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Acta Comportamentalia

versão impressa ISSN 0188-8145

Acta comport. vol.22 no.2 Guadalajara  2014

 

Artigo

 

Interação terapêutica: Considerações sobre os efeitos dos comportamentos de empatia, interpretação e orientação1

 

Therapeutic interaction: Considerations about the influence of the therapist's behavior of empathy, interpretation, and orientation

 

 

Fabiane Ferraz Silveira FogacaI, Alessandra Turini Bolsoni-SilvaII, Sonia Beatriz MeyerIII

I   Universidade Federal de São Carlos
II
  Universidade Estadual Paulista, Bauru
III
 Universidade de São Paulo (Brasil)

 

 


RESUMO

Este estudo discute os efeitos dos comportamentos verbais vocais do terapeuta, em específico, orientação, interpretação e empatia, sobre os comportamentos do cliente de resistência e cooperação. Examina-se diferentes sistemas de categorização de comportamentos do terapeuta e cliente e como tais sistematizações permitem o estudo da interação terapêutica na terapia analítico-comportamental. São apresentadas diferentes pesquisas sobre as categorias orientação, empatia e interpretação, bem como as divergências e convergências de conclusões com relação aos efeitos positivos e negativos sobre os resultados da terapia. Constata-se que resultados discordantes sejam produzidos a partir de diferenças quanto aos procedimentos de coleta e análise dos dados utilizados. Por fim, discute-se que o impacto de categorias de comportamentos do terapeuta esteja condicionado à etapa do processo terapêutico e comportamentos precedentes do cliente e do terapeuta.

Palavras-clave: Terapia Analítico-Comportamental, comportamento verbal, sistemas de categorização, avaliação de resultados de intervenções


ABSTRACT

This study discuss the effects of the therapist's vocal verbal behavior, in particular, orientation, interpretation and empathy in relation to the client's behavior and therapy's results. The differences of several behavioral coding systems are analyzed, as well as their utility on the study of the therapeutic interaction on Analytic Behavior Therapy. It is also presented the different researches regarding the positive and negative effects of the categories orientation, empathy and interpretation. The different results are discussed in terms of data analysis procedures employed. Finally, it is assumed that the impact of therapist's behaviors are influenced by the phase of therapeutic process (beginning, intermediary or final) and the precedent behaviors of the client and therapist.

Key words: analytic behavior therapy, verbal behavior, behavioral coding system, outcome assessment


 

 

O presente estudo discute a relação entre os comportamentos do terapeuta de demonstrar empatia, interpretar e orientar, e os comportamentos do cliente de resistência, que sugerem oposição à terapia, e os de cooperação, sinalizando adesão ao processo terapêutico. A descrição do impacto dos comportamentos do terapeuta, a partir de observações e análises empíricas, revela-se um campo de interesse de todos os envolvidos com a prática clínica, especialmente em um momento histórico de consolidação do movimento de busca por critérios de efetividade de tratamentos e intervenções.

Para efeito desse trabalho, discute-se sobre: a) sistematizações de categorias de comportamento do terapeuta e cliente; b) relações entre resultados de sucesso ou insucesso de intervenções e frequência de comportamentos do terapeuta; e c) efeitos dos comportamentos do terapeuta sobre comportamentos do cliente de cooperação e resistência.

Meyer (2006) defende a importância de pesquisas que versem sobre as contingências dispostas na terapia analítico-comportamental, pois o acúmulo de evidências sobre como as mudanças comportamentais são produzidas pode favorecer a criação de políticas do setor de saúde e de prestação de serviços e auxiliar pesquisadores e professores na formulação de teorias e no treino de novos terapeutas. Especificamente sobre a terapia analítico-comportamental, os estudos que buscavam explicitar quais variáveis eram responsáveis pelos resultados foram aos poucos mudando seu enfoque. Kerbauy (1981), ao descrever os primeiros trabalhos realizados por terapeutas comportamentais, afirmou que a prática tendia, frequentemente, a caracterizá-los como aqueles que empregavam técnicas. Como consequência, pesquisadores, professores e supervisores enfocavam somente a necessidade do aluno aprender a administrar técnicas de modificação do comportamento. No entanto, o fato de que a aplicação das técnicas não alcançava os resultados esperados em todos os casos fez com que surgissem dúvidas com relação à possibilidade de outras variáveis, tais como as características do cliente e os comportamentos do terapeuta, exercerem influência sobre o resultado do processo terapêutico (Kerbauy, 1981).

