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Revista Brasileira de Psicanálise

versão impressa ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál v.43 n.2 São Paulo jun. 2009

 

CONGRESSO INTERNACIONAL

 

Transformações em sonho e personagens no campo analítico1

 

Transformaciones en sueño y personajes en el campo psicoanalítico

 

Transformations in dreaming and characters in the psychoanalytic field

 

 

Antonino Ferro2

Associação Internacional de Psicanálise
Sociedade Psicanalítica Italiana

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Partindo da clínica e da técnica, o autor mostra o curso de uma análise focado nos conteúdos para uma análise interessada essencialmente no desenvolvimento dos instrumentos para sonhar, sentir e pensar. A transformação em sonho da comunicação do paciente assim como o desenvolvimento da capacidade de consonância são considerados essenciais para tal desenvolvimento.

Palavras-chave: Personagem; Modelo; Campo psicanalítico; Transformações; Transformações em sonhos.


RESUMEN

A partir de la clínica y de la técnica, el autor muestra el paso de un psicoanálisis centrado en los contenidos a un psicoanálisis interesándose esencialmente por el desarrollo de los instrumentos para soñar, sentir y pensar. La transformación en sueño de la comunicación del paciente así como el desarrollo de la capacidad de consonancia son considerados esenciales para tal desarrollo.

Palabras clave: Personaje; Modelo; Campo psicoanalítico; Transformaciones; Transformaciones en sueño.


ABSTRACT

On the basis of clinical material and technical considerations, the author attempts to demonstrate the transition from a psychoanalysis directed towards contents to a psychoanalysis interested predominantly in the development of the instruments for dreaming, feeling, and thinking. Transformation in dreaming of the patient’s communications and development of the capacity for being in unison are deemed to be of central importance to this development.

Keywords: Personage; Model; Psychoanalytical field; Transformations; Transformations in dream.


 

 

Reflexões preliminares sobre diferenças entre os modelos teóricos em psicanálise

Diversos autores têm ressaltado de forma abrangente os pontos em comum e as diferenças entre os vários modelos (Wallerstein, 1988, 1990, 2005; Kernberg, 1993, 2001; Gabbard, 1995; Gabbard e Western 2003; Green 2005 etc.). Vários estudos sobre modelos implícitos na obra de cada analista foram recentemente publicados depois de um longo trabalho realizado com analistas de diferentes escolas (Canestri, 2006; Tuckett, 2008).

Graças a todos esses trabalhos que considero compartilhados, sinto-me livre para explicitar, a meu modo, as diversidades que existem, às vezes profundas, e as consequentes implicações técnicas.

Acredito que para que se possa falar de “psicanálise” é preciso que haja três invariantes imprescindíveis: convicção da existência de um inconsciente (ainda que com diferentes leituras), respeito pelas invariantes ligadas ao setting e, por último, assimetria, ou seja, o analista deve assumir firmemente a responsabilidade pelo que acontece dentro da sala de análise.

São muitas, porém, as variantes possíveis entre os vários modelos. Examinarei rapidamente algumas que me parecem significativas.

a) Um ponto de fratura (ou de distinção entre diferentes modelos) é se deve ser considerada central a operação de reconstrução histórica, tornar consciente aquilo que estava inconsciente em relação até às várias fantasmatizações do mundo interno ou então a expansão dos instrumentos para conter (continente) e transformar as protoemoções (função alfa).
Um meio termo poderia ser o de considerar que as operações de reconstrução histórica (ou a construção mítica da história) ou de revelação das fantasias inconscientes (assim como outros dialetos e cenários: o aqui e o agora, o mundo interno, as transformações no campo), não são importantes apenas em si mesmas, mas também por representarem a oportunidade e o veículo de desenvolvimento do continente e da função alfa, ou melhor, daquilo que Grotstein (2007) chamou de ‘dreaming ensemble’, ainda que ocorra sem que o analisa e o paciente estejam cientes disso.

b) Outro ponto de distinção entre modelos refere-se à amplitude que se dá ao espectro onírico na sessão. Vai-se desde considerar o sonho um evento significativo da sessão, que deve ser interpretado com um conjunto de procedimentos fortes (Freud, 1899), até modelos que consideram a atividade de rêverie na sessão (ou seja, o aflorar de imagens na mente do analista ligadas ao que acontece na relação analítica), como fato central e essencial do desenvolvimento da análise. Outros consideram toda a sessão um sonho e a atividade mais importante realizada pelo analista torna-se a operação de transformação em sonho que opera constantemente por meio de um filtro específico que ele antepõe a qualquer comunicação do paciente. “Tive um sonho em que…”. Desse modo, qualquer narração ou personagem torna-se como uma série de hologramas que captam a realidade emocional do campo em busca de figuração (Ferro, 2002b, 2008; Ogden, 2003, 2005; Botella, C. and S., 2001).

c) Outro ponto é o grau de realidade atribuído às comunicações do paciente, desde o modo de escuta totalmente histórico-realístico até a escuta centrada na realidade do mundo interno do paciente, tão real quanto o externo (Klein) e até uma escuta que deliberadamente, e “por absurdo”, zera o grau de realidade externa em qualquer comunicação do paciente, de modo que a sessão constitua um espaço privilegiado e uma ocasião única para as transformações do funcionamento mental do paciente e do analista (Ferro, 2002a, 2005a). Winnicott (1971) já afirmava que a psicanálise é uma forma específica de jogo no qual há projeções de potenciais oníricos e no qual os fenômenos externos são colocados a serviço do sonho.
Não posso me eximir de ressaltar que as minhas colocações sobre o estatuto onírico das sessões de análise refere-se esclusivamente ao trabalho analítico enquanto outros vértices impõem visões diferentes.

d) Outro ponto central é a importância que deve ser reservada ao dipolo verdade/ mentira, com todos os estados intermediários. Este aspecto é, por sua vez, uma variável também nos modelos que são, por outros aspectos, homogêneos entre si. Vai-se desde a verdade histórica até a verdade narrativa (é suficiente lembrar os trabalhos clássicos de Spence, 1982; Schafer, 1992; Hanly 1990), até a ‘verdade’ do contato emocional consigo próprio e, portanto, da verdade do funcionamento do mundo interno, até os modos diversos de pensar o ‘O’ de Bion (1970), e os de pensar os fatos da sessão como fictícios. Isso leva a conceitos como o da verdade tolerável ao pensamento e até mesmo de uníssono com as comunicações manifestas do paciente e da capacidade preliminar do analista de tolerar graus de mentira e distorção (Ferro et al., 2007).

