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Revista Brasileira de Psicanálise

versão impressa ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál v.43 n.3 São Paulo set. 2009

 

ARTIGOS

 

Consciência moral primitiva: um vislumbre da mente primordial

 

Consciencia moral primitiva: un vislumbre de la mente primordial

 

Primitive conscience: a glimpse of the primordial mind

 

 

José Américo Junqueira de MattosI,II,1; João Carlos BragaI,III,2

ISociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo - São Paulo
IISociedade Brasileira de Psicanálise de Ribeirão Preto - Ribeirão Preto
IIINúcleo Psicanalítico de Curitiba - Curitiba

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Estudando mais de uma centena de supervisões dadas por Bion no Brasil, um dos presentes autores (JAJM) identificou referências, nas supervisões de 1978, a uma configuração psíquica, coloquialmente nomeada por Bion de consciência moral primitiva (primitive conscience). Em um rastreamento, foi possível identificar esta ideia também em outros artigos e seminários dessa época, como parte do modelo de mente utilizado por Bion em seus últimos anos de vida (1976-1979). São ideias sobre uma mente primordial, desenvolvida antes do nascimento, que parece se manter inalterada e ativa após este.
Com esta hipótese sobre os primórdios do psíquico, Bion chama a atenção para registros associados a órgãos atuantes precocemente no funcionamento somático (tálamo e adrenais), antes da disponibilidade do córtex cerebral para registros com potencialidade para representações.
Neste contexto, Bion conjectura que sentimentos de culpa muito primitivos, capazes de desencadear sanções cruéis, a ponto de serem mortais, apontariam a existência de uma moralidade primordial, que se manifesta impondo proibições, sem considerar a experiência para indicar escolhas. Desta maneira, impede experiências emocionais potencialmente criativas. Termos como terror sem nome e medo subtalâmico foram utilizados tentativamente por Bion, em outros momentos, para aproximar esta condição.

Palavras-chave: Consciência; Superego; Superego arcaico; Mente primordial; Bion.


RESUMEN

Estudiando más de una centena de supervisiones dadas por Bion en Brasil, uno de los presentes autores (JAJM) identificó referencias, en las supervisiones de 1978, a una configuración síquica, coloquialmente nombrada por Bion de consciencia moral primitiva.
En un rastreamiento, que posible identificar esta idéa también en otros artículos y seminários de esta época, como parte del modelo de mente utilizada por Bion en sus últimos años de vida (1976-79). Son ideas sobre una mente primordial, desarrollada antes del nacimiento, que parece mantenerse inalterada y activa tras éste. Con esta hipótesis sobre los primórdios del síquico, Bion llama la atención para registros asociados a órganos actuantes precozmente en el funcionamiento somático (tálamo y adrenales), antes de la disponibilidad del córtex cerebral para registros con potencialidad para representaciones.
En este contexto, Bion coyectura que sentimientos de culpa muy primitivos, capaces de desencadenar sanciones crueles, a punto de que sean mortales, apuntarían la existencia de una moralidad primordial, que se manifiesta imponiendo prohibiciones, sin considerar la experiencia para indicar elecciones.
De esta manera, impide experiencias emocionales potencialmente creativas. Términos como terror sin nombre y miedo sub-talámico fueron utilizados, por intento, por Bion, en otros momentos, para aproximar esta condición.

Palabras clave: Consciencia; Superyo; Superyo arcaico; Mente primordial; Bion.


ABSTRACT

On studying the supervisions given by Bion in 1978 in São Paulo, Brazil, one of the present authors (JAJM) identified references to a mental configuration, colloquially named by Bion as primitive conscience. Reviewing his articles and seminars from that time period, it was possible to identify this idea in different occasions. This concept, developed over Bion’s last years of life (1976-1979), is part of an important addition to the model of the mind developed by him. At that time, he formulated conjectures about a primordial mind, developed before birth, which would remain unchanged and active after that. Withthis hypothesis, Bion drew our attention to the earliest stages of the development of the mind, to somatic imprintings associated with organs (thalamus and adrenal) that are ready to act early in the body, before the cerebral cortex is prepared for records with mental potentiality.
In this context, Bion conjectured that very primitive feelings of guilt, capable of triggering cruel sanctions to a fatal point, would give base to a primitive conscience. This conscience does not consider experience to indicate choices, but rather, imposes rules. This way, it vetoes emotional experiences potentially capable of leading to mental growth. Terms such as nameless dread and sub-thalamic fear were tentatively used by Bion in different moments to approach this condition.

Keywords: Conscience; Superego; Archaic superego; Primordial mind; Bion.


 

 

(…) parece existir uma forma de moral inata, da maneira com que, por exemplo, a Igreja Católica Romana chama de Pecado Original. (…) Nascemos com um sentimento de culpa, nascemos com isto que um dia se tornará uma forma de consciência moral.

W.R. Bion (São Paulo, 1978, supervisão S123).

 

Trinta anos após a sua morte, as contribuições de Bion à psicanálise continuam contendo pensamentos que ainda aguardam para serem pensados. Este trabalho testemunha este fato. Estudando supervisões realizadas por Bion (1973, 1974, 1975 e 1978) no Brasil, um dos presentes autores (JAJM), teve sua atenção despertada por referências a uma configuração específica no complexo funcionamento do psiquismo, para a qual Bion utilizou a expressão primitive conscience.4

Referindo-a como “… uma situação que surge frequentemente em muitas análises diferentes”, Bion descreveu-a coloquialmente como um sentimento básico de culpa, encobrindo um estado de intenso terror. Fica acessível indiretamente através de cuidados tomados pelo indivíduo para evitar despertá-la, ou diretamente como autoódio (1985a). Nas supervisões que destacamos, Bion apontou-a em impedimentos ao desenvolvimento do self e em proibições a vivências prazerosas, sexuais, assim como alertou para sua periculosidade, podendo conduzir o indivíduo ao suicídio.5

Bion conjecturou estar esta consciência moral primitiva associada a registros talâmicos e glandulares de experiências ocorridas ainda antes do nascimento. Esta condição primitiva, caracterizada por impor apenas o que não deve ser feito, aponta sua anterioridade ao aprender com a experiência.6 Este caráter inato é também destacado pela analogia com o Pecado Original.7 Outras tentativas de denominação, medo talâmico e medo subtalâmico (1988c), chamam a atenção para sua base somática. Os conceitos anteriores de terror sem nome (1988c) e mudança catastrófica (1966),8 parecem-nos tentativas prévias de formular a experiência da mente desenvolvida, ao não conseguir continência para estes registros primordiais.

Um exame dirigido aos escritos de Bion, confirma ser este um conceito que surge com as modificações que fez em seu modelo da mente entre 1976 e 1979. Apresenta-o como conjectura imaginativa (1985a, 1981) e sugere que esta ideia seja examinada pelos analistas em sua prática clínica. Permitir-nos-ia um vislumbre da mente primordial, que nos fica inacessível com a cesura do nascimento.

