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Revista Brasileira de Psicanálise

Print version ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál vol.48 no.4 São Paulo Sep./Dec. 2014

 

ARTIGOS TEMÁTICOS: SEXUALIDADE E GÊNERO

 

Repensando o complexo de Édipo

 

Rethinking the Oedipus Complex

 

Repensando el complejo de Edipo

 

 

Leticia Glocer FioriniI; Tradução Sonia Scala Padalino

IMédica. Psicanalista didata e presidente da Associação Psicanalítica Argentina (APA). Foi diretora editorial da Associação Internacional de Psicanálise (IPA) e da APA. Publicou o livro Lo femenino y el pensamiento complejo e é editora e autora de On Freud's femininity, entre outros livros. Publicou também numerosos artigos e capítulos de livros sobre feminidade, parentalidade e diferenças sexuais

Correspondência

 

 


RESUMO

A autora propõe que a leitura do complexo de Édipo seja feita à luz das questões contemporâneas que influenciam a construção da subjetividade. Toma para isso dois pontos de partida: (1) as mudanças na posição feminina nas sociedades atuais, principalmente ocidentais; e (2) a maior visibilidade e aceitação das diferentes apresentações sexuais e de gênero que se afastam dos padrões tradicionais. Considera que estejam em jogo, entre outras, as seguintes questões: (a) as concepções sobre a diferença sexual; (b) o conceito de masculinidade e feminidade; (c) a prioridade fálica; (d) a inveja do pênis na menina; (e) a noção de desejo; (f) as funções paterna e materna. Analisa a importância de mergulhar em suas genealogias para pensar na posição feminina e nas novas configurações relacionais. Aborda o conceito de homossexualidade e sua equiparação com a perversão. Propõe analisar os pontos cegos e aporias do complexo de Édipo quando considerado como explicação última da construção da subjetividade sexuada, a partir da historicização desta narrativa. Ressalta a significação da noção de "castração" como incompletude. Aborda a necessidade de pensar num complexo de Édipo ampliado, o complexo de Édipo completo. Do mesmo modo, inclui a proposta de Deleuze de um Édipo transfamiliar, vacuolar, que supere o modelo da família nuclear. A proposta é considerar de modo triádico as variáveis que estão em jogo na construção de subjetividade, para mais além dos clássicos binarismos.

Palavras-chave: complexo de Édipo; diferença sexual; função paterna; desejo de filho; feminidade/ masculinidade.


ABSTRACT

The author proposes that the interpretation of the Oedipus complex be made in light of the contemporary issues which influence the construction of subjectivity. To that end, she considers two starting points: (1) the changes in the female position in current societies, specially the Western ones; and (2) the greater visibility and acceptance of the different sexual and gender manifestations which diverge from traditional standards. She considers the following matters, among others, to be at stake: (a) the conceptions surrounding sexual difference; (b) the concepts of masculinity and femininity; (c) the phallic priority; (d) penis envy in the girl; (e) the notion of desire; (f) the maternal and paternal roles. The author analyses the importance of immersing oneself in the genealogy of these matters to reflect on the female position and on new relationship configurations. She approaches the concept of homosexuality and the fact that it is considered a form of perversion. She proposes the analysis of the blind spots and aporias of the Oedipus complex when considered the ultimate explanation of the construction of sexuated subjectivity, from the historicising of this narrative. She emphasises the signification of the notion of "castration" as incompleteness. She approaches the need to think of a broadened Oedipus complex, the complete Oedipus complex. In the same manner, she includes Deleuze's proposal of a transfamiliar, vacuolar Oedipus, which overcomes the nuclear family model. The proposal is to consider in a triadic way the variables at stake in the construction of subjectivity, going beyond the classic binarity.

Keywords: Oedipus complex; sexual difference; paternal role; child's desire; femininity/masculinity.


