uma classificação das variáveis dependentes. Foi realizado tambén um agrupamento dos trabalhos que apresentavam metodologias similares. Os quatro grupos conceituais orientaram a classificação das variáveis dependentes. Características metodológicas permitiram uma classificação dos experimentos, que recaíram em quatro grupos. O primeiro grupo compreende trabalhos que empregaram manipulanda localizados em diferentes pontos do espaço e mediram distribuição, uniformidade distribuitiva ou dispersão. O segundo grupo reúne trabalhos que examinaram a variabilidade em labirintos e mediram uniformidade distribuitiva ou dispersão. O terceiro grupo contém os trabalhos que realizaram análise sequencial do comportamento e mediram uniformidade distribuitiva, recência ou aleatoriedade. O quarto grupo concentra trabalhos que analisaram a variabilidade em variáveis quantitativas contínuas e mediram dispersãoou uniformidade distributiva.

Palavras-chave: Variabilidade comportamental; Seleção dependente da frequência; Comportamento aleatório; Teoria da informação.


ABSTRACT

Several empirical works have been devoted to study behavioral variability. However, the term "variability" does not contain a rigorous conceptual uniformity. In this paper structural taxonomy of variability is formulated by taking into account empirical studies that investigate behavioral variability. It is concluded that there are four conceptual groups which the term "variability" relates. The first group includes the studies that match variability with dispersion around a central tendency value. The second group includes the studies that match variability with distribution or distributive uniformity. The third group includes the studies that match variability with recency. The fourth group includes the studies that match variability with sequential dependence. We note, however, that different variables denotig dispersion, distribution, recency or sequential dependence can be identified sometimes at a single empirical work. Taking into account this fact, we developed a classification of dependent variables. We also developed a clustering of the empirical studies that have similar methodological characteristics. The four conceptual groups guided the classification of the dependent variables. Methodological characteristics, on the other hand, guided the classification of empirical studies. We note that empirical studies can be assigned to one of four different groups: The first group includes the studies that used two or more manipulanda set at different locations and chose dependent variables measuring distribution, distributive uniformity or dispersion. The second group includes the studies that behavioral variability using mazes and chose dependent variables measuring distributive uniformity or dispersion. The third group includes the studies that utilized sequential analysis of behavior and chose dependent variables measuring recency, distributive uniformity or randomness. The fourth group includes the studies works that studied behavioral variabilty using continuous variables and chose dependent variables measuring distributive uniformity or dispersion.

Keywords: Behavioral variability; Frequency-dependent selection; Random behavior; Information theory.


 

 

Muitos pesquisadores se dispuseram a investigar a variabilidade comportamental. O que se tem, contudo, denominado "variabilidade" pode mudar consideravelmente, segundo o estudo que tomemos. Notamos que o termo "variabilidade" parece não ter, a sustentá-lo, uma rigorosa uniformidade conceituai. O que faremos em seguida é procurar elucidar essa diversidade de sentidos. Proporemos, neste trabalho, uma classificação da variabilidade comportamental. Sugerimos, ainda, algumas implicações, teóricas e empíricas, que pode acarretar a adoção de diferentes concepções do conceito.

Para desenvolver a classificação da variabilidade comportamental, estabelecemos a seguinte metodologia: selecionamos estudos empíricos, particularmente na área da análise experimental do comportamento, que elegeram o tema "variabilidade comportamental" para objeto de estudo. Examinamos a concepção de variabilidade que se adotou em cada um deles, analisando as variáveis dependentes que definiram. Apoiados nesse exame, constatamos que se podem identificar basicamente quatro concepções distintas daquilo que se tem denominado "variabilidade", no âmbito da pesquisa comportamental. Caracterizamos cada uma das quatro concepções. Em seguida, retomamos os trabalhos empíricos, separando as variáveis dependentes e associando-as a cada uma das quatro concepções.

Ao apresentarmos os estudos empíricos, restringiremos nossas descrições àqueles aspectos que permitem determinar a concepção de variabilidade que subjaz aos estudos. Concentraremos, por isso, nossa atenção nas variáveis dependentes e descreveremos tópicos de procedimento somente naqueles pontos que se mostrarem úteis à boa compreensão das ditas variáveis. Tampouco nos ocuparemos com descrever e discutir os resultados a que chegaram os pesquisadores.

 

CLASSIFICAÇÃO ESTRUTURAL DA VARIABILIDADE

O exame dos estudos empíricos levou-nos a estabelecer quatro grandes grupos conceituais. Eis aqui sua descrição:

1 - DISPERSÃO: o termo "variabilidade" pode significar "dispersão em relação a uma medida de posição central". Dada uma série de valores, podem-se extrair medidas de posição central (médias, medianas etc.) e valores que reflitam a dispersão em torno dessas medidas: variância, desvio médio, desvio padrão, intervalo interquartílico, coeficiente de variação.

Lachter e Corey (1982) oferecem um exemplo de estudo em que "variabilidade" é sinônimo de "dispersão". Esses pesquisadores submeteram seus sujeitos à seguinte condição: os animais foram treinados em esquemas de razão fixa. À exigência própria do esquema de razão, somava-se esta outra exigência: uma resposta de pressão à barra somente era efetiva, se o animal a mantivesse pressionada por um intervalo mínimo de tempo. Foram registrados, para todas as respostas, os intervalos temporais durante os quais os animais mantinham pressionada a barra. Foram calculados, sobre a série de durações das respostas de pressão à barra, valores de desvio padrão. Esses valores representavam a variabilidade investigada no estudo.

2 - DISTRIBUIÇÃO E UNIFORMIDADE DISTRIBUTIVA: 'Variabilidade" equivale aqui, em termos gerais, a "grau de distribuição que apresentam os valores de uma série". Em McCray e Harper (1962), por exemplo, crianças foram instruídas a colocar a mão dentro de uma caixa opaca e acionar um de quatro dispositivos instalados em seu interior: uma pequena alavanca; uma pequena maçaneta; uma pequena corrente de puxar; uma pequena manivela. As crianças, que não podiam enxergar o interior da caixa, eram treinadas a introduzir suas mãos dentro dela e acionar qualquer um dos quatro dispositivos. Os experimentadores registraram o número de diferentes dispositivos que cada criança acionou. Ocorrendo que o mesmo sujeito acionasse mais de um dos dispositivos, os pesquisadores calcularam as porcentagens em que foi acionado cada um deles.

A primeira variável exprime, portanto, QUANTOS dispositivos distintos foram acionados, e a segunda variável exprime EM QUE PROPORÇÃO foram acionados. A primeira mede aquilo que aqui denominamos "distribuição". Uma definição geral do que denominamos 'distribuição1 poderia dar-se nos seguintes termos: 'distribuição' refere-se ao número de diferentes realizações que efetivamente assumiu uma variável, dentro de um universo de realizações possíveis. No caso que expusemos, eram quatro as realizações possíveis (os quatro dispositivos). Algumas crianças acionaram apenas um, outras acionaram dois, três ou até os quatro dispositivos. Nessa concepção, maior variabilidade implica maior número de realizações da variável, dentro do universo possível de realizações. A segunda variável mede aquilo que aqui denominamos "uniformidade distributiva". Maior uniformidade distributiva, ou maior variabilidade, implicava, no caso do estudo de McCray e Harper (1962), distribuição mais equilibrada das respostas pelos quatro dispositivos. Um sujeito que tivesse acionado os quatro dispositivos em igual proporção (cada dispositivo teria recebido 25% do total de respostas) apresentaria uma maior uniformidade distributiva que um outro sujeito que tivesse acionado os quatro dispositivos nas proporções de 70%: 15%: 10%: 5%. Este último, de sua parte, teria mostrado maior uniformidade distributiva - ou maior variabilidade - que um terceiro sujeito que tivesse acionado apenas um dos quatro dispositivos (as proporções seriam, nesse caso, as seguintes: 100%: 0%: 0%: 0%).

