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Acta Comportamentalia

versão impressa ISSN 0188-8145

Acta comport. vol.21 no.1 Guadalajara  2013

 

ARTIGOS

 

Escolha e preferência por alimentos com ou sem valor calórico em crianças com deficiência intelectual e sobrepeso1

 

Choice and Preference for caloric and non caloric food in children with intellectual disabilities and overweight

 

 

Marina Macedo; Giovana Escobal; Celso Goyos2

Universidade Federal de São Carlos (Brasil)

 

 


RESUMO

Obesidade e sobrepeso são consideradas questões relevantes de saúde atualmente. Este estudo investigou se o valor calórico do alimento (Fase 1) e sua magnitude (Fases 2 e 3) controlavam o comportamento de escolha de dois indivíduos de nove e treze anos com sobrepeso e deficiência intelectual. Foram elaboradas duas gomas idênticas, diferindo apenas no valor calórico. Na Fase 1, escolhas nos Botões 1 e 2 foram seguidas por uma goma calórica e uma goma não calórica, respectivamente. Na Fase 2, escolhas nos Botões 1 e 2 foram seguidas por uma goma calórica e duas gomas não calóricas, respectivamente. Na Fase 3, escolhas nos Botões 1 e 2 foram seguidas por uma goma calórica e uma não calórica e uma goma não calórica, respectivamente. Quatro apresentações dos esquemas constituíam uma sessão. Os dados de interesse foram as respostas de escolha nos Botões 1 e 2. Os resultados dos participantes na Fase 1 tenderam a indiferença entre alternativas. Na Fase 2, P1 demonstrou preferência pela alternativa de maior magnitude, porém na Fase 3, a magnitude exerceu pouco controle sobre sua resposta de escolha. Os dados de P2 tenderam a indiferença nas duas fases. Questionou-se o valor reforçador dos estímulos empregados no estudo.

Palavras-chave: escolha alimentar, obesidade, crianças, deficiência intelectual, goma com ou sem valor calórico.


ABSTRACT

Obesity and overweight are considered relevant health issues today. Although much is known about the types of foods that contribute to it, few results have been observed in the control of impulsivity commonly involved in the food intake. Under the Experimental Analysis of Behavior perspective, impulsivity can be addressed within the choice paradigm through the model of concurrent-chain schedules in which responses to two alternatives of concurrent and independent schedules of reinforcement lead to other two schedules of reinforcement, depending on the chosen alternative. This experimental model allows the manipulation of many variables, among which delay of reinforcement. This study investigated whether the caloric value of food (Phase 1) and its magnitude (Phases 2 and 3) controlled the choice behavior of two individuals of nine and thirteen years with overweight and intellectual disability. Two identical gums were prepared, differing only in caloric value. In Phase 1, choices on Buttons 1 and 2 were followed by one caloric gum and one non-caloric gum, respectively. In Phase 2, choices on Buttons 1 and 2 were followed by one caloric gum and two non caloric gums, respectively. In Phase 3, choices on Buttons 1 and 2 were followed by one caloric and one non-caloric gum and a non-caloric gum, respectively. Four presentations of the schedules constituted a session. The data of interest were the responses of choice in Buttons 1 and 2. The first results illustrated that there is no preference for high-caloric foods, and will be considered as baseline for continuing the study, in which each of the possible controlling variables of food choice could be introduced (e.g., delay of reinforcing contingency, magnitude of reinforcement and response cost).The results of the participants in Phase 1 tended to indifference between alternatives. In Phase 2, P1 showed preference for the alternative of greater magnitude, but in Phase 3, the magnitude had little control over his choice response. The data of P2 tended to indifference in the two phases. It was discussed the reinforcing value of the stimuli used in the study. Studies on the nature of choice and preference for non-caloric and caloric foods are important to identify and describe appropriate procedures to understand and control food intake in populations in need, for example, preschool overweight or obese and with delayed intellectual development.

Keywords: food choice, obesity, children, intellectual disabilities, gum with or without caloric value.


 

 

Um dos principais problemas de saúde na sociedade moderna é o aumento dos índices de indivíduos obesos ou com sobrepeso, sendo esta última condição o intermédio entre a eutrofia e a obesidade (Carneiro et al., 2003). Segundo Hedley et al. (2004), o aumento na prevalência de obesidade em crianças e adolescentes nas últimas décadas é um dado preocupante, pois, a presença de obesidade nessa faixa etária tem sido associada ao aparecimento da obesidade na vida adulta (Margarey, Daniels, Boulton, & Cockington, 2003).

Flegal, Carroll, Ogden, e Curtin, (2010) com base em dados da pesquisa nacional de saúde e nutrição, realizada nos Estados Unidos, nos anos de 2007 e 2008, constataram que indivíduos adultos, acima de 20 anos de idade, com desenvolvimento típico e com sobrepeso abrangem 68,3% da população e os classificados obesos englobam 33,9%. Em crianças de dois a cinco anos de idade a prevalência de sobrepeso e obesidade é estimada em 8,5%, mas com uma estimativa menos rigorosa este índice sobe para 24% (Ogden, Carroll, & Flegal, 2008). Nos indivíduos com deficiência intelectual se observa maior prevalência de sobrepeso e obesidade quando comparada com a prevalência da população adulta e com desenvolvimento típico (Fernhall, 1997). Os dados trazidos por Kelly, Rimmer e Ness (1986) estimaram taxas de obesidade nessas pessoas em 45,2% para homens e 50,3% para mulheres. As características dos indivíduos com deficiência intelectual, cuja morfologia dificulta a ação motora e dificulta o deslocamento corporal, torna-os mais sedentários e com baixo metabolismo basal (Branca, Nikogosian, & Lobstain, 2007; Eichstaedt & Lavay 1992; Luke, Roizen, Sutton & Schoeller, 1994).