Um dos presentes autores (JAJM), em trabalho escrito sobre sua análise com Bion (1977-1979),9 refere lembranças de interpretações de uma consciência moral que apenas proíbe. No entanto, foi apenas quando este conceito foi ganhando consistência no presente trabalho, que lhe foi possível alcançar mais satisfatoriamente, o que Bion então lhe dissera.

 

1. Consciência moral primitiva: excertos das supervisões10 A5 e A6

Em um estudo de mais de uma centena de supervisões conduzidas por Bion no Brasil,11 foi nas supervisões A5, A6 e S12 que Bion discorreu mais longamente sobre a “consciência moral primitiva”. Em outras supervisões ocorre esta aproximação, por vezes explícita,12 por vezes implicitamente.13

 

Fragmentos da supervisão A514:

A analisanda começa a sessão dizendo que pensa em parar a análise, mudar-se para o subúrbio e colocar o dinheiro economizado à disposição da irmã para que esta custeie as despesas com o seu divórcio. É o fundamental, pois não se sente merecedora de morar onde mora e de fazer análise.

Bion: Parece que se ela gastar todos os seus recursos em tempo e dinheiro com ela mesma, vai se sentir tão culpada que não aguentará. (…) Eu penso que esta é uma culpa básica, fundamental. Se a pessoa tivesse uma visão religiosa eu chamaria de pecado original. Mas, de meu ponto de vista, penso que são sintomas de uma consciência moral muito perigosa e fundamental, básica, como eu disse - que é mais uma desvantagem do que uma vantagem. (…) Por que eu estou pensando isso? É porque essa consciência não diz para ela o que ela deve fazer, apenas diz o que ela não deve fazer.

(…) Penso que estaria inclinado a chamar a atenção ao fato de que há duas pessoas na sala. Uma delas é ela e a outra é você, o analista. Mas há também um observador, que também está observando esse intercurso verbal - entre o analista e ela mesma. (…) A questão me parece ser que os dois foram deixados a sós em um jogo de consciência moral primitiva. Essa situação me parece ser uma situação que surge frequentemente em muitas análises diferentes. Eu poderia colocar nestes termos: duas crianças pequenas precisam de um pai ou de uma mãe, porque um pai ou uma mãe têm bastante experiência. Essa consciência moral primitiva não tem experiência, portanto, ela não sabe o suficiente para saber como cuidar de duas crianças. Agora, uma mãe experiente está propensa a ser muito severa, porque ela está sempre dizendo: não faça isso, não faça aquilo, não seja malcriado, não… e assim por diante… infinitamente. Mas, de fato, a mãe experiente apesar de frequentemente dizer: não faça isso e daí por diante - é muito mais indulgente, muito menos severa do que a consciência inexperiente. Portanto, o perigo de deixar duas crianças pequenas sozinhas não é só pelas artes que elas vão fazer - coisas más, mas sim porque elas vão ficar à mercê de uma consciência moral bastante inexperiente, muito severa e muito cruel. Assim, apesar de parecer que a mãe seja severa, de fato o que é verdadeiramente importante a respeito disto é que suas consciências morais serão muito mais severas se não houver uma mãe lá. Desta forma, o perigo não é só nas artes e malcriações que a criança possa fazer, ou as coisas erradas que a criança pode fazer, mas também quais coisas erradas essa cruel consciência moral irá fazer. É claro que num estado mais tardio o perigo deste sistema moral é que ele pode impor, sem necessidade, uma sentença de morte. Em outras palavras, é um tipo de consciência moral que pode levar ao suicídio.

 

Fragmentos da supervisão A615:

Trata de um analisando muito ansioso com conflitos e atuações na área da sexualidade. Após uma briga com sua esposa sobre infidelidades mútuas, eles se reconciliaram e tiveram uma segunda lua-de-mel.

Bion: Ele se opõe ao fato de que se ele e sua esposa tiverem uma lua-de-mel, logo seu pai e sua mãe também podem ter tido um jogo sexual prazeroso - eles podem ter sido capazes de jogar esses jogos sexuais, jogos sexuais agradáveis, quando a ele não era permitido, mesmo quando aprendeu a ter prazer - como a masturbação etc. - esse prazer está passível de ser interrompido.

(…) O fato de duas pessoas poderem se encontrar e terem um intercurso verbal como esse, provoca reminiscências, o que significaria que ele ou teria de parar de vir às sessões, ele teria de parar de existir, ou teria de mudar sua visão a respeito da perversidade de seu pai e de sua mãe. Ambos sendo o tipo de perversidade de pessoas que fazem coisas sexuais juntas. Algo tem de acontecer. O problema em se matar é que se ele se matar, ele vai estar morto. Se ele não se matar vai ter de fazer algo a respeito daquela consciência moral; se ele não fizer, então ele tem que se matar, porque ele não tem direito de existir se os pais não têm permissão para estar juntos. Se eles não têm permissão para ter uma relação sexual agradável, então é o fim dele. Mas se ele quiser continuar a existir, terá de mudar sua visão a respeito da depravação de seus pais, e também terá de mudar sua visão a respeito de analista e analisando, porque em vez de ser apenas uma dessas coisas estúpidas que analistas e analisandos fazem, a análise verdadeiramente dá resultado. As pessoas, na verdade, crescem - ele cresceu - portanto, teria de admitir que ambos analista e analisando - ele é um deles - estão envolvidos em uma atividade criativa e efetiva. Eu pensaria que a questão sobre a qual ele tem de estar consciente é a qualidade assassina daquela consciência moral, que odeia um intercurso prazeroso - verbal ou de qualquer outra forma, com sucesso e feliz. Portanto, penso que seria útil para ele estar consciente disso para que pudesse compensar aquele tipo de padrão moral homicida, que realmente significaria a destruição de qualquer atividade criativa.

 

2. Como fomos integrando, em nosso referencial, o conceito consciência moral primitiva

Nossa forma de pensar psicanaliticamente sobre as manifestações da moralidade sempre se baseou nas formulações clássicas de S. Freud (1924/1976, 1930/1974, 1938/1975) e de Melanie Klein (1933/1970) sobre o sentimento inconsciente de culpa. Víamos o pensamento de Bion a esse respeito, especificamente sua ênfase em um superego cruel, como também tendo este embasamento.

Perceber que com o conceito consciência moral primitiva estávamos frente a um novo referencial, desencadeou-nos diversos movimentos: passamos a dar atenção e a reunir dados de nossa própria experiência clínica que convergissem com esta ideia; passamos a rastrear este conceito na obra publicada de Bion; passamos a examiná-lo no conjunto das teorias psicanalíticas sobre culpa.