Supomos que "distribuição" e "uniformidade distributiva" não correspondem a conceitos propriamente distintos. São noções complementares. O conceito de "uniformidade distributiva" constitui, a nosso juízo, uma extensão do conceito de "distribuição". Por isso, os agrupamos numa mesma unidade conceitual.

Em Ferraro e Branch (1968), vemos aplicado o conceito de uniformidade distributiva. Esses pesquisadores treinaram pombos a responder a oito chaves de resposta dispostas horizontalmente, à frente dos animais. Os pombos foram submetidos a esquemas de esquemas de intervalo variável e, posteriormente, eram submetidos a esquemas de reforçamento contínuo. Regístrou-se a porcentagem de respostas emitidas em cada uma das oito chaves. Foi também definido o indice de "redundância" C, que media a variabilidade "à avessas". Isto é, C refletia a "estereotipia" ou "redundância" que caracterizava o comportamento dos pombos. C definia-se pela fórmula C = 1 - (H / Hmáx), em que H constituía um índice oriundo da teoria da informação e refletia o grau de distribuição das respostas pelas oito chaves (Attneave, 1959). Para oito chaves, Hmáx correspondia a 3. H assumia valores que iam de 0 a 3, conforme as respostas estivessem mais ou menos distribuídas pelas oito chaves: H era igual a 0, se todas as respostas fossem emitidas sobre uma única chave, e H era igual a 3, se todas as respostas fossem igualmente distribuídas pelas oito chaves. Assim, C podia assumir valores de 0 a 1, correspondendo 0 ao menor montante de redundância - ou maior montante de variabilidade (ou ainda, distribuição perfeitamente uniforme das respostas pelas oito chaves), e correspondendo 1 ao maior montante de redundância - ou menor montante de variabilidade (ou ainda, todas as respostas emitidas em uma única chave). Attneave (1959) apresenta, de maneira bastante didática, os conceitos que subjazem à elaboração dos índices H, Hmáx e C. A razão H / Hmáx será ainda retomada em outros estudos que mencionaremos. Essa razão é normalmente denominada índice U (Attneave, 1959).

Algo se deve dizer, ainda, sobre algumas "medidas de preferência". Em Ferraro e Branch (1968), por exemplo, uma medida de preferência poderia corresponder à porcentagem de respostas emitidas sobre a chave mais acionada em uma sessão. Quanto maior essa porcentagem, tanto maior a concentração das respostas sobre uma só chave. Analogamente, valores baixos dessa porcentagem poderiam indicar maior distribuição das respostas pelas oito chaves. As medidas de preferência refletem, portanto, a uniformidade distributiva "às avessas". Deixamo-las, por isso, junto às medidas de uniformidade distributiva. Descreveremos alguns trabalhos em que medidas de preferência foram utilizadas.

3 - RECÊNCIA: nos estudos de variabilidade, foram definidas variáveis dependentes que exprimem a propriedade que denominamos 'recência'. Podemos enunciar essa propriedade nos seguintes termos: suponhamos uma série de realizações de uma variável. É possível atribuir a cada uma delas, a partir do momento em que tenham ocorrido pela segunda vez, uma valor que exprima o quão separada está de sua passada e mais recente ocorrência. Vamos a dois casos que ajudam a elucidar o conceito.

Em Morgan e Neuringer (1990), ratos foram submetidos ao seguinte esquema: eram colocados em uma caixa que continha um par de barras de resposta - uma barra esquerda (E) e uma barra direita (D). Os reforços programados somente podiam ser dispensados ao final da emissão de quatro respostas consecutivas em qualquer uma das duas barras. Os ratos recebiam os reforços programados, somente se emitissem sequências de quatro respostas que diferissem, em sua composição, ao menos das cinco últimas sequências emitidas (esquema lag - 5). Diferiam entre si todas as sequências que exibiam respostas à barra esquerda e à barra direita em diferentes quantidades, ou as exibissem em diferentes configurações, ainda que as apresentassem em iguais quantidades. Diferiam entre si, por exemplo, as sequências EEDD (duas respostas à barra esquerda, seguidas de duas resposta à barra direita) e DDEE (duas respostas à barra direita, seguidas de duas resposta à barra esquerda). Na série de sequências EEDD, DDEE, DDDE, EDED, DEDE, EEDD, EEDE, EEDE, DDDD, EEEE, DDDD, DEED, DEDD, EEEE, emitidas nessa ordem, as sequências sublinhadas seriam seguidas de reforço, e as sequências em negrito não o seriam. São 16 as diferentes sequências possíveis, nesse caso. Uma das variáveis dependentes correspondeu à 'porcentagem de variação' (número de sequências que atendiam às exigências do esquema / número total de sequências emitidas na sessão) X 100. Essa porcentagem equivalia, portanto, à porcentagem de sequências emitidas que diferiam, ao menos, das cinco últimas sequências emitidas. Ou seja, correspondia à porcentagem de sequências que tinham, entre a ocorrência atual e a ocorrência passada mais recente, ao menos cinco diferentes sequências intervenientes. Nesse estudo, portanto, o animal que mais "variava" seu comportamento era aquele que emitia maior número de sequências que tinham, a separarem-nas da sua passada e mais recente ocorrência, ao menos cinco diferentes sequências intervenientes.

Mencionaremos, mais adiante, muitos trabalhos empíricos que adotaram o procedimento lag. Doravante chamaremos de esquema lag - n padrão a todo esquema de reforçamento que apresente as seguintes características: sujeitos devem responder a dois manipulanda - duas chaves ou duas barras de respostas - uma situada à esquerda e outra situada à direita de um ponto central; a apresentação do reforço é contingente à emissão de sequências de respostas discretas - respostas emitidas sobre os manipulanda - que difiram, ao menos, das n últimas sequências emitidas (critério lag). Essas sequências apresentam número fixo de respostas, em cada experimento, e a apresentação do reforço somente se pode dar ao final da emissão de uma sequência completa, desde que satisfeito o critério lag.

Em Machado (1989), que adotou uma variante do esquema lag-n, temos uma variável dependente que exprime recência. A toda sequência emitida correspondia um "índice de variabilidade" ('variability score'). Esse índice correspondia ao número de diferentes sequências que se interpunham entre uma determinada ocorrência da sequência S e sua passada e mais recente ocorrência. Um "índice médio de variabilidade" foi também calculado, sobre algumas séries de índices de variabilidade. Essa média assumia valores tanto mais elevados, quanto maior fosse, em termos gerais, o número de sequências intervenientes a separarem duas ocorrências seguidas de uma mesma sequência. Aporcentagem de variação, em Morgan e Neuringer (1990), assumia, como vimos, valores tanto mais elevados, quanto maior fosse o número de sequências que tivessem, a separarem-nas de sua ocorrência passada e mais recente, ao menos cinco diferentes sequências intervenientes.

O "índice de variabilidade", em Machado (1989), media a "distância" que separava toda sequência da sua ocorrência passada mais recente. "Distância" correspondia, nesse caso, ao número de diferentes sequências intervenientes. Era possível definir, para toda sequência, a partir do momento em que ela ocorresse pela segunda vez, a "distância" a que estava da sua ocorrência passada mais recente, tanto em Machado (1989) quanto em Morgan e Neuringer (1990). A toda série de sequências emitidas correspondia, portanto, um conjunto de "distâncias" - uma "distância" para cada sequência emitida (a partir da segunda emissão). Essas distâncias afetaram diretamente o 'índice médio de variabilidade", de Machado (1989), que correspondia a uma média dessas distâncias. Afetaram também a porcentagem de variação de Morgan e Neuringer (1990). A porcentagem de variação era menos afetada por eventuais alterações no conjunto de distâncias, uma vez que essa variável apenas distinguia as sequências em dois grupos: aquelas cuja distância a separá-las de sua ocorrência mais recente era maior ou igual a cinco e aquelas cuja distância a separá-las de sua ocorrência mais recente era menor que cinco. Importa, no entanto, acentuar que ambas eram afetadas por essas "distâncias" e assumiam maiores valores, à medida que essas distâncias aumentavam. "Maior variabilidade", traduzida nessas duas variáveis dependentes, implicava, portanto, "maiores distâncias a separarem duas ocorrências seguidas da mesma sequência de respostas". Diremos, nesse caso, que "variabilidade" equivale a "recência". Denominaremos, ainda, medidas de recência a todas aquelas variáveis dependentes que são afetadas por essas distâncias e que variem direta e sistematicamente com elas.