De acordo com Zamignani (2007), a caracterização da interação terapeuta-cliente resultou na tradição, iniciada na década de 70, do desenvolvimento de pesquisas de processo, que buscam descrever de forma molar ou molecular, relações sequenciais entre eventos do processo terapêutico. A mútua e complexa influência entre os comportamentos do terapeuta e cliente no decorrer das sessões pode ser desvelada a partir da identificação de regularidades nos fluxos de interações. A identificação dos padrões de interação exige, por sua vez, a operacionalização das classes de comportamentos a serem registradas, resultando em sistemas de categorização que possam ser utilizados por múltiplos observadores. Partindo da premissa de que os comportamentos do terapeuta constituem parte das explicações para os resultados alcançados, a despeito das técnicas utilizadas, apresenta-se, no tópico seguinte, alguns sistemas de categorização de comportamentos do terapeuta e do cliente.

 

SISTEMAS DE CATEGORIZAÇÃO DOS COMPORTAMENTOS DO TERAPEUTA E DO CLIENTE

A organização dos dados de sessões, a partir de sistemas de categorias, representa uma etapa relevante para o estudo da efetividade da terapia (Harwood & Eyberg, 2004; Zamignani, 2007). Algumas categorias de comportamentos do terapeuta foram apresentadas por pesquisadores brasileiros, dentre eles, Meyer e Vermes (2001), Rangé (1995), Tourinho et al. (2007) e Zamignani (2007). Os estudos de Rangé (1995) e Meyer e Vermes (2001) consistiram de levantamentos da literatura, acompanhados de proposições teóricas comprometidas com os referenciais da terapia cognitivo-comportamental e da terapia analítico-comportamental, respectivamente. Ao considerar que tais trabalhos corresponderam a revisões teóricas, acredita-se que forneceram direcionamentos importantes para pesquisas de caráter empírico.

Rangé (1995) identificou os seguintes comportamentos gerais do terapeuta: promover a confiança do cliente nos procedimentos terapêuticos através da apresentação de informações; aceitar incondicionalmente o cliente, ser cortês e compreensivo; ser empático; encorajar a participação ativa; adaptar o procedimento ao cliente, oferecer apoio; apresentar questionamentos; oferecer clarificação e interpretação, entre outras. Meyer e Vermes (2001) descreveram as seguintes categorias do terapeuta: solicitar informações, fornecer informações, empatia, sinalização de variáveis relevantes, aprovação, orientação, interpretação, confrontação e silêncio.

Como exemplos de pesquisas nacionais fundamentadas em análises de registros de sessões terapêuticas, pode-se destacar os estudos de Tourinho et al. (2007) e Zamignani (2007). Na proposta de 2007, Tourinho et al. estavam interessados em desenvolver um novo sistema de classificação considerando as funções de diferentes verbalizações do terapeuta e do cliente, ao passo que a categorização proposta por Zamignani (2007) almejava, sobretudo, superar algumas restrições metodológicas identificadas em outros sistemas de categorias.

Tourinho et al. (2007) elaboraram oito categorias, a saber: informar- verbalizações cuja função seja alterar o conhecimento do cliente sobre o processo terapêutico, ou sobre diferentes assuntos abordados em sessão; investigar- tem a função de produzir informações sobre a história ambiental do cliente e ensinar o cliente a se posicionar de uma forma investigativa diante dos fatos; dar feedback - tem a função de fortalecer ou enfraquecer verbalizações do cliente sobre si mesmo ou sobre sua história ambiental; confrontar - tem a função de questionar/confrontar o cliente com uma interpretação do terapeuta para os eventos relatados; dar conselho - tem a função de, ao sugerir uma determinada forma de se comportar, indicar um comportamento com probabilidade maior de ser reforçado; verbalizações mínimas - tem a função de facilitar a continuidade de verbalização do cliente, e outras verbalizações. O sistema proposto por Tourinho et al. (2007), mediante uma análise empírica, gerou uma descrição operacional de categorias do terapeuta em intervenções individuais, diferenciando-as a partir da identificação das funções básicas a que correspondem.