Nossas observações clínicas confirmaram a ideia de ser esta “uma situação que surge frequentemente em muitas análises diferentes”,16 à medida que examinávamos situações de impedimento ao crescimento da personalidade e a experiências criativas e prazerosas, como descrito nas supervisões acima. Logo aprendemos também a identificar este medo aterrorizante, quando os movimentos psíquicos tendiam a levar o indivíduo a buscar ser ele mesmo, integrando seus pensamentos ainda não pensados. Na sequência, foi-nos ficando acessível em situações nas quais formas mais primitivas de funcionamento psíquico ficam evisceradas, como em estados psicóticos ou de depressão profunda, assim como em condutas autodestrutivas associadas a dependência de drogas. Com mais facilidade, fomos reconhecendo estarmos frente à culpa, em um primeiro plano, mas estando subjacente um terror não vinculado a representações, silencioso e não elaborável na dimensão do conhecimento.

Aos poucos, a ideia de uma consciência moral primitiva, ativa no psiquismo, mas não acessível pelos processos de formação simbólica, ficou-nos muito convincente. No entanto, não conseguimos alcançar clareza quanto a serem os registros experiências pré-natais, embora esta nos pareça ser uma hipótese bastante coerente. Esta origem continua, para nós, uma conjectura imaginativa, com o mesmo estatuto que também consideramos as teorizações sobre a culpa inconsciente (assassinato do pai da horda primitiva e instinto de morte).

Na prática clínica, nosso primeiro problema foi o de discriminarmos sentimentos de culpa associados a relações objetais (ódio e rivalidade edípica; ataques primitivos ao seio), desta culpa que encobre um estado de terror primordial. Os primeiros mostram-se elaboráveis na experiência emocional da sessão analítica; os segundos, não. Feita esta discriminação, sendo o caso, passávamos a considerar a hipótese de estarmos às voltas com algo primordial.

Incluir essa compreensão em nosso referencial clínico provocou efeitos mutativos na forma de pensarmos sobre diversas situações da prática clínica:

(I) Passamos a perceber melhor a dinâmica da culpa nos impedimentos ao desenvolvimento do trabalho analítico, dando-lhe maior peso em nossas considerações;

(II) observamos que não tratávamos com igualdade os movimentos psíquicos para o conhecer e para o não conhecer, privilegiando os primeiros, possivelmente pela importância que dávamos à teoria da função alfa e a seus fatores, em especial à rêverie;

(III) alcançamos maior clareza na visão de uma mente multidimensional, em que o sistema consciente-inconsciente (sensorialidade, pensamento, alucinose e o colocar-se em harmonia com a realidade) convive com uma dimensão inacessível, da qual advém elementos que, quando se manifestam, o fazem de forma disruptiva;

(IV) de maneira ainda mais significativa, fomos percebendo o analisando como uma pessoa que está batalhando em vários fronts internos, buscando primeiro sobreviver para depois buscar viver suas relações objetais. Isto enfatizou-nos a dimensão do existir. A vicissitude de vir a ser o que se é, revelou-se a nós mais demandante do que as condições do tornar consciente o inconsciente, de reintegrar o projetado identificatoriamente e a de formar pensamentos a partir da experiência emocional;

(V) ficou-nos mais possível observar a criação de padrões de qualidade alucinatória, de indiferenciação entre animado e inanimado, vistos como traindo a existência de uma culpa fundamental na dinâmica do aprender/não aprender com a experiência emocional. Assim, ficou-nos mais acessível a compreensão de condições de não pensamento que, com frequência cada vez maior, chegam a nossos consultórios como as chamadas “novas patologias”: o predomínio dos impulsos sobre sua continência; o empobrecimento do viver as experiências emocionais e os afetos; as relações submetidas ao atendimento de exigências imediatas de satisfação; e a perda dos referenciais éticos e morais;

(VI) na compreensão do funcionamento mental, enfraqueceu-se o alcance da consciência moral experiente, favorecedora dos processos de pensar, ganhando maior presença a consciência moral primitiva, favorecedora da evitação do contato com o mental;

(VII) ganharam consistência para nós as ampliações do modelo da mente de Bion, implícitos em Transformações (2004) e na hipótese da mente primordial, desenvolvida entre 1976 e 1979.

 

3. Modificações no modelo de mente de Bion entre 1976 e 1979

Compartilhamos a tese que Bion manteve, ao longo de sua obra, de uma visão monista da mente humana, acentuando serem suas diferenças dimensões de um único self. Nossos recursos para examiná-la privilegiam a contraposição de diferentes funções; de forma ampla, Bion a via composta por uma parte voltada ao pensamento, operando símbolos (a mente propriamente dita) e, por outra, primitiva, operando informações somáticas e descarregando pelo soma o acréscimo de estímulos, seguindo as leis da neurofisiologia (a proto-mente). Este modelo binário manteve-se puro até Transformações: mente e protomental (1948-1951), parte psicótica e não psicótica da personalidade (1957), elementos alfa e elementos beta (1962). Após 1965, a visão passa a ser multidimensional, mas uma polarização básica persiste: transformações em conhecer e transformações em alucinose (1965), estados mentais consciente/inconsciente e inacessível (1978).

É esta última posição (1978) que nos interessa aqui destacar, para cuja compreensão a ideia consciência moral primitiva, nos foi fator catalisador.

Nesse período final de vida, Bion parte do reconhecimento de um descompasso entre os desenvolvimentos somático e psíquico, presente entre o surgimento de proto-sensações e proto-emoções e o amadurecimento cerebral, devido à impossibilidade do córtex cerebral em registrar as experiências físicas do feto, assim como a inexistência de uma mente capaz de contê-las. Após o nascimento, temos um self formado por “corpo ou mente e por um espaço mental para futuras ideias que possam vir a ser desenvolvidas” (1994; tradução nossa). Neste espaço mental aconteceria o desenvolvimento da personalidade através da articulação do potencial constitucional com as experiências da relação criança/pais. Neste domínio, temos as teorizações psicanalíticas clássicas, de um sistema mental conscienteinconsciente, com suas faces instintual, de aprendizado das experiências e da moralidade.