4 - DEPENDÊNCIA SEQUENCIAL OU ALEATORIEDADE: em alguns trabalhos, o conceito de "variabilidade" liga-se à noção de "independência sequencial entre eventos". Dois eventos são independentes, se a ocorrência de um não altera a probabilidade de que venha a ocorrer o outro. Esse quarto e último grupo compreende, portanto, variáveis dependentes que exprimam essa dependência de eventos. É necessário, por conseguinte, que o conceito de dependência seja traduzido em termos operacionais. Em outras palavras, devemos indagar: dada uma série de eventos, como podemos determinar se há ou não dependência entre eles? Podemos graduar essa dependência, quando a houver? Que propriedades deveria apresentar essa série, se ela compreendesse eventos independentes?

Esses pontos podem elucidar-se mais facilmente, se recorrermos a um exemplo simples: os lançamentos sucessivos de uma moeda. A cada lançamento, teríamos uma face da moeda voltada para cima: 'cara' ou 'coroa'. Os lançamentos passados não terão, presumivelmente, qualquer efeito sobre os lançamentos presentes ou futuros. Depois de um grande número de lançamentos, teríamos uma longa sequência de 'caras e coroas1. Nessa sequência, esperamos que os eventos independam completamente uns dos outros. Isto é, a ocorrência de 'cara' - ou de 'coroa'-, a uma determinada altura da sequência, não afetaria, presumivelmente, as chances de ocorrem caras - ou coroas - em ocasiões subsequentes. Nesse caso, seriam dois os CARACTERES constituintes da sequência: 'cara' (A) e 'coroa' (B). A cada lançamento corresponderia um novo EVENTO independente, que poderia ser 'cara' ou 'coroa'. Podíamos ter, talvez, uma sequência como esta: A, A, B, A, B, B, A, B, A....A ocorrência do caracter 'cara' (ou 'coroa') - isto é, o fato de a moeda pousar com a face 'cara' voltada para cima -, em qualquer ponto de uma série de lançamentos, não deve depender de nenhum dos eventos anteriores nem influir em nenhum evento subsequente.

Que propriedades estruturais deveria conter uma tal sequência, suposto que a moeda fosse lançada um grande numero de vezes? Se a moeda não fosse viciada - isto é, se fossem iguais as probabilidades de ocorrer cada um dos caracteres ('cara' ou 'coroa'), em cada lançamento - essa sequência deveria compreender, em proporções aproximadamente iguais, os caracteres A e B. Cada caracter deveria figurar, portanto, na proporção aproximada de 1 / 2. Os pares de caracteres consecutivos, AA, AB, BA e BB também deveriam constar em proporções aproximadamente iguais. Como são quatro os pares, cada um deles deveria entrar na proporção aproximada de 1 / 4. O mesmo ocorreria aos tercetos de caracteres consecutivos, AAA, AAB, ABA, ABB, BAA, BAB, BBA e BBB, que deveriam mostrar-se na proporção aproximada de 1 / 8. Também os 16 quartetos de caracteres consecutivos, os 32 quintetos de caracteres consecutivo, e, de maneira genérica, os 2n n -tetos de caracteres consecutivos (em que n representa qualquer número natural maior que 0) deveriam compor a sequência, em proporções aproximadamente iguais entre si, a saber, 1 /16,1 / 32,1 / 2n, respectivamente (Attneave, 1959). Diz-se, ainda, que uma sequência que apresente essas características constitui uma sequência de eventos aleatórios.

Mas não seria preciso que fosse honesta a moeda que supusemos. Também os lançamentos sucessivos de uma moeda viciada constituiriam eventos igualmente independentes. Suponha-se, por exemplo, uma moeda fortemente viciada, cujos lançamentos resultassem no evento 'cara', em 90% das vezes. Os eventos seriam, ainda aqui, perfeitamente independentes de todos os eventos que lhe fossem anteriores. A sequência gerada nessas condições poderia ser a seguinte: A, A, A, A, A, A, B, A, A, A, A, A, B, A, A, A, A, A, A, A (sequência S). As frequências relativas - ou proporções - em que esperaríamos contar os caracteres, pares de caracteres consecutivos e tercetos de caracteres consecutivos seriam as seguintes, se S fosse bastante extensa: (A = 0,9), (B = 0,1), (AB = BA = 0,09), (AA =0,81), (BB = 0,01), (AAA = 0,729), (BBB =0,001), (BAB = BBA = ABB = 0,009), (BAA = AAB = ABA = 0,081). Cálculos similares poderiam ser efetuados sobre as frequências esperadas de quartetos, quintetos, sextetos, etc...

Quaisquer que sejam, pois, as frequências e o número dos caracteres - no nosso exemplo eram apenas dois, A e B -, em uma sequência S, podem-se calcular as frequência relativas esperadas dos pares, tercetos, quartetos, .n-tetos de caracteres consecutivos, sob a hipótese de que S tem, a constituí-la, uma série de eventos independentes. As discrepâncias que venham a separar as proporções observadas das proporções esperadas constituem, pois, uma medida de dependência sequencial.

Em Machado (1992), por exemplo, pombos respondiam sobre duas chaves: chave esquerda (E) e chave direita (D), produzindo sequências da forma E, E, D, E, D, D, E, D..... Sobre as sequências produzidas, foram calculados, sessão a sessão, valores de probabilidades condicionais e incondicionais. Foram calculadas: a probabilidade incondicional de que uma resposta fosse emitida sobre a chave direita; a probabilidade de que a resposta n + 1 fosse emitida sobre a chave direita, dado que a resposta n fora emitida sobre a chave direita; a probabilidade de que a resposta n + 2 fosse emitida sobre a chave direita, dado que a resposta n fora emitida sobre a chave direita; a probabilidade de que a resposta n + 3 fosse emitida sobre a chave direita, dado que a resposta n fora emitida sobre a chave direita; a probabilidade de que a resposta n + 4 fosse emitida sobre a chave direita, dado que a resposta n fora emitida sobre a chave direita, e a probabilidade de que a resposta n + 5 fosse emitida sobre a chave direita, dado que a resposta n fora emitida sobre a chave direita. Essas probabilidades refletiam diretamente as frequências em que figuravam, nas sequências geradas, os caracteres E e D, os pares de caracteres consecutivos EE, ED, DE, DD, bem como os tercetos, quartetos e quintetos de caracteres consecutivos. Seria de esperar que, se E e D constituíssem eventos independentes, as probabilidades condicionais não se desviassem muito da probabilidade incondicional de ocorrer uma resposta sobre a chave direita. Esses desvios seriam tanto mais acentuados, quanto mais as frequências observadas se distanciassem das frequências esperadas, em uma sequência de eventos independentes. Esses desvios constituíram, assim, uma medida de dependência sequencial.

Outras variáveis dependentes podem definir-se que meçam a dependência sequencial. O teste estatístico de qui-quadrado constitui um exemplo. Podem contrapor-se as proporções observadas às esperadas, sob a hipótese nula de independência sequencial (Blough, 1966). Pode ainda o qui-quadrado combinar-se às cadeias de Markov, em testes que consideram diferentes ordens de dependência (Machado, 1992).