As consequências da obesidade são múltiplas, entre as quais podem ser citadas: alteração do perfil lipídico e glicídico (Dietz, 1998), problemas cardíacos, doenças cérebro-vasculares (Grotto, Huerta, Kark, Shpilberg, & Meyerovitch, 2003), diabetes (Carnethon et al., 2003), câncer (Evenson, Stevens, Cai, Thomas, & Thomas, 2003) e outros.

Analisando os motivos que colaboram para o aumento dos índices de obesidade, nota-se que vários fatores contribuíram para sua etiologia, tornando-a assim, um fenômeno especialmente complexo (Brownell, & O'Neil, 1999). Dos casos de obesidade, 99% são considerados de causa exógena e 1% de causa endógena (síndromes genéticas e alterações endocrinológicas) (Damiani, Carvalho, & Oliveira, 2002).

A causa exógena pode ser resultante de uma ingestão impulsiva de alimentos, na qual o comportamento de escolha do indivíduo parece estar sob controle das consequências reforçadoras imediatas (e.g., saborear um alimento mais palatável) (Wooley, Wooley, & Dyrenforth, 1979). Esta ingestão impulsiva fornece um aporte calórico excessivo, podendo promover um balanço energético positivo quando combinada com baixo gasto energético por meio de atividades físicas (sedentarismo). Variáveis ambientais estão diretamente envolvidas na ingestão impulsiva (Epstein, Paluch, Gordy, & Dorn, 2000; Gortmaker, Must, Perrin, Sobol, & Dietz, 1993; Hill & Peters, 1998). Para a Análise do Comportamento os comportamentos que promovem um balanço energético positivo (sedentarismo e ingestão impulsiva) são aprendidos. Todavia, segundo Skinner (1990), como qualquer outro comportamento operante, a escolha poderia ser estudada levando-se em consideração contribuições de três níveis de contingências: filogenéticas (a história evolutiva da espécie); ontogenéticas (os aprendizados do organismo em sua vida) e culturais (as particularidades da cultura em que está inserido) (de Carvalho Neto & Tourinho, 1999; Skinner, 1990). Apesar de considerar as variáveis biológicas em suas discussões, Skinner, não as considerava em sua análise. O foco para análise nesta pesquisa também será nas variáveis ambientais.

Muitos trabalhos utilizados para estudar comportamentos de impulsividade e autocontrole pela Análise do Comportamento derivam do paradigma de Rachlin e Green (1972), um tipo específico de escolha denominado comprometimento (Logue, & Peña-Correal, 1984; Logue, & Peña-Correal, 1985; Logue, Chavarro, Rachlin, & Reeder, 1988). No paradigma de Rachlin e Green (1972), o comportamento de autocontrole, que pode ser entendido como o processo inverso ao comportamento de impulsividade, ocorre quando o comportamento de escolha do indivíduo parece estar sob controle das consequências reforçadoras em longo prazo (Dixon, Rehfeldt, & Randich, 2003; Rachlin & Green, 1972; Wooley, Wooley, & Dyrenforth, 1979). Outras variáveis como o reforçamento social e reforçadores arbitrários disponibilizados em curto prazo parecem influenciar e aumentar a motivação para a emissão de comportamentos de autocontrole.

Uma sólida metodologia experimental para investigar este processo de escolha e preferência, com potencial de aplicação prática foi desenvolvida (Hanna & Ribeiro, 2005). Sob o ponto de vista analíticocomportamental, escolher é responder a um entre dois ou mais estímulos acessíveis e preferir é responder mais frequentemente a um desses estímulos (Skinner, 1950). Procedimentos que empregam esquemas concorrentes e esquemas concorrentes com encadeamento têm sido os mais comumente utilizados pela literatura analítico-comportamental para investigar preferência.

Ferster e Skinner (1957) definiram esquemas concorrentes como duas ou mais condições simultaneamente disponíveis e sinalizadas. Cada uma delas constitui um componente com uma contingência de três termos: um estímulo discriminativo, a classe de respostas e a consequência. Em esquemas concorrentes a relação entre distribuição de reforços e de respostas apresenta uma grande generalidade. Esta generalidade tem sido obtida com situações que envolvem reforços qualitativamente semelhantes e que levou a Lei do Efeito. Herrnstein (1970) investigou a relação entre a distribuição do comportamento entre alternativas e a distribuição de estímulos reforçadores e propôs a lei de igualação (matching law) segundo a qual, em uma situação de escolha, as proporções de respostas dos participantes tendem a se igualar às proporções de reforçamento. A medida da preferência de um indivíduo é dada pela maior distribuição de respostas em um componente que em outro. Essa medida é denominada taxa relativa de resposta de escolha e refere-se à frequência de uma resposta em proporção à combinação de taxas de todas as respostas de escolha disponíveis em um arranjo de operantes concorrentes [p.ex., em um arranjo de dois operantes, a taxa de resposta A dividida pela combinação de taxas das respostas A e B, representada pela fórmula: Taxa relativa de resposta de escolha = A/(A+B) ou B/(A+B)] (Fisher & Mazur, 1997).