e) É necessário também mencionar as diferentes modalidades interpretativas: interpretações reconstrutivas, interpretações da transferência, na transferência, insaturadas, do campo, no campo, coconstruídas (‘copensamento’ de Widlöcher, 1996). Não vou me alongar sobre essa questão porque já falei muito disso em outros textos (Ferro, 1996, 1999). Talvez fosse necessário mencionar ainda mais as diferentes maneiras de considerar o que um paciente diz “depois” de receber uma interpretação (Joseph, 1984; Nissim, 1992, Faimberg, 1996; Ferro, 2002a, 2006b): desde o não considerar o problema, a considerar a resposta como derivante das distorções operadas pelo modo de escuta do paciente até considerar o que o paciente diz como um sonho tido sobre a interpretação recebida e sobre os efeitos da mesma. Desse ponto de vista, um dos motores contínuos do campo são os contínuos après-coups derivados da escuta da resposta à interpretação (essa resposta não precisa ser necessariamente interpretada) que permitirá a futura modulação interpretativa.
Este trabalho de micros après-coups (Guignard, 2004) é também a forma na qual tudo o que é trabalhado no campo irá, em certo momento, por “somatória”, rehabitar o mundo interno e até mesmo a história, transformando-a a posteriori (ousaria dizer “inventando-a”, mencionando Bion (1979) de “Memória do futuro”).

f) Outro mapa significativo é o que permitiria fazer distinções conforme o privilégio que recebem os conceitos de Transferência (tanto como repetição do que não pode ser lembrado, quanto como projeção de fantasmas externos), de Relação (que leve em conta, em outra medida, a subjetividade do analista (Renik, 1993; Smith 1999) e o seu funcionamento mental peculiar ‘naquele dia’ (Bion, 1992; Ferro e Basile 2004).
Não se pode, é claro, prescindir do nível de escuta e de interpretação sobre o qual nos alicerçamos de modo predominante: edípico, pré-edípico, de angústias psicóticas ou de níveis ainda mais subterrâneos e, no entanto, onipresentes, como os autista-contíguos, admiravelmente descritos por Ogden (1989), que são um dos funcionamentos possíveis da mente (Bleger, 1986). Cada uma dessa escolhas implica, naturalmente, estratégias diferentes, desde as que dão mais relevo ao conteúdo (recalcamentos, conflitos) até aquelas em que o mais importante é aumentar a voltagem emocional tolerável pela mente, por meio do desenvolvimento de instrumentos para pensar (Ferro, 2008).

Outros pontos a serem explorados, aos quais devo renunciar para ser breve, são: os critérios de analisabilidade, os critérios de fim de análise, os modos de conceber a sexualidade, os objetivos da análise e os fatores de doença e de cura. É claro que, para mim, os vários fatores de doença ou de cura coincidem com a insuficiência ou a eficiência do já citado “dreaming ensemble”, em sintonia completa com Grotstein (2000, 2002) e Ogden (2002, 2005).

 

A clínica como Pedra de Roseta

André Green já falava em pensamento clínico (Green, 2003). Para mim, uma chave possível de acesso privilegiado aos vários modelos é a maneira diferente de compreender os “personagens” na sessão. Se uma paciente diz que está atormentada pelos contínuos exames aos quais deve se submeter no ginecologista e o quanto os sente como intrusões e humilhações; depois narra um refluxo gastroesofagiano e em seguida relata que tomou doses homeopáticas de um medicamento aconselhado por uma amiga, passou mal e vomitou tudo, podemos nos perguntar como compreender esses diferentes personagens.

Segundo uma primeira ótica, seriam personagens que pertencem à experiência de vida real externa da paciente (e também histórica, com nós traumáticos que necessitam ser desenterrados). Em uma segunda ótica, deveriam ser remetidos aos movimentos transferenciais atuais como uma deriva de transferências colaterais e, finalmente, poderiam ser compreendidos como personagens que são hologramas, marcadores ou ícones afetivos dos quais se fez o casting para exprimir as linhas e ondas emocionais presentes no interior do campo emocional da sessão.

Nessa última ótica, o ginecologista remeteria à maneira de se colocar do analista, sentida como intrusiva; a intimidade violada corresponderia a um efeito do trabalho analítico, o refluxo gastroesofagiano a uma área de incontinência do campo, a amiga que dá doses homeopáticas estaria relacionada a algum tipo de atividade interpretativa que, mesmo quando administrada em doses mínimas, provoca mal-estar e assim por diante.

Esse aceno aos vários modos de compreender os personagens (não necessariamente antropomorfos) (Ferro, 1992, 1996; Ferro e Foresti, 2008) foi bem destacado por La Farge (2007) e por Cairo (2007).

Entramos, assim, diretamente no conceito de campo psicanalítico: nele, a escuta não está muito distante de como podemos imaginá-la em uma teoria relacional muito forte, mas é muito diferente o modo de interpretar do analista que não tem mais urgência em interpretar tudo continuamente em termos de transferência (ou “na transferência”, na forma relacional mais atenuada) (Gibeault, 1991), mas mantendo firmemente na mente a ideia de que não há comunicação, personagem, narração ou turbulência que não seja pertinente ao campo, pode fazer intervenções muito mais insaturadas e está sempre pronto a captar a resposta do paciente à interpretação como sinal da movimentação do campo.

Se após uma interpretação o paciente responde: hoje tive que fugir de um cachorro que queria me morder, isso é diferente de um paciente que diz: hoje meu primo acertou o medicamento que me deu, e diferente ainda de: fui jantar na casa de minha avó que me ofereceu somente um caldinho e eu fiquei com fome e raiva. Ou seja, o paciente (ou um ponto qualquer do campo) assinala continuamente de que modo a intervenção (ou silêncio) do analista foi percebida e isso se torna o ponto de partida para sucessivos ajustes, de modo que o processo transformador se mantenha ativo e não seja bloqueado por um excesso de perseguição ou por uma insuficiência da atividade interpretativa.

Até mesmo a infância e a sexualidade podem se tornar não apenas coisas em si e, por si só, significativas, mas sinais-personagens do funcionamento do campo.

A) Narrações no campo: O avô incontinente

Digamos que uma paciente, nas primeiríssimas sessões de análise diga, após algumas intervenções interpretativas do analista: “Quando era criança fui, confiante, à casa de minha colega Matilda e jamais teria imaginado que seu avô – quando ficamos sozinhos – fosse me tocar por baixo da saia de modo tão perturbador. Lembro que me afastei com a intenção de nunca mais voltar”.

