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Revista Brasileira de Psicanálise

Print version ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál vol.46 no.3 São Paulo July/Sept. 2012

 

ARTIGOS TEMÁTICOS: PASSAGENS II - ENTRE O MODERNO E O CONTEMPORÂNEO

 

Sobre a verdade como tensão entre invenção e descoberta (I//V//D)

 

On truth as the tension between invention and discovery (I//T//D)

 

Sobre la verdad como tensión entre la invención y el descubrimiento (I//V//D)

 

 

Fabio Herrmann

1944-2006. Médico e psicanalista, foi presidente da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo SBPSP e da Federação Latino Americana de Psicanálise FEPAL, foi professor do Programa de Pós-graduação em Psicologia Clínica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUCSP a partir de 1984, criador da Teoria dos Campos, escreveu 10 livros e centenas de artigos publicados em livros e revistas científicas, fundou o Centro de Estudos da Teoria dos Campos CETEC, que presidiu até sua morte

Correspondência

 

 


RESUMO

Este texto é inédito e faz parte do conjunto de aulas do curso Da clínica extensa à alta teoria: meditações clínicas. Diz respeito às considerações sobre o regime de verdade próprio de uma ciência em formação que ainda precisa estabelecer níveis de abrangência de suas produções em teorias. No estágio inicial ela lida muito de perto com seu nascedouro em criação, isto é, com as formas possíveis que vai encontrando para explorar o objeto, que desafiadoramente surgiu como questão ou problema. A Psicanálise foi criada por Freud par e passo com a invenção que ia fazendo de um método de investigação interpretativa do sentido humano, descobrindo a psique. Entre a invenção do método interpretativo e a descoberta da psique, fundada na construção da noção de inconsciente, um espaço de tensão se forma, ocupado pela questão da verdade psíquica - um novo campo de saber, um ponto de vista em que as fronteiras da consciência expandem-se para lá da razão.

Palavras-chave: psicanálise; método psicanalítico; ruptura de campo; Teoria dos Campos; Fabio Herrmann.


ABSTRACT

This is an unpublished paper, a sub-section of Herrmann's written lectures for the course From the Extended Clinic to High Theory: Clinical Meditations. The paper deals with the considerations about the regime of truth that pertains to a science in formation, which is yet to establish the scope of its productions as theories. At its initial stage, this science works closely with its own origin in creation, that is, with the possible forms that are found in order to explore an object which defiantly emerges as an issue or problem. Freud created Psychoanalysis alongside the invention of an interpretive method of human meaning investigation, discovering the psyche. Between the invention of the interpretive method and the discovery of the psyche, founded on the construction of the notion of the unconscious, a space of tension is formed, engaged with the issue of psychic truth - a new field of knowledge, a point of view in which the frontiers of consciousness expand themselves beyond reason.

Keywords: psychoanalysis; psychoanalytic method; field rupture; Multiple Field Theory; Fabio Herrmann.


RESUMEN

Este texto es inédito, y pertenece a un conjunto de clases organizadas para el curso De la Clínica Extensa a la Alta Teoría: Meditaciones Clínicas. Presenta consideraciones respecto al régimen de verdad propio de una ciencia en formación, que todavía necesita establecer niveles de alcance en sus producciones teóricas. En la fase inicial, se encuentra muy cercana a su origen en creación, es decir, a las formas posibles que encuentra para explorar su objeto, el cual de manera desafiadora le ha surgido como cuestión o problema. El Psicoanálisis fue creado por Freud, al mismo tiempo en que iba inventando un método de investigación interpretativa del sentido humano y descubriendo la psique. Entre la invención del método interpretativo y el descubrimiento de la psique, fundada en la construcción del concepto de inconsciente, se forma un espacio de tensión ocupado por la cuestión de la verdad psíquica - un nuevo campo del saber, un punto de vista donde las fronteras de la conciencia se expanden más allá de la razón.

Palabras clave: psicoanálisis; método psicoanalítico; ruptura de campo; Teoría de los Campos; Fabio Herrmann.


 

 

Introdução: a clínica como empiria

O texto solicitado pela editoria da Revista Brasileira de Psicanálise é inédito e integra o conjunto de textos escritos por Fabio Herrmann para o último curso que ministrou, de 2002 a 2006, tanto no Instituto de Psicanálise da SBPSP como no Programa de Pós-graduação da PUCSP. Da clínica extensa à alta teoria: meditações clínicas constitui-se sem dúvida em uma revisitação do autor a sua obra, cujo início de produção data do final da década de 60 do século XX.

Essas Meditações clínicas explicitam e exploram a pergunta sobre a eficácia da Psicanálise1 que o pensamento psicanalítico da Teoria dos Campos responde. A resposta exigiu do autor um percurso por caminhos epistemológicos que, descendo aos fundamentos da Psicanálise, propiciaram o desvelamento do método psicanalítico como ruptura de campo, e a recuperação do valor de descoberta, tão vivo na obra de Freud, seu criador. A própria pergunta já nos indica que o pensamento psicanalítico produzido tem uma marca crítica.

A organização do curso em quatro meditações explicita a crítica na primeira delas, "A história da Psicanálise como resistência à Psicanálise"2, e o lugar da produção teórica em Psicanálise análogo à literatura de ficção na segunda, "O análogo"3. A terceira, "O tempo, o sujeito e a cura", explicita a exploração da característica que Freud deu a essa nova ciência de conjunção de conhecimento e cura. A última meditação faz um mergulho na intimidade da clínica, como é seu título, trabalhando-a como um campo de pesquisa. Em qualquer mergulho há dois movimentos conectados, o do impulso ascendente para facilitar ao mergulhador o movimento descendente na água, seja em uma piscina, em um rio ou no mar.