RESUMEN

La autora propone leer el complejo de Edipo a la luz de las problemáticas contemporáneas que inciden en la construcción de subjetividad. Toma para ello dos puntos de partida: (1) los cambios en la posición femenina en las sociedades actuales, principalmente occidentales; y (2) la mayor visibilización y aceptación de las diversas presentaciones sexuales y de género que se alejan de los cánones tradicionales. Considera que se ponen en juego, entre otras, las siguientes cuestiones: (a) las concepciones sobre la diferencia sexual; (b) el concepto de masculinidad y feminidad; (c) la prioridad fálica; (d) la envidia del pene en la niña; (e) la noción de deseo; (f) las funciones paterna y materna. Analiza la importancia de bucear en sus genealogías para pensar en la posición femenina y en las nuevas configuraciones vinculares. Se aborda el concepto de homosexualidad y su homologación con la perversión. Propone analizar los puntos ciegos y aporías del complejo de Edipo en tanto es considerado como explicación última de la construcción de subjetividad sexuada, a partir de historizar esta narrativa. Se acentúa la significación de la noción de "castración" como incompletud. Se aborda la necesidad de pensar en un complejo de Edipo ampliado, el complejo de Edipo completo. Asimismo, se incluye la propuesta de Deleuze de un Edipo transfamiliar, vacuolar, que exceda el modelo de la familia nuclear. La propuesta es considerar en forma triádica las variables en juego en la construcción de subjetividad, más allá de los binarismos clásicos.

Palabras clave: complejo de Edipo; diferencia sexual; función paterna; deseo de hijo; feminidad/masculinidad.


 

 

Coexistências em tensão

O objetivo deste trabalho concentra-se na leitura do complexo de Édipo à luz dos problemas contemporâneos que influenciam a construção da subjetividade. Existem, nesse sentido, duas perspectivas que considero importantes como pontos de partida: (1) a modificação da posição feminina nas sociedades atuais, sobretudo ocidentais; e (2) a maior visibilidade e aceitação das diferentes apresentações sexuais e de gênero que se afastam dos padrões tradicionais. Estas duas perspectivas impõem uma revisão completa do complexo de Édipo como eixo dos processos de subjetivação sexuada, tal como proposto no campo psicanalítico.

Não é minha intenção liquidar apressadamente essas questões recorrendo a respostas predeterminadas, mas sim levantar perguntas sobre as respostas que se apresentam como já dadas. Isso implica delimitar as zonas de discussão, pontos cegos e paradoxos que inevitavelmente se colocam.

Sabemos que o complexo de Édipo corresponde a um mito grego no qual Freud se baseou para explicar a interação entre desejos e identificações que conduzem, em sua resolução, bem ou menos bem-sucedida, a uma posição exogâmica do sujeito, mediante a proibição do incesto. Por meio dessa resolução, o homem adota uma posição masculina, e a mulher, uma posição feminina.

Indubitavelmente, ao introduzir o complexo de Édipo como elemento fundamental da construção da subjetividade sexuada, Freud se afasta da concepção naturalista da diferença sexual, embora em outros pontos de sua obra afirme que "a anatomia é o destino". Essas duas propostas entram em contradição no contexto da lógica formal. Se as considerarmos, porém, com outras lógicas, que levem em conta as relações entre conjuntos heterogêneos, poderemos pensar essas duas variáveis a partir de uma coexistência em tensão. Em outras palavras, a proposta é manter os termos contraditórios, em suas concordâncias e discordâncias, sem renunciar a nenhum deles. As séries complementares são um antecedente inevitável. Do mesmo modo, as teorias da hipercomplexidade (Morin, 1986/1988, 1990/1995) constituem uma ferramenta necessária do ponto de vista epistemológico, já que sustentam que pode haver uma coexistência em tensão de variáveis heterogêneas que não necessariamente se resolvem em uma síntese dialética superadora.

O complexo de Édipo é visto por alguns autores como um mito; por outros, como um complexo, um modelo ou então uma estrutura. Ressaltemos que o mito de Édipo é também uma narrativa que remete a um imaginário, individual e coletivo, com efeitos simbolizantes. Para Lacan (1958/1970), o valor estruturante reside no complexo de castração, mais do que no complexo de Édipo.

Em relação à proposta deste trabalho, o conceito de estrutura que usamos não é o do estruturalismo, no sentido de propor estruturas eternas, a-históricas e imutáveis, que só admitem modificações "superestruturais" por influência das diversas épocas. Ao contrário, considero a proposta de Sartre (1963) de que as próprias estruturas são historicizáveis e sujeitas a modificações.