Esquemas concorrentes com encadeamento envolvem a apresentação simultânea de duas ou mais condições de estímulo associadas, cada uma delas a um esquema específico de reforçamento concorrentemente disponíveis. Cada uma dessas condições é chamada de elo inicial, analogia aos elementos de uma corrente ou cadeia. Uma vez que o indivíduo atende ao esquema de um elo inicial, outra condição é apresentada como consequência, referida como elo terminal. Enquanto o indivíduo responde sob o esquema de um elo inicial, o outro continua presente na situação, podendo o indivíduo responder sob o esquema associado a este outro elo. Quando o esquema em vigor no elo terminal for concluído, a consequência programada é apresentada. Esse procedimento separa a eficácia reforçadora do elo terminal das contingências que mantêm o responder neste elo e, exatamente por essa razão, são considerados mais adequados para o estudo do comportamento de escolha (Catania, 1999). Esquemas concorrentes podem confundir a preferência com as variáveis que determinam as taxas de respostas concorrentes (Catania, 1999; Squires & Fantino, 1971). Por exemplo, com esquemas concorrentes que reforçam diferentemente altas e baixas taxas de respostas (DRH e DRL), as taxas relativas de respostas são determinadas simplesmente pelas contingências de alta e baixa taxa e não podem ser tomadas como preferência (Catania, Souza, & Ono, 2005).

Pesquisas têm contribuído para o desenvolvimento de procedimentos que auxiliam na prevenção e tratamento da obesidade, utilizando a metodologia desenvolvida pela Análise do Comportamento. Como exemplo de pesquisa básica pode-se citar à análise do efeito na preferência de pombos a reforçadores de qualidade diferentes sob o paradigma de autocontrole (King & Logue, 1990); e como exemplos de pesquisas translacionais e aplicadas podem-se citar: utilização de treino nutricional e reforçadores sociais para alterar a preferência por lanches saudáveis em crianças (Stark, Collins, Osnes, & Stokes, 1986); avaliação de preferências alimentares em indivíduos com deficiência intelectual e promoção de oportunidade de escolhas (Parsons & Reid, 1990); análise do efeito da preferência alimentar sob o paradigma de autocontrole em crianças e adultos (Forzano & Logue, 1995), dentre outros. Apenas alguns estudos serão mais detalhados a seguir em função da maior similaridade com esta pesquisa.

King e Logue (1990) estudaram por meio do paradigma de autocontrole, a preferência de pombos à tipos de grãos com características organolépticas diferentes. Os pombos foram expostos à situações de escolha entre um reforçador maior e atrasado e outro reforçador menor e imediato. O tipo de grão (reforçador) variou nas diferentes condições. Os resultados mostraram que a preferência foi influenciada pelo tipo de grão utilizado como reforçador. Adicionalmente, os autores apontam que as manipulações da qualidade dos reforçadores podem significativamente influenciar o grau de autocontrole tipicamente exibido por pombos.

Stark, Collins, Osnes e Stokes (1986) examinaram no ambiente escolar (ambiente experimental) e em casa (ambiente de generalização) o efeito de procedimentos comportamentais para modificar a preferência por lanches em crianças pré-escolares. No primeiro experimento foi avaliada a eficácia de um treino nutricional e de um procedimento de reforçamento social generalizado para aumentar a preferência por lanches saudáveis. O reforçamento social foi realizado por meio de perguntas realizadas pelas crianças e elogios fornecidos pelos cuidadores. No segundo experimento, foi investigado apenas o efeito do treino nutricional. Os resultados indicaram que houve aumento na preferência das crianças por lanches saudáveis com o treino nutricional e reforçamento social associados, e a generalização para o ambiente de casa foi alcançada apenas quando o reforçamento social foi implementado em casa.

Parsons e Reid (1990) avaliaram um programa que fornece oportunidade de escolha para pessoas com deficiência intelectual, a fim de permitir que estes indivíduos expressem preferências por alimentos e bebidas. No Experimento 1, o procedimento envolveu entrevistas com cuidadores e repetidas apresentações de itens aos pares, promovendo oportunidade de escolha para a identificação de preferências de cinco participantes. Os resultados indicaram que a opinião dos cuidadores em relação à preferência por alimentos e bebidas não foram fidedignas. O Experimento 2, analisou a praticidade do procedimento de avaliação de preferência, baseada em: (a) avaliar se os cuidadores poderiam aplicar o procedimento com supervisão apropriada, e (b) se os resultados do procedimento foram preditores das escolhas dos participantes, quando uma oportunidade para expressar preferência menos estruturada e mais natural foi fornecida durante os horários regulares de refeições. Os resultados indicaram que os cuidadores poderiam aplicar o procedimento de maneira eficiente e promover oportunidades de escolha. Os resultados obtidos com o procedimento predisseram a preferência dos participantes. Esses resultados são discutidos em termos de estender o desenvolvimento de tecnologia para identificação de preferência e de reforçadores para pessoas com deficiência intelectual.