O texto que segue foi retirado desta quarta meditação. É seu segundo item e uma parada reflexiva no movimento ascendente do mergulho. Trata-se de considerações sobre o regime de verdade próprio de uma ciência em formação, ou uma ciência futura, que ainda precisa estabelecer níveis de abrangência de suas produções em teorias. O estágio inicial de um ramo de conhecimento lida muito de perto com seu nascedouro em criação, isto é, com as formas possíveis que vai encontrando para explorar o objeto, que desafiadoramente surgiu como questão ou problema. A Psicanálise foi criada por Freud par e passo com a invenção que ia fazendo de um método de investigação interpretativa do sentido humano, descobrindo a psique. Entre a invenção do método interpretativo e a descoberta da psique, fundada na construção da noção de inconsciente, um espaço de tensão se forma ocupado pela questão da verdade psíquica - um novo campo de saber, um ponto de vista em que as fronteiras da consciência expandem-se para lá da razão.

A clínica do sentido e da imersão de possibilidades criada pela Psicanálise - e que será trabalhada ao longo desta quarta meditação, para prosseguir na tarefa de consolidação de conhecimentos iniciada por Freud - pede atenção para esse regime de verdade que o texto discute. É necessária uma parada de cunho epistemológico, que tome em consideração a novidade de formas de construção de conhecimentos que a Psicanálise traz. Sem ela corremos o risco de que nos passe despercebida a constatação que dá título a esta introdução, a de que a clínica é nossa empiria.

Leda Herrmann4

 

A parábola do sertanista imantado, do índio e do laptop

Por falar na aventura freudiana, deixem-me contar por onde começou a minha - se o posso dizer assim, sem criar a falsa impressão de haver arriscado mais que a existência intelectual. Como tantos outros, imagino, não demorei a perceber que havia um descompasso interior na Psicanálise. O método psicanalítico, aplicado clinicamente, parecia funcionar às maravilhas, mesmo nas mãos, ou melhor, nas orelhas e boca inexperientes que o praticavam, as minhas. Já a teoria, nem tanto. O aparelho psíquico freudiano, tal como me era ensinado, com tantas emendas e correções, dava a impressão de ser complicado demais para poder funcionar; para explicar os efeitos da interpretação, em primeiro lugar, mas igualmente para fazer funcionar o homem. Como é natural com todos, pensei de início que não o estava entendendo direito. Voltava, vezes sem conta, aos textos básicos, esquematizava quadros sinóticos, tentava criar diagramas gerais, mas não conseguia tirar da cabeça a imagem de uma dessas engenhocas, que aparecem nas revistas em quadrinhos e nos desenhos animados, construídas com peças reunidas de eletrodomésticos desmontados - de criança, eu mesmo já tentara criar algumas, sem grande sucesso. O diabo é que, em separado, vários desses componentes funcionavam bem, como, aliás, os aparelhos íntegros, antes de minhas experiências amadorísticas.

Aos poucos, uma dúvida mais precisa me tomou de assalto. Como se sabe que é assim, como se faz para provar que a psique só pode ser assim? Via meus colegas - éramos todos ridiculamente jovens, então - dispersando-se em várias direções. Alguns trocavam a psicanálise por outras correntes de psicoterapia. A maioria ficou optando, porém, por simplificar o problema teórico, e aderiu a uma das escolas psicanalíticas que, pelo menos, oferecia uma receita clínica simples ou, como se dizia, por eufemismo, um esquema referencial. Os poucos que se mantiveram freudianos pareciam fazer uma escolha interna ao sistema; diziam: no meu trabalho, privilegio este ou aquele grupo de conceitos, ou não se pode tomar tudo ao pé da letra. Por azar, não conseguia fazer o mesmo. É lógico que o sistema kleiniano ou o de Bion eram imensamente mais simples, e que mesmo o de Lacan, com toda a complicação da linguagem dos Escritos, oferecia quando menos um operador unificado para a clínica. Mas a questão central persistia: como se prova que o homem é assim? Como se prova que o bebê tem mesmo tais mecanismos esquizo-paranóides, ou que o inconsciente possui exatamente essas formações? Nunca encontrei uma resposta convincente.

Hoje, passadas algumas décadas em que a aventura teve de conviver com a desventura, já não espero mais a resposta. Em compensação, aprendi a perguntar melhor. Para começo de conversa, a maior parte dos analistas, é duro admitir, aceita uma teoria como a gente acata uma opinião abalizada: Freud diz que é assim, eu me dou por satisfeito com ter chegado a entender. No máximo, aduz o conhecido argumento clínico - minha clínica o demonstra - sem parar para ponderar que, se os interpretantes5 de uma clínica são freudianos (ou se são kleinianos, por exemplo), eles naturalmente apontarão para o lugar de origem. Como o homem que sai à floresta guiado por sua bússola, mas carregando um ímã no bolso da calça6. Bem, minha clínica prova que é assim, mas a de meu vizinho, de outra escola, deve provar que é assado. Como ficamos?

Não, meus caros, àqueles de vocês que estão agora se aproximando da selva da Psicanálise, posso garantir que por aí só ficarão dando voltas. Nem adianta perguntar aos que já incorporaram uma corrente autodemonstrável, tendo a bússola no cérebro e o ímã no estômago.