E quanto a esses registros primordiais inacessíveis, por ausência de uma capacidade para formar pensamentos e para o pensar? O feto não teria outra possibilidade que não a de deles se livrar, no que seria o precursor das identificações projetivas. Assim se formaria uma área de registros psíquicos, vividos como somáticos, inacessível ao sistema simbólico, mas nem por isso não operativa e nem não existente. A eles se somaria nossa herança filogenética que, em uma imagem poderosa, surge como sermos espécimes arqueológicos vivos,17 de termos enterrado em nossa mente uma sabedoria de gerações anteriores. Pensamentos sem dono e pensamentos selvagens seriam formas com que esta mente primordial ganharia nosso sistema consciente/inconsciente (ver Cesura, 1981, p. 125-126). Encontramos a exposição desta conjectura em Taming Wild Thoughts:

Mesmo o feto desenvolve uma capacidade para o que, posteriormente, é denominado “identificação projetiva”. Em outras palavras, ele tem sentimentos ou ideias primordiais, com as quais tenta lidar evacuando-as - um mecanismo primitivo possivelmente derivado da capacidade física para a evacuação, literalmente, uma vez que o líquido amniótico é poluído com mecônio. Estou sugerindo que além dos estados de mente consciente e inconsciente há um outro mais. O mais próximo que posso chegar para dar-lhe um nome provisório é o estado de mente inacessível. Ele pode tornar-se inacessível porque o feto livra-se dele tão logo o possa. (1997, p. 50; tradução nossa).

Estamos diante, pois, de um modelo da mente que acentua o conceito da cesura do nascimento, como um acontecimento momentoso e determinante para a vida mental. O que passa a interessar é o destino da relação entre o pré- e o pós-natal. Recorrendo a um modelo geométrico18 para aproximarmos esta visão da mente, imaginemos um plano e uma esfera e as diferentes possibilidades de relação que podem ter: ausência de contato, tangenciamento, pontos conjugados e corte. O plano nos sugere um sistema aberto, capaz de dar suporte a elementos dispersos em um espaço infinito, multidimensional e atemporal. A esfera, por sua vez, um sistema com limites e continência, com um dentro e um fora. Seriam imagens de um sistema infinito associado a outro finito e de suas possíveis relações. Ao primeiro sistema, cabe a qualidade inacessível; ao segundo, as de consciente e inconsciente.

 

4. Rastreando a configuração consciência moral primitiva na obra publicada de Bion

A existência, na personalidade, de uma atividade crítica violenta e cruel, surge como uma compreensão presente todo o tempo da obra de Bion. Podemos pensá-la como sua aceitação da visão kleiniana de um superego arcaico, um objeto mau integrante do conjunto de objetos constitutivos do superego. No entanto, há duas mudanças fundamentais neste pensamento de Bion: a concepção de uma consciência moral inata e o afastamento do modelo estrutural da mente, em favor do privilegiar as funções. Examinemos melhor estas diferenças.

Melanie Klein, ao estudar o surgimento da consciência moral na criança (1933/1970), ressalta seus aspectos opostos, ameaçadores e de proteção, que se organizam pela articulação pós-natal entre instintos e relações objetais. Na presente formulação de Bion, estamos diante apenas de aspectos persecutórios relacionados a ocorrências anteriores ao nascimento, antecedendo os processos de fusão/defusão dos instintos. Na teorização kleiniana, o superego forma-se pela introjeção do seio bom e do seio mau, operação presente na criança desde o nascimento, em que o cruel superego arcaico está vinculado à parte do instinto de morte não fusionado ao instinto de vida. Já Bion está propondo uma condição prévia à gênese do superego, enfatizando uma hipótese psicológica: a identificação projetiva que ainda não dispõe de continência.

Nossa visão é que, fundamentalmente, o conceito consciência moral primitiva não parece se integrar às teorizações de Freud e de Klein sobre o superego e o instinto de morte. É uma aproximação descritiva de uma configuração psíquica - e não explicativo-causal. Parece-nos similar à situação que surge com a ideia situação edípica (1966b, cap. 19), que tem estatuto epistemológico diferente de complexo de Édipo como proposto por Freud e por Melanie Klein.

Revendo a obra de Bion, encontramos já em O gêmeo imaginário (1950/1988a) descrições sugestivas de uma atividade moral aterrorizante, estrangeira à personalidade estruturada, como no sonho terrorífico do analisando aprisionado em seu automóvel, perseguido pelo “gêmeo”. Logo esta atividade é nomeada como superego cruel e assassino do ego (1988b; 2000, p. 45, 50 e 82). Avaliamos que esta forma de pensar, presente até 1962, pode ser assimilada à visão kleiniana do superego arcaico. Parece ser o exame dos distúrbios na capacidade para o pensar que leva Bion a aprofundar a investigação sobre a presença de uma atividade psíquica contrária ao desenvolvimento de pensamentos. Este objeto interno que se opõe e é destrutivo para com todo e qualquer elo de ligação (1988b, p. 99), ganha um exame detalhado em O aprender com a experiência, e em Transformações, como um objeto antipensamento. Surge apoiado na ideia de inveja, como exposta por Melanie Klein, como um fator da personalidade que é reintrojetado como se fosse um superego que é “super ao ego”: “É uma asserção invejosa de superioridade moral sem a mínima moralidade. Em suma, constitui a resultante da expoliação e da denudação invejosa de tudo que é bom” (1966a, cap.28, item 9, p. 115).

Este exame continua em Elementos da psicanálise (1966b, cap. 14 e 17), assim como em Transformações (2004, cap. 5), como formulações míticas desta ação contrária ao desenvolvimento da personalidade, nos mitos da expulsão do paraíso, da torre de Babel e da Esfinge. É considerado o próprio superego, que, ao usurpar as funções investigativas da realidade pelo ego, impede ao indivíduo o contato com a verdade. Sua consequência é a inanição da psique e retardo no desenvolvimento (…) pelo desenvolvimento incompleto do princípio da realidade, exaltação de uma perspectiva moral e falta de respeito pela verdade (p.74). Logo, em um novo exame com maior grau de abstração, ganha a designação de “-K”. No capítulo 7, a descrição fica ainda mais abstrata e é também mais contundente. Apoiado na Grade, é nomeado como o movimento psíquico <-, com destaque para sua qualidade dinâmica. É-nos apresentado como uma consciência moral completamente imoral, cujas qualidades, quando personificadas, podem ser enunciadas como: violento, voraz e invejoso, implacável, assassino e predatório, sem respeito pela verdade, pessoas ou coisas. (…) Esta força é dominada por uma determinação invejosa de possuir tudo aquilo que os objetos que existem possuem - incluindo a própria existência (2004, cap. 7).

Seu tratamento em Transformações sugere-nos a imagem de uma espiral, que mantém o mesmo centro, mas cujo raio vai se ampliando. Parte das mesmas ideias de inveja e superego, mas estas “desaparecem” e passamos a nos haver com descrições de maior complexidade, com maior grau de abstração. Em termos da Grade, é como se passássemos da linha A (experiência vivida como um fato pelo analisando), para a linha C (mitos de Babel e da expulsão do paraíso), para a linha F (os conceitos de inveja e superego) para atingir as linhas G (o sistema de hipóteses que o autor está criando) e H (sua formulação vetorial).