Forzano e Logue (1995) estudaram o efeito de preferências entre reforçadores alimentares de mulheres e crianças sob o paradigma de autocontrole, derivado de Rachlin e Green (1972). No primeiro experimento, foi realizado um teste de preferência entre três reforçadores (cereal, pastilhas de chocolate e uva passa). Para a coleta de dados foram utilizados os alimentos classificados no nível alto e no nível baixo de preferência. Cada participante foi exposto a seis condições de escolha diferentes. Nos resultados, os meninos mostraram preferência para o reforçador de alta preferência, porém, atrasado (uma medida de autocontrole). Na condição que disponibilizava uma quantidade menor do reforçador de alta preferência, entregue mais rápido em uma alternativa e na outra, uma quantidade maior do reforçador de baixa preferência, entregue mais atrasado, os garotos apresentaram comportamentos impulsivos, escolhendo a menor quantidade do reforçador de alta preferência, entregue mais rápido. No segundo experimento realizado com mulheres, sucos de diferentes sabores foram utilizados como reforçadores. Inicialmente realizou-se uma avaliação de preferência entre os sabores de sucos. Para coleta de dados foram utilizados os sucos classificados no nível alto e baixo de preferência. Os participantes foram instruídos a operar um aparato experimental e ganhar o maior número de pontos possíveis que seriam, posteriormente, trocados por porções de sucos. Cada participante foi exposto a três condições de escolha diferentes. Os elos iniciais esquerdo e direito foram associados a luz verde e vermelha, respectivamente. As Condições 1, 2 e 3 foram apresentadas ora do lado direito, ora do lado esquerdo para evitar viés por posição. Na primeira condição (linha de base), os pontos ganhos em ambas alternativas eram trocados pelo suco de maior preferência ao final da sessão. Nas condições 2 e 3, em uma alternativa operava um período de tempo fixo e menor, no qual o participante poderia ganhar pontos para trocar pelo suco de maior preferência, e na outra operava um período de tempo ajustável e maior, no qual ele poderia ganhar pontos para trocar pelo suco de menor preferência. O comportamento das mulheres pareceu ficar menos sob controle da magnitude dos reforçadores do que para o atraso na entrega do reforçador. Este comportamento foi observado quando as amostras do suco de maior preferência eram disponibilizadas como reforçadores. Elas escolheram mais frequentemente o reforçador de menor magnitude e menos atrasado, quando essa alternativa entregava o suco de maior preferência, ao invés de escolher um reforçador de maior magnitude, porém, mais atrasado do suco de menor preferência. Os resultados dos dois experimentos mostraram que o comportamento de autocontrole é função de variáveis, tais como a preferência ou a magnitude. Conclui-se que a hierarquia de preferência dos reforçadores é um elemento importante do contexto.

Os estudos descritos anteriormente mostram que a preferência alimentar pode ser alterada mediante procedimentos eficazes e da manipulação de características dos alimentos (sabor, cor, volume e textura). Assim, diante da diversidade de opções alimentares e de suas múltiplas características, é importante conhecer os determinantes dos comportamentos de escolha e de preferência por alimentos saudáveis.

Apesar da importância da identificação de preferências para qualquer indivíduo, do desenvolvimento de procedimentos efetivos pelas pesquisas básicas, translacionais e aplicadas na área, oportunidades de escolha nem sempre se encontram presentes em programas clínicos e educacionais.

Indivíduos com deficiências intelectuais graves têm, frequentemente, pouco controle sobre os alimentos e bebidas que compõem suas refeições devido à falta de oportunidade de escolher (Wilson, Reid, Phillips, & Burgio, 1984) a oportunidade para escolher ativamente o que se deseja beber ou comer pode afetar significativamente a qualidade destas refeições, bem como a qualidade de vida de um indivíduo (Perske, Clifton, McLean, & Stein, 1977).

O presente estudo foi, portanto, delineado de modo a investigar se o componente calórico do alimento e sua magnitude exercem algum controle sobre os comportamentos de escolha e preferência de indivíduos com deficiência intelectual.

 

MÉTODO

Participantes

Participaram desta pesquisa dois indivíduos com idade de sete e treze anos, recrutados em uma instituição especializada no atendimento de pessoas com deficiência intelectual, situada em uma cidade do interior paulista. O diagnóstico dos participantes foi, respectivamente, Síndrome de Down e deficiência intelectual não avaliável em função do participante emitir respostas verbais e de execução incompatíveis com os requisitos do teste Wechsler Intelligence Scale for Children-WISC IV (Wechsler, s/d). Ambos apresentavam minimamente entendimento de instruções simples e se comunicavam utilizando palavras ou expressões vocais. O critério para avaliar sobrepeso foi o IMC (Índice de Massa Corporal). Os dois participantes apresentaram um IMC acima do percentil 85 na curva do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) para meninos: 31,05 e 24,8 respectivamente (Kuczmarski, et al., 2002).

Os procedimentos éticos estabelecidos pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de São Carlos foram seguidos (Processo nº. 23112.000830/2009-08, Parecer nº. 0093/2009). Foi obtida assinatura dos responsáveis no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, preservado o anonimato do participante, assim como a sua integridade, não o submetendo a situação de risco mínimo. A tarefa ensinada foi bastante simples e não envolveu uso de objetos perigosos.

Local, Recursos Materiais e Equipamentos

A pesquisa foi realizada em uma sala de aproximadamente 6m x 4m, que continha três cadeiras, duas mesas, o aparato experimental e um computador.