Imaginem o índio que se cansa do movimento de tanta gente a dar voltas no mato e sai da choça a inquirir vários grupos de sertanistas perdidos, cada qual com ímã e bússola. Depois de umas quantas tentativas, nosso índio daria de ombros e voltaria para casa, mais convencido que nunca de que esses brancos são mesmo uns neuróticos - ele era leitor do Asterix. No caminho da taba, é provável que encontrasse diversos objetos abandonados pelos caminhantes fatigados. Entre estes, quase certamente, um laptop. Sendo um índio com espírito científico, como o são os índios que ainda não aprenderam que teoria se compra pronta, talvez o quisesse compreender. Depois de algumas tentativas vãs, teria anotado suas conclusões. Não se enganem, os índios de hoje já não são mais os de antigamente. 1) Ctrl + B serve para gravar. 2) C\: dir fornece a lista dos arquivos de um diretório. 3) Ctrl + Alt + Del dá um boot seco e perde as informações. 4) Os circuitos digitais funcionam no sistema binário. Por fim: 5) a bateria esgota-se com o uso.

- Por Tupã! - exclamaria, desapontado - onde encontro uma tomada de 110 nestes cafundós! A essa altura, talvez chegasse a simpatizar com os expedicionários perdidos. Tinha experimentado o que faz bem pra tosse.

Minha suspeita, já nos meus tempos de índio, sempre foi de que os elementos que compõem a teoria psicanalítica não são apenas esparsos, mas dizem respeito a planos irreconciliavelmente distintos do ser psíquico. No caso do computador, a primeira observação anotada por nosso analista selvagem refere-se ao Office, um aplicativo entre outros. A segunda, ao DOS, o sistema operacional. A terceira é uma ordem geral de software. A quarta é propriedade da linguagem de máquina. A quinta, o fluxo energético, um requisito do hardware. Medindo só o dispêndio de energia, é improvável que se possa decidir se um usuário está operando com o DOS ou com o Windows, por exemplo. Os softwares relacionam-se entre si e com o hardware, mas a análise dos rendimentos de um aplicativo informa muito pouco sobre o sistema operacional e, menos ainda, sobre o estado da máquina, somente se está funcionando ou não7. Se você está pensando que me refiro às relações entre pulsões (hardware), processo primário ou secundário (linguagem de máquina), angústia (software I/O), mecanismos de defesa (sistema operacional) e representação (aplicativo), acertou na mosca e pode ser promovido a pajé didata. Descobrir alguns indícios do funcionamento de planos distintos é uma proeza considerável. Nosso erro, dos índios da psique e sertanistas da clínica, foi o de vincular apressadamente aquilo que, muito vagamente, se supõe ocorrer em um certo plano, com alguns detalhes esparsos, descobertos noutro, noutro e noutro ainda; quando seria indispensável descobrir a totalidade de cada nível de organização, antes de inferir a relação entre os mesmos, se me faço entender. Do contrário, a teoria psicanalítica da clínica vai assemelhar-se a um artigo recentemente publicado no IJP (The International Jungle's Pc-user), que aconselhava ao explorador perdido com sua bússola e seu ímã: se não encontrar o caminho da tomada, salve o que puder, antes que a onça o delete.

 

Psicanálise, teoria, ciência

A Psicanálise é uma ciência, mas uma ciência futura. Por ora e por muitos anos, é de se supor, teorias complicadas, com muitas partes e muitos adendos, são e serão indecidíveis. A verdadeira aventura freudiana foi a de haver criado um método que fez por nós uma coisa que a filosofia vinha buscando durante milênios: mostrar que o senso comum, resultante da ação da rotina8, muito embora seja essencial para a vida quotidiana, não exprime a verdade psíquica. Os filósofos criaram hipóteses alternativas perfeitamente lúcidas, mas sem qualquer poder de convicção sobre o homem comum. O método psicanalítico, mesmo não sendo uma filosofia, ou talvez exatamente por isso, permite vencer momentaneamente a poderosa resistência contra experimentar o universo dos possíveis, a quase ilimitada variedade das possibilidades de experiência de que é dotada a proteica alma humana. Nisso consiste, diga-se de passagem, a verdade última do psiquismo, do ponto de vista da clínica: a verdade dos possíveis. Este é o caminho da cura analítica, a ruptura de cada campo aprisionador da experiência de ser.

E a teoria, então? Como ficamos? Se você é iniciante, ou se, mesmo experiente, conseguiu até aqui contornar a força de atração de um grupo escolástico, meu conselho é que estude Freud com cuidado. Procure entender de que assunto e em que nível de software ele está falando em cada texto - o que não é sempre fácil, cem anos depois -, e repare como seus esforços para juntar os diferentes planos de sua investigação, em teorias mais amplas, levam a produtivos questionamentos recíprocos, mas nunca se fecham em um sistema geral. Mesmo que, no afã de organizar sua vasta produção, ele às vezes sugira que sim. Note como logo depois se desdiz.

Veja a noção de inconsciente, a coisa mais parecida com E=mc2, em nosso ramo de conhecimento. Ela denuncia a autonomia da consciência racional com relação a sua lógica produtiva (irracional), com a mesma elegância com que Einstein denunciou a separação radical entre matéria e energia9. Descobrir que afetos, através da síntese emocional, convertem-se em ideias não é pouca coisa, evidentemente. Nem que a expulsão, no plano instintivo, funda o juízo intelectual de negação. Freud junta o que o senso comum separa, corpo e alma, razão e emoção, cultura e indivíduo, em um trânsito suave, que quando a gente mal se deu conta, já está rompido o campo das distinções consensuais mais arraigadas na humanidade. O haver inconsciente abre as portas para uma relativização tão eficaz de nossas ideias, crenças e princípios morais, que, se o nome já não tivesse dono, a Psicanálise poderia reivindicar o subtítulo de teoria da relatividade. Não estou brincando. Investigue com afinco os textos que tratam da demonstração do inconsciente, como A interpretação dos sonhos (Freud, 1900/1973). Mas é prudente nunca perder de vista que a noção de inconsciente pode rapidamente se transformar em um pretenso saber positivo sobre aquilo que há no inconsciente, como ele é composto, qual sua origem, quais os complexos de ideias que contém etc10.