No primeiro modelo de compreensão dos personagens, a análise ganharia vida justamente a partir da narração feita, por meio de uma progressiva dissolução do recalcamento de experiência infantis, reais, ocorridas que, à medida que forem sendo “lembradas” ou repetidas na transferência, serão elaboradas e desintoxicadas. O que antes era inconsciente e causa de inibição e de vivências de culpa, ao se tornar consciente, se dissolverá como neve ao sol. O analista será este Poirot-Homero que cantará enquanto explora a Odisseia da paciente até chegar à Ítaca do conhecimento de si.

No segundo modelo de compreensão dos personagens, a mesma narração seria compreendida e interpretada, principalmente, como uma vivência estritamente relacionada à atualidade da situação relacional: a paciente está dizendo que se sentiu inesperadamente tocada em profundidade pelas interpretações do analista, de modo por demais íntimo e desrespeitoso em relação às suas emoções e que desejou não continuar a experiência analítica que a expõe a vivências muito perturbadoras. No terceiro modo de compreensão (que definiria como campo insaturado em perene expansão), a escuta se volta para a comunicação manifesta relativa à infância e para o sentir fundamental relativo a esse nível de narração; volta-se também para o segundo nível relacional atual, sem necessidade de interpretá-lo, mas considerando-o uma sinalização proveniente do campo que indica que a atividade interpretativa está excessivamente próxima e profunda e precisa ser modulada. Na situação específica como a permitida pelo setting, abre-se uma porta também para a vivência da paciente que sente o próprio mundo afetivo invadido pelos próprios estados protoemocionais tumultuosos e abusadores, porque não dispõe da aparelhagem necessária para contê-los e metabolizá-los (insuficiente continente, insuficiente função alfa).

O analista, levando em conta a necessidade atual de respeitar a narração, a resposta à qualidade das próprias interpretações, o tipo de instrumento para pensar de que dispõe a paciente, vai dar espaço a outras operações narrativas que pertencerão à infância, ao aqui e agora, ao interior da paciente, em oscilação contínua dos vértices da escuta. O “romance” novo e imprevisível irá ganhar vida a partir do acasalamento, na sessão, dos dois conarradores, que terão continuamente que se haver com quanto do recalcado, do cindido e do impensável entrará na atualidade do campo e com quanto a partir de tudo isso (nesse “transformado” derivado da interação entre as mentes), voltará a habitar o mundo interno e a história do paciente, sem nunca pôr a palavra ‘fim’ a essa tessitura narrativa e transformadora. A história também será um lugar “mítico” do campo e, de qualquer modo, mais do que conhecer qualquer história, será importante aprender a ler e produzir novas línguas e novos alfabetos: ou seja, vamos nos deslocar de uma psicanálise de conteúdos e memórias para uma psicanálise que privilegia o desenvolvimento dos aparatos para sonhar, sentir, pensar (Ferro, 2006a, 2008).

B) Transformações em sonho: desconstruir e desconcretizar a comunicação

Gostaria de retomar clinicamente o conceito de “transformações em sonho” no qual o analista antepõe a qualquer comunicação do paciente uma espécie de “filtro mágico” constituído pelas palavras “tive um sonho em que…” que representa o ponto máximo do bom funcionamento do campo: o campo sonha. As funções alfa transformam sensorialidade em pensamento.

Pensemos na comunicação da paciente que falava da vergonha em relação ao ginecologista, da intrusividade ou do medicamento dado pela amiga. Se ouvirmos essas comunicações como “tive um sonho… em que havia um ginecologista que… ou uma amiga que…” vemos imediatamente que se abrem vias de compreensão e de gestão da comunicação muito mais amplas e, em alguns casos, até imprevisíveis.

Creio, além disso, que a operação de “desconstrução narrativa” é uma das operações principais de que a mente do analista pode lançar mão ao ativar os processos transformadores.

Bollas (1999) afirma que a meta da psicanálise é o método das associações livres, uma nova forma com a qual o Self nos fala, e diz que as associações livres levam a uma desconstrução da relação, colocando-se desse modo a serviço de uma meta subversiva: a evolução mental (p. 85). Essa desconstrução abre vértices anteriormente fechados.

Eis dois exemplos clínicos:

a) A intervenção no seio

Uma paciente diz: “decidi fazer uma operação porque estou insatisfeita com meus seios”. São, naturalmente, infinitas as intervenções possíveis e infinitos os pensamentos que diferentes analistas podem ter, conforme o contexto dessa comunicação, conforme as associações da paciente e conforme os modelos explícitos ou implícitos do analista (e, acrescentaria, conforme seu estado mental naquele dia).

A gama de possibilidades é ampla: pode-se considerar a comunicação da paciente o prelúdio de uma atuação ou considerá-la a afirmação de algo que não a agrada ou ainda a necessidade de valorizar-se esteticamente diante de uma reprovação do analista e por aí afora.

A escuta do analista será muito diferente se ele antepuser às palavras da paciente – como já disse – o prefixo automático “Tive um sonho”. Nesse caso, a comunicação seria: “Tive um sonho em que decidia fazer uma operação porque estava insatisfeita com meus seios”.

Nesse ponto, a escuta se amplia e se desconstrói: o que é a operação? o que é o seio? a paciente está insatisfeita com o quê?

A gama de significados se amplia e poderia, por exemplo, ser tomada como sinalização da insatisfação da paciente quanto ao próprio analista (o seio?) e de que queira fazer “operações na sessão” que modifiquem o eixo mental. Infinitas variáveis são possíveis. Nesse ponto, perguntas tangenciais do tipo “o que, nos seus seios, não a satisfaz?” ou então “o que gostaria de mudar em seus seios?” poderiam permitir que se adquirissem elementos de roteiro/cenografia antes impensáveis.

Des-construir (Baranés e Sacco, 2002) significa, portanto, des-concretizar a comunicação; desse modo, uma profusão de outros vértices possíveis de leitura tornam-se possíveis.

Qual estatuto para o fora de campo: um lugar para Kociss

Do meu ponto de vista, a capacidade do analista de sonhar a comunicação que lhe é feita, é fundamental até em situações de supervisão ou de entrevista (Boyer, 1988). Essa operação fundamenta-se nas “capacidades negativas” do analista e na sua capacidade de rêverie (Bion, 1962, 1970, 1992).