Vimos que o índice H, em Ferraro e Branch (1968), media a distribuição das respostas pelas oito chaves. Vimos também que o índice H assumia seu maior valor quando a distribuição fosse perfeitamente uniforme - isto é, quando as respostas sobre as oito chaves ocorressem em igual proporção. O índice H, que apresentamos em Ferraro e Branch (1968), pode também aplicar-se às proporções em que se apresentam os pares, tercetos, quartetos...n-tetos de respostas consecutivas. A razão H / Hmáx (também denominada índice U) assume, como vimos, o valor mínimo 0, que indica a menor distribuição possível, e o valor máximo 1, que expressa a maior uniformidade distributiva possível. O mesmo ocorre aos H's que medem a distribuição em qualquer nível: pares, tercetos, quartetos etc...

Na sequência que representa os sucessivos lançamentos de uma moeda, teríamos o seguinte: o índice U calculado sobre as proporções dos dois caracteres assumiria o valor 1, se 'caras' e 'coroas' ocorressem em iguais proporções, e tomaria o valor 0, se somente um dos caracteres ocorresse; o índice U calculado sobre as proporções dos quatro pares de caracteres consecutivos assumiria o valor 1, se os pares 'cara - cara', 'cara - coroa', 'coroa - cara' e 'coroa - coroa' ocorressem em iguais proporções e desceria a 0, se somente um dos pares ocorresse; o índice U calculado sobre as proporções dos oito tercetos de caracteres consecutivos alcançaria o valor 1, se os oito tercetos ocorressem em iguais proporções, e assumiria o valor 0, se somente um dos tercetos ocorresse o mesmo pode estender-se aos demais níveis: quarteto, quintetos, n-tetos.

Dessa forma, se o índice U calculado sobre a proporção dos caracteres for igual a 1 (o que significa que 'caras' e 'coroas' estarão na proporção de 50%), devemos esperar que o índice U, calculado nos demais n íveis, também assuma o valor I, se os eventos que compõem a sequência forem, de fato, independentes. Isto é, 1 é o valor esperado de U, em todos os níveis, sob a hipótese de independência.

Raciocínio análogo valeria para a sequência formada com os lances da moeda viciada (A na proporção de 0,9 e B na proporção de 0,1). Nesse caso, o índice U calculado sobre as proporções de caracteres apresentaria um baixo valor - por volta de 0,469. Mas também os índices U calculados sobre os pares, tercetos, quartetos e n -tetos de caracteres consecutivos mostrariam o valor aproximado de 0,469, sob a hipótese de que são independentes os eventos que formam a sequência. Ou seja, valores de U -quando calculado sobre pares, tercetos e quartetos - menores que 0,469 acusariam algum grau de dependência sequencial.

Dessa forma, são as discrepâncias que venham a apresentar, entre si, os índices U medidos em diferentes n íveis que podem refletir a dependência sequencial (Page & Neuringer, 1985).

Daqui em diante chamaremos U1 ao índice U calculado sobre as frequências em que se apresentam os caracteres em uma série qualquer, Chamaremos U2 ao índice U calculado sobre as frequências em que se apresentam os pares de caracteres consecutivos em uma série qualquer e U3 ao índice U calculado sobre as frequências em que se apresentam os tercetos de caracteres consecutivos em uma série qualquer. Todos esses índices, tomados isoladamente, medem o grau de uniformidade distributiva em que se apresenta um conjunto de frequências. As discrepâncias entre eles podem, por outro lado, apontar n íveis de dependência sequencial.

 

AGRUPAMENTO DOS TRABALHOS

Descritos, em termos gerais, esses quatro grupos conceituais, deve-se notar um ponto importante. Um mesmo estudo pode definir variáveis dependentes que refletem propriedades diversas. Isto é, variáveis distintas, que exprimam dispersão, distribuição, recência ou dependência sequencial, podem ser definidas num mesmo trabalho. A investigação de Eckerman e Lanson (1969) pertence a esse grupo de trabalhos. Seu procedimento foi o seguinte: pombos foram treinados a responder a 20 chaves de resposta dispostas horizontalmente. Submeteram-se os animais a esquemas de reforçamento contínuo, extinção, intervalo fixo e intervalo variável. Cada chave ocupava, no sentido horizontal, um espaço de 0,5 polegadas (havendo assim uma faixa de 10 polegadas em que poderiam responder os pombos). A cada uma das 20 chaves correspondia uma distância (em múltiplos de 0,5 polegada), medida a partir da extremidade direita do painel de chaves. Toda bicada ocorria, portanto, a uma certa distância da extremidade direita do conjunto de chaves. Essas distancias foram registradas. Sobre esse registro, calculou-se o desvio médio em relação a uma medida de posição central (primeira variável dependente). A proporção em que foram emitidas as respostas, sobre cada uma das 20 chaves, constituiu uma segunda variável dependente. Essa proporção reflete, em verdade, a distribuição das respostas pelas 20 chaves. Temos, assim, que a primeira variável dependente exprime dispersão, enquanto a segunda exprime distribuição.

Sucede aqui um problema: essas propriedades - dispersão e uniformidade distributiva - podem não covariar. Essa circunstância não ocorreu aos pombos de Eckerman e Lanson (1969), mas, em princípio, nada impedia que ocorresse. Tínhamos aí que a distribuição mais uniforme ocorreria, se o animal bicasse cada uma das 20 chaves o mesmo número de vezes. A distribuição menos uniforme, ou mais concentrada, ocorreria se o animal bicasse apenas uma das 20 chaves (qualquer uma delas). O mesmo não sucede à dispersão. O desvio médio, em relação a uma medida de posição central, atingiria seu mais alto valor, se os pombos concentrassem todas as suas respostas apenas sobre a primeira e última chaves do conjunto (as chaves que ocupavam as extremidades do painel).

Suponhamos, por exemplo, que o animal emitisse suas respostas apenas sobre a primeira chave à direita e sobre a primeira chave à esquerda do painel, alternando-as sistematicamente. Teríamos, então, as seguintes distâncias em polegadas: 0,5; 10; 0,5; 10; 0,5; 10; 0,5; 10.... A dispersão em relação à posição central atingiria, nesse caso, seu valor máximo (DP= 4,75 polegadas). A uniformidade distributiva seria, contudo, muito pequena. Suponhamos que, em vez disso, o animal distribuísse igualmente suas respostas pelas 20 chaves, bicando cada uma delas um mesmo número de vezes. Teríamos então que a uniformidade distributiva seria máxima. A dispersão seria, no entanto, menor que aquela primeira (DP= 2,88 polegadas).

Note-se que as duas concepções diferem fundamentalmente em que "dispersão" implica sempre uma medida de posição central. Isto é, os dados estão dispersos em relação a uma medida de posição central. "Uniformidade distributiva" não envolve referência a medidas de posição central. Uma medida de dispersão e uma medida de uniformidade distributiva podem, portanto, não 'caminhar juntas'. O seguinte exemplo hipotético dá a exata noção do que queremos demonstrar:

Suponhamos três distribuições distintas, em três instantes distintos: 1 - concentrada no centro: o pombo bica somente sobre as duas chaves centrais (chaves 10 e 11 ), no instante 1. A partir do instante 1, o animal começa a distribuir suas respostas, que vão diminuindo sobre as chaves centrais, à medida que vão aumentando sobre as chaves vizinhas às chaves centrais (chaves 9 e 12,8 e 13,7 e 14 ) Isto é, a distribuição iria 'achatando-se', até que se tomasse perfeitamente uniforme. Teríamos, então, o instante 2, com a distribuição perfeitamente uniforme. A partir do instante 2, as bicadas sobre as chaves centrais iriam diminuindo, à medida que fossem aumentando as bicadas sobre as chaves das extremidades (chaves 1 e 20,2 e 19,3 e 18.,.). Esse processo seguiria até que as bicadas fossem emitidas somente sobre as chaves mais distantes do centro (chaves 1 e 20). Teríamos, então, o instante 3, com as respostas concentradas nas extremidades (distribuição em "U").