A atitude que lhe proponho seguir é de um ceticismo tolerante, como aquele que Freud esperava de seu interlocutor imaginário. Se você já pratica a clínica psicanalítica, mas doutrina alguma ainda o convenceu, lembre-se dos equívocos do software e da armadilha do ímã, e sustente seu ceticismo, tanto quanto aguentar. Pelo menos, até o fim do curso. Se foi convencido por alguma doutrina, ou deve fidelidade a algum grupo de formação, talvez ele seja dispensável, afinal de contas. Mas, se ainda assim continuar, suportando as pressões escolásticas e meu mau hábito de exigir que os alunos pensem junto, é porque seu potencial cético ainda não foi soterrado, e que você tem boas chances como psicanalista, profissão para desilusionistas.

Pensemos em Picasso, um gênio, como Freud. Quando pintou a Mulher sentada, hoje exposto na Pinacoteca dos Modernos, em Munique, não tinha provavelmente a intenção de provar que, para ser linda, uma mulher tem que ter três olhos. Nem que os objetos só existem de fato na dimensão cubista. Nem, muito menos, que todos os seus amigos deveriam pintar a seu modo. O que Picasso demonstra com extrema felicidade é que, redimensionada em um perfil frontal, que lhe concede a possibilidade de um olho a mais, a pintura da modelo não deixa de ser esplendidamente uma mulher, desafiando nossa visão do feminino, da beleza e da pintura. Ao mesmo tempo, o espaço, que a arte da perspectiva pictórica esforçou-se durante séculos para tornar verídico e inconspícuo, retorna à tela gloriosamente (e às nossas consciências), com uma verdade superior à veracidade, e com uma beleza intrínseca só comparável, talvez fosse esta a razão do quadro, à sobranceira beleza da Mulher sentada. Picasso nem sempre via a mulher assim, nesse espaço cubista, a crer em sua galante reputação; mas via a mulher assim, nesse espaço, a crer em sua obra. Freud, creio eu, como Picasso, não estava primordialmente interessado em mostrar que a razão consciente é, na verdade, um produto da repressão do complexo de Édipo. Ele amava a razão, tanto quanto Picasso, as mulheres. Seu interesse, expresso na obra escrita, parece tender a demonstrar que a consciência pode ser vista em diversas dimensões, sem contradição aparente. Que exprime a atração de complexos inconscientes desconhecidos, possivelmente de três olhos ou mais, mesmo quando pretende resolver equações - ou as está criando, como no caso de Einstein. Ou seja, que a consciência racional faz parte de uma operação cuja lógica ainda está para ser compreendida. Em uma palavra, Freud - como Picasso, como Einstein - inaugura um espaço de relativização, potencialmente multidimensional, não cria uma doutrina. A doutrina vai por nossa conta, dos leitores pós-freudianos.

 

Relatividade relativa e seu absoluto

Neste curso sobre A intimidade da clínica, pretendo deixar que a clínica fale por si mesma. Não significa este propósito a negação ou o rebaixamento do valor da teoria psicanalítica, mas o reconhecimento de dois fatos. Que parte considerável da teoria psicanalítica pode não ser verdadeira, no mínimo indemonstrável, exprimindo com frequência apenas a opinião de analistas competentes, que perseguem o projeto de justificar sua forma de trabalho por meio de construções hipotéticas, que as poderiam, com efeito, justificar, se comprovadas, mas que não se podem deduzir com certeza de seus resultados clínicos. E, em segundo lugar, que o conjunto formado pelos sistemas psicanalíticos reúne componentes muito desiguais, mesmo o freudiano, no tocante a sua probabilidade de correção. Alguns, como a psicopatologia psicanalítica, apresentando fortes indícios de validade; outros, como a teoria geral dos instintos, sendo fruto, admitidamente, de uma especulação quase filosófica. Não é possível acreditar por igual na teoria psicanalítica. Fiel a esse espírito crítico, não querendo partir senão do que é razoavelmente certo, nossa aventura pela verdade psíquica, meta da clínica, vai guiar-se constantemente pelo princípio de que esta, a verdade psíquica, nada mais é senão o despertar dos possíveis: em que existe uma representação de si que ata o desejo humano a um sentido fixo nodal, desatar o nó, para que as diferentes possibilidades do sujeito entrem em choque, despertando a relatividade essencial da identidade e da realidade. Tal processo recebe o nome de ruptura de campo, e constitui, a meu ver, o eixo do método interpretativo inventado por Freud. O sentido último de cada inconsciente descoberto é a restauração da relatividade da consciência de que ele é o avesso.

Ora, essa história de relatividade presta-se a toda sorte de enganos. O mais comum é o de sacudir a cabeça e pensar com seus botões: isso eu já sabia, tudo é relativo... Está errado, nada é relativo até que se o demonstre de forma absoluta. Em face de um sólido e inegável absoluto é que os demais valores de verdade se relativizam. Relativo significa: relativo a. Para Picasso, a verdade da expressão artística é o absoluto frente ao qual a realidade perceptual se deve curvar. Einstein demonstrou a relatividade de tempo e espaço físicos, por ter levado às últimas consequências a observação anterior de ser a velocidade da luz o limite universal absoluto. Só quando fixamos o eixo de nosso pensamento em um absoluto e o acatamos resolutamente, é que, por decorrência, os outros parâmetros se tornam relativos.