Reencontramos esta ideia em Atenção e interpretação na descrição do espaço mental de um paciente apresentado como extremamente perturbado: Em algum lugar está presente um ‘superego’ cruel, despido de todas as características usualmente associadas ao superego e, finalmente, da própria ‘existência’ . Tem, portanto, as características de ‘não-existência’ (1973, cap. 2, p. 24). Esta conjectura ganha esclarecimentos com os acréscimos que faz em seu modelo de mente após 1975, com a concepção de uma mente primordial, inacessível pela ação da cesura do nascimento, que pode infiltrar-se na personalidade consciente/inconsciente. É possível estabelecer com clareza que esta forma de pensar foi desenvolvida após 1975, a partir de uma observação feita em uma das supervisões em Brasília,19 em que aponta esta consciência moral primitiva como relativa a experiências no início da vida pósnatal (supervisão S17):

… acho que este objeto interno - isso que ele chama de dor de estômago - é, de fato, uma consciência moral muito assustadora. De fato, ele está amedrontado com seu analista, como se o analista fosse uma espécie de reencarnação do fantasma da mãe. (…) Mas, se isto for verdadeiro, está realmente sugerindo ser algo extremamente primitivo - provavelmente voltado no tempo e relacionado às suas primeiras mamadas.

A conjectura de se estar às voltas com remanescentes de experiências pré-natais, firma- se em trabalhos escritos (1987a, 1987b, 1985a, 1981, 1994), e seminários20 conduzidos por Bion nos três anos finais de sua vida. São compreensões altamente abstratas, expressas de forma descritiva, coloquial, recorrendo frequentemente a modelos e analogias, em um pensamento sempre em trânsito, não enrijecido em definições; os conceitos vão sendo expandidos por diferentes visões, obtidas por mudanças no vértice de observação.

Nas três primeiras das “Quatro discussões com W. R. Bion”, assim como em palestras de N ova York (1977), de Roma (1977) e de São Paulo (1978), há várias referências a esta ideia (1992a, p. 11-13, 30, 42). Porém, é em “Evidência” (1985a) que encontramos sua formulação mais completa, ali qualificada como uma conjectura imaginativa: a ideia de uma atividade de precoce e severa censura ao self. O contexto em que surge explora a possibilidade de olharmos a personalidade a partir de duas direções, a somática e a psíquica. Caso o façamos pela perspectiva somática (face somatopsicótica), é possível destacar um tipo de consciência moral já presente no bebê, com sentimentos de culpa estabelecidos, que nomeia como medo subtalâmico.21 Por ser a formulação mais precisa e detalhada que encontramos em sua obra publicada, vamos citar todo o trecho pertinente:

Façamos um voo pela fantasia; uma espécie de infância de nosso próprio pensamento. Posso imaginar uma situação na qual um feto quase a termo poderia estar consciente de oscilações extremamente desprazerosas no fluido amniótico antes que ele fosse transferido para o meio gasoso - em outras palavras, que ele nascesse. Posso imaginar que existe algum distúrbio ocorrendo, por exemplo, algo assim como os pais não estarem se entendendo. Posso ainda imaginar ruídos muito altos, ocorrendo entre a mãe e o pai - ou mesmo barulhos feitos pelo sistema digestivo da mãe. Suponha que este feto também esteja consciente das pressões daquilo que algum dia vai se tornar um caráter ou personalidade; consciente de coisas tais como medo, ódio, emoções primitivas deste tipo. Então, penso que o feto poderia, onipotentemente, transformar estes sentimentos perturbadores em hostilidade, proto-ideias, proto-sentimentos, e, em um estágio muito precoce, cindi-los, destruí-los, fragmentá-los e tentar evacuá-los. Suponha que, então, a cesura toma lugar e que o bebê seja sujeito ao trauma do nascimento e ao trauma posterior de ter que se reajustar a um meio gasoso. (…) Posso imaginar que o feto seja tão precoce, tão prematuro que ele tenta se livrar de sua personalidade para o início de tudo, e então, depois do nascimento - sendo ainda muito inteligente, se é este o termo adequado - ele é capaz de aprender todas as palavras e frases que as pessoas usam de modo consciente. Na situação muito severa e muito obstrutiva que tenho em mente, o paciente aprende bastante bem a diferença entre o certo e o errado. Na realidade, o todo das regras de Mc Naughton22 não apresentam nenhuma dificuldade. Mas até o ponto que concerne ao paciente, ele pode preservar uma mente em um nível mais profundo, como aliás ocorre, que nada sabe a respeito disto, mas que poderia, não obstante, ter sentimentos de culpa bem estabelecidos. Fico impressionado ao ver o modo pelo qual um bebê estremece e recua, como que sujeito a uma acusação quase intolerável, se você fizer um som levemente desaprovador para ele. Será que ele tem uma “consciência” bem estabelecida, de um tipo-bebê? Como é que se poderia denominá-la? Não sei que linguagem utilizar. Para meus objetivos particulares, andei inventando termos tais como “medo subtalâmico”, significando tipo de medo que alguém teria se nenhuma contraprova para ele fosse produzida pelos níveis superiores de mente. (p. 139-140)23

Em Uma memória do futuro, Bion nos apresenta o quadro de uma mente com diversos níveis simultâneos de funcionamento, inclusive com distintas representações no self de estágios pré-natais. No primeiro volume, há várias passagens (p. 173, 180, 189) em que é possível vislumbrar o conceito consciência moral primitiva. É interessante notarmos que Bion não lhe dá um “personagem” específico, como o faz com outras manifestações da mente primordial, como os Somitos, Adolfo Tiranossauro e Alberto Estegossauro. Referências a ela surgem por meio de “personagens” com alta capacidade de manejo de pensamentos, “Bion” e “Homem”, como na passagem seguinte, na sequência de observações sobre o medo:

Bion - (…) devo e vou continuar devendo minha existência contínua à minha capacidade de temer um ‘desastre iminente’. A questão não é ‘onde se deve traçar a linha’, mas ‘onde foi traçada a linha: entre o consciente e o inconsciente?’, ‘junto ao frenos?’, ‘ao tálamo?’ (1989, p. 189)

Em termos conceituais, esta visão está explicitada no verbete “Thalamus”, em A Key to “A memoir of the Future”:

Existem algumas formas de terror que podem ser observadas em psicanálise, que têm sua origem no tálamo em desenvolvimento e suas ‘conexões nervosas não-mielinizadas’. Esta é, evidentemente, uma ‘conjectura imaginativa’ que pode levar anos para confirmar cientificamente. (p. 83)24

 

Uma moralidade primordial

A visão da moralidade como um processo humano primordial, pode ser acompanhada em mitos de transgressão da vontade onipotente dos deuses, presentes em muitas e diferentes culturas. A associação acesso ao conhecimento/punição que encontramos nos mitos hebreus da expulsão do paraíso e de Babel, nos mitos gregos da Esfinge e de Prometeu, também encontramos em mitos de origem de culturas tão diferentes como a védica (Green, 1987) e a dos índios americanos (Lévy-Strauss, 1985).

