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Revista Brasileira de Psicanálise

versão impressa ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál vol.45 no.2 São Paulo abr./jun. 2011

 

EDITORIAL

 

Editorial

 

 

Bernardo Tanis

Editor

 

 

Estamos às vésperas do 47º Congresso Internacional de Psicanálise cujo tema é: Explorando os conceitos fundamentais: sexualidade, sonhos, inconsciente. Esses conceitos, desenvolvidos por Freud, fundam a nossa disciplina e a metapsicologia, nada mais apropriado para comemorar os 100 anos da fundação da IPA.

Relembramos as palavras com as quais Freud deu início aos textos de sua Metapsicologia:

Não é raro ouvirmos as exigências que uma ciência deve ser edificada sobre conceitos fundamentais claros e bem definidos. Na realidade, nenhuma ciência começa com tais definições, nem mesmo as mais exatas. O verdadeiro início da atividade científica está na descrição de fenômenos que depois são agrupados, ordenados e relacionados entre si, já na descrição é inevitável que apliquemos ao material certas ideias abstratas, tomadas daqui e dali, tomadas não só da nova experiência... Apenas depois de uma exploração mais radical desse âmbito de fenômenos podemos apreender seus conceitos fundamentais de maneira mais nítida e modificá-los progressivamente ... Mas, o progresso do conhecimento não tolera definições rígidas. (Freud, 1915/2010, p. 52)

Freud expressa nesse texto um espírito de abertura, pesquisa clínica e humildade na construção de conceitos. Também assinala que as descrições clínicas possuem alguns elementos, "certas ideias abstratas", que não se originam apenas da experiência, desse modo alerta às limitações do empirismo ingênuo.

Compreendemos o convite a explorar os conceitos fundamentais da psicanálise como um convite à indagação sobre os diferentes "contextos" nos quais a prática clínica acontece e nos quais novas teorizações emergem. Diz Mezan:

pode-se falar em contexto teórico no qual se formulam as noções, do contexto cultural e social que emoldura e atravessa a prática clínica, de contexto no sentido mais restrito de uma escola dentro do pensamento psicanalítico etc. (Mezan, 2002, p. 444)

Assim são complexos, sobredeterminados e não lineares os caminhos que conduzem às novas teorizações e modelos, fato que podemos observar nas respostas, de analistas de várias latitudes e instituições, às perguntas formuladas pelo Comitê Organizador do Congresso que publicamos neste número. Para estimular e enriquecer o debate e a reflexão dos nossos leitores convidamos Ruggero Levy, Deodato de Curvo Azambuja e Bernard Miodownik para comentar estes trabalhos expondo suas próprias ideias.

A ideia de contexto também se faz presente como eixo central no trabalho "Sobre migrações e transferências", de Márcio de Freitas Giovannetti, que ao situar a clínica psicanalítica na perspectiva do contemporâneo o faz a partir de um "aqui e agora" inexoravelmente histórico.

A ideia de contexto far-se-á presente novamente, dessa vez no trabalho do analista italiano Franco Borgogno, "Ferenczi, o analista introjetivo".

é preciso investigar o contexto analista-paciente em que os sintomas emergem, já que é a avaliação do contexto próximo e atual que nos permite conhecer "em miniatura" (Ferenczi, 1912a, p. 189) o modo em que surgiu, no passado, o sofrimento do paciente. (2011, p. 110)

Trata-se agora de apreender as sutilezas do contexto transferencial-contratransferencial da situação analítica.

Na seção de Interface, Jorge de Almeida, em seu ensaio "Condenados à interpretação: Kafka e os sentidos do mundo", nos confronta com a incapacidade de outorgar pleno sentido a si mesmo e ao mundo no contexto histórico da modernidade. O absurdo, assim como para Freud, o umbigo do sonho, convocam o ato interpretativo ao mesmo tempo em que interrogam a possibilidade de sentido último.

Reconhecemos como presença central na psicanálise contemporânea o aspecto intersubjetivo, o inquestionável papel desempenhado pelo outro na constituição subjetiva, de modo que falar em intersubjetividade hoje não é mais patrimônio exclusivo de uma escola. Buscamos oferecer aos nossos leitores, ao longo deste ano, na seção de Intercâmbio, diferentes concepções presentes na psicanálise mundial em torno do intersubjetivo. Neste número publicamos um trabalho recente de Robert D. Storolow, um dos pioneiros da abordagem intersubjetiva americana.

É difícil assinalar a riqueza, neste breve espaço, de todos os trabalhos publicados, convidamos, então, o leitor a percorrer os textos de Julia Coutinho Costa Lima, Adriana Salvitti, Ronis Magdaleno Junior e Julio Hirschhorn Gheller que, ancorados na experiência clínica, tematizam diferentes aspectos da clínica atual, mostrando a vitalidade e vigência dos fundamentos de nossa disciplina.

 

Referências

Borgogno, F. (2011). Ferenczi, o "analista introjetivo". Revista Brasileira de Psicanálise, 45(2),105-117.         [ Links ]

Freud, S. (2010). Ensaios de Metapsicologia. In S. Freud, Obras completas. (Vol. 12, Paulo Cesar de Souza, trad.). São Paulo: Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1915)        [ Links ]

Mezan, R. (2002). Sobre a epistemologia da Psicanálise. In R. Mezan, Interfaces da psicanálise (pp. 437-519). São Paulo: Companhia das Letras.         [ Links ]