Minha relativização da teoria psicanalítica, vocês já terão suspeitado, não envolve menosprezo, mas decorre de haver estatuído o método psicanalítico como fonte absoluta de todo e qualquer conhecimento possível na Psicanálise, dispondo-me a levar também às últimas consequências esta constatação. Ao considerar a Psicanálise uma ciência, a ciência geral da psique, já não posso admitir em seu corpo teórico senão aquilo que seu método demonstre. Não cabe em uma ciência nada daquilo que eu possa escolher por gosto, por comodidade, por respeito à autoridade de um mestre, ou porque casa bem com minha prática clínica costumeira. Ver para crer é um princípio razoável, porém a maioria das doutrinas psicanalíticas o inverte, ao sustentar suas teorias. Nesses casos: só crendo para ver. A nossa é, portanto, uma proposta de rigor.

Para torná-la mais clara, avancemos um pouco mais nestas considerações a propósito da verdade psíquica. Freud criou a Psicanálise. Ao fazê-lo, inventou um método geral de investigação interpretativa, do qual a clínica é um caso particular de aplicação, exemplar e, sem margem a dúvidas, o mais decisivo11. Valendo-se do método, descobriu a psique, pode-se dizer sem exagero, pois a moderna concepção de psique só faz sentido à luz da noção de inconsciente. Temos aqui três verbos inter-relacionados: criar, inventar, descobrir. Qualquer avanço decisivo em uma área de conhecimento envolve criação e, como se sabe, a manutenção do rumo, repetição. A criação científica é uma delicada composição de invenção com descoberta. Ideologias, movimentos partidários, religiões são invenção sem descoberta. Por outro lado, ao descobrir a nascente de um rio ou uma nova estrela, ao telescópio, temos descoberta sem invenção. O que é inventado não existia antes, senão como possibilidade, e pode-se, em boa fé, duvidar de seu valor, até que mostre o que é capaz de produzir. Aquilo que se descobre já existia, só podemos duvidar do acerto da descoberta, pondo em dúvida o instrumento utilizado pelo cientista ou sua integridade profissional. Isso é válido, porém, para o curso normal da prática científica, não para os momentos de criação. Nestes, a invenção vai de par com a descoberta. Aquilo que se inventa, um método geral ou algum procedimento particular, logo descobre diversas coisas que simplesmente não existiam para o conhecimento, pois foi criado um novo campo de saber ou uma nova maneira de ver dentro de algum domínio já estabelecido. Com isso, surgem objetos de conhecimento que sempre estiveram bem aí, como se poderia dizer depois, mas que, antes, não existiam em absoluto para fins práticos. Como veremos, a verdade psíquica é um desses campos.

 

Enfim, I//V//D

Para chegar a ela, tomemos agora um exemplo notável da química, ciência calcada na experimentação e avessa a construções teóricas especulativas. Todos já ouviram falar da tabela periódica dos elementos, criada por Mendeleiev12. A ideia da regularidade progressiva do número atômico dos elementos foi tipicamente uma invenção. Várias casas da tabela estavam em branco, assinalando o lugar de elementos desconhecidos, que pouco a pouco foram sendo descobertos. Na realidade, porém, quando a tabela inventada se foi provando eficaz, os elementos ainda faltantes já se podiam considerar meio descobertos. O de número atômico 98, por exemplo, antecipado pela tabela, resultou ser um elemento artificial, chamado Califórnio. Artificial? Claro, não encontrado na observação direta da natureza, mas produzido em laboratório. A magia da tabela periódica consiste, por conseguinte, em criar um novo reino natural, a série periódica, cujos componentes foram acrescentados à natureza, em alguns casos. Na expressão simplista dos manuais científicos, a descoberta do Califórnio corrobora a intuição de Mendeleiv. Todavia, este elemento já fora descoberto, chamava-se 98 e não ainda Califórnio, e tinha algumas propriedades, não todas as que depois se constataram.

Tudo se passa como se, entre invenção e descoberta, existisse uma lacuna, uma brecha, lugar da verdade que se institui. No caso da tabela de Mendeleiev, essa verdade heurística tem o caráter de antecipação: os elementos vão sendo descobertos, ou "criados", porque passaram a ter de existir. Vale dizer que se inventaram diversos instrumentos físico-químicos, como os aceleradores de partículas, que serviriam para descobrir empiricamente aquilo que já fora descoberto por antecipação heurística.

A rigor, a zona de eficácia veritativa no processo de criação não se encontra exatamente em I, na invenção, nem em D, na descoberta, mas no meio dos dois: I//V//D. Verdade (V), nesse sentido, não se confunde com confirmação, é promessa de nova produção de saber, possibilidade antecipada. O sentido de verdade, extremamente variável mesmo nas ciências, durante os períodos criativos equivale a uma promissória epistemológica. Nossa eterna ilusão retrospectiva, o julgamento a posteriori, afirma mediocremente que, saldada a promissória pela comprovação, a ideia revelou-se então verdadeira. Não é assim. Ela era antecipatoriamente verdadeira desde o início, portadora de uma verdade diversa daquela do fato. Na pura descoberta, a balança inclina-se para o polo da comprovação; na invenção pura, para o lado da probabilidade; mas na criação científica, o sentido de verdade decorre da tensão dialética entre invenção e descoberta (V). Se é verdade que certas invenções não descobrem nada, é também constatável que certas descobertas matam a invenção que as originou, destruindo suas demais potencialidades, por exemplo. Para compreender o momento criativo, e para preservá-lo, é necessário manter a tensão dialética entre I e D, ou seja I//V//D.