Zamignani (2007) verificou na literatura que alguns sistemas de categorização apresentam restrições metodológicas, sobretudo, descrição limitada das categorias e inexistência de manual para treino de registro por observadores independentes. De forma a superar as dificuldades metodológicas citadas, Zamignani (2007) propôs um novo sistema de categorias, a partir de revisões teóricas e testes empíricos, "que fosse sensível à detecção de eventos relevantes para diferentes questões de pesquisa e cujas categorias fossem fidedignas para a sua replicação por diferentes pesquisadores" (p. 24). O sistema apresenta diferentes dimensões a serem analisadas: Eixo I - categorias referentes ao comportamento verbal vocal e verbal não-vocal do terapeuta e cliente; Eixo II – temas abordados em sessão; e Eixo III – respostas motoras. Os elementos verbais vocais do Eixo I são constituídos das seguintes categorias do terapeuta: solicitação de relato - o terapeuta solicita descrições de eventos; facilitação - o terapeuta emite vocalizações que indicam que está atento ao relato e sugere sua continuidade; empatia - caracterizada por verbalizações que sugerem expressão de afeto, compreensão e aceitação do cliente; informação - o terapeuta informa sobre eventos, que não o comportamento do cliente ou de terceiros, estabelecendo ou não relações causais ou explicativas entre eles; solicitação de reflexão - o terapeuta solicita explicações, interpretações, reflexões ou previsões a respeito de qualquer tipo de evento; recomendação - o terapeuta sugere alternativas de comportamento ao cliente ou solicita o engajamento do mesmo em ações ou tarefas; interpretação - o terapeuta descreve relações causais ou explicativas a respeito do comportamento do cliente ou de terceiros e identifica padrões comportamentais do cliente ou de terceiros; aprovação - é caracterizada por verbalizações que sugerem avaliação favorável a respeito de ações, características ou avaliações do cliente; reprovação - é caracterizada por verbalizações que sugerem avaliação desfavorável a respeito de ações, características ou avaliações do cliente e outras.

Em relação aos comportamentos verbais vocais do cliente, Zamignani (2007) elaborou as categorias: solicitação - caracterizada por verbalizações que apresentam pedidos ou questões ao terapeuta; relato - verbalizações que descrevem ou informam ao terapeuta a ocorrência de eventos, respostas emocionais suas ou de terceiros, seus estados emocionais e/ou tendências a ações, sem estabelecer relações causais ou funcionais entre eles; melhora ou progresso terapêutico - verbalizações nas quais o cliente relata mudanças satisfatórias com relação à sua queixa clínica; formula metas - verbalizações que descrevem projetos, planos ou estratégias para solução de problemas trazidos como queixas para a terapia; estabelece relações – a categoria é definida por verbalizações que estabelecem relações causais e/ou explicativas entre eventos; concordância ou confiança - é caracterizada por verbalizações nas quais o cliente expressa avaliação favorável a respeito de comportamentos emitidos pelo terapeuta ou relata satisfação sobre o processo terapêutico; oposição - verbalizações nas quais o cliente expressa discordância, avaliação desfavorável a respeito de comportamentos emitidos pelo terapeuta e outras. Vale ressaltar que para cada categoria do terapeuta e cliente são apresentadas diferentes subcategorias que as compõem.

Os sistemas de categorização de Tourinho et al. (2007) e Zamignani (2007) foram utilizados em diferentes pesquisas e, dessa forma, estão em contínuo processo de teste e aperfeiçoamento. A maior contribuição de ambas as propostas de categorização advém da adoção de critérios funcionais de definição de categorias. Categorias funcionalmente orientadas possibilitam o estudo da interação terapêutica isto é, a descrição de como terapeuta e cliente comportam-se durante as sessões de modo a influenciar mutuamente os seus comportamentos (Silveira, 1997; Zamignani, 2007).