O que ocorreria às medidas de dispersão e uniformidade distributiva, se fossem auferidas nos instantes 1,2 e 3? As medidas de dispersão aumentariam, do instante 1 ao instante 2, e seguiriam aumentando, do instante 2 ao instante 3. As medidas de uniformidade distributiva também aumentariam, do instante 1 ao instante 2, mas voltariam a diminuir, do instante 2 ao instante 3.

O trabalho de Carlton (1962) mostra concretamente esse ponto. Carlton (1962) apresentou aos seus sujeitos experimentais um painel equipado com cinco manipulanda, atribuindo os valores 1,2,3,4 e 5 a cada um deles respectivamente. Uma das variáveis dependentes foi a porcentagem de respostas emitidas sobre cada um dos cinco manipulanda. Carlton (1962) definiu ainda uma segunda variável dependente: um sujeito que respondesse sucessivamente aos manipulanda 5, 3, 2, 3, 1, 4... produziria a série numérica 5, 3, 2, 3, 1, 4.... Sobre essas séries, calcularam-se intervalos interquartis, medida que exprime dispersão. Um sujeito de seu estudo (T-02) concentrou suas respostas nos manipulando mais laterais (manipulandum 1 e manipulandum 5), apresentando uma distribuição em U. Uma distribuição desse tipo é pouco uniforme, mas revela alta dispersão. De fato, para o sujeito T-02, durante todo o experimento, foi obtido um alto valor de intervalo interquartil, cerca de 3,5. Os demais sujeitos, ainda quando apresentaram as distribuições mais uniformes, produziram valores de intervalo interquartil menores que 3,5. Ou seja, o desempenho que renderia o mais alto valor de intervalo interquartil não corresponderia à distribuição mais uniforme das respostas pelos cinco manipulanda. E uma distribuição perfeitamente uniforme das respostas pelos manipulanda não produziria o mais alto valor de intervalo interquartil.

Também em Morgan e Neuringer (1990) podemos ver variáveis dependentes que exprimem propriedades diversas. Já vimos que a porcentagem de variação reflete aquilo que denominamos "recência", pois o esquema empregado foi o lag - n . Mas Morgan e Neuringer (1990) empregaram também o índice U, que, como vimos, mede a "uniformidade distributiva". O U de Morgan e Neuringer (1990) atingia seu valor máximo, 1, se o pombo houvtsse emitido, em iguais proporções, as 16 diferentes sequências, independentememe da ordem em que tivessem sido emitidas. Já a porcentagem de variação alcançaria seu ponto máximo, se o animal sempre emitisse sequências que tivessem, a separá-las da mais recente ocorrência, o número mínimo de sequências intervenientes imposto pelo esquema. A depender do valor de n (no esquema lag - n), o sujeito poderia obter o grau máximo de recência, emitindo um pequeno número de sequências diferentes.

Machado (1992), j á mencionado, também mediu, a par da dependência sequencial, a uniformidade distributiva, apresentando as frequências em que foram emitidas as 16 sequências.

Sucede aqui algo análogo àquilo que pode ocorrer às medidas de dispersão e uniformidade distributiva. Uma sequência de eventos pode, em tese, apresentar altas medidas de recência e, simultaneamente, dependência sequencial estrita. Suponha-se que o animal, no experimento de Morgan e Neuringer (1990), emitisse as 16 diferentes sequências possíveis, em alternaçôes sistemáticas: sequência 1, sequência 2,..., sequência 16, sequência 1, sequência 2,..., sequência 16, sequência 1, sequência 2,..., sequência 16. O seu "índice médio de variabilidade", uma medida de recência, seria muito alto (15). Também seu U calculado sobre as proporções em que foram emitidas as 16 sequências (U,) atingiria o valor máximo (1). Mas as emissões obedeceriam a uma regularidade temporal fixa. Haveria, pois, completa dependência sequencial. As discrepâncias entre os valores U (por exemplo: U2 - U1), se calculadas, revelariam claramente essa dependência estrita.

Esse ponto levou-nos a desenvolver, apoiados nos quatro grupos que descrevemos, uma classificação das variáveis dependentes que examinamos, em lugar de classificar os trabalhos experimentais.

A bem da parcimônia, foi desenvolvido também um agrupamento dos trabalhos. Foram reunidos, num mesmo grupo, trabalhos que apresentaram características metodológicas - aparato experimental e / ou procedimento - comuns ou similares. Temos, dessa forma, que os quatro grupos conceituais - dispersão, distribuição ou urdformidade distributiva, recência e dependência sequencial - orientaram a classificação das variáveis dependentes. Características metodológicas - aparato ou procedimento comuns ou similares - permitiram, de outra parte, uma classificação dos trabalhos experimentais, que passamos a apresentar em seguida.

PRIMEIRO GRUPO: compreende trabalhos que revelam o seguinte ponto comum: empregaram aparatos em que os sujeitos eram apresentados a quatro ou mais manipulanda, localizados em diferentes pontos do espaço, a exemplo das 20 chaves de Eckerman e Lanson (1969). Uma variável dependente comum a muitos trabalhos desse grupo é a frequência ou porcentagem das respostas emitidas em cada um dos manipulanda. Maior variabilidade equivalia a maior distribuição das respostas pelos manipulanda. Além dessa variável, temos:

Carlton (1962), cujo procedimento básico já descrevemos, calculou também, para um sujeito, a porcentagem de respostas emitidas sobre o manipulandum mais acionado: uma medida de preferência.

Gates e Fixsen (1968) expuseram os sujeitos a oito chaves de resposta. Instauraram diferentes esquemas de reforçamento das respostas às chaves. Calcularam o índice PI, assim definido: (número de respostas emitidas sobre a chave mais acionada - número de respostas emitidas sobre a chave menos acionada) / número total de resposta da sessão. PI assumia valores de 0 a 1, com o valor 0 indicando que todas as chaves foram acionadas um mesmo número de vezes, e o valor 1 indicando que todas as respostas da sessão emitiram-se sobre uma só das oito chaves. Variabilidade significou aqui, portanto, uniformidade distributiva.

Boren, Moerschbaecher e Whyte (1978) apresentaram seis manipulanda aos seus sujeitos. Calcularam a porcentagem de respostas no manipulandum mais pressionado - (número de respostas no manipulandum mais acionado / número total de respostas) X 100 - e a porcentagem de alternações entre os manipulanâa - (número de vezes em que o sujeito mudou de um a outro manipulandum I número total de respostas) X 100. Segundo os autores, "baixa variabilidade" equivalia a altos valores da primeira variável e pequenos valores da segunda. "Muita variabilidade" significava, portanto, distribuir as respostas equitativamente sobre os seis manipulanda.

Em Newberry (1971), eram quatro os manipulanda e localizavam-se nos vértices de um quadrilátero. Ao acionar um dos manipulanda, o sujeito emitia uma resposta. Para emitir uma nova resposta, o sujeito escolhia um dos demais manipulanda ou permanecia no mesmo que fora acionado na última resposta. Ao escolher um novo manipulandum, ou permanecer no mesmo, o sujeito efetuava uma transição. Oito transições, de um universo de 16 transições possíveis, foram consideradas corretas. Maior variabilidade significava maior número de transições corretas aprendidas ("aprendidas" significava "emitidas numa proporção maior que a esperada ao acaso"). Maior variabilidade implicava aqui maior número de transições corretas aprendidas, dentro do universo das oito transições corretas. Maior variabilidade significava aqui, portanto, maior distribuição das respostas, dentro do universo das transições corretas.

Pertencem a esse grupo também McCray e Harper (1962), Ferraro e Branch (1968) e Eckerman e Lanson (1969), cujos procedimentos gerais e variáveis dependentes já foram descritos.