No caso da Psicanálise, por comparação ao da tabela periódica, devemos reconhecer semelhanças e diferenças. A química já existia ao tempo de Mendeleiev, a febre de descoberta de novos elementos já estava acesa. Talvez se possa dizer que a química ficou um pouco diferente depois; mas nada disso se compara com a revolução psicanalítica. Em nosso caso, fundou-se um ramo de conhecimento. Que digo? Uma nova árvore do conhecimento, uma ciência nova, que ainda está em formação. Também não se trata para nós de antecipar descobertas que, na química, se realizariam ou não, segundo uma rotina já bem estabelecida - muito embora, alguns elementos tenham sido "descobertos" por meio de procedimentos antes inexistentes, cuja criação se deveu, em grande parte, ao afã de os descobrir. Dizendo de outro modo, não existe uma ciência junto a qual se deva resgatar nossa promissória, como a química, para a tabela periódica. A comprovação das descobertas psicanalíticas só se pode dar dentro da própria Psicanálise. Assim sendo, não há como abreviar legitimamente a tensão dialética entre I e D: mesmo os critérios de comprovação de D dependem do perfeito esclarecimento de I, do método heurístico da Psicanálise.

A Psicanálise já descobriu uma vasta quantidade de coisas perfeitamente novas e bastante sustentáveis. Todavia, estando ainda em processo de criação como ciência - com meros cem anos de vida -, ainda vigora para ela o espaço heurístico da codeterminação entre invenção e descoberta. Pelo menos até que seu método seja esclarecido por completo. Não contamos com uma rotina estabelecida de investigação universalmente aceita, por exemplo. O que, por um lado, é bom, pois o período de criação é mais rico que o de confirmação/repetição.

Como nas demais ciências, porém, os tempos não se decidem por decreto nem há linhas demarcatórias claras entre eles. Ao mesmo tempo em que os criadores da ciência psicanalítica, como Freud, como Lacan, mergulham de cabeça no problema da verdade heurística, uma legião de analistas deseja praticar a clínica sem perturbações epistemológicas ou dores de cabeça dialéticas. Isso não só é possível, como desejável, pois sem o acervo das experiências menores, a Psicanálise estaria prisioneira da torre de marfim da especulação epistemológica. O único problema grave dessa antecipação prática da comprovação e consequente aplicação, segundo creio, reside na exigência de segurança antecipada, que exigem os praticantes. Não lhes parece confortável, e com toda a razão, que se lhes diga que devem preservar a tensão dialética entre I e D, como forma de V. Eles querem saber se a teoria instintiva de Freud é uma invenção ou se é uma descoberta, se os sentimentos primários dos bebês são mesmo como postula Melanie Klein. E, in dubio pro reo, que parece ser traduzido barbaramente: na dúvida para o reles, optam, portanto, pelo D, pelas estruturas pulsionais, e se tornam freudianos, ou pelas posições, e se tornam kleinianos. É natural. No entanto, quando chegarmos a ter instrumentos psicanalíticos verdadeiramente confiáveis para a investigação da estrutura instintiva ou dos primórdios do pensamento, é quase certo que instintos e mecanismos originais mostrar-se-ão radicalmente diferentes daquilo que as escolas propõem e os clínicos adotam. Talvez - há leves indícios nessa direção - instintos ou pulsões acabem por serem concebidos como sistemas energéticos de agregação estrutural, como a estabilidade de forma e a energia de posição, e não como combustível do trabalho psíquico; enquanto as primeiras experiências emocionais talvez venham a ser traduzidas em termos de engramas formais, de conteúdo evanescente. Quando isso acontecer, e caso a Psicanálise consolide-se como ciência da psique, será talvez possível render uma justa homenagem aos criadores, Freud e Melanie Klein no caso, reconhecendo a perspicácia com que avançaram hipóteses fecundas, mesmo sem contar com instrumentos interpretativos precisos. Hoje, há o risco de que "o reles D", a assunção apressada de valor factual de descoberta para certas hipóteses demasiado gerais e simplistas, venha a paralisar o pólo I, a investigação metodológica das condições de verdade dos conceitos psicanalíticos. Há outro ditado jurídico parecido, que é prudente jamais esquecer: in dubiis abstine - na dúvida, abstém-te.

Nem sempre a descoberta mata a invenção, todavia. Mesmo descobertas que não o são podem favorecer a quitação da verdade promissória de uma ciência em construção. Como a tabela periódica, a invenção da teoria da evolução das espécies, por Darwin, provocou uma corrida, não mais aos elementos, mas ao elo perdido entre o macaco e o homem, como assim se pensava. A "descoberta" do homem de Piltdown, na Inglaterra, uma notória e escandalosa impostura científica - tratava-se de um crânio de primata cuja mandíbula fora, inventivamente, forjada por algum dentista - parece haver estimulado decisivamente a procura de outros restos que testemunhassem o acerto da hipótese de Darwin. Crendo saber que um deles já fora encontrado, a determinação dos pesquisadores sentiu-se fortalecida, e rapidamente vieram à luz achados arqueológicos definitivos, que demonstraram e corrigiram a invenção darwiniana. Não se tratava do elo entre macaco e homem, e daí? O fato é que, quando vergonhosamente a impostura teve de ser confessada, décadas depois, o evolucionismo, de fantasiosa hipótese blasfema, havia se convertido em verdade científica13.