Da análise das categorias do terapeuta nos sistemas propostos por Tourinho et al. (2007) e Zamignani (2007), comprometidos com o referencial da Análise do Comportamento, constata-se a presença de eventos comportamentais semelhantes, apesar das denominações diferenciadas. As compatibilidades dizem respeito à apresentação de alternativas comportamentais ao cliente (orientação/recomendação), apresentação de informações teóricas ou sobre o processo terapêutico (informação), descrição de relações entre eventos (inferência/interpretação), solicitação de informações (investigação/solicitação de relato), verbalizações que visam o fortalecimento (recuperação/aprovação) ou enfraquecimento na frequência de comportamentos do cliente (recuperação/reprovação).

 

RELAÇÕES ENTRE COMPORTAMENTOS DO TERAPEUTA E CLIENTE E RESULTADOS DA TERAPIA

Meyer (2009), ao sistematizar um banco de dados com 495 sessões de terapia analítico-comportamental, verificou que a ocorrência discreta de "interpretação" nas primeiras sessões, tende substancialmente a aumentar durante a terapia, atingindo valores próximos a 25% do total de verbalizações do terapeuta por volta da décima sessão e a estabilidade na 25ª sessão.

Orlinsky, Grawe e Parks (1994) ao examinarem intervenções individuais bem e mal sucedidas, observaram que as categorias "interpretação" e "empatia" ocorreram com frequência maior em intervenções que produziram resultados positivos.

Piper et al. (1998) conduziram um estudo em que clientes adultos foram distribuídos randomicamente entre duas condições de terapia, com predomínio de "interpretação" ou "empatia". Os resultados indicaram um número maior de abandono na condição de interpretação (23%) em comparação à empatia (6%). Conclusão divergente foi descrita por Yano, Almeida e Meyer (2008) ao realizar uma análise retrospectiva de sessões de dois grupos de clientes, que abandonaram ou não abandonaram a terapia. Em tal estudo observou-se que interpretação e empatia, ao serem apresentadas com frequência similar, parecem não contribuir para o abandono, mas sim, para a adesão do cliente ao processo terapêutico. Alexander, Barton, Schiavo e Parsons (1976), ao analisar registros de sessões iniciais, observaram que as ocorrências de "empatia" estão positivamente correlacionadas ao sucesso da terapia.

Conquanto as proposições mencionadas assumam aspectos positivos relacionados à empatia (Alexander et al., 1976; Orlinsky et al., 1994), igualmente são produzidas evidências de neutralidade e, ocasionalmente, prejuízos para os resultados da terapia. Correlações positivas significativas entre "empatia" e abandono são demonstradas, indicando que a cooperação observada nas primeiras sessões, corresponde a um efeito temporário, insuficiente, portanto, para garantir a adesão ao processo terapêutico (Harwood & Eyberg, 2004).

Comportamento empático pode produzir condições emocionais descritas pelo cliente como acolhimento e compreensão, entretanto, também tem o potencial de levar o terapeuta, inadvertidamente, a reforçar e manter padrões comportamentais que o fizeram procurar a terapia (Harwood, 2003). Patterson e Chamberlain (1994) constataram que uma alta frequência de "empatia", comparada a ocorrências inferiores de "orientação" e "interpretação", produzem mudanças terapêuticas discretas ao final da intervenção.

Um estudo de revisão sugere que, comparado a terapeutas de outras abordagens teóricas, os terapeutas analítico-comportamentais, no geral, falam mais, fazem mais perguntas, oferecem mais estruturação e orientação (Keijsers, Schaap & Hoogduin, 2000). Meyer (2009) observou uma tendência nos resultados de "orientação", isto é, um aumento gradual na sua ocorrência atingindo o valor máximo de 19% das verbalizações do terapeuta na décima quarta sessão. No entanto, a partir desse momento, ocorre um contínuo decréscimo, alcançando 14% e 7% ao final do primeiro e segundo ano de atendimento, respectivamente.