Um colega muito experiente me pede uma consulta para uma situação dramática em que se encontra. As primeiras informações me são dadas por telefone, pois vive em uma cidade distante. Há algumas semanas tanto ele quanto seus familiares são acompanhados por guarda-costas por causa de ameaças recebidas de um paciente.

Esse paciente – ele me contará na sessão – ameaçou-o seriamente porque a análise o fez perder toda a beleza da vida, fez com que se casasse, se tornasse pai, encontrasse um trabalho no banco; isso o impediu de viver a “vida verdadeira”: perdeu todas as mulheres que poderia ter tido, precisou renunciar aos carros esporte que tinha quando jovem, às viagens que teria feito, em suma, o preço fora alto demais e ele queria que o analista o pagasse, suicidando-se e fazendo, antes, uma carnificina na família do analista. Este último, incidentalmente, me diz que o paciente continua mandando vir da Suíça cremes especiais que clareiam a pele, já que a mesma começou a ficar avermelhada em alguns pontos.

O que surge diante dos meus olhos é justamente a pele vermelha, o elemento aparentemente circunstancial, ou seja, o “pele-vermelha”. Um pele-vermelha que está aterrorizando todos os brancos. Mas por quê?, me pergunto. Um pele-vermelha não pode causar tanto medo.

Pergunto a idade do paciente e também do analista.

O paciente vai completar 40 anos e, nos mesmos dias, o analista, 50.

Eis a chave. O “pele-vermelha” do paciente com as suas flechas incendiárias pôs fogo no “pele-vermelha” do analista. Pele-vermelha com o qual o analista havia perdido contato e que voltava a se acender no momento da crise dos cinquenta anos (e dos quarenta do paciente).

Uma vida no banco, uma vida na sala de análise, é para o pele-vermelha (para os peles-vermelhas!) realmente inaceitável, clama e ameaça vingança, e há um luto doloroso a ser realizado em relação a tantas potencialidades existenciais às quais renunciar. O luto pela aceitação da realidade é precedido por movimentos telúricos de raiva.

Ter ajudado, com tato, o colega a contatar novamente seu próprio “pele-vermelha”, lhe permitirá em breve conter o “pele-vermelha” do paciente sem ter medo do “pele-vermelha” ao qual cada um deles tenta dar um pouco de fôlego e espaço na própria vida mental.

Gostaria de dizer aos três - visto que eu, de minha parte, estava para completar 60 anos e que quando criança um dos meus heróis preferidos era Kociss3 - que o pele-vermelha aproveita assim a situação para que lhe seja reconhecido um espaço e um direito à existência que há certo tempo não lhe eram reconhecidos.

 

Raízes teóricas do modelo

Depois de expor de forma narrativa o modelo no qual me reconheço, gostaria de destacar rapidamente suas raízes teóricas:

a) a contribuição de Bion (1962, 1965, 1992) que utilizo e desenvolvi refere-se ao conceito de “pensamento onírico do estado de vigília” (que considero sua formulação mais genial); é fruto do contínuo trabalho de alfabetização que a função alfa faz sobre turbilhões de protossensorialidade e protoemoções (elementos β), produzindo elementos α. Estes pictogramas (Rocha Barros, 2000) e sua sequência permanecem, é verdade, não conhecíveis diretamente, mas é possível nos aproximarmos deles por meio de seus derivados narrativos.

Consideramos que, na sessão, operam identificações projetivas (espera-se que sejam bem mais numerosas as do paciente em direção ao analista), ativação da(s) função(funções) alfa, turbilhões de protossensorialidade.

As funções alfa do campo começam a gerar um “pensamento onírico da vigília” no campo que permanece desconhecido.

A partir dele ganhariam vida os derivados narrativos.

Se pensarmos que um funcionamento onírico do campo entra em ação imediatamente, não há comunicação que não possa ser vista como ativadora do próprio campo e pertinente a ele.

Mesmo os fatos aparentemente de realidade também teriam o valor de “ganchos narrativos”, que permitem chegar perto do pensamento onírico e permitem também a sua significação. Até os elementos mais subjetivos, como o sonho do paciente, pertencem ao campo por significarem e sinalizarem os movimentos do sonho da vigília relativos ao momento em que o mesmo é narrado.

O campo permite descrever, recolher, agrupar essas emoções, esclarecendo-as, focalizando- as, usando os personagens como “pegadores de panela” que permitem que nos aproximemos de conteúdos quentes demais, mesmo que o analista tenha certeza de que a comunicação do paciente é um difratograma da situação atual do campo, cujos ingredientes à espera de focalização, transformação, digestão têm relação com os estados emocionais e protoemocionais do próprio campo: o campo é, naturalmente, o lugar que recolhe as identificações projetivas e as histórias de paciente e analista, que são coprotagonistas. Em outros termos, em uma ótica de campo, ele é codeterminado pelo funcionamento mental tanto do paciente quanto do analista.

O paciente se torna, de algum modo, o lugar do campo que continuamente narra as evoluções e transformações do próprio campo.

Essas emoções podem ser “cozidas” por meio da transformação narrativa das mesmas, com intervenções insaturadas, e “experimentando” sempre a resposta do paciente, para saber qual ingrediente deve enriquecer o prato ou torná-lo mais leve.

A pictografia dos estados protoemocionais implica dar nome a algo que não era nomeado.

Se uma paciente começasse a terapia por causa de ataques de pânico, fobia por estrangeiros e tivesse a tendência a se esconder por meio da própria maneira de se vestir, quase se camuflando, poderíamos imaginar que ela é periodicamente vítima de erupções de estados protoemocionais vulcânicos que determinam as crises de pânico. É a projeção das fagulhas protoemocionais que torna os outros perigosos (enquanto portadores das fagulhas); poderíamos também supor que deseja que tais aspectos de si mesma não sejam reconhecidos.

Pode-se imaginar que o filme (a sequência) de fotogramas oníricos na base dessa primeira narração seja constituído pelos seguintes pictogramas emocionais (Ferro, 2002, 2006b).

 

Vulcão em erupção “medo dos extracomunitários”4 rosto com máscara

Naturalmente, a narração que deriva da sequência destes pictogramas poderia ser totalmente diferente e usar gêneros narrativos ou literários diferentes, mas com o mesmo valor comunicativo (apenas com graus diferentes de distanciamento-distorção da sequência dos pictogramas do pensamento onírico da vigília). Poderíamos ter, por exemplo:

Relato da infância

Quando era pequena, tinha medo que os balões de gás estourassem e tinha medo também das crianças que não conhecia; só ficava feliz no Carnaval porque saía fantasiada.