Nesse sentido, vou abordar o complexo de Édipo como uma metáfora que tende a explicar de que modo um menino ou menina se introduz simbolicamente num universo de laços sociais. Não em qualquer universo simbólico, porém, mas naquele que é sustentado por uma legalidade e vigência histórica em particular. Desse modo, sustento também que não haveria uma ordem simbólica eterna e imutável.

Volto, então, a Freud. Existem duas linhas na obra freudiana: uma delas - que constitui uma de suas grandes descobertas - é a sexualidade infantil "perverso-polimorfa", ou seja, envolve o campo pulsional, sempre fragmentário, desordenado, não unificado; a outra é a linha que propõe uma hipótese para explicar de que modo esse menino ou menina "pulsional" se organiza em sua sexualidade e em seus processos de subjetivação, a partir de uma legalidade cultural. Surgem, aqui, várias explicações que não se excluem necessariamente, mas, ao contrário, podem também ser vistas em interface. De um lado, o complexo de Édipo/castração em termos de desejos e identificações vinculados à tríade mãe-pai-filho/a e sua resolução simbólica. De outro, a teoria do desenvolvimento em fases libidinais (oral, sádico-anal, fálica e genital). Poderíamos acrescentar ainda mais uma: a do narcisismo até o amor objetal. Nesse ponto, é necessário esclarecer que a teoria das fases evolutivas não é exclusivamente sequencial, mas implica coexistências e ressignificações.

Com qualquer uma dessas explicações, a resolução edípica indica a escolha heterossexual do objeto, no âmbito da unificação pulsional, o acesso à exogamia e a formação do Superego.

Em última análise, entram em jogo as seguintes questões: (a) as concepções sobre a diferença sexual; (b) o conceito de masculinidade e feminidade; (c) a prioridade fálica; (d) a inveja do pênis na menina; (e) a noção de desejo; (f) as funções paterna e materna.

Sem dúvida, isto se insere num grande debate sobre o papel que o reconhecimento e a aceitação da diferença sexual exercem na construção da subjetividade. Mais adiante, discutirei os múltiplos significados do conceito de diferença. Como ressaltado, a ênfase nas determinações anatômicas ou no poder performativo dos discursos pode conduzir a abordagens diferentes, salvo quando se trabalha nas zonas de cruzamento, de intersecção. Por isso, surge a pergunta: é necessário escolher? Ou então, novamente: existirão formas lógicas de abordar tudo isso para além das polaridades excludentes - nos cruzamentos, nas intersecções ou nas interfaces entre estes determinantes?

 

Contribuições freudianas

♦ Ao introduzir o complexo de Édipo, Freud se afasta de uma determinação naturalista e biológica e complexifica a noção de diferença sexual.

♦ Apresenta um esquema imaginário que revela os itinerários do desejo e as identificações no menino, além de sua importância na construção da subjetividade.

♦ Diferencia o desenvolvimento sexual da menina e do menino, embora privilegie um organizador central: o falo. Descreve uma fase pré-edípica muito prolongada na menina.

♦ Para Mitchel e Rose (1982), ao introduzir a fase fálica e a inveja do pênis na menina, Freud está descrevendo o estado das coisas num contexto sociocultural determinado, baseado nas pacientes histéricas que tratou.

 

Questões

a) O complexo de édipo e a polaridade masculino-feminino

O ponto de vista clínico mostra, a meu ver, que as observações de Freud sobre o complexo de castração no menino correspondem a questões observáveis na clínica, e que poderíamos considerar fundantes de subjetividade em relação aos padrões vigentes de masculinidade. A angústia de castração atravessa a sexualidade do menino. É nesse sentido que o confronto com a diferença sexual promove a construção de uma teoria que protege o narcisismo do menino ao projetar a "castração" na menina: a teoria da castração no sentido freudiano.

Já no caso da menina, há várias questões a discutir e rever (Freud, 1931/1986c, 1933/1986a):

- Seria a inveja do pênis a explicação principal do desenvolvimento libidinal da menina?

- Existiría uma masculinidade primária na menina, como afirma a teoria freudiana, ou, como propõem outros autores (Jones, 1927/1979), ela é secundária? Essa masculinidade primária é um fundamento para a construção de subjetividade na menina?

- O que fundamentaria a afirmação de que essa masculinidade primária, proposta por Freud, seja representada por um órgão, o clitóris, se não levarmos em conta analogias simplistas?