O aparato experimental (Figura 1) utilizado era composto por um tampo redondo de fibra de média densidade (MDF), na cor branca, medindo 1,20 m de diâmetro. Sobre o tampo havia uma divisória que o separava em três partes iguais. Em uma das três partes encontrava-se afixado um dispositivo medindo 28 cm x 14 cm x 2,5 cm (comp. x larg. x alt.), contendo dois botões interruptores em acrílico translúcido, com diâmetro de 3,5 cm, distantes 10 cm entre si. Sob cada um desses botões havia cinco diodos emissores de luz (leds) nas cores azul, vermelha, verde, branca e amarela. Os botões eram ligados a um contador temporal programável e a outro, de respostas, através de um programa de computador, que possibilitava a programação de esquemas de reforçamento. O programa registrava o número de respostas do participante em cada botão, de acordo com o esquema de reforçamento em vigor, além de girar a mesa em sentido horário (botão direito) ou anti-horário (botão esquerdo), assim que o participante completasse o esquema. Sob o tampo havia um cilindro giratório que fazia o tampo do aparato experimental girar sobre uma cremalheira (Escobal, 2010). Em um compartimento que se localizava acima da junção das três divisórias e no centro do aparato continha uma campainha móvel. Além do aparato e do computador foram utilizados um dispositivo portátil de memória (pendrive), protocolos de registro e dois tipos de goma comestíveis, com e sem valor calórico, utilizadas como consequência para os comportamentos de escolha. Estas gomas foram elaboradas por uma farmaceutica especializada e vinculada ao laboratório da farmácia Calêndula Homeopatia e Manipulação Ltda EPP/CNPJ 04.207.744.0001-32, localizada na mesma cidade em que a pesquisa foi realizada. Para tal elaboração, foram feitas manipulações de formulação diferentes para se obter a quantidade apropriada de cada ingrediente (Glicerina 11,45g; Gelatina 2,72g; conservante 0,035g; água destilada 1,18g; bentonita 0,285g; gomaguar 0,26g; ácido citrico 0,25g; Aroma de morango 0,295 e os componentes que diferiram foram sucralose 0,01% adicionado na goma sem valor calórico e sacarose 5% na goma com valor calórico).

 

 

Delineamento Experimental

O delineamento experimental empregado foi do tipo ABCB para o participante 1 e ABC para o participante 2 (Tawney & Gast, 1984).

A Tabela 1 resume as características de cada Fase realizada no estudo.

 

 

PROCEDIMENTO

Fase 1

Nessa fase, nos elos iniciais, respostas em esquema de Razão Fixa (FR 1), no Botão 1 (direita), eram seguidas por uma apresentação manual feita pela experimentadora de uma campainha (FR 1) que se encontrava em um compartimento centralizado do aparato experimental. Após acionamento da campainha (FR 1) pelo participante, ocorria a liberação de uma goma com valor calórico, no respectivo elo terminal. Respostas em FR 1, no Botão 2 (esquerda), eram também seguidas por apresentação manual feita pela experimentadora de uma campainha (FR 1) que se encontrava no mesmo compartimento centralizado do aparato experimental. Após acionamento da campainha (FR 1) pelo participante, ocorria a liberação de uma goma sem valor calórico, no respectivo elo terminal. A liberação das gomas sobre o aparato experimental em todas as fases do estudo foi manual.

Os critérios para estabilidade de resposta de escolha e mudança de fase foram: (1) realização de número mínimo de cinco sessões; e (2A) emissão de 75% de respostas de escolha nos elos iniciais dos esquemas concorrentes com encadeamento para uma das alternativas, durante três sessões consecutivas; ou (2B) demonstração de indiferença (50%) nas respostas de escolhas entre as alternativas dos elos iniciais do esquema concorrente com encadeamento, durante três sessões consecutivas. Assim que o participante atingisse um dos dois critérios, uma nova condição experimental era introduzida

Fase 2

Nesta fase, nos elos iniciais, respostas em FR 1, no Botão 1 (direita) eram seguidas de apresentação de uma campainha (FR 1) e liberação de uma goma com valor calórico, no respectivo elo terminal. Respostas em FR 1, no Botão 2 (esquerda) eram seguidas de apresentação de uma campainha (FR 1) e liberação de duas gomas sem valor calórico no respectivo elo terminal.

O critério para estabilidade de resposta de escolha e mudança de fase foi o mesmo da Fase 1, exceto a necessidade de realização de cinco sessões antes da mudança de fase. O número de sessões para o critério de estabilidade de respostas e introdução de uma condição experimental variou de acordo com cada participante. Assim que atingisse um dos dois critérios, uma nova condição experimental era introduzida.

Fase 3

Nesta fase, nos elos iniciais, respostas em FR 1 no Botão 1 (direita), eram seguidas de apresentação de uma campainha (FR 1) e liberação de duas gomas, sendo uma com e outra sem valor calórico, no respectivo elo terminal. Respostas em FR 1, no Botão 2 (esquerda), eram seguidas de apresentação de uma campainha (FR 1) e liberação de uma goma sem valor calórico no respectivo elo terminal.

O critério para estabilidade de resposta de escolha e mudança de fase foi o mesmo da Fase 2. O número de sessões para o critério de estabilidade de respostas e introdução de uma condição experimental variou de acordo com cada participante. Assim que atingisse um dos dois critérios, uma nova condição experimental era introduzida.

Nas Fases 1, 2 e 3 para ambos participantes a topografia para a resposta de escolha foi de apertar o botão do elo inicial do aparato experimental, sendo idêntica e com o mesmo esforço físico envolvido em sua emissão. Após apertar um dos botões o aparato experimental girava para a direção em que o botão foi apertado, inviabilizando a emissão de respostas no outro botão.

Foram realizadas quatro tentativas por sessão e três sessões por semana durante as Fases 1, 2 e 3. Para um participante foram realizadas 10 sessões na Fase 1, 3 sessões tanto na primeira como na segunda execução da Fase 2 e 6 sessões na Fase 3, para o outro 12 sessões na Fase 1, 6 sessões na Fase 2 e 3 sessões na Fase 3. Houve uma quebra de um mês no período de coleta de dados que se deveu às férias de julho.

Procedimento para Registro e Análise de Dados e para Cálculo de Fidedignidade

Nas Fases 1, 2 e 3, os dados referentes as respostas de escolha em cada alternativa foram analisados a partir de relatórios fornecidos pelo programa de computador do aparato experimental e pelos registros feitos pela experimentadora, no momento da sessão. Neste registro anotava-se as respostas de escolha em cada botão do aparato experimental (elos iniciais). O resultado do cálculo de fidedignidade foi de 97 % de concordância (Hall, 1974).