Filme visto na televisão

Vi um filme em que uma bomba explodia em um shopping center e todos fugiam com medo de que houvesse terroristas, vestidos, talvez, como policiais.

Relato de uma cena familiar

Explodiu uma briga com minha sogra quando ela quis vir passar as férias com a irmã e o segundo marido em nossa casa, mas depois fui obrigada a fingir que estava tudo bem.

Os exemplos dos derivados narrativos poderiam ser infinitos.

Estamos, é claro, falando de um paciente com uma função alfa (geradora de pictogramas) suficientemente funcionante.

Se o paciente não tivesse essa capacidade de transformar protoemoções e protossensorialidade em pictogramas (do sonho do estado de vigília) o analista precisaria cooperar e coconstruir, com as próprias rêveries, as sequências ά do paciente, permitindo o desenvolvimento da função alfa e a capacidade de continência do paciente, até possibilitar uma introjeção estável desses aspectos.

Edna O’ Shaughnessy (2005) destacou muito bem como, para mim, qualquer comunicação entre paciente e analista pode ser vista como um derivado narrativo deste pensamento onírico com o qual o analista precisa ser capaz de entrar em contato.

Isto nos leva a retomar novamente, ainda que de forma tangencial, o conceito de “paciente melhor colega” (Bion, 1993), como lugar privilegiado de sinalizações do campo. Ou seja, o paciente se torna também uma espécie de navegador por satélite (GPS) que nos informa constantemente a respeito do funcionamento do campo.

b) A segunda raiz está no conceito de campo, considerado na genial e fundamental formulação feita por W. e M. Baranger (1961-62) e depois retomada por M. Baranger (1993) e em seus desenvolvimentos e complexizações (Bezoari e Ferro 1992; Kancyper, 2002; Lewkowicz e Flechner, 2005; Ferro, 1999; Eizirik, 2005, Ferro e Basile, 2009) que levaram a uma concepção multidimensional e insaturada do campo, considerado não somente em um eixo horizontal, mas também vertical (histórico), habitado pelos personagens-hologramas afetivos do funcionamento da dupla analítica. Entendido desse modo, o campo é resultado da soma dos mundos possíveis de analista e paciente, com o limite da deriva subjetiva, que funda suas ancoragens na eticidade do analista, na análise pessoal e na preparação do analista e na responsabilidade do analista quanto à questão de que os fatos narrados sejam os que urgem à espera de alfabetização por parte da dupla analítica e não outros (como a confirmação das teorias do analista ou a evitação da dor mental suportável). A esse propósito, alguns conceitos derivados da narratologia, como os de “limites da interpretação”, “limite relativo à abertura de mundos possíveis”, podem ajudar muito a refletir (Eco, 1979; Pavell 1976). O analista coautor do texto é garante de uma fortíssima assimetria na responsabilidade pelo que acontece na sala de análise (Gabbard e Lester, 1995).

No fundo, o conceito de campo como fenômeno que mirava a formação dos “bastiões” como fruto de manchas cegas, da resistência cruzada de analista e paciente que podiam ser dissolvidas pelo “segundo olhar” dos mesmos, por meio de uma interpretação (Baranger e Baranger, 1961-62), tornou-se para mim “um campo holográfico onírico” em constante expansão (como esquecer a afirmação de Bion de que a análise é a sonda que expande continuamente o campo que explora?) no qual mundos e histórias possíveis aos poucos ganham vida, transformam-se, precipitam em neoformações de lembranças, de histórias, de História (Ferro, 1992, 1999, 2008); História que é substancialmente baluarte de terceidade e de identidade no fluir contínuo das operações de microtransformações. A História torna-se, assim, o lugar calcificado do campo de identidades pessoais e transgeracionais (Faimberg, 2005), no qual o trabalho de desconstrução, construção e reconstrução, de “historioclase e historioblase” continuam incessantemente (Chianese, 1997).

Vale a pena lembrar que na origem das áreas calcificadas das histórias e da História, existem as operações de alfabetização dos estados protoemocionais em relação aos quais frequentemente caminha-se a partir das zonas de alexia emocional para chegar à zona de dislexia e, finalmente, à leitura, à possibilidade de continência e à transformação de emoções que têm nome e estatuto.

O campo deve adoecer das “doenças” do paciente e apenas a partir daí será possível uma transformação real: encontramos, assim, Freud (1914) que dizia: one cannot overcome an enemy who is absent or not within range (não se pode derrotar um inimigo que está ausente ou fora do alcance).

A figura a seguir, o desenho de um sonho de Federico Fellini (2007), feito por ele mesmo, dá a ideia de como pode ser um campo emocional com os vários personagens/ funcionamentos presentes e interagentes entre eles: verdadeiros hologramas afetivos da dupla analítica ao trabalho.

 

 

c) Os Personagens: a última raiz, que se conjuga às outras duas, enquanto fonte de pensamentos, deriva da narratologia, parte da semiologia que lida com as organizações complexas das narrações e que tem pontos de vista próprios e fortes sobre “personagens”, sobre a interpretação de um texto, sobre a superinterpretação, sobre os limites da interpretação. Não me detenho, porque já falei disso indiretamente.

Conjugando o conceito de Bion de “pensamento onírico do estado de vigília” ao conceito de campo e de personagens da sessão, temos um espaço-tempo em que os turbilhões de elementos beta são transformados, através da função alfa do campo, em pensamentos oníricos do campo. Sobre estes, opera-se com as transformações narrativas (nas quais não há decodificação; a transformação ocorre favorecendo a narração) que se acrescentam às clássicas, descritas por Bion (1965) (transformações em movimento rígido, transformações projetivas, transformações em alucinose) e à transformação em sonho que postulei.

É claro que uma teoria do campo pede ao analista uma contínua vigilância e manutenção do seu principal instrumento de trabalho: a sua vida mental.

A atenção dirigida à observação da comunicação do paciente e à contratransferência desloca-se para as figuras e personagens que ganham vida no campo, constituem um sinalizador contínuo da vida do campo. Isso permite desconstruir continuamente, de maneira subliminar, o “novelo” enrolado da transferência em subunidades narrativas que podem ser, cada uma delas, transformadas e continuamente remontadas.

Finalmente: na minha sala de análise

Filippo é um jovem psicólogo de belo aspecto, com cabelos cacheados e muito pacato e agradável no contato. Não tem projetos claros para o futuro, está indeciso entre um trabalho que o colocaria em contato com outros e um trabalho de estatística que poderia lhe abrir portas na universidade.

