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Revista Brasileira de Psicanálise

Print version ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál vol.42 no.2 São Paulo June 2008

 

EDITORIAL

Um projeto: a busca da excelência

 

A project: searching the excellence

 

Un proyecto: la búsqueda de la excelencia

 

 

Leopold Nosek

 

 

Quero reafirmar a importância que a política editorial da Revista Brasileira de Psicanálise tem dado ao debate com outras disciplinas do saber acerca do humano. Assim, comemoramos a oportunidade de dialogar com o eminente professor de história Fernando Novais. Temos considerado que ocorre um reposicionamento em todos os campos do conhecimento, fruto de mudanças fundamentais em nossa realidade cotidiana. Como nos diz também Novais, a partir dos anos 80 há um reposicionamento do que seria ciência e uma rediscussão acerca de seu papel como modelo de conhecimento.

Os paradigmas entram em crise– e não é diferente em nosso campo. Nosso orgulhoso isolamento de décadas não pode mais subsistir. Estamos mergulhados em nossa prática, em meios específicos que nos questionam, propõem perguntas e exigem respostas e posicionamentos. Temos apenas uma pequena faixa no saber do humano submetido à nossa interrogação, e nossos impasses e avanços têm paralelo com outros campos que muitas vezes já maturaram reflexões das quais podemos nos beneficiar.

É, pois, um privilégio acolher em nossas páginas colegas que se dispõem ao diálogo conosco. É um desafio interessantíssimo, ouvir do melhor da academia que a história não é uma ciência, mas que é preciso ter cuidado sobre onde dizer isso, pois se necessitam de verbas de instituições oficiais. Trafegar por onde necessário for– mas sem sacrificar os princípios, sem uma acomodação oportunista aos tempos, sem uma rendição ao que pede o mercado científico.

Vemos também, na entrevista de Fernando Novais, como não é monopólio da ciência o rigor da definição do objeto e do método de sua abordagem. Nós, psicanalistas, temos sofrido uma pressão institucional enorme para uma nova rendição aos métodos e paradigmas do empirismo e do positivismo. Não temos comemorado devidamente a crise de paradigmas que se instituiu por toda parte nos últimos anos.

Que oportunidade enorme é a crise. Que espaço enorme se abre com o abismo de certezas. Se não quisermos rapidamente obturar o vazio deixado pelo desmoronamento de modelos e preenchê-lo rapidamente com afirmativas apressadas, se não nos rendermos rapidamente às exigências do mercado, nosso pensamento encontrará seu espaço próprio. Mais uma vez, como nos primórdios de nossa disciplina, acreditamos que também devemos mostrar nossa eficácia em trazer bem-estar, tal como apregoam os laboratórios. Queremos mostrar que vemos Deus tão bem quanto reivindicam nossos colegas das neurociências. Queremos sua glória e seu sucesso. Acabaremos, por essa rendição, abandonando nossa maior herança, que é o pensamento metapsicológico, em favor de uma psicologia empírica dita “de base psicanalítica” e de uma prática psicoterápica “competitiva”.

Mas competitivos em relação a quem e para quê? Esquecemos que é por nosso método que ocorre o nosso maior êxito: sem querermos ser terapêuticos, atingimos paradoxalmente a nossa maior potência. Nosso método, a partir da definição de nosso objeto– o inconsciente–, propõe uma abstenção de intencionalidades que nos leva a este único e original método da atenção flutuante e da livre associação. Nada seremos se abandonarmos nosso objeto e nosso método.

Não precisamos ter o expediente de historiadores, mas, aproveitando seus questionamentos, os colegas Marcio Giovannetti e Ruggero Levy nos trazem reflexões próprias de nossa área, mostrando a fertilidade que pode haver nesse diálogo. Entre outras questões, posicionarmo-nos diante da escolha entre a ciência e a metapsicologia é vital. Refletir acerca de nossa prática, nossa teoria, nosso método e nossa especificidade se apresenta como essencial, nestes tempos em que as respostas buscam procedimentos e sucessos imediatos.

Orgulhamo-nos dos nossos autores. As reflexões que percorrem este número mostram a maturidade de uma comunidade que se questiona, que tem uma riqueza de hipóteses e confia na discussão entre seus pares. A tarefa de uma revista é encorajar a autoria e a educação da recepção do leitor. Se somos um grupo que atingiu a maturidade, muito há que fazer ainda para que a rbp atinja um grau de excelência entre seus pares. Dependemos de agências de avaliação, agentes patrocinadores, leitores de outras disciplinas, acesso a bibliotecas etc. Necessitamos de verbas e reconhecimento amplo. Como fazê-lo sem desnaturar nossa natureza, sem abrir mão de nossa identidade?

Recusamos o caminho fácil de simplesmente nos adaptarmos. Contudo, se o que não queremos fazer é relativamente simples, respostas afirmativas ainda estão por maturar. Necessitamos um amplo debate em nossa comunidade, para que nós, como grupo, possamos fazer novas escolhas. Nesses termos, a Federação Brasileira de Psicanálise e as sociedades federadas terão de estar mais próximas da Revista e participar das decisões. Contamos também com os leitores e esperamos que nos enviem cartas-artigos, sugestões e críticas. Assim, convidamos a todos para que nos acompanhem neste novo trecho do nosso trajeto, que terá de ser um salto a mais na busca de excelência da nossa rbp.

 

L. N.

SP, agosto de 2008

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