Nesse grupo encontramos, portanto, variáveis dependentes que medem distribuição, uniformidade distributiva e dispersão.

SEGUNDO GRUPO: reúne trabalhos que examinaram a variabilidade comportamental em labirintos.

Em Elliott (1934) os cinco corredores de um labirinto foram numerados. O animal era colocado em uma caixa de partida e podia escolher qualquer um dos cinco corredores. Cada escolha definia uma tentativa. Depois de um número de tentativas, o animal tinha constituído uma série numérica, que correspondia aos corredores escolhidos. Se o sujeito escolhesse os corredores 1,1,2,2,3,4,4,4,5,5, em dez tentativas seguidas, sua série correspondente seria 1, 1, 2, 2, 3, 4, 4, 4, 5, 5. Foram extraídos os desvios padrões dessas séries, primeira variável dependente, que exprimia dispersão. Uma segunda variável dependente foi definida: a porcentagem em que foi escolhido o corredor mais escolhido dos cinco: uma medida de preferência.

De Valois (1954) empregou um labirinto que continha cinco birurcações. Ao deparar cada uma delas, o animal escolhia entre seguir à esquerda ou seguir à direita. O animal era submetido a sessões diárias. Cada sessão compreendia apenas uma exposição ao labirinto. A partir da segunda sessão, o experimentador comparava o desempenho do sujeito, na sessão do dia, ao desempenho na sessão do dia anterior. Se a escolha do sujeito, em cada bifurcação, fosse oposta à do dia anterior, ele recebia um ponto no seu escore. Cada bifurcação rendia um ponto, se a escolha fosse diferente da efetuada na sessão anterior. Se o sujeito, na primeira bifurcação, escolhia seguir à direita - tendo escolhido, no dia anterior, seguir à esquerda na mesma bifurcação - ele recebia um ponto. Se escolhesse seguir à esquerda (escolha idêntica à do dia anterior), ele não pontuava. O mesmo valia para as outras quatro birurcações. Assim, a cada sessão o sujeito podia receber 0, 1,2, 3,4 ou 5 pontos. Se repetisse exatamente as escolhas da sessão anterior, em todas as cinco birurcações, não lhe era atribuído nenhum ponto. Se escolhesse direções opostas às da sessão anterior, em todas as cinco birurcações, ele recebia a pontuação máxima. Maior pontuação significava maior variabi 1 idade. Uma segunda variável foi também definida, em uma etapa posterior do experimento. O labirinto possuía em cada bifurcação, além das entradas à esquerda e à direita, uma passagem central. Essas passagens permaneceram fechadas durante toda a primeira fase do experimento. Foram todas abertas na segunda fase. Logo, o animal, na segunda fase, tinha, a cada bifurcação, três opções: seguir à esquerda, seguir à direita ou seguir em frente. Toda vez que o animal escolhia a passagem central - e somente nesse caso -, ele recebia um ponto. Maior pontuação implicava maior variabilidade. Essa variabilidade, observa o autor, é diferente da variabilidade medida pela primeira variável. Essa segunda etapa mediu, na verdade, a ausência de 'fixação'. 'Fixação' significava a inaptidão para modificar o comportamento, quando uma resposta mais adaptativa é possível. A escolha da passagem central era mais 'adaptativa', pois permitia ao animal atingir mais rapidamente o objetivo. Nenhuma das duas variáveis encontra classificação, dentro do sistema conceituai que aqui propomos.

Dale e Roberts (1986) empregaram um labirinto radial. Constituíram variáveis dependentes: o número absoluto de diferentes corredores percorridos (variável que mostra distribuição) e a diferença angular que separava dois corredores percorridos em tentativas consecutivas. Essa última variável não permite uma classificação, segundo os grupos conceituais que propomos.

Temos aqui, portanto, variáveis dependentes que refletem distribuição, uniformidade distributiva e dispersão.

TERCEIRO GRUPO: contém os trabalhos que realizaram alguma forma de análise sequencial do comportamento. Isto é, nos estudos desse grupo, foi considerada, de alguma maneira, a ordem ou sequência em que ocorriam certas respostas. O que os distingue é, portanto, uma certa forma de analisar os dados. Encontramos aqui um grande número de estudos que empregaram o esquema lag - n padrão, ou variantes deste, ou ainda esquemas similares que reforçavam diferencialmente a emissão de sequências menos frequentes. São eles: Schwartz (1982); Page e Neuringer (1985); Morris (1987); Crow (1988); Machado (1989); Morris (1989), Van Hest, van Haaren e van de Poli (1989); Cohen, Neuringer e Rhodes (1990); Morgan e Neuringer (1990); Morris (1990); Neuringer (1991); Neuringer e Huntley (1991); Neuringer (1992); Mook e Neuringer (1994); Cherot, Jones e Neuringer (1996); Hunziker, Saldaria e Neuringer (1996); Denney e Neuringer (1998); Hunziker, Caramori, Silva e Barba, (1999); Neuringer, Deiss e Olson (2000) e Barba e Hunziker (2003). Esses estudos definiram variáveis dependentes idênticas ou similares. Assim, temos: a porcentagem de reforçamento ou porcentagem de variação (número de sequências emitidas que atendiam ao critério lag I número total de sequências emitidas). Note-se que essa porcentagem equivalia, em sendo a contingência vigente lag - n , à porcentagem de sequências emitidas que diferiam, ao menos, das n últimas sequências emitidas. Essa porcentagem exprime, portanto, aquilo a que chamamos recência.

Aparecem ainda: número absoluto ou proporção de diferentes sequências emitidas (número de diferentes sequências emitidas / número total de sequências emitidas); proporção ou porcentagem em que foram emitidas as diferentes sequências; o índice Ur Essas medidas exprimem distribuição. Também aparece o número absoluto ou a porcentagem da sequência mais emitida (Page & Neuringer, 1985; Schwartz, 1982) -uma medida de preferência. Alguns exibem ainda a porcentagem de sequências emitidas que continham zero, uma, duas e três alternações (uma alternação corresponde a uma mudança da chave esquerda para a chave direita ou da chave direita para a chave esquerda, dentro da sequência). Essa última variável dependente exprime a distribuição das frequências em que foram emitidas as sequências, agrupadas em classes definidas pelo número de alternações. Morris (1990) apresenta também a porcentagem de alternação (número de alternações / número total de oportunidades de alternar) X100. Sendo somente duas as chaves de resposta (E e D), o índice máximo de alternação, assim calculado, indica que as respostas à chave esquerda e as respostas à chave direita ocorreram em proporções idênticas.

Page e Neuringer (1985) calcularam também os índices U,, U2, U3 e apresentaram as discrepâncias entre eles. Page e Neuringer (1985) compararam vários dos índices que obtiveram àqueles índices que seriam produzidos por um gerador de sequências aleatórias. Esse procedimento talvez permitisse "unificar" o conceito de variabilidade com que trabalharam. Embora tenham apresentado medidas de uniformidade distributiva, recência e dependência sequencial, a comparação que realizaram indica que 'Variabilidade" equivalia, para esses pesquisadores, a "independência sequencial".

Machado (1993) adotou um procedimento semelhante ao de Machado (1992), já descrito anteriormente. Foram apresentadas, além das variáveis que já descrevemos, a porcentagem de respostas à chave direita (porcentagem de D, na sequência) e a porcentagem de pares de respostas consecutivas ED e DE (isto é, a porcentagem correspondente a ED + DE). A partir da porcentagem de D, poder-se-iam calcular, como dissemos anteriormente, as proporções esperadas dos pares de respostas consecutivas. As discrepâncias entre valores esperados e observados acusariam a exis­tência de dependência sequencial. Foram ainda conduzidos testes estatísticos de X2, com base na hipótese de que a ocorrência dos eventos E e D independiam dos eventos que lhes antecediam. Essas variáveis dependentes traduzem o conceito de "variabilidade comportamental' na forma de "independência sequencial". Machado (1992) apresentou ainda a distribuição de frequências, para uma sessão, de cada uma das 16 sequências formadas a partir de quatro respostas consecutivas. Aqui, a contagem foi feita "em contínuo", uma vez que a apresentação do reforço podia ocorrer ao final de qualquer resposta individual (E ou D). Essa última variável pode revelar se a distribuição foi mais ou menos uniforme.