Na investigação psicanalítica, desde Freud, as raízes da moralidade também estiveram sempre ligadas a situações arcaicas, tanto do indivíduo quanto da espécie. O assassinato do pai da horda primitiva - e seu subsequente entronizar como ser sobrenatural - foi sua hipótese inicial para o reconhecimento da existência de primitivas emoções de culpa e de perseguição. Com a segunda teoria dos instintos, o desenvolvimento da ideia de uma culpa básica ganhou o nome sentimento inconsciente de culpa, atribuído à presença de um resíduo do instinto de morte no ego, não defletido (Freud, 1924/1976, 1930/1974, 1938/1975). De ambas as visões, decorre que o sentimento de culpa precederia a existência da consciência moral.

Melanie Klein desenvolve esta última posição de Freud e propõe a distinção entre um cruel superego arcaico e o superego descrito por Freud. Diferenciava, também, uma culpa depressiva, produto da elaboração dos conflitos acontecidos em uma área da personalidade que alcançou desenvolvimento simbólico e integração, e uma culpa persecutória, relacionada à destrutividade pela virulência de impulsos sádicos.

Não nos parece, já que não é um tema tratado explicitamente, que Bion tenha rejeitado as ideias de uma herança moral filogenética (Freud), ou de um superego cruel moldado pelos impulsos sádicos dirigidos aos objetos (Klein), assim como do desenvolvimento do superego por meio das relações objetais (Freud e Klein). Bion, com a noção de consciência moral primitiva acrescenta a elas uma nova teoria sobre o desenvolvimento da moralidade humana, conjugando quatro hipóteses:

(I) o feto tem capacidade para experimentar sensações (proto-emoções e protoideias) por excitações no eixo tálamo-adrenais, não dispondo de estruturas cerebrais amadurecidas. Sensações do que posteriormente será chamado de “medo” ou “ódio” poderiam ser experimentadas, mobilizando impulsos a lutar ou fugir25;

(II) o mecanismo da identificação projetiva já estaria disponível ao feto em desenvolvimento e seria o recurso por ele utilizado para livrar-se destes estímulos;

(III) a qualidade destas sensações é terrorífica, a experiência de uma inundação de excitações, vivida como aniquilação. Formar-se-ia um núcleo de registro destas experiências de “nadificação”, cujo contato, posteriormente, passa a ser imperiosamente evitado. Para tal, desenvolvem-se reações proibitivas (“não pode”), que buscam impedir a aproximação com experiências que estimulem fantasias catastróficas. Culpa seria a emoção com que este contato se apresentaria;

(IV) ocorre uma cesura, ligada ao nascimento, que torna estes registros primordiais inacessíveis à mente que irá se desenvolver.

A conjectura, então, é de que nas fundações de nossa vida mental existe uma atividade moral que urge para existir. Refere-nos ao que não é pensamento e nem aprendido com a experiência, mas sim repetições de um já vivido primevo. O conceito consciência moral primitiva, neste sentido, mescla as teorizações precedentes: é inata (embora não filogenética) e é decorrente de experiências, embora anteriores às relações de objeto.

Estabelece-se uma distinção entre uma consciência moral “madura” e uma consciência moral “primitiva”. A primeira compreendendo os desenvolvimentos éticos de um superego em interação criativa com o ego, enquanto a moralidade primitiva manifesta-se de forma impeditiva ao contato com situações novas, que possibilitam crescimento da personalidade.

Em seus últimos trabalhos, Bion examina esta moralidade primitiva e seus efeitos:

A menos que se reconheça a natureza primitiva do sistema moral, da consciência moral, este não pode ser devidamente avaliado. Infelizmente, somos obrigados a usar termos como ‘superego’, o qual sugere imediatamente algo que está acima de tudo. Muito mais provavelmente é algo que está embaixo de tudo - o mais básico, fundamental. (1992a, p. 13)

E

Realmente, penso que seria bastante útil considerar que alguns estágios de medo, de intenso medo, são por nós visualizados ou imaginados como se alguém pensasse sobre eles como um medo subtalâmico, ou como algum tipo de manifestação glandular, algo que tivesse a ver com as adrenais ou aquilo que posteriormente virão a ser as estruturas genitais. (1987b, p. 138)

 

6. Uma aproximação clínica

Os fragmentos das Supervisões A5 e A6 já apresentados, permitem aproximações com as manifestações clínicas que pensamos serem mais comuns à configuração consciência moral primitiva. Há, no entanto, condições em que conjecturamos poder identificá-la em forma dramática e abertamente impositiva. Em uma análise conduzida por um dos presentes autores (JAJM), pensamos ter sido possível aproximar esta condição.

Esta pessoa, já com longos anos de frutífera análise, imergiu em um longo período de intenso sofrimento mental, em que se sentia terrivelmente deprimida, com crises de intensa angústia e ideias recorrentes de suicídio. Em um estado de alucinose, sentia-se acusada por todos os erros e “pecados” - reais ou imaginários - que porventura tivesse cometido. Não conseguia ver em si nenhuma qualidade, sentindo-se um traste e um peso para seus familiares. Ao mesmo tempo, era dominada por uma vergonha delirante de si mesma, imaginando como seria se seu marido e filhos viessem a saber, de fato, quem era a esposa e mãe que tinham. Com isso, perderiam o amor e o respeito que por ela nutriam. Havia momentos em que descrevia seu estado como que caindo em um abismo sem fim… Nesses momentos, era possuída por intenso desespero, recorrendo a tranquilizantes e antidepressivos, pois se não aliviasse sua angústia, o perigo de se suicidar fazia-se iminente.

Mobilizado pelas compreensões sobre a ideia de uma consciência moral primitiva, enquanto mantinha o vértice analítico o analista foi chamando a atenção para a qualidade irreal, inútil e assassina desta instância moral, passaram a apresentar-se algumas mudanças no trabalho analítico, sob a forma de modificações em seus estados emocionais. Uma dessas evidências, após meses de evolução, foi o surgimento de sonhos com imagens que adequadamente representavam um intenso estado terrorífico.

No primeiro desses sonhos, via-se diante de um ser, à guisa de um espantalho coberto de andrajos, em que, numa cabeça-caveira com cabelos desgrenhados, havia fiapos de linha saídos de dentes descarnados os quais foram vistos por ela como fios de esperança, unindo-a ao mundo dos viventes.