- Deveríamos pensar que a renúncia ao gozo clitoridiano, proposta por Freud (1925/1984), é uma hierarquização da função reprodutora da mulher para a conservação da espécie, fato que mencionou ao longo de sua obra?

- O Superego da menina é mais fraco, menos rigoroso, do que o do menino?

- Finalmente, e não menos importante, consideremos os três desfechos do Édipo na menina apresentados por Freud (inibição, complexo de masculinidade e maternidade) e sua proposta de que a maternidade é a meta principal da feminidade, meta privilegiada do desenvolvimento libidinal da menina. Nessa linha, não surgem conceituações da sexualidade feminina independentes da maternidade, já que as outras opções seriam a frigidez ou o complexo de masculinidade (Glocer Fiorini, 1994, 2001a). As perguntas, então, são: é possível se pensar em uma sexualidade feminina independente da maternidade e da histeria ou do complexo de masculinidade? E ainda, é possível se pensar num não desejo de filho na mulher? Pode-se responder afirmativamente que sim, é possível. Mas, nesse caso, é necessário rever as limitações da teoria sobre esse tema, para que estas questões possam ser reformuladas e ter inclusão teórica.

Nesse sentido, eu havia proposto em outras publicações (Glocer Fiorini, 2001a) que o conceito de maternidade em psicanálise está ligado de modo inextricável à noção de filho-falo, baseada numa carência fundamental da mulher. O filho seria sempre um substituto para esta carência e chegaria a preenchê-la. Através da inveja do pênis - com base no conceito de carência ligado à mulher -, não haveria outra explicação convincente para o desejo de filho e para a maternidade. A equação pênis-filho seria o único argumento possível. O filho estaria, então, destinado, de modo inexorável, a ser exclusivamente um filho-falo. Isso pode acontecer principalmente nas histerias, mas sustentamos que não é generalizável, pois, nesse caso, seria impossível pensar na alternativa de que a mãe possa considerar o filho como "outro". A intervenção paterna, como função, poderia levar a um corte, mas não necessariamente a que a mãe aceite a alteridade do filho (Glocer Fiorini, 2013).

Havíamos, por isso, proposto a necessidade de rever o conceito de função paterna e separá-lo de suas conotações patriarcais. Certamente, a denominação "paterna" já é suficiente para equipará-la às estruturas patriarcais, ainda que se sugira abstraí-la e considerá-la uma função de caráter estrutural. Nessa linha, sugeri denominá-la "função terceira", que pode ser exercida por outros, incluindo a mãe com suas próprias reservas simbólicas. Isso garantiria que a mãe também pudesse exercer essa função terceira e reconhecer o filho em sua alteridade.

Do mesmo modo, propus em outra publicação que se reconsidere o conceito de desejo de filho (Glocer Fiorini, 2001b). Se este conceito for pensado a partir de uma carência originária que pode ser suprida apenas através da equação simbólica pênis-filho, o filho será sempre um filho-falo. Por este motivo, recorri ao conceito de desejo de Deleuze (1977/1980): o autor sustenta que o desejo não surge de uma carência fundamental, mas é produção, é poiesis, e que a carência é um resultado do desejo, e não o contrário. Assim, o desejo de filho não teria apenas uma única explicação e também poderia ser considerado a partir de outros pontos de vista, que permitiriam ainda reconhecer a alteridade do/a filho/a. Isso tem fortes repercussões na clínica. Além disso, usar exclusivamente a inveja fálica e o conceito de filho-falo como explicação leva alguns analistas a superinterpretar a inveja fálica nas mulheres ao equiparar histeria com feminidade.

Repensar, do modo descrito, o conceito de filho-falo, a partir da reformulação da assim chamada função paterna e da noção de desejo de filho, é fundamental para conceituar de outra forma a maternidade, ampliando sua abordagem edípica clássica. A noção de filho-falo não é excluída, mas sim incluída num panorama complexo, analisável na singularidade de cada caso.