Os dados de interesse consistiram nas respostas de escolhas para os estímulos do aparato experimental apresentados simultaneamente, nos elos iniciais dos esquemas concorrentes com encadeamento (Botões 1 e 2). Para a análise do comportamento de escolha, a variável dependente foi a taxa relativa de resposta de escolha para uma das alternativas dos elos iniciais dos esquemas concorrentes com encadeamento dividido pelo total de disponibilidades de ambas as alternativas, apresentadas nos elos iniciais dos esquemas concorrentes com encadeamento, representada pela fórmula: Taxa relativa de resposta de escolha = 1/1+2 ou 2/1+2 (Fisher & Mazur, 1997).

Para a análise do desempenho foram considerados a taxa relativa de resposta de escolha da alternativa contendo uma goma com valor calórico em relação ao número total de oportunidades de respostas de escolha, na Fase 1, a taxa relativa de resposta de escolha da alternativa contendo duas gomas sem valor calórico, em relação ao número total de oportunidades de respostas de escolha na Fase 2, e também, a taxa relativa de resposta de escolha da alternativa, contendo duas gomas, uma com e outra sem valor calórico em relação a taxa total de oportunidades de respostas de escolha na Fase 3, para cada participante. A taxa relativa de resposta de escolha foi calculada dividindo-se a taxa de resposta de escolha da alternativa contendo a goma com valor calórico na Fase 1, da alternativa contendo duas gomas sem valor calórico na Fase 2, como também, da alternativa contendo duas gomas, uma com e outra sem valor calórico, na Fase 3, pela taxa relativa de resposta de escolhas total efetuadas em cada fase. Valores acima de 0,5 indicam preferência pela alternativa contendo a goma com valor calórico na Fase 1, ou pela alternativa com duas gomas sem valor calórico na Fase 2 ou pela alternativa contendo duas gomas, uma com e outra sem valor calórico na Fase 3; valores abaixo de 0,5 indicam preferência pela alternativa contendo a goma sem valor calórico na Fase 1, indicam preferência pela alternativa contendo uma goma com valor calórico na Fase 2 e indicam preferência pela alternativa contendo uma goma sem valor calórico na Fase 3 e valores iguais a 0,5 apontam ausência de preferência.

 

RESULTADOS

Os resultados, primeiramente, ilustraram que não houve preferência por alimentos calóricos para os dois participantes, uma vez que a taxa relativa de resposta de escolha da alternativa contendo a goma com valor calórico, para ambos os participantes indicou dados em torno de 0,5, o que tende a indiferença.

A Figura 2 apresenta a porcentagem de escolhas nos elos iniciais dos esquemas concorrentes com encadeamento (Eixo y) e o número de sessões realizado com cada participante (Eixo x) nas Fases 1, 2 e 3. As barras claras indicam escolhas no botão situado no lado esquerdo do aparato experimental e as barras escuras indicam escolhas no botão no lado direito do aparato experimental. As linhas verticais tracejadas indicam final de uma fase e início de outra.

No painel da Figura 2 referente aos dados do participante 1 (P1), observa-se variabilidade dos dados na Fase 1 desde a sessão inicial até a sétima sessão. Nas sessões 2, 4 e 5 e 1, 6 e 7, o resultado da soma das porcentagens das respostas de escolha nos dois elos iniciais mostra-se iguais. Na terceira sessão, houve distribuição igual das respostas de escolha para os dois elos iniciais.

 

 

Nas 8ª, 9ª e 10ª sessões P1 atingiu critério de estabilidade dos dados (50% de respostas em cada elo inicial) sendo introduzida a Fase 2. Nesta fase, os dados de P1 mostram preferência para a alternativa de maior magnitude (duas gomas sem valor calórico), sendo atingindo o critério de estabilidade dos dados (75% de reposta de escolha para uma alternativa) e introdução da Fase 3. Nessa fase P1 atingiu o critério de estabilidade dos dados (50% de respostas em cada elo inicial) nas três primeiras sessões, porém, não foi introduzida outra fase, por ter ocorrido o período de férias entre as Sessões 16 e 17.

Na última sessão desta fase (19ª), os dados do participante demonstram preferência (75% de respostas) pelo lado esquerdo do aparato experimental, de menor magnitude (uma goma sem valor calórico). Na tentativa de verificar se havia uma preferência pela goma sem valor calórico, foi introduzida novamente a Fase 2, na qual eram disponibilizadas duas gomas (sem valor calórico) contingentes à seleção do botão correspondente ao lado esquerdo, e uma goma (com valor calórico) contingente à seleção do botão correspondente ao lado direito. Não foi notada preferência por nenhuma alternativa dos elos inicias dos esquemas concorrentes com encadeamento durante a replicação da Fase 2.

No painel da Figura 2 referente aos dados de P2, observa-se que os dados tenderam a indiferença (50% de respostas em cada elo inicial) nas respostas de escolhas do participante na maioria das sessões na Fase 1. Nota-se através dos dados preferência pelo lado esquerdo do aparato experimental (goma sem valor calórico) nas Sessões 4 e 7, e preferência pelo lado direito (goma com valor calórico) na Sessão 9. Após o participante atingir critério de estabilidade (12ª sessão) foi introduzida a Fase 2. Nessa fase, os dados do participante tenderam a indiferença nas respostas de escolha em todas as sessões (50% de respostas em cada elo inicial) atingindo critério de estabilidade dos dados nas primeiras três sessões, porém, não foi introduzida a Fase 3 por ter ocorrido o período de férias entre as sessões 15 e 16.