Zamignani (2007) analisou três sessões de terapia analítico-comportamental com o objetivo de ilustrar a aplicação do seu sistema multidimensional de categorização dos comportamentos do terapeuta e cliente. Participaram do estudo um terapeuta com 25 anos de experiência e uma cliente de 32 anos com queixas conjugais. Os resultados indicaram superioridade na frequência e duração de "interpretação", "recomendação" e "aprovação", em relação às demais categorias de comportamento do terapeuta, com aumento progressivo da fase inicial para a final da terapia. As explicações do pesquisador para o aumento de "recomendação" e "interpretação" na fase intermediária, dizem respeito à etapa do processo terapêutico correspondente, na qual já se prevê a formulação de hipóteses e realização da intervenção propriamente dita.

Orlinsky et al. (1994) constataram que "orientação" ocorreu com frequência maior em intervenções que produziram mudanças discretas. Considerando sessões iniciais em intervenções com famílias, Alexander et al. (1976) e Harwood e Eyberg (2004) verificaram que "orientação" gerou efeitos negativos somente nas primeiras sessões, com nenhum efeito prejudicial nas fases seguintes da terapia.

De modo concomitante à produção de pesquisas que versam sobre comportamentos do terapeuta e resultados de terapia, outros pesquisadores selecionam os efeitos do comportamento do terapeuta sobre os comportamentos do cliente de resistência e cooperação como objeto de estudo.

Newman (2002), em uma proposta cognitivo-comportamental, define resistência a partir de aspectos do funcionamento do cliente, que procuram manter o status quo do seu funcionamento psicológico ou que, em outras palavras, atuam contra uma mudança produtiva na vida do cliente. O mesmo estudo fornece uma descrição ampla de possíveis categorias comportamentais de resistência. Dentre as principais categorias pode-se citar: a recusa na realização de tarefas de casa; repetidamente tomar decisões diferentes do que as que foram acordadas em sessão; alta frequência de expressões emocionais em relação ao terapeuta (que vão do flerte à hostilidade extrema); evitação durante a sessão, com longos períodos de silêncio e abruptas mudanças de assunto; e repetidas interpretações equivocadas, em um sentido negativo aos comentários do terapeuta.

Segundo MacKenzie, Fites e Bates (2004) apesar da falta de consenso sobre o conceito de resistência, uma das referências mais utilizadas foi proposta por Bischoff e Tracey (1995), que a definem como qualquer comportamento do cliente que indique oposição ao terapeuta, ao processo terapêutico ou à agenda da sessão. Para Bischoff e Tracey (1995) comportamentos de resistência do cliente acompanham intervenções do terapeuta consideradas diretivas - qualquer sentença que controle a atividade verbal da terapia ou que apresente uma demanda ao cliente - como, por exemplo, "orientação" e "interpretação". O mesmo efeito não ocorre com as categorias não diretivas, ou seja, qualquer verbalização do terapeuta que atribua ao cliente a responsabilidade por direcionar a atividade verbal da terapia ou que indique encorajamento e apoio, como no caso de "empatia" e "facilitação".

Patterson e Forgatch (1985) examinaram o impacto dos comportamentos do terapeuta (variável independente) sobre a resistência do cliente (variável dependente) em uma intervenção com pais. Conforme as hipóteses dos autores, as intervenções diretivas, no caso "confrontação" e "orientação", levaram a um aumento na frequência de resistência; já "facilitação" e "empatia" produziram uma diminuição em tais comportamentos. Os autores identificaram como prováveis implicações da ocorrência de resistência em situações clínicas, a redução na frequência de orientação e confrontação e o aumento do número de sessões necessárias para produção de mudanças terapêuticas.

Barbera e Waldron (1994) analisaram trechos de filmagens de segundas sessões com 12 famílias de adolescentes infratores. Os autores verificaram que "empatia" representou a maior frequência (41%) das verbalizações do terapeuta, seguida por "orientação". Análises revelaram que "empatia" gerou cooperação para a maior parte dos clientes; "facilitação" e "confrontação" não produziram aumento na cooperação ou resistência, e "questionamento" mostrou resultados inconsistentes. A categoria "orientação", ao contrário das hipóteses apresentadas, não foi seguida por resistência, mas sim, gerou aumento na cooperação para metade da amostra.