Desta maneira, propomos considerar os processos de subjetivação sexuada em seu caráter multicêntrico. Essas questões foram motivo de debate desde o início da psicanálise. Lembremos que o próprio Freud (1931/1986c) declarou que seu conhecimento sobre as mulheres não lhe permitira chegar a resultados satisfatórios nesse tema.

b) O complexo de Édipo frente às diversidades sexuais e de gênero e as novas configurações familiares

Ora, se assumirmos a outra perspectiva que levantei, torna-se imprescindível pensar de que modo as migrações sexuais e de gênero influenciam a conceituação dos processos de subjetivação sexuada. As homossexualidades, os transexualismos, travestismos, sexualidades queer em geral e as novas formas de casal e família representam um desafio que leva a rever certas propostas teóricas que influenciam a clínica (Glocer Fiorini, 2010b, 2010c). Com base nesse amplo campo, enfocamos a homossexualidade, neste trabalho, como um tema a ser analisado em relação à resolução do complexo de Édipo/castração e o acesso à diferença sexual. Trata-se de uma questão de enormes implicações sociais, éticas e jurídicas, com efeitos poderosos sobre os processos de subjetivação. Se a resolução do complexo de Édipo leva à heterossexualidade como desfecho concordante com a norma, deparamo-nos com a questão de como pensar a homossexualidade, que foi tradicionalmente categorizada como perversão. E não só: nas sociedades em que existem casais e famílias não convencionais, com filhos a serem educados e inseridos na sociedade, ficariam estes excluídos do tecido social, simbólico (Glocer Fiorini, 2011-12)? Dir-se-á que este é um problema social e não do campo psicanalítico. Sem dúvida, seria necessário esclarecer e rever alguns pontos. Primeiro, porque não existe apenas um tipo de homossexualidade e, a rigor, seria preciso falar em homossexualidades. A categorização exclusiva como perversão não abrange a complexidade da questão. Sabemos que a perversão pode ser constatada tanto na heterossexualidade quanto nas homossexualidades. Por outro lado, na clínica, observam-se também homossexualidades nas neuroses, e isso torna o panorama muito complexo. Além disso, se não fosse assim, não seria possível entender os resultados dos estudos longitudinais sobre os filhos de casais homossexuais, que demonstram que o desenvolvimento destes não apresenta diferenças significativas em relação aos dos casais heterossexuais (Roudinesco, 2002/2003).

Voltamos, assim, à pergunta: a homossexualidade é equivalente à perversão? O mesmo que dissemos quanto às homossexualidades poderia ser aplicado às perversões em geral. Trata-se de um conceito intimamente ligado às normas determinadas pelos discursos vigentes e, por conseguinte, muito discutido por suas conotações. Além disso, a perversão também não é unívoca e seus limites são ambíguos. Falar de fetichismo ou travestismo, nos quais está claramente em jogo a angústia de castração e a recusa da diferença sexual, não é o mesmo que falar de pedofilia, na qual está em jogo também a diferença entre gerações. A noção inteira de perversão está no cruzamento entre o pulsional e o desejo, com os limites, proibições e barreiras que os discursos vigentes e as leis da cultura propõem. E esse limite pode variar.

Assim, seria suficiente dizer que a homossexualidade é uma conduta que corresponde a mecanismos presumivelmente homogêneos, ou é preciso analisar os mecanismos psíquicos em jogo em cada uma das formas em que se apresenta? Certamente, levar em conta apenas as práticas homossexuais seria extremamente descritivo e não basta para analisar a questão do ponto de vista psicanalítico. Ou então, no segundo caso, seria a recusa da diferença uma explicação plausível para todas as variantes de homossexualidade?

Ora, se nos referimos a uma das formas da homossexualidade, que seria a homossexualidade como perversão, deveríamos falar da conjunção de um mecanismo (a recusa da diferença) e de uma conduta (obrigatória e compulsiva como única forma de gozar). Se essas condições não ocorrem, entramos em zonas mais complexas que remetem a certa ambiguidade. Por outro lado, é preciso assinalar ainda que alguns autores só falam em perversão, quando está em jogo também a integridade do outro.

O que foi acima descrito torna claro que homossexualidade e perversão não podem ser automaticamente equiparadas. Não existe uma homossexualidade e nem todas as homossexualidades são perversão. Isto está em jogo na clínica e tem efeitos sobre a posição do analista, tanto na eventual expectativa de reverter essa escolha de objeto quanto em suas interpretações sobre o desejo de filho em casais homossexuais, e, não menos importante, na questão do destino das identificações nos filhos destes casais, quer sejam adotados, quer gestados por fertilização assistida.