 

A verdade na clínica e a ética do método

Para a clínica, que é o que nos interessa neste curso, o estatuto de verdade está fortemente alicerçado em I//V//D. Descobertas fundamentais na clínica rompem o campo de certos pressupostos teórico-técnicos, tidos como imutáveis, desobstruindo o caminho para a especificação completa do método psicanalítico. Mas, como é inevitável durante o período criativo, gera dissensões e desconfiança, pois sempre se está propenso a segurar qualquer verdade aparente, quando nos encontramos em uma zona de instabilidade científica. Dou-lhe um pequeno exemplo pessoal. O conceito de ruptura de campo leva forçosamente, como ainda veremos melhor, a pôr em dúvida que o efeito psicanalítico geral dependa em essência de o analista acertar em cheio um "conteúdo inconsciente" do analisando - existem também efeitos especiais da direção teórico-técnica a que se filia o analista, mas essa é uma outra história. Como ainda veremos, através de exemplos concretos, o desencadeamento de um efeito interpretativo costuma advir de certa confluência paradoxal entre falas do analista e do paciente, de mal-entendidos aparentes, de pequenos equívocos sobre o tema em pauta, de distorções de memória etc. Em uma palavra, a interpretação eficaz tem a forma geral de um ato falho a dois14. Creio ser esta uma descoberta de certa importância, em especial porque esclarece decisivamente a invenção freudiana do método interpretativo da Psicanálise. Tem as características de uma verdade psíquica, ou seja, I//V//D. Entretanto, ela se choca frontalmente, como vocês percebem, com a ideia estabelecida de que a interpretação deve apontar para um dos problemas inconscientes do analisando, a fim de tirá-los do inconsciente, um a um. A reação geral dos colegas à noção de interpretação como ato falho parece ser, ainda hoje, quase unânime: você não está dizendo isso a sério, está?

Sejamos otimistas, porém. É possível que a Psicanálise rompa o campo do dogmatismo - que afirma a verdade, sem perguntar qual seu estatuto peculiar em cada caso - e complete-se como ciência, no futuro. Caso contrário, não apenas deixará de ter maior interesse, pois técnicas terapêuticas vão como vêm, mas sua prática atual terá levantado um problema ético de monta. A aplicação de um conhecimento em construção só pode ser justificada eticamente pelo avanço em direção a completá-lo - movimento para o qual sua aplicação, no período construtivo, fornece um dos motores principais. Imagine-se o caso do atendimento de pacientes hospitalares, por interesse científico, se por desgraça chegássemos a constatar que não há qualquer pesquisa em andamento.

Mas talvez vocês estejam se perguntando: não será possível praticar a clínica sem ser obrigado antes a tomar o partido de um conjunto teórico ainda não demonstrado? É óbvio! Eticamente, aliás, isso é quase uma obrigação. Se nosso compromisso é com a verdade psíquica, a primeira coisa a fazer é não lhe dar um caráter falso. Verdade psíquica não é sinônimo de fortes emoções, como na novela das oito, nem de um conjunto arbitrário de regras de comportamento, como no manual de boas maneiras. Ela é, no momento, o regime de criação: I//V//D. Nosso V, tensão entre I e D, é o movimento em que as propriedades da invenção, ou seja, do método interpretativo, se vão esclarecendo à medida que seus derivados teóricos são arriscados em novas descobertas, e são refutados ou corrigidos por elas.

Permitam-me uma sentença de peso, no fim da aula: a verdade psíquica é o próprio método que a descobre. O método que, como vimos na aula passada, lhe tira a cobertura formada por seus produtos. O parentesco profundo entre método interpretativo e psique, aquilo que denominei espessura ontológica do método, é uma propriedade fundamental dos períodos criativos das ciências: pode ser encontrado sempre que um avanço decisivo, ou a criação de novo campo científico (nosso caso), gera uma nova região de objetos de conhecimento. Esta nova região aparece, de início pelo menos, com as características mesmas do processo (I) de descoberta (D) - sua natureza é inexoravelmente híbrida de método e objeto, que vem a ser nossa situação atual, em que os fatos partejados ainda estão úmidos do líquido amniótico do útero metodológico que os gerou15. Ao cumprir seu papel anônimo, mas fundamental, nessa aventura em busca da verdade, o clínico pode e deve manter-se em sua prática com as poucas verdades até agora alcançadas, mas sobretudo dentro do regime de verdade que nesta aula acabamos de analisar com o rigor possível.

 

Referências

Freud, S. (1973). The interpretation of dreams. In S. Freud, The standard edition of the complete psychological works of Sigmund Freud (Vol. 4, 5). London: Hogarth Press. (Trabalho original publicado em 1900).         [ Links ]

Herrmann, F. (2001a). Andaimes do real: o método da psicanálise (3ª ed). São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Herrmann, F. (2001b). Andaimes do real: psicanálise do quotidiano (3ª ed). São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Herrmann, F. (2002a). Da clínica extensa à alta teoria - primeira meditação. A história da psicanálise como resistência à psicanálise. Percurso, XV(29), 15-20.         [ Links ]

Herrmann, F. (2002b). O escorpião e a tartaruga. In F. Herrmann, A infância de Adão e outras ficções freudianas. São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Herrmann, F. (2004a). Introdução à teoria dos campos (2ª ed). São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Herrmann, F. (2004b). Nossa clínica. In F. Herrmann, Introdução à teoria dos campos (2ª ed). São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Herrmann, F. (2008-nov). A fragmentação dos discursos psicanalíticos. Língua/Especial Psicanálise e Linguagem        [ Links ]

Herrmann, F. (2012). Quem? Hoje Joyce. IDE, 34(53),109-122.         [ Links ]

Herrmann, L. (2007). Andaimes do real: a construção de um pensamento. São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

 

 

Correspondência:
Leda Herrmann
[Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo]
R. Girassol, 34, 102
05433-000 São Paulo, SP
Tel: 11 3088-8123
herrmannfl@globo.com