Para Patterson e Chamberlain (1994) o terapeuta deve apresentar uma frequência ótima de "orientação" e "interpretação", que seja suficiente, mas não em excesso, para garantir a produção de mudanças. Em intervenções com famílias também são observadas alterações na frequência de resistência associadas às fases do processo terapêutico (Stoolmiller, Duncan, Bank & Patterson, 1993). No início da intervenção são observadas baixas ocorrências de resistência, pois se trata de uma fase em que o terapeuta estabelece uma relação de confiança e dá início à investigação das dificuldades. Na etapa seguinte, o terapeuta apresenta solicitações e utiliza diferentes estratégias e procedimentos gerando, então, um aumento na resistência. Em um terceiro momento, quando ganhos terapêuticos são observados, ocorre redução da resistência.

Os estudos apresentados buscam descrever as implicações dos comportamentos do terapeuta para o processo terapêutico, contudo, as conclusões ainda são divergentes. No caso de "orientação", indicativos de aumento nos níveis de resistência (Patterson & Forgacth, 1985), aumento na cooperação (Barbera & Waldron, 1994), prejuízos para os resultados (Orlinsky et al., 1994) e de efeitos prejudiciais circunscritos somente ao início da intervenção são igualmente demonstrados (Harwood & Eyberg, 2004).

Em síntese, no que se refere à "interpretação", constata-se o aumento progressivo da frequência com o passar das sessões (Meyer, 2009), a atribuição de responsabilidade por resultados de sucesso (Orlinsky et al., 1994), a produção de resistência (Bischof & Tracey, 1995) e posicionamento divergente quanto à adesão ao processo terapêutico (Piper et al., 1998; Yano et al., 2008).

Observou-se, em relação à literatura referenciada, que alguns autores atribuem à "empatia" a responsabilidade por resultados positivos (Barbera & Waldron, 1994), a diminuição da resistência (Patterson & Forgatch, 1985) e também o abandono da terapia (Harwood & Eyberg, 2004).

As divergências entre resultados são produzidas em função de diferenças no tipo de intervenção analisada (familiar, individual, etc), avaliadores selecionados (terapeuta, cliente ou observadores independentes) e procedimentos de coleta e análise dos dados (sistemas de categorização, transcrições de sessões, trechos de filmagens ou filmagens completas) da interação terapêutica (Harwood & Eyberg, 2004). A utilização de sistemas de categorização de comportamentos, gravação audiovisual e observadores independentes como avaliadores são considerados procedimentos metodológicos mais confiáveis (Meyer, 2006; Tourinho et al., 2007). Resultados opostos são produzidos também em função da etapa do processo terapêutico analisada. Diferenças importantes parecem surgir se o enfoque é atribuído à fase inicial, intermediária, final ou inclui segmentos de toda a terapia.

Supõe-se que o impacto de uma das categorias do terapeuta sobre o processo terapêutico está condicionado aos percentuais de ocorrência dos demais comportamentos por ele apresentados. Como exemplo hipotético da afirmação anterior, considera-se que as explicações para os resultados que associam "orientação" a resultados inexpressivos ou de sucesso, estariam amparadas pela investigação das ocorrências de "empatia", "facilitação", "investigação", "aprovação", dentre outras.

Em parte dos estudos citados, a investigação envolveu dois ou mais comportamentos do terapeuta (e.g., Barbera & Waldron, 1994; Patterson & Chamberlain, 1994; Yano et al., 2008), sinalizando a opção por análises conjugadas entre categorias. Nessa direção, a investigação da distribuição da frequência de todos os comportamentos do terapeuta apresentados, fortalece as hipóteses sobre resultados positivos e adesão do cliente, ao invés do estudo de uma categoria isolada.

Segundo Hill (2001) os dados de frequência das categorias do terapeuta, ainda que signifiquem um avanço importante, não permitem inferências a respeito das variáveis antecedentes e consequências produzidas. Além das frequências de diferentes comportamentos do terapeuta, dados a respeito do contexto no qual foram apresentadas e diante de quais comportamentos do cliente, forneceriam indícios a respeito dos seus efeitos na sessão.