Em suma, existe tal pluralidade de apresentações homossexuais que seria difícil atribuí-las a um mecanismo em ação. Além disso, é preciso delimitar, em cada caso, qual mecanismo ou mecanismos coexistentes podem estar em ação. E, avançando ainda mais, acreditamos que também não é suficiente sustentar que as homossexualidades podem ser agrupadas em neuróticas, perversas ou psicóticas. Impõe-se a necessidade, acreditamos, de singularizar e pensar como as variáveis funcionam em cada caso.

Em resumo, nossa proposta baseia-se na necessidade de distinguir entre as diferentes formas de homossexualidade, acentuar que cada uma delas corresponde a mecanismos psíquicos distintos, enfatizar que são consequência de processos de historicização particulares de cada sujeito, descentrar as equiparações indiscriminadas entre homossexualidade e perversão, e recordar que as perversões existem tanto na heterossexualidade quanto na homossexualidade.

Nesse sentido, considero que pode haver registro da diferença em sentido simbólico mesmo quando a escolha de objeto é homoerótica.

 

A noção de diferença

Essa discussão nos leva a abordar o conceito de diferença. Considero que a diferença sexual seja uma das apresentações da diferença (2001a). Seu reconhecimento e registro, sua inscrição psíquica podem estar presentes tanto na escolha homossexual de objeto quanto na heterossexual. E podem também estar ausentes, em ambos os casos. Além disso, nossa proposta é que o conceito de diferença é mais amplo do que o de diferença sexual, mesmo no campo psicanalítico. Embora para alguns esteja baseado na anatomia ou na biologia - ou seja, é predeterminado -, para outros tem um valor simbólico ao qual é preciso aceder. Nesse caso, atravessar o complexo de Édipo/castração seria um modo - freudiano - de acesso simbólico à diferença. A normatividade do desfecho edípico, neste contexto, corresponde a um âmbito cultural e discursivo determinado.

Porém, como já mencionamos, a diferença não é apenas sexual e anatômica, nem apenas simbólica. Assim, propomos considerar os múltiplos significados do conceito de diferença. Não são a mesma coisa a diferença como distinção (Heidegger, 1988), a diferença na linguagem, a diferença como deslocamento significativo e a diferença no sentido deleuziano como diferença de fluxos. Nada disso é igual à diferença sexual e de gêneros - anatômica, cultural e discursiva -, embora haja relações entre essas categorias. Isso amplia muito o conceito de diferença em relação à construção de subjetividade. Levar em conta esses múltiplos significados permite pensar, através de epistemologias complexas, nos aspectos simbolizantes e não simbolizantes da diferença.

Essas questões colocam em jogo o modo de conceituar o complexo de Édipo. Tende-se a pensar em termos de Édipo positivo, como resolução ideal, que é uma de suas variantes em conformidade com a norma e a legalidade vigentes. Por isso, há autores que consideram que o complexo de Édipo é heteronormativo (Butler, 1990). Por outro lado, as categorias masculino e feminino são categorias de conteúdos incertos, como o próprio Freud (1933/1986a) havia indicado. Essas categorias correspondem a uma ordem binária que é ainda uma ordem de hierarquias e, portanto, de poder (Bourdieu, 1998/1999). Héritier (2007) também havia indicado isso, a partir da etnologia.

Entendemos que o complexo de Édipo completo, como metáfora e como narrativa, corresponde muito melhor aos avatares dos processos de subjetivação sexuada.

 

Complexo de castração e construção de teorias

Sabemos que, na proposta freudiana, o complexo de Édipo é indissociável do complexo de castração, e que é o complexo de castração que comanda, segundo Freud, o desenvolvimento libidinal da menina e do menino. No menino, caracterizando a resolução do Édipo; na menina, como começo deste.