Em uma das primeiras sessões de análise me conta a respeito do novo trabalho que encontrou na penitenciária (!). Vê, principalmente, pacientes árabes, dos quais não compreende a língua, mas procura entender-se com eles. A minha renúncia a interpretar tanto os aspectos “desconhecidos de si”, quanto a sua dificuldade com a nova e difícil língua da análise, tem como resultado fazer brotar a história desses árabes… a história de Ali e de seu ciúme, a história de Mohammed e seu desejo de vingança… configuram-se, assim, emoções que começam a circular, ainda que protegidas por “outros nomes”: parece-me que esse é um modo de permitir que as emoções bidimensionalizadas ou liofilizadas entrem de modo tolerável na sala de análise.

Minha prudência se segue a uma sessão em que Filippo havia dito que estava consertando sua “Vespa” (um velho tipo de motocicleta). Digo-lhe que “vespa” me lembra também um inseto que pica. Fica em silêncio pelo resto da sessão e na sessão seguinte me diz que um raio havia queimado literalmente seu computador, impedindo-o de trabalhar e destruindo todo o trabalho já feito.

Um relato, uma lembrança de infância, torna-se central para muitas sessões: com o nascimento da irmã, ele havia sido entregue aos cuidados dos avós maternos na Suíça, com os quais, diz, dava-se muito bem. Guarda lembrança somente do leite que tomava, à janela, com muitas colheres de açúcar e outras mais que ele acrescentava escondido.

Voltando para casa após um longo período, lembra que levantava às seis e meia da manhã, criança de poucos anos, antes de todos, para levar café e bolachas para os pais na cama.

Por ocasião da minha ausência na sessão, que se repetiu por duas quintas-feiras seguidas, fala-me angustiado de um “louco que fugiu da comunidade onde reside habitualmente” e conta também que na sua bolsa está o certificado que deve ser dado à polícia para detê-lo e submetê-lo a um tratamento sanitário obrigatório.

Não é difícil estabelecer uma ligação entre seu desejo de me manter obrigatoriamente no meu lugar e ter sido afastado de casa: justo ele que tinha sido uma criança “sempre boazinha”. Era como se um bom cidadão houvesse sido exilado, talvez numa bela ilha, mas quanta amargura no leite distante de casa, leite que precisava ser preenchido com açúcar.

É com espanto que Filippo, a partir do que acontece por ocasião de qualquer separação na análise, se reapropria de fiapos de sentimentos desconhecidos como a vivência de ter sido exilado, o terror de ser mandado embora de casa, o terror em relação aos pais (e a mim), como figuras que precisam ser apaziguadas. Entra em cena, assim, no nosso léxico, “o barman” (referência a levar o café na cama aos pais, por anos), a sua atitude de ser complacente e às vezes quase servil (Fantozzi5). Nesse meio tempo sua fazenda vai se enriquecendo de animais, galinhas, coelhos, gansos (que descubro serem agressivos!) e depois ovelhas, cabras (todos animais que parecem corresponder ao florescer de novas emoções na sala de análise, ainda que domésticas e ‘herbívoras’).

Eu, frequentemente, o acompanho no texto manifesto, pois aprendi que se superar o limiar de tolerabilidade à dor, o trabalho logo se estanca (surge um vizinho de casa que o aterroriza com sua metralhadora, não fosse que a metralhadora tem uma tampa vermelha,6 ou seja, é um brinquedo quando abrando minha atividade interpretativa, ou então se ‘achata’ diante do “chefe de hospital tirânico”.

Antes da suspensão dos feriados de Páscoa chegam à fazenda novas espécies de galinhas que são, porém, atacadas e dilaceradas por uma raposa. Dessa vez interpreto que sou como a raposa que devora as sessões, fazendo-o sofrer, e digo também que talvez estejamos cansados de uma fazenda povoada apenas por herbívoros. Antes das férias de verão sucessivas, ele me traz um pacote no qual havia pequenos animais ferozes!

Na volta das férias, para meu espanto, com ar surpreso, reconhece no teto de traves e madeira de meu consultório, um símbolo das Brigadas Vermelhas:7 uma estrela com cinco pontas que ninguém havia notado em 30 anos de uso do divã.

Realizo que a raiva, talvez a fúria envolvida na complacência, entraram tangencialmente na sala de análise. Nesse meio tempo, enriquecem-se os relatos, as lembranças, os problemas com a mãe, às vezes fria, às vezes afetiva, e com o pai, às vezes acolhedor, às vezes despótico.

Esses personagens fotografam sempre os funcionamentos atuais do campo.

Estados emocionais mais intensos começam a entrar. Relata, certa vez, que, tendo recebido uma carta de Simona (a namorada) – e isso após uma minha interpretação mais ativa – não sabia se deveria rasgá-la ou abri-la com um canivete (não interpretei, mas dei boas-vindas dentro de mim a esse novo Jack, o estripador!).

Filippo, recentemente, começou a trabalhar em uma comunidade de jovens pacientes psiquiátricos e, privadamente, com dois pacientes. Todos eles, frequentemente turbulentos, tornam-se veículo de narração de emoções muito primitivas e intensas das quais vai se reapropriando.

Dou-me conta que, para mim, trata-se sempre de modular a franqueza interpretativa que bloquearia o processo e o excesso de atenuação que o apagaria. Por sorte, Filippo é muito bom em indicar as velocidades e intensidades desejáveis. O que mais temo é o risco de uma falsa análise, fruto da complacência. Prefiro colher poucos frutos autênticos do que muitos de autenticidade duvidosa.

Filippo está em análise com quatro sessões por semana, de segunda a quinta; as sessões pertencem ao terceiro ano de análise.

Quinta-feira

(Ao final da sessão anterior eu não estava satisfeito com a forma como havia trabalhado, pois havia feito intervenções que, facilmente, poderiam ser sentidas pelo paciente, como críticas; desconfirmavam o paciente no que dizia e propunham precocemente outros pontos de vista. Disse-me que, no dia seguinte, deveria ser mais acolhedor e receptivo, mais capaz de captar o bom, além de ressaltar o negativo).

Paciente – Tive um sonho, ou melhor, duas vezes o mesmo sonho: havia aviões, explosões, uma espécie de bombardeio; depois chegavam espécie de dentes muito compridos que transpassavam as pessoas, sem matá-las; eu consegui me colocar a salvo, escondendome atrás de um muro espesso.