Além do esquema lag - n padrão, Machado (1997) empregou, numa primeira fase do experimento, uma esquema que reforçava diferencialmente a emissão de sequências que contivessem números específicos de alternação. A apresentação do reforço independia de diferirem das sequências anteriormente emitidas. Foram calculadas: a proporção de sequências reforçadas, o número médio de alternações por sequência emitida e a proporção de diferentes sequências emitidas. Todas foram comparadas aos índices que produziria, em iguais circunstâncias, um gerador aleatório de sequências. Esse procedimento parece indicar que o autor trabalhou com a quarta concepção de variabilidade. Nesse caso, variabilidade equivale a aleatoriedade. Machado (1997) apresentou também uma série de dados relativos à estrutura interna das sequências emitidas pelos pombos. Barba e Hunziker (2003) empregaram uma variante do procedimento de Machado (1997). Em Barba e Hunziker (2003), o critério de reforçamento também recaía sobre o número de alternações das sequências emitidas. Barba e Hunziker (2003) utilizaram o índice U, calculado sobre a frequência em que eram emitidas as sequências. A concepção de variabilidade que adotaram foi, portanto, a de uniformidade distributiva.

Vogel e Annau (1973) impuseram seus sujeitos à seguinte condição: os animais eram colocados diante de duas chaves de respostas. A apresentação do reforço somente ocorria, se fossem emitidas certas sequências específicas de respostas às duas chaves. O universo total de sequências possíveis compreendia, portanto, dois grupos: sequências corretas (as que produziam reforço) e as incorretas (que não produziam reforço). As variáveis dependentes foram: as porcentagens em que foi emitida cada uma das sequências, corretas e incorretas (maior variabilidade significou distribuição mais uniforme das porcentagens); número absoluto de diferentes sequências corretas emitidas (maior variabilidade significou maior número de diferentes sequências emitidas). As variáveis expressam aqui, portanto, distribuição.

Finalmente, em Crow e Hart (1983) e Stokes (1995), foram definidas diferentes categorias topográficas e, sobre as sequências comportamentais registradas, foram realizadas análises de dependência sequencial.

Esse grupo mostra, portanto, variáveis dependentes que exprimem distribuição, recência e aleatoriedade.

QUARTO GRUPO: abrange trabalhos que analisaram a variabilidade em variáveis quantitativas contínuas. Mencionamos abaixo os trabalhos. Logo em seguida a cada um deles, aparecem a variável contínua analisada e, entre parênteses, a variável dependente definida. São eles: Antonitis (1951): localização, em uma régua, da posição em que foi executada uma resposta (desvio médio em relação à mediana); D'Amato e Siller (1962): ponto de uma régua em que foi emitida uma resposta (desvio padrão); Schoenfeld, Harris e Farmer (1966): intervalo entre respostas (frequência absoluta); Ferraro e Hayes (1967): duração da resposta (nonagésimo percentil - décimo percentil / 2); Eckerman e Vreeland (1973): distância entre duas marcas efetuadas sobre uma superfície de papel (desvio médio); McSweeney (1974): taxa de resposta (coeficiente de variação); Lachter e Corey (1982): duração da resposta (desvio padrão) e Tremont (1984): força e intervalo entre respostas (semi intervalo interquartil). Em todos os casos, os dados brutos correspondiam aos valores que assumiram as variáveis contínuas mencionadas. Sobre os valores colhidos dessas variáveis, foram computadas as medidas que constituíram as variáveis dependentes referidas. Essas variáveis refletem a dispersão dos dados. Excetua-se o trabalho de Schoenfeld, Harris e Farmer (1966), que apresenta a frequência absoluta dos intervalos (medida que mostra a distribuição).

Em alguns trabalhos, o contínuo foi dividido em classes ou intervalos, e foi medida a frequência - absoluta ou relativa - em que a variável recaiu em cada classe. Ferraro e Hayes (1967), por exemplo, definiram classes temporais sucessivas (com a extensão de 0,05 segundos, cada uma), e, sobre essas classes, distribuíram o conjunto de durações que obtiveram por sessão, para um sujeito. Respostas cujas durações iam de Os a 0,05 s incidiam em uma classe, respostas cujas durações iam de 0,05s a 0,10 s incidiam na classe posterior, e assim por diante. Nesses casos, maior variabilidade implicava maior uniformidade na distribuição das frequências. "Umformidade distributiva" é a concepção a que se filiam, portanto, variáveis dependentes dessa espécie. Schoenfeld, Harris e Farmer (1966) adotaram procedimento similar.

Esse grupo apresenta, portanto, variáveis dependentes que denotam dispersão e distribuição.

 

CONSIDERAÇÕES ADICIONAIS

O experimento de Eckerman e Lanson (1969) deu-nos oportunidade de demonstrar que "dispersão" e "uniformidade distributiva" constituem propriedades que podem não covariar. Também vimos, no experimento de Morgan e Neuringer (1990), que algo análogo pode ocorrer às propriedades "recência" e "dependência sequencial". Convém ainda acrescentar alguns pontos a essas considerações.

Compararemos as propriedades "uniformidade distributiva" e "dependência sequencial", retomando o experimento de Eckerman e Lanson (1969). Um animal que distribuísse igualmente suas respostas pelas 20 chaves, de maneira perfeitamente regular - respondendo à chave 1, à chave 2, à chave 3,...,à chave 20, sempre nessa ordem -exibiria a máxima uniformidade distributiva. Isto é, os caracteres 'chave 1', 'chave 2',... 'chave 20' entrariam em iguais proporções, se tomássemos a longa sequência de bicadas que produziria o animal. Haveria, porém, uma dependência sequencial estrita na série de bicadas assim produzidas. Depois do caracter 'chave 1', viria sempre o caracter 'chave 2' depois do caracter 'chave 2' viria sempre o caracter 'chave 3' e assim por diante. Isto é, dos 202 diferentes possíveis pares de caracteres consecutivos, somente 20 estariam presentes nessa longa série. Vimos que os índices H (absoluto) e U (relativo) medem a propriedade ''uniformidade distributiva". O índice U que medisse as proporções em que entravam os caracteres (U1), na sequência de bicadas que supusemos, atingiria seu ponto máximo. Mas o índice U que medisse as proporções em que figuravam os pares de caracteres consecutivos (U2) assumiria pequeno valor. A diferença entre U2 e U1 acusaria a existência de dependência sequencial. Temos assim que "uniformidade distributiva" e "dependência sequencial" constituem, segundo nossa conceituação, propriedades do comportamento que convém distinguir.

Talvez se pudesse opor a essa distinção que defendemos aqui a noção mais geral de "ordem de redundância" (Attneave, 1959) ou "ordem de incerteza". Diríamos, assim, que a sequência do nosso exemplo apresenta alta incerteza de "primeira ordem" (na verdade, a máxima incerteza), mas apresenta baixa incerteza de "segunda ordem". O conceito de "ordem de incerteza" poderia, assim, "unificar" as duas concepções.

Preferimos, no entanto, conservar a distinção, pois as propriedades "uniformidade distributiva" e "dependência sequencial" apresentam uma importante diferença. Como observa Attneave (1959, p. 15), "qualquer ordem de redundância acima da primeira implica que os eventos são mais ou menos padronizados; que dependências sequenciais existem entre eles". Ou seja, a incerteza (ou redundância) de primeira ordem, sozinha, não revela nada sobre a existência de dependência sequencial.