Quanto às dimensões contextuais, Stiles (1999) discute a questão da responsividade no processo terapêutico. Ao analisar sessões de terapia breve para depressão foi verificada que a correlação entre ingredientes ativos de terapia e resultados se mostrou insuficiente. Segundo o autor, a lógica da análise de frequência de categorias de comportamentos do terapeuta supersimplifica a relação entre variáveis de processo e variáveis de resultados. Para o autor a relação dinâmica entre processo terapêutico e resultados pode ser compreendida a partir do conceito de responsividade, o qual significa comportar-se de modo a ser afetado pelo contexto emergente, incluindo solicitações do cliente, de modo a avançar em direção aos objetivos da terapia.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diferentes pesquisadores afirmam que a experiência, formação teórica, técnicas e procedimentos utilizados, e especialmente, a maneira como o terapeuta conduz a sessão e interage com o cliente, são consideradas variáveis terapêuticas importantes, que interferem nas diferentes etapas do processo terapêutico (Gavino, 1996; Kerbauy, 1981). Contudo, conclusões divergentes sobre a adesão ou resultados da terapia engrossam as críticas quanto às limitações ao apelo único a dados de frequência, como medida confiável da efetividade das intervenções do terapeuta.

De acordo com Schaffer (1982) estudos sobre o processo terapêutico devem incluir análises sobre variáveis contextuais, bem como a proficiência com que o comportamento do terapeuta é apresentado. Para o autor, a desconsideração das dimensões citadas se reflete em conclusões restritas a respeito da qualidade da intervenção realizada.

A operacionalização de comportamentos do terapeuta por meio de sistemas de categorização, além de valor heurístico, adquire importância adicional ao permitir a observação sistemática de relações entre comportamentos do terapeuta e cliente. As dificuldades de definição da unidade de análise em pesquisas clínicas implicam na divisão do processo de coleta e análise dos dados sobre a interação terapêutica em pelo menos dois momentos distintos (Zamignani, 2007). Em um primeiro momento, o registro das categorias baseia-se em análises moleculares, identificando interações momento-a-momento entre terapeuta e cliente. Sistemas de categorização, como o de Zamignani, permitem o registro de categorias a partir da estimativa da função imediata, considerando eventos imediatamente precedentes e subsequentes, "(...) em direção a uma estratégia que envolve certo grau de inferência sobre a função da resposta no contexto imediato da interação" (Zamignani, 2007, p. 22). Em um segundo momento, a partir das regularidades observadas, são estabelecidas análises de caráter molar (Baum, 2003), incluindo relações entre eventos temporalmente distantes, como a análise de episódios comportamentais (Zamignani, 2001).

A investigação das interações terapêuticas responsáveis pela mudança em terapia é realizada mediante observações sistemáticas de transições momento-a-momento entre comportamentos do terapeuta e cliente e por meio de análises intra e entre sessões. A inexistência de dados a respeito das condições nas quais os comportamentos de "empatia", "interpretação" e "orientação" foram apresentados nos estudos citados limita o alcance das discussões apresentadas.

Favoravelmente ao posicionamento de Hill (2001), acredita-se que dados de frequência de comportamentos, ainda que representem uma diretriz inicial importante de investigação, requerem um alto grau de inferência com relação ao impacto sobre os comportamentos do cliente. Os posicionamentos de Hill e Stiles (1999) apontam para o estudo da interação como alternativa promissora para a pesquisa clínica, haja vista que análises moleculares ou molares das sequências de transições entre comportamentos do terapeuta e cliente indicam padrões de interação com maior probabilidade de produzir resultados positivos.

Face ao exposto, considera-se imperativo que novos estudos sobre a interação terapêutica, na impossibilidade de investigação da totalidade dos comportamentos emitidos, adicionem dados a respeito do contexto de apresentação dos comportamentos do terapeuta, incluindo o comportamento do cliente, os quais forneceriam indícios mais confiáveis a respeito dos seus possíveis efeitos e resultados obtidos.

 

REFERÊNCIAS

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Received: November 5, 2013
Accepted: February 4, 2014

 

 

1 Endereço para correspondência: fabianeferrazsilveira@yahoo.com.br