(Vem-me à mente quanto isso seja a específica descrição do seu ponto de vista da sessão do dia anterior e da forma como interpretei, mas não quero saturar logo nessa direção)

A – O que o sonho lhe sugere?

P – Não sei, ago que tem a ver com as emoções… os outros estavam feridos, transpassados por balas, pelos dentes, mas eu me salvava.

A – Talvez, ontem, eu tenha sido como um bombardeiro que tinha você como alvo?

P – Realmente não. O clima da sessão de ontem era bom. Depois fui comer na casa de minha mãe e tive uma terrível dor de barriga. Ela [em italiano o pronome pode ser dirigido tanto à mãe quanto ao analista] não cuida da higiene daquilo que dá de comer. À noite fui a Milão jantar em um restaurante africano e me deram uma comida intragável. A amiga que estava comigo disse: “mas onde me trouxe para jantar? Tenho vontade de vomitar”.

A – Assim, à indigerível comida de sua mãe juntou-se à do cozinheiro africano? Dupla ração de comida indigesta.

P – Minha mãe tinha preparado rolinhos recheados com coisas velhas; o cozinheiro, uma panela cheia de muitas coisas misturadas, uma ‘gororoba’ [o termo italiano é o termo que se usa para a alimentação das galinhas].

A – (Evito interpretar tudo isso como efeito da minha interpretação excessiva do dia anterior à qual se juntara a interpretação precoce de hoje sobre o bombardeiro, pois estou tentando descobrir como propor uma interpretação que não seja imediatamente rejeitada)

Segue-se um silêncio de alguns minutos.

P. Minha mãe tem um hábito: faz como a personagem daquele seriado (uma espécie de bruxa): tira as flores das rosas, joga-as fora e coloca no vaso apenas os caules com espinhos. Ontem assisti a um espetáculo na TV no qual havia um rapaz que entrava num barco acompanhado pela mãe; depois era abandonado e ia trabalhar como limpador de chaminés; estava sem mãe, mas continuava trabalhando. Depois vi o último filme de Muccino no qual havia um pai sem esposa com uma criança; vivam como vagabundos, sozinhos, mas depois conseguiam se arranjar.

A – Estava pensando que talvez tenha sido “mordaz”, ontem. Eu o mordi com o que disse e só colhi e ressaltei os espinhos do seu discurso, jogando fora a flor, as coisas que podiam ser apreciadas.

P – Por que diz isso?

A – Quando critiquei seu modo de se adequar a Carlo (tinha considerado um aspecto paranoide do paciente e o havia criticado antes de compreender a fonte da perseguição) e, especialmente, quando você falava dos tapetes e eu ressaltei a “oportunidade de não se deixar pisotear” (tencionava interpretar a sua complacência, mas o fiz de modo inadequado e fora do timing), em lugar de captar na sua fala o seu desejo de que alguém o ensinasse a fazer tapetes, a tecer o fio, a organizar os fios do pensamento.

P – De fato fiquei espantado com o que me disse.

A – Talvez você tenha atravessado uma série de estados emocionais em razão da minha mordacidade e depois do meu silêncio, indo da perseguição ao abandono – sem mãe. Teve que limpar sozinho toda a fuligem. Mas gostaria de ressaltar que foi capaz de fazer isso, tanto nos bombardeios quanto na solidão. Conseguiu, apesar das dificuldades.

P – E no filme, aquele rapaz, com a ajuda do pai, realizava seus projetos e se tornava capaz de sonhar.

A – Tomara que o cozinheiro eritreu ou siciliano (Filippo sabe que nasci na Sicília) não faça mais pratos tão indigestos.

P – (ri) (após um breve silêncio): ontem houve uma discussão entre meu pai e o pai de Simona a respeito de como é melhor cultivar a horta. O pai de Simona usa uma motoenxada elétrica para fazer tudo rápido. Segundo meu pai, é melhor usar a enxada manual, não só porque permite ir mais em profundidade, mas porque, embora a motoenxada elétrica quebre melhor a superfície, acaba por criar um estado impermeável que impede a osmose com os níveis mais profundos. Cada um decidiu ficar com uma parte da horta, como acontece no departamento da Universidade: de um lado a psiquiatria, de outro a estatística. Bem separadas uma da outra.

A – Há quase necessidade de uma barreira que mantenha as zonas separadas.

P – Se não, acaba como os galos que se bicam. Vi brigas de galo no Oriente; são apaixonantes, mas corre sangue e eles continuam a se bicar apesar das feridas. Prefiro brincar no computador. Há um jogo de briga de galo, mas o sangue, pelo menos, não é de verdade.

A – (penso que está sinalizando um risco, ou seja, o que interpreto demais e de forma automática, pode dar a ideia, na superfície, de um campo bem arado, mas pode impermeabilizar um nível mais profundo do próprio campo, impedindo que aflorem níveis ainda mais profundos. Desisto dessa interpretação que sinto mais decodificadora do que fruto de rêverie): mas talvez seja possível chegar a um acordo entre estatística e psiquiatria, como entre seu pai e o pai de Simona.

P – Bem, percebo que estou falando de dois modos que estão em conflito dentro de mim: viver as emoções a custo de sangrar como os galos, porque são explosivas, ou então, me entocar como no início do sonho atrás de um muro ou dentro de um videogame.

A – Mas por que considerar os dois modos como “ou um ou outro”? Existem pratos como a caponata siciliana em que o salgado e o doce coexistem, como na sua história coexistem a explosividade da mãe e o excesso de reserva do pai.

Algumas sessões mais tarde, fico espantado com as transformações que acontecem na sessão: Filippo chega vestindo um pulôver muito colorido, feito de pedaços – uma manga vermelha, uma verde, a parte da frente azul, atrás amarelo – que me faz pensar em Frankenstein, em Arlequim, mas não uso essas minhas rêveries no início da sessão.

Um sonho de Filippo introduz o Senhor Brighi, paciente psiquiátrico muito violento que é libertado de um porão, enquanto um novo personagem, um energúmeno, ganha lugar no porão que ficou livre (emerge em mim a imagem de queijos ou presuntos que ficam envelhecendo no porão/sala de espera enquanto não estão “prontos”). Filippo associa o energúmeno no porão a Frankenstein, dizendo espantado: o pulôver feito de pedaços! De Frankenstein, que era cheio de fúria homicida, porque não amado, emerge a dor da Pequena Vendedora de Fósforos abandonada ao frio e à fome.