Realizou-se três sessões (16, 17 e 18) e notou-se manutenção da indiferença nas respostas de escolha (50% de respostas em cada elo inicial). Foi introduzida a Fase 3. Nessa fase ocorreu manutenção da indiferença nas respostas de escolha (50% de respostas em cada elo inicial). P2 não demonstrou sensibilidade em relação à magnitude do reforçador nas Fases 2 e 3.

A taxa total de oportunidades de respostas de escolha variou entre os participantes, 40 para P1 e 47 para P2. Na Fase 1, os participantes apresentaram uma taxa relativa de resposta de escolha próxima a 0,5, o que tendeu a indiferença. Na Fase 2 notou-se pelos dados de P1, preferência pela alternativa de maior magnitude (duas gomas sem valor calórico), durante a primeira aplicação, com uma taxa relativa de resposta de escolha de 0,75, na segunda aplicação desta fase, os dados do participante tenderam a indiferença, com uma taxa relativa de resposta de escolha de 0,5; para P2 notou-se indiferença com a taxa relativa de resposta de escolha igual a 0,5. Na Fase 3 os participantes apresentaram uma a taxa relativa de resposta de escolha próximo a 0,5, o que tendeu a indiferença para a alternativa de maior magnitude (uma com e uma sem valor calórico).

Portanto, observou-se para os dois participantes ausência de preferência (valores inferiores a 0,5) para a alternativa que continha uma goma com valor calórico na Fase 1, e para as alternativas de maior magnitude na Fase 2 (duas gomas sem valor calórico) e na Fase 3 (uma com e outra sem valor calórico). Esta ausência de preferência para a alternativa de maior magnitude não foi observada em P1 durante a primeira aplicação da Fase 2.

 

DISCUSSÃO

Como mostraram os resultados, todos os participantes emitiram respostas de escolha nos elos iniciais dos esquemas concorrentes com encadeamento. Uma variável que pode contribuir para que isso aconteça é a maneira como o comportamento de escolha é emitido (sua topografia). O comportamento de apontar pode ser mais fácil de ser emitido que o de dizer o nome do item, uma topografia complexa pode confundir o indivíduo. Assim, a topografia de resposta de escolha nesse estudo parece ter sido adequada, por ser mais simples. Este fato explica por que no estudo não foram utilizadas respostas verbais orais, que podem ser pelo menos, à primeira vista, respostas mais funcionais.

Notaram-se algumas diferenças individuais em relação à distribuição das respostas de escolha entre os botões do aparato experimental (elos iniciais), mas em geral, a análise dos dados indica que a variável independente "quantidade de calorias" exerceu pouco controle sobre estas respostas.

Na Fase 1, a distribuição de respostas entre as alternativas se mostrou indiferente (50% de respostas em cada elo inicial). Esperava-se, então, que com a introdução de uma goma sem valor calórico na alternativa que já continha uma goma sem valor calórico, a distribuição de respostas poderia demonstrar uma tendência à preferência pelas alternativas com duas gomas não calóricas. Assim, a demonstração ainda seria pelo controle de alimentos sem valor calórico sobre aqueles com valor calórico.

Como não foi observada preferência entre as alternativas com gomas com e sem valor calórico (Fase 1), a introdução de uma goma sem valor calórico na mesma alternativa (Fase 2) demonstrou que a magnitude (quantidade) do reforçador, exerceu pouco controle sobre a resposta de escolha estudada. Este controle foi exercido apenas durante a primeira aplicação da Fase 2 para P1.

Uma hipótese a ser investigada que explicaria a indiferença na emissão de respostas de escolha pelo lado de maior magnitude do reforçador é a saciação ao estímulo experimental. Pode-se exemplificar com os comportamentos emitidos por P1 e P2. A partir da 13ª sessão, P1 não mais ingeria a goma imediatamente após a entrega, além de ingeri-la devagar e não emitir pedido de repetição como ocorria no início da coleta de dados. Esses comportamentos emitidos pelo participante podem indicar saciação do estímulo experimental. Uma solução possível para verificar se realmente houve um efeito de saciação do estímulo experimental, seria alternar o sabor e as cores das gomas e analisar se ocorreriam mudanças nas escolhas dos participantes.

O comportamento de P2 parece não ter sido controlado pelo aumento da magnitude do reforçador na Fase 2 (contingente ao lado esquerdo do aparato experimental) e na Fase 3 (contingente ao lado direito do aparato experimental). A não preferência pela alternativa que apresentava maior magnitude ocorreu em ambos os lados.

Adicionalmente, no presente estudo, as diferenças entre as alternativas, tanto visualmente quanto funcionalmente, foram muito sutis para permitir um exame da natureza dos reforçadores envolvidos, o que pode ter sido responsável pelos dados de indiferença, assim como em Escobal e Goyos (2008). Os dados de indiferença obtidos também podem ser explicados: (1) pela igualdade do valor reforçador dos estímulos, (2) pela ausência de discriminabilidade entre as alternativas, (3) pela ausência de repertório de escolha no repertório dos participantes ou ainda (4) pela filogenia.