Recebido em 10.7.2012
Aceito em 31.7.2012

 

 

1 Na Teoria dos Campos, o uso de maiúscula para Psicanálise diz respeito à referência ao ramo do conhecimento, distinguindo-o das referências a suas adjetivações, como psicanálise clínica, grafadas em minúsculas.
2 A primeira parte dessa meditação foi publicada em 2002 na revista Percurso, sob o título de "Da clínica extensa à alta teoria - primeira meditação. A História da Psicanálise como Resistência à Psicanálise" (F. Herrmann, 2002a).
3 O primeiro e terceiro itens foram publicados na revista Língua/Especial Psicanálise e Linguagem, sob o título "A fragmentação dos discursos psicanalíticos" (F. Herrmann, 2008). O segundo, "Quem? Hoje Joyce", saiu na revista IDE (F. Herrmann, 2012).
4 Psicanalista, Diretora Científica e membro efetivo da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo SBPSP, Presidente do Centro de Estudos da Teoria dos Campos CETEC, Doutora em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUCSP. (As notas e resumos deste artigo são de Leda Herrmann).
5 Para Fabio Herrmann, interpretante é o elemento que medeia a transformação de um material discursivo oferecido pelo paciente e a compreensão analítica, exercendo uma função teorizante. Quando retirado diretamente de esquemas teóricos já consagrados, o próprio processo teorizante fica limitado a redescobrir o já descoberto, perdendo sua possibilidade heurística (Cf. L. Herrmann, 2007, p. 62).
6 Em "Há o inconsciente (à guisa de conclusão)", o último capítulo da quarta parte de Andaimes do real: o método da psicanálise (F. Herrmann, 2001a, p. 326) usa essa metáfora como ilustração da situação aprisio-nadora de se usar teorias como um a priori na escuta analítica. A bússola é o método interpretativo, mas se sua agulha (a escuta analítica) não puder girar livremente, devido à imantação de teorias produzidas em situações anteriores de descoberta, o resultado é o andar viciado em círculos que leva sempre ao mesmo lugar. A bússola perde seu poder de precisão de indicar o norte, para indicar o ímã no bolso, ou a teoria que o analista carrega na cabeça.
7 Este texto foi escrito no início de 2003 quando o Windows, sistema operacional criado pela Microsoft, embora dominante para os usuários de computadores, não nos havia apagado da lembrança o sistema operacional que o precedeu, o DOS, que exigia passos para que acessássemos um arquivo de texto, por exemplo. O arquivo não se apresentava em uma janela na tela imediatamente, precisávamos entrar pelo disco C, digitando na tela preta inicial todo caminho de sua localização, que se iniciava por "C:\dir". Na hierarquia da linguagem dessa máquina que não mais podemos dispensar, o fluxo energético é o que a desperta - quando acaba a bateria ou a energia elétrica ficamos desesperados pela impotência de não podermos nos conectar. Ele está na base da hierarquia dessa linguagem de dois dígitos, isto é, o computador usa as combinações da linguagem binária para "tomar suas decisões" - ou é 0 ou é 1. O sistema operacional - DOS, Windows, Mac -, o hardware, é o nível seguinte que nos permite acesso por clique ao programa que queremos usar, ou seja, ao software. Este, por sua vez, está alocado em um aplicativo, que o controla - o Word 2003, software que uso e que me permite pôr no papel, ou melhor, na tela, estas palavras, pertence ao aplicativo Office, que controla este e outros softwares, como o Power Point, por exemplo. Fabio usa os níveis da linguagem de computador como metáfora para a identificação de níveis na construção teórica da Psicanálise que só se mostram se a considerarmos nessa perspectiva.
8 Rotina é um importante conceito desenvolvido por este pensamento psicanalítico. Permeia a obra de Fabio Herrmann. É tomada como uma função opacificadora das camadas produtoras das representações mentais de identidade e de realidade, que por darem a impressão de serem só aquilo que mostram, tornam-se parciais e rotineiras (Cf. F. Herrmann, 2001b, principalmente capítulos 1, "O momento da Psicanálise" e 12, "Conclusão: realidade e real na obra freudiana").
9 Pela equação E=mc2: energia é igual à massa vezes velocidade ao quadrado.
10 A noção freudiana de inconsciente é revisitada na quarta parte, "Há o inconsciente", do livro Andaimes do real: o método da psicanálise (F. Herrmann, 2001a), retirando-lhe a carga de um saber positivo e conteudís-tico.
11 Uma discussão aprofundada do método psicanalítico pode ser buscada em Andaimes do real: o método da Psicanálise (F. Herrmann, 2001a). Em Introdução à teoria dos campos (F. Herrmann, 2004a), pode-se encontrar uma visão panorâmica do método em sua relação com as teorias da Psicanálise. À frente, de qualquer modo, o método será exemplificado exaustivamente em sua aplicação clínica (NT do autor).
12 Foi no livro Princípios de Química, de 1869, que Mendeleiv publicou sua tabela periódica dos elementos.
13 Em "O escorpião e a tartaruga", do livro A infância de Adão e outras ficções freudiana (2002b), Fabio refere essa farsa científica criando um conto heurístico para abordar as entranhas da produção de descobertas na construção de conhecimentos.
14 Cf. F. Herrmann (2004b, cap. 17).
15 Por espessura ontológica do método, Fabio expressa sua ideia de interpenetração entre operador e objeto psicanalíticos: "Devemos conceder ao método da Psicanálise um estatuto singular, híbrido, operação do analista, mas estrutura psíquica do paciente, dotado de certa espessura ontológica: é a operação que recupera a constituição psicológica que a originou" (F. Herrmann, 2001a, p.30, Introdução).

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