Arlequim aparece depois como a capacidade de sobreviver. A sessão se encerra com o relato da sra. Cândida que bebia cândida e, com isso, me dá a possibilidade de interpretar o medo e o esforço de se encontrar cheio de emoções intensas das quais gostaria de limparse. As últimas palavras são de Filippo que diz: acho que senti muita raiva na minha vida, mas muita, muita. Percebo que gosto de falar com meu pai. Gosto mesmo e não renunciaria a isso por nada nesse mundo!

 

Conclusão: Grasping <&—> Casting

Grotstein (2007) descreve um “truth instinct or drive” que nos guia em direção a “O”, mas coloca também o problema de que a curiosidade pode ser perigosa porque pode forçar a barreira de contato (sequência de elementos alfa que separa o consciente do inconsciente e da qual ganham vida os infinitos derivados narrativos possíveis): é necessário paciência, como a virtude que é exigida em Hollywood quando “a producer who might characteristically say to an actor auditioning for a part: “Don’t call us, we’ll call you!” (p. 142)

Esse conceito não é diferente do meu de “casting”, entendido como a atividade contínua do pensamento onírico do estado de vigília (de analista e paciente) de encontrar situações que permitam a encarnação emocional, trilho este que corre paralelo àquele em que “every perception, conception or act in external reality must be ’dreamed’ in order to become a part of the unconscious as well as become conscious as a result of initial unconscious precessing” (p. 145).

O que direi agora deve ser compreendido de modo exclusivamente metafórico, o único, específico, sobre o qual posso ter competência.

Um dos reflexos primários de nossa espécie é o do “grasping”, agarrar-se. Esse reflexo desaparece muito rapidamente (outro, com características semelhantes, é o da marcha automática). Mas esse reflexo “arborícola” nos acompanha por muitos anos, por meio da necessidade de permanecermos agarrados a algo: como analistas, agarrados a teorias conhecidas e consolidadas e, como seres humanos, a religiões e ideologias (Bion, 2005). Portanto, é como se uma enorme parte do funcionamento humano pudesse ser comparada a um ônibus elétrico ou a um bonde que precisa, através dos comandos, pegar energia da rede de crenças pré-constituídas.

Seria possível fazer reflexões análogas a propósito da marcha automática, com frequência uma marcha sem por que, sem espessura de pensamento. Essa atitude diz respeito a todos quando estamos na sala de análise, com a tentação constante de ficar no conhecido (do paciente ou das teorias). Uma tentação que, como observa Bolognini (2008), pode se estender até o Édipo do analista, quando este forma uma díade narcísica por demais exclusiva (em vez de uma dupla geradora, capaz de dar espaço para a originalidade do filho/ paciente), com uma esposa/teoria hiperssaturada. Dois ótimos antídotos seriam duas sinalizações de Bion (1987): “o paciente de hoje não tem nada a ver com o de ontem”, ou então, “daria uma interpretação freudiana, kleiniana se estivesse cansado e não tivesse nenhuma ideia original!”

O que chamo de casting é um fenômeno que me parece cada vez mais central em todas as análises. Nas análises mais clássicas temos com frequência, já no início – como nos livros de suspense de antigamente – todo, ou quase todo, o elenco de protagonistas. Nas análises com menos capacidade de simbolização, o desenvolvimento das capacidades de casting torna-se um dos objetivos da análise. Zonas mudas, inexprimíveis, tornam-se matriz de geração de personagens animados, inanimados, atuais, de histórias que começam a ter um sentido e uma narrabilidade antes impossíveis.

Às vezes o casting inclui cenários, lugares, que deverão, em seguida, animar-se.

A confiança no método, as rêveries do analista, sua capacidade de intuição, suas capacidades negativas, a capacidade de escuta dos bolsões escondidos na linguagem são os fertilizantes que permitirão que as zonas desérticas floresçam.

A vida psíquica tem profundidades abissais que se abrem cada vez mais para o profundo.

Isso nos leva a dizer, de um lado, que a análise só pode consistir no desenvolvimento da função de casting e, de outro, que os mecanismos de defesa com suas divisórias, blindagens, furos e aberturas são o que permite que se tenha uma vida psíquica organizada.

Seria útil ter em mente que abaixo de qualquer piso psíquico existe um magma protoemocional do qual é preciso defender-se, mas que ao mesmo tempo contém potencialidades expressivas extraordinárias.

O casting, nesse sentido, nunca termina, e o desenvolvimento do casting é, sobretudo, um dos nossos objetivos. Ele passa, no fundo, através de nossa renúncia, na medida do possível, ao grasping do já conhecido, das teorias consolidadas que são também barreiras defensivas em relação a um verdadeiro conhecimento. É essa a estrada-mestra que permite a nós e a nosso paciente, castings cada vez mais significativos e imprevisíveis.

No fundo, o famoso “sem memória e sem desejo” de Bion significa permitir-se recomeçar sempre a partir do que não sabemos, sem insistir muito no que já adquirimos.

Um tema que envolve todas essas reflexões é a doença incurável de “dar sentido”, “encontrar um sentido”, até mesmo para coisas que não têm sentido algum.

E essa atividade se, por um lado, é uma característica peculiar e vital da nossa espécie, por outro, é também a sua doença, porque uma coisa é buscar um sentido e outra é ter necessidade de encontrá-lo ou de acreditar tê-lo encontrado. Essa questão já criou, tanto na sala de análise quanto fora dela, situações dramáticas que todo fanatismo acaba sempre por criar.

 

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Endereço para correspondência
Antonino Ferro
Via Cardano 77
27100 Pavia, Italia
E-mail: antonino.ferro3@tin.it

Recebido em: 20.5.2009
Aceito em: 10.6.2009

 

 

1 Tradução de Marta Petricciani. Membro efetivo da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo SBPSP. Conferência apresentada no 46o Congresso da Associação International de Psicanálise. Chicago, 29 de julho a 1 agosto de 2009. ipa – Psychoanalytic Practice: Convergences and Divergences.
2 Membro da IPA. Analista didata da Sociedade Psicanalítica Italiana SPI.
3 Líder indígena de um filme de 1952, “O levante dos apaches"
4 Estrangeiros não pertencentes à União Européia (n.d.t.).
5 Personagem muito conhecido na Itália, interpretado por Paolo Villaggio. O personagem procura sempre cativar a proteção dos potentes que adula de todas as maneiras possíveis.
6 Na Itália caracteriza as armas de brinquedo.
7 Grupo terrorista que agiu na Itália nos anos 1970/80.

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