As Hipóteses 1 e 2 poderiam ser melhor estudadas em um novo estudo. Para avaliar os efeitos do tipo de reforçador e de sua magnitude nas condições estudadas seria necessário, por exemplo, acentuar essas características em uma das condições. Como procedimento adicional, para aumentar a discriminabilidade e avaliar a influência da magnitude reforçadora, um item de nível alto de preferência poderia ser apresentado ora com uma das alternativas, ora com outra. Adicionalmente, pode-se também ter acesso às condições relacionadas ao controle das operações motivacionais dos participantes ou ainda manipular as operações motivacionais dos participantes. Para tentar explicar a indiferença nos dados de escolha das alternativas, é importante considerar não somente se ficam ou não sob controle das contingências apresentadas, mas também a quais aspectos das contingências apresentadas o desempenho dos participantes demonstrou estar sob controle.

Em relação à Hipótese 3, o participante poderia não apresentar em seu repertório o comportamento de escolha, por não ter sido realizado um procedimento de ensino sistematizado desta resposta. Isto pode ter sido uma variável interveniente que confundiu os resultados. Futuros estudos poderiam controlá-la. Adicionalmente, o reforçador poderia não ser efetivo o suficiente. Como não foi feito um teste de "preferência", não se pode afirmar que nosso reforçador era efetivo. O participante pode ter persistido na tarefa experimental por controle verbal ("faça a tarefa") ou mesmo por reforçamento negativo.

Em relação à Hipótese 4, o organismo possui uma história evolutiva. A história da nossa espécie pode ter definido o funcionamento do nosso corpo. Um exemplo é o gosto pelo açúcar. Comer açúcar provia a energia necessária para a sobrevivência dos organismos no passado. Não há meios de analisar um comportamento sem considerar como alguns elementos desse comportamento podem ter sido relevantes para a evolução da espécie. O conceito de operante está intrinsecamente relacionado a uma história filogenética. Tal processo seria mais um produto da seleção natural e tanto a origem de uma primeira resposta quanto a explicação para a sensibilidade a determinadas consequências estariam irremediavelmente atreladas à filogênese.

Outro fato que denotou ter influência na preferência dos participantes foi o horário em que os participantes se alimentavam. Quando a coleta era realizada em um período curto (20 minutos), antes do recreio ou antes da refeição, os participantes apresentavam melhor engajamento na atividade de escolha. A variável horário de realização da sessão deveria ter sido controlada. Um novo estudo poderia replicar essa pesquisa controlando essa variável.

O procedimento de avaliação de preferência utilizado neste estudo forneceu oportunidade de escolha apenas entre dois tipos de alimentos. Este procedimento pode ser utilizado para analisar preferências entre diversos itens comestíveis, dada a importância de promover oportunidades de escolhas (Bannerman, Sheldon, Sherman, & Harchik, 1990; Guess, Benson, & Siegel- Causey, 1985; Houghton, Bronicki, & Guess, 1987; Shevin & Klein, 1984). Porém, do ponto de vista do participante, os dois tipos de alimento poderiam ser vistos como um único tipo em função das similaridades que apenas variava a posição.

Estudos sobre a natureza da escolha e preferência por alimentos calóricos ou não calóricos são importantes para identificar e descrever os procedimentos adequados para compreender e controlar a ingestão de alimentos em populações que necessitam fazê-lo como, por exemplo, crianças com sobrepeso ou obesas e com deficiência intelectual.

Um ponto forte do estudo foi tentar produzir dois alimentos rigorosamente idênticos e palatáveis isolando apenas a variável caloria. Porém, o aroma utilizado para produzir tais alimentos (gomas) tem em sua composição macronutriente (carboidrato), o que adiciona caloria a tal substância, limitando o uso de vários sabores nos estímulos experimentais, o que pode ter se tornado outra variável que pode ter influenciado nos resultados. Um novo estudo poderia tentar controlar essa variável.

Um fato que pode também ter influenciado os resultados do estudo foi a quantidade de escolhas que os participantes puderam realizar por dia (quatro). Esse critério de número de tentativas por sessão foi escolhido arbitrariamente. Infere-se que tal critério, associados aos critérios para estabilidade de desempenho nas tarefas e, consequentemente o baixo número de tentativas ao longo das fases do estudo pode ter limitado a interpretação dos resultados de preferência e, particularmente, uma avaliação dos efeitos cumulativos de uma preferência sobre a alteração da operação motivacional vigente no momento da escolha.

Muitas preferências cotidianas são controladas pelo sabor, pela forma, coloração etc., os quais têm uma correlação forte com calorias, principalmente as voltadas para o público infantil. Novas possibilidades poderiam incluir a elaboração de novas gomas, usando produtos e formulações diferentes. Além da magnitude do estímulo reforçador, poderia se estudar também, atraso do reforço, aumento do custo de respostas, operações motivacionais, entre outras variáveis que entrariam no controle dos comportamentos de escolha e preferência investigados neste estudo e com esta população.

 

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Received: July 20, 2011
Accepted: February 25, 2012

 

 

1 Trabalho feito com base na dissertação de mestrado da primeira autora, sob orientação do terceiro autor, apresentado ao Programa de Pós graduação em Psicologia da Universidade Federal de São Carlos. Os autores agradecem à FAPESP por Bolsa de Pós-doutorado concedida a segunda autora (Processo 2010/11201-9) e ao CNPq por bolsa de produtividade em pesquisa concedida ao terceiro autor (Processo 2008/04407-0). Todos os autores encontram-se vinculados ao Laboratório de Aprendizagem Humana, Multimídia Interativa e Ensino Informatizado (LAHMIEI), UFSCar.
2 Endereço para correspondência: Departamento de Psicologia, UFSCar, C.P. 676, São Carlos, SP, CEP: 13565-905. E-mail: celsogoyos@hotmail.com.