Dias mais tarde, descreveu dois outros sonhos. No primeiro deles, passeava pela rua onde mora, com sua filhinha ao colo. Em frente, do lado oposto, havia um enorme cachorro, um dog alemão o qual ameaçava ferozmente pular uma cerca de madeira - paus fincados lado a lado - que os separavam. Apavorada, viu, de repente, que a cerca diminuía rapidamente de altura e tornava iminente o ataque daquela fera. O pavor que mais a ameaçava era de não ser capaz de proteger sua filhinha. Em estado de extrema angústia acordou, ainda com a sensação da ameaça do terrível animal.

No outro sonho, a paciente que vinha com tosse e com uma pequena expectoração, sonhou que um de seus pulmões era dividido ao meio. Sua metade inferior estava tomada por um ataque de bactérias, que logo se transformavam em larvas virulentas, ameaçando invadir e devorar, também, o tecido sadio.

A partir desses sonhos foi possível ao analista ir além do assinalamento da presença de uma consciência moral assassina, e passar à elaboração dessas vivências. Progressivamente ganhou sentido a percepção de uma mente dividida, de que convive com aspectos seus primitivos, com qualidades assassina e de loucura, que ameaçam irromper, apossar-se de seu self e destruí-la.

O seguimento psicanalítico mostrou ganhos na elaboração de suas experiências consigo mesma, mas não o mitigar do terror e da culpa percebidos. N o entanto, era-lhe possível suportá-los de forma mais tolerável, com maior consciência e mesmo podendo pensar sobre esses aspectos.

Nossa avaliação é de ter sido psicanaliticamente significativo examinar a possibilidade de estar a analisanda às voltas com o ingresso, na atmosfera mental, de registros estranhos aos estados de mente consciente/inconsciente. Pareceu-nos uma ideia bastante útil a de estar ela respondendo, como alguém encurralado em um padrão de luta e fuga, a um estado de grande terror. Esta percepção evolveu entre sintomas, “não-sonhos”, “quase sonhos” e sonhos.26

Na descrição clínica acima feita, pensamos poder acompanhar a transição de um estado de mente em que, violentamente, a paciente é afastada do contato consigo mesma, para outro estado de mente em que se retoma a primazia consciente/inconsciente. Fica explicitada a precedência da mente primordial sobre as elaborações (pelo pensador) das experiências sensoriais e emocionais. Remete-nos, assim, à descontinuidade entre uma “mente somática”, desenvolvida antes do nascimento, e outra “proto-simbólica” e “simbólica”, desenvolvida após este. Em algumas análises, como nesta, é possível acompanhar que frente a imposições de vir a ser o que de fato se é, estes analisandos aproximam-se de estados psíquicos primordiais, e vivem um terror sem nome, que então pode ganhar algum reconhecimento. Podemos conjecturar esta condição como uma realização da possibilidade da personalidade consciente/inconsciente em domar pensamentos selvagens? (Bion, 1997; Junqueira de Mattos, 1995)

A posição do analista, na descrição clínica, mostra as dificuldades para operar com esta condição. Assinala a inutilidade de tentar elaborar o contato com estas forças primordiais (estado de mente inacessível), enquanto significados da relação analítica, mesmo que surgidos na relação analítica. Não há “tecido mental” para suportar significados. No entanto, sua identificação e assinalamentos deixam estes conteúdos emocionais “disponíveis” para outras maneiras de convivência com o mental, como um inimigo a ser cuidadosamente observado. Neste ponto, necessitamos pensar em termos de crescimento da personalidade e não em resolução de conflitos.

 

7. Algumas observações para a prática clínica

Como ocorre com toda função do psiquismo, consciência moral primitiva se nos apresenta como o conceito de uma configuração psíquica. Fazemos dela representações, a partir da elaboração de experiências. Intuímos sua presença em estados de terror, não ligados a processos de formação simbólica, com a qualidade de indiscriminação entre fato, fantasia e ideia.

Se tivermos a compreensão de que esta configuração é um remanescente arcaico (“embrionário”) no psiquismo, também teremos a compreensão de que ela estará inacessível aos nossos recursos clássicos de elaboração psicanalítica, como transferência, contratransferência, interpretação, dinamismos consciente/ inconsciente ou mesmo identificação projetiva. Bion se propõe este problema em “Evidência”:

Que teoria temos em relação a isto? (…)… existe algum modo pelo qual possamos verbalizá-los sem que produza uma distorção completa? (…) Supondo-se que alguém esteja lidando com algum tipo de condição psicossomática, será que é uma boa falar com uma pessoa altamente articulada em termos altamente articulados? (…) Será que é possível falar com o soma, se ele existe, de um modo tal que a psicose seja capaz de entender, ou vice-versa? (p. 140)

Nas supervisões que inicialmente referimos, encontramos indicações de Bion sobre as dificuldades para abordar esta situação na clínica:

Eu não sei se diria alguma coisa a respeito disso a ela, nesse momento, porque não sei se ela aguentaria - eu provavelmente iria querer ouvir algo mais. Mas enquanto isso, guardaria para mim o fato de que essa é uma culpa básica, fundamental.

A questão a respeito disso: o que devo dizer à paciente? Qual interpretação devo dar? Ou devo permanecer em silêncio? Agora, se eu permanecer em silêncio, estarei me pondo na posição de ser esta consciência moral, o que não é bom para ela; eu preciso de mais informações e, portanto, preferiria permanecer em silêncio até ouvir mais. Mas se eu fosse o analista, não saberia ao certo se poderia me dar ao luxo de esperar, ou se isso faria com que ela se sentisse, mais do que nunca, com medo de mim, como esta consciência moral hostil e inútil.27

E

Eu pensaria que a questão sobre a qual ele tem de estar consciente é a qualidade assassina daquela consciência moral, que odeia um intercurso prazeroso - verbal ou de qualquer outra forma, com sucesso e feliz. Portanto, penso que seria útil para ele estar consciente disso para que ele pudesse compensar aquele tipo de padrão moral homicida, que realmente significaria a destruição de qualquer atividade criativa.28

Reflexões sobre nossa experiência clínica levam-nos a acentuar quatro pontos:

I. De forma ampla, duas orientações nos ficam marcantes:

a) uma flutuação entre dois vértices pelos quais examinar o continuum somatopsíquico, diminui as consequências da cesura entre a experiência física e a psíquica: em vez de só olharmos o somático a partir do psíquico, que também possamos examinar o psíquico a partir do somático;

b) o destacar experiências terroríficas, pervasivas, mas impositivas, por vezes exuberantes e por vezes silenciosas, constitui um importante fator na abordagem da dinâmica mental.

II. Os modelos de mente utilizados por Freud e por Melanie Klein centram-se na complementaridade consciente/inconsciente. No entanto, já em Transformações (2004, cap. 4), Bion nos alerta que está operando em um outro paradigma, em que a polarização fica entre finito e infinito, referindo-se ao uso de recursos simbólicos e não simbólicos para lidar com pensamentos, respectivamente.