Assim, a distinção que propomos conduz à seguinte consideração: as propriedades "dispersão" e "distribuição" / "uniformidade distributiva" não consideram a organização temporal do comportamento. Isto é, a organização serial do comportamento não afeta as variáveis dependentes que medem "dispersão" e "distribuição" / 'Hiniformidade distributiva". O oposto ocorre às propriedades "recência" e "dependência sequencial", que consideram a organização temporal do comportamento. Isto é, a organização sequencial do comportamento afeta as variáveis que medem "recência" e "dependência sequencial".

Quer isso dizer que a ordem em que bicasse o pombo, no experimento de Eckerman e Lanson (1969), não afetaria as variáveis que medissem "dispersão" ou "uniformidade distributiva". A ordem afetaria, no entanto, variáveis que exprimissem "recência" e "dependência sequencial". Daí, pois, o havermos procedido à distinção entre ''uniformidade distributiva" e "dependência sequencial".

É preciso ressaltar, de outra parte, que a organização do tempo afeta algumas variáveis dependentes que, segundo nossa descrição, exprimem distribuição. Muitos estudos que impuseram a emissão de sequências de respostas discretas - como as respostas às barras esquerda e direita ou respostas às chaves esquerda e direita -, ao medirem a "uniformidade distributiva" (expressa pelo índice U,, por exemplo), tiveram suas variáveis dependentes afetadas pela organização temporal das emissões. Isso ocorreu porque as proporções que entravam nos cálculos eram aquelas em que os animais tinham emitido cada uma das diferentes sequências, dentro do universo das sequências possíveis. Essas frequências eram, pois, diretamente afetadas pela organização serial das respostas. A frequência em que foi emitida a sequência EEDD, por exemplo, era função da ordem temporal em que o animal emitia as respostas E e D. Note-se, no entanto, que a ordem em que eram emitidas as sequências de quatro respostas, tomadas em conjunto, não afetava as variáveis que mediam uniformidade distributiva. Assim o índice U, assumiria o mesmo valor, qualquer que fosse a ordem em que se tivessem emitido as sequências de respostas discretas, desde que não se alterassem as frequências em que era emitida cada uma das referidas sequências. Em Morgan e Neuringer (1990), por exemplo, o valor de U, calculado sobre as frequências em que era emitida cada uma das 16 sequências possíveis, não era afetado pela ordem em que eram emitidas as sequências de quatro respostas, tomadas em conjunto.

Os pombos de Eckerman e Lanson (1969) permitem ainda que se comparem diretamente algumas outras concepções que definimos. Já demonstramos em que diferem as propriedades "dispersão" e "uniformidade distributiva". Também já notamos que as propriedades "recência" e "dependência sequencial" podem não covariar (Morgan e Neuringer, 1990). A série de bicadas que supusemos agora - resposta à chave 1, à chave 2, à chave 3...,à chave 20, à chave 1ocorrendo sempre nessa ordem- confirma esse ponto. Embora apresente dependência sequencial estrita, sua "recência média" -número médio de respostas que separam duas ocorrências consecutivas da mesma resposta - seria igual a 20 (o mais alto valor). É fácil ver, ainda, que uma série de bicadas emitidas somente nas extremidades da régua (chave 1, chave, 20, chave 1, chave 20...) apresentaria alta dispersão. Sua "recência média" seria, no entanto, muito baixa, igual a 1, (supondo-se que um índice de recência fosse atribuído a cada resposta, a partir da sua segunda ocorrência). E se as bicadas se alternassem sistematicamente, teríamos estrita dependência sequencial. Finalmente, poderíamos ter uma série em que as respostas fossem emitidas em todas as chaves, em igual quantidade. Mas, em vez de constituírem um ciclo perfeito e regular, como no exemplo inicial, teríamos que o animal emitiria 50 respostas à chavel, seguidas de 50 respostas à chave 2, seguidas de 50 respostas à chave 3 e assim sucessivamente, até as 50 respostas à chave 20. Nessa série, teríamos a máxima uniformidade distributiva, mas a sua "recência média" seria zero.

 

ASPECTOS FUNCIONAIS

Examinando a literatura pertinente, encontramos algumas classificações funcionais da variabilidade comportamental - classificações que tomam por base as "causas" da variabilidade. Assim, Boulanger, Ingebos, Lahak, Machado e Richelle (1987) distinguem variabilidade "espontânea" - aquela que é permitida pelo experimentador, mas que não é uma condição para obtenção do reforço - e variabilidade "operante" - aquela que é obtida e mantida por reforçamento diferencial De forma análoga, vemos que Page e Neuringer (1985) adotaram um procedimento experimental específico (o esquema yoked - VR), no intuito de separar a variabilidade operante e a variabilidade que pode resultar da mera exposição a esquemas de reforçamento intermitente.

Note-se que as expressões "variabilidade espontânea", "variabilidade operante", 'Variabilidade que tem origem na exposição a reforçamento intermitente" constituem uma taxonomia funcional da variabilidade comportamental. Essa taxonomia teria uma base distinta da que adotamos neste trabalho. As duas classificações não são, porém, incompatíveis. Elas podem mesmo ser complementares.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como observa Tremont (1984), a variabilidade pode ser diferentemente afetada por determinadas variáveis, conforme a dimensão do comportamento que se considere. A variabilidade na dimensão "localização da resposta" pode ser afetada pela localização do pombo ao responder, assim como a variabilidade no intervalo entre respostas pode ser afetada pelas atividades executadas entre elas. Já a variabilidade em dimensões como força e duração pode ser menos afetadas por aquelas variáveis. De forma análoga, temos que uma mesma manipulação experimental pode ter efeitos diversos, segundo a concepção de variabilidade que se tenha adotado. No que cumpre aos estudos experimentais, portanto, parece que as pesquisas ganhariam muito em especificar, com mais rigor, aquilo que denominam "variabilidade". É possível que determinadas manipulações experimentais tenham efeitos distintos sobre diferentes propriedades do comportamento. Nada impede, por exemplo, que, em certas circunstâncias, determinado procedimento leve a que aumentem os n íveis de dispersão e diminuam os n íveis de uniformidade distributiva em certa variável dependente. Outro ponto que merece consideração é a precariedade que se nota, quando, a partir dos estudos empíricos, busca-se formular princípios gerais sobre a variabilidade comportamental. Notamos que é difícil extrair conclusões gerais. Alguns estudos indicam que a variabilidade se eleva, quando os organismos são expostos a esquemas de reforçamento intermitente ou a extinção (Antonitis, 1951; Eckerman & Lanson, 1969; D'Amato & Siller, 1962; Eckerman & Vreeland, 1973; Lachter & Corey, 1982). Mas em Boren e col. (1978) podemos ver o oposto. Alguns estudos indicam ainda que variáveis motivacionais podem ter efeito sobre a variabilidade comportamental (Elliott, 1934; Carlton, 1962). Mas ainda aqui, não é fácil extrair uma conclusão geral, uma vez que os procedimentos diferiram consideravelmente, e os estudos não adotaram concepções idênticas de "variabilidade". Defendemos, enfim, que qualquer tese sobre a variabilidade ganharia muito em consistência, se começasse por adotar uma definição rigorosa do termo. Esperamos, com nosso trabalho, trazer alguma contribuição a essa área de estudo do comportamento.

 

REFERÊNCIAS

Antonitis, J. J. (1951). Response variability in the tat during conditioning, extinction, and reconditioning. Journal of Experimental Psychology, 42, 273-281.         [ Links ]

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1 Endereço para correspondência e solicitação de separatas: Rua Braseliza Alves de Carvalho, 522. CEP 02510-030. São Paulo-SP - Brasil E-mail do autor: lourenbarba@yahoo.com.br Tel: (11) 3858-4241

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