Esta condição é retomada, em seus últimos anos de vida, ao criar a imagem de dois estados de mente que coexistem: o consciente/inconsciente e o inacessível (1997, p. 50). O primeiro sistema é o domínio clássico da psicanálise, coberto pelas contribuições de Freud e de Klein; o segundo, não mentalizável, inclui as experiências sensoriais e emocionais primordiais do ser humano, ainda enquanto feto, e que ficam separadas do estado de mente consciente-inconsciente pela cesura do nascimento. Este estado psíquico primordial está articulado com as inervações somáticas e se expressa fisicamente, por meio de emoções básicas vividas em forma excessiva (1981).

III. A consciência moral primitiva, fazendo parte do estado mental inacessível, somente nos fica disponível quando se manifesta sob a forma de comportamentos reveladores de uma culpa primária ocultando um estado de terror. Reconhecidos como infensos à interpretação de significados, fica o analista limitado a favorecer sua aproximação com o sistema consciente/inconsciente, pela sua identificação no exame da experiência emocional presente. Meltzer formula este problema do analista em uma linguagem diferente, mas de conteúdo convergente:

Então, você acaba ficando com estes pacientes com uma parte psicótica da personalidade não analisada e, eu penso, não analisável. Isto não quer dizer que ela não possa se desenvolver, mas ela não irá se desenvolver como resultado de ser analisada. Ela pode se desenvolver como o resultado de ser nutrida, maternalizada, aquilo que eu chamo o impacto da atmosfera da sala de análise. Mas não por interpretação ou investigação.29

IV. Uma situação clínica em especial que nos pareceu particularmente iluminadora pela ideia consciência moral primitiva, está nas análises que se estendem por prolongados períodos de tempo, com o mesmo ou diferentes analistas. Passou a nos fazer sentido que estas pessoas se deparam com um estado de terror ao fazerem movimentos para virem a ser o que de fato são. A análise é experimentada, simultaneamente, como esperança para esse desenvolvimento e como proteção contra o contato com esse terror. O analista fica sendo um acompanhante experiente e indispensável para as tentativas de crescimento mental, que esses analisandos não se dispõem a abrir mão.

Situações reconhecidas como reação terapêutica negativa, inanalisabilidade, análises que não evoluem, merecem ser examinadas como a presença de uma consciência moral primitiva, aterrorizando o indivíduo e paralisando seus movimentos de contato com a realidade psíquica.

 

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Endereço para correspondência
José Américo Junqueira de Mattos
[Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo SBPSP e Sociedade Brasileira de Psicanálise de Ribeirão Preto SBPRP]
José Américo Junqueira de Mattos
Caixa Postal 755
14001-970 Ribeirão Preto, SP
E-mail: junqueira@familiajunqueira.com.br

João Carlos Braga
[Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo SBPSP e Núcleo Psicanalítico de Curitiba NPC]
Rua José Antoniassi, 320, Vista Alegre
80810170 Curitiba, PR
E-mail: bragajc@hotmail.com

Recebido em 11.9.2009
Aceito em 21.09.2009

 

 

1 Membro efetivo e analista didata da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo e da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Ribeirão Preto.
2 Membro efetivo e analista didata da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo. Núcleo Psicanalítico de Curitiba.
3 Publicado parcialmente como supervisão 7 em Clinical Seminars and other works, São Paulo (1978).
4 Traduzimos conscience por consciência moral, para diferenciá-la de consciência (consciousness) enquanto órgão sensorial para a qualidade psíquica (Freud, 1900), assim como para acentuar seu caráter moral.
5 Supervisões A5 e A6.
6 Inexperienced conscience.
7 Supervisão A5. Também nas Conferências em Nova Iorque, 1977.
8 Também publicado como capítulo 12 de Atenção e Interpretação.
9 “Algumas vezes, durante o curso de minha análise, dr. Bion apontou uma peculiaridade da consciência, ou seja, que ela está sempre pronta a nos dizer o que NÃO DEVEMOS fazer ou pensar, mas N UNCA o que devemos” (Junqueira, 1980, p. 17).
10 Os autores irão se referir ao termo “Supervisão” em vez de “Seminário”, pois essa era a denominação que o próprio Bion usava na ocasião em que foram dadas. A notação que estamos utilizando para identificar estas supervisões é a dada por seu organizador, José Américo Junqueira de Mattos.
11 Transcrições e traduções de registros em fitas magnéticas feitas pelo dr. José Américo Junqueira de Mattos.
12 Supervisão S17.
13 Supervisões S34, A36 e A43.
14 São Paulo, abril de 1978. Publicado, de forma parcial, em Clinical Seminars and Other Works, como o seminário 18 de São Paulo.
15 1978. Supervisão inédita.
16 Bion, Supervisão A5, acima (1978).
17 Supervisão S-17.
18 Inspirado no modelo da relação entre uma reta e um círculo, em Transformações, capítulos 6 e 7.
19 Abril de 1975, supervisão S17.
20 Los Angeles, abril de 1976; Nova York, abril de 1977; Roma, julho de 1977; São Paulo, abril de 1978.
21 Na segunda das palestras em Nova York, Bion explica a ideia de “subtalâmico”.
22 Princípio na lei inglesa sobre a necessidade de esclarecer se o indivíduo tem condições de distinguir entre o certo e o errado. Ver a segunda das palestras em Nova York, 1977.
23 Fica significativo que o que se segue a estas observações, seja a descrição do suicídio de um analisando do próprio Bion.
24 Tradução dos presentes autores.
25 Ocorre-nos aproximar estas ideias de Bion sobre sentimentos inatos de culpa, das contribuições advindas pelo estudos, por meio do utrassom, de observações sobre o psiquismo pré-natal, como a “síndrome do gêmeo desaparecido”. Ver, por exemplo, Joanna Wilheim, “Síndrome do sobrevivente de concepção gemelar - o gêmeo desaparecido”.
26 Seguindo Bion (1981; 2000, p. 40) e Rezze (1999), referimo-nos a sonhos quando identificamos a elaboração simbólica, através da função alfa, das experiências emocionais acontecendo no estado de sono. Estas experiências revelam-se úteis para o aprender com a experiência emocional quando aparecem na sessão analítica. “Quasesonhos” são descritos como sonhos pelo analisando e são similares a eles; entretanto, não se mostram úteis para a elaboração da experiência emocional da sessão, sugerindo serem, de fato, transformações em uma dimensão infinita. Já por “não-sonhos”, referimo-nos a imagens pictóricas tratadas como fatos, sugerindo a intuição de conteúdos mentais incapazes de representação simbólica. Parecem revelar tentativas da mente de livrar-se de elementos não transformáveis.
27 Supervisão A5.
28 Supervisão A6.
29 D. Meltzer, julho de 1997, comunicação pessoal aos autores.

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