Ou seja, o complexo de castração põe fim ao complexo de Édipo no menino, mas prepara o complexo de Édipo na menina. Num giro teórico cujos fundamentos deveriam ser analisados, Freud propõe que a castração seja aceita, para a menina, como premissa. É o que se denomina castração consumada. Isso corresponde, sem dúvida, à interpretação da diferença como "castração", própria das teorias sexuais infantis. Inevitavelmente, coloca-se a questão da relação entre as teorias sexuais infantis e adultas (Laplanche, 1980/1988) e sua influência na construção de teorias em geral. Em outras palavras, a questão é que as teorias sexuais infantis são depois estabelecidas como teorias adultas e perdem o caráter interpretativo e imaginário de teorias sexuais infantis. Assim, apresentam-se como verdade comprovada factualmente e, com mais sofisticação, passam a fazer parte de algumas vertentes da teoria psicanalítica.

Continua de pé a pergunta: por que a menina concordaria com a teoria sexual do menino, aceitando sua "castração" como premissa? Neste ponto, abordamos as discussões de Bourdieu (1998/1999) sobre a dominação masculina, própria das sociedades androcêntricas. Esse autor afirma que a dominação se apoia na identificação do dominado com as pautas do dominador, o que leva a inscrições psíquicas concordantes com estas. Estão implicados nisso as teorias, os modos de pensamento e a práxis que se sustenta a respeito.

Embora Freud tenha se referido especificamente à fase fálica, ligada à posse ou não do pênis, ou seja, à anatomia, o falo passou a ser o eixo, o significante-mestre da construção da subjetividade. Lacan (1958/1970) o desenvolveu a partir dos três momentos do Édipo, que transcorrem desde ser e ter o falo até o acesso à castração simbólica, na qual o falo circula e não é da posse de ninguém. Este é outro tema que merece ser analisado. Derrida (1987/1989) afirma, na sua crítica do falogocentrismo, que propor um significante-mestre correspondia a um transcendentalismo que contradizia o conceito de que um significante remete sempre a outro significante.

Julgo necessário sustentar essas questões sobre os desenvolvimentos freudianos da sexualidade feminina porque estão relacionadas à proposta de centralidade do falo em suas diferentes versões, tanto como símbolo de potência quanto como significante privilegiado do desejo e da falta.

De todo modo, se pensamos o conceito de castração em sentido simbólico, como incompletude, essa significação contribui muito mais para refletir sobre os problemas em discussão. Nesse sentido, abrange igualmente ambos os sexos.

A construção da subjetividade implica reconhecimento e aceitação da incompletude; esse é o sentido da "castração", para além dos imaginários sociais e pessoais. É, portanto, reconhecimento do outro, implica sair do narcisismo. E, a meu ver, embora isso inclua o reconhecimento da diferença sexual como uma das versões da diferença, vai muito além. É o que podemos observar em muitos heterossexuais, cujo aparente reconhecimento da diferença sexual não vem acompanhado do reconhecimento do outro em todos os sentidos. E, por outro lado, como já mencionei, o reconhecimento da diferença sexual pode vir acompanhado de uma escolha homossexual de objeto. Nesse sentido, podemos afirmar que não existe acesso à diferença em sentido amplo se não há reconhecimento do outro.

Como afirmamos, a angústia de castração no menino é um fato que se observa muito frequentemente na clínica. Em contrapartida, a inveja do pênis na menina é um fato clínico que nem sempre é comprovado, salvo recorrendo a certas contorções intelectuais que tendem a adaptar os fatos e as teorias. Pode haver, como já mencionado, uma superinterpretação da inveja fálica que seria necessário rever. Lembremos também que o próprio Freud (1930/1986b) ressaltou claramente a influência de determinantes sociais e educacionais.

Como já sustentei em outras publicações, a construção de teorias mantém íntima relação com o ponto de vista do pesquisador, que não deve ser ignorado quando as analisamos (Glocer Fiorini, 2007, 2010a). David-Menard (1997/1999), filósofa e psicanalista, tratou da forte influência dos fantasmas de castração masculinos na construção de teorias, não só na psicanálise como também na filosofia. O ponto de vista do qual se parte é fundamental, o que inclui ainda o gênero do teórico. Isso indica que não existe neutralidade absoluta. A ideia é exposta por Freud (1933/1986a) a seu público, apelando à crença, quando afirma que se não acreditarem no que diz... aquilo ficaria inerme.

 

Conclusões

É impossível ignorar no complexo de Édipo uma narrativa que permite fazer, na clínica, referência a conflitos atuais e à historicização infantil: desejos, identificações, fantasmas estão presentes. É uma ferramenta clínica, mas tem seus limites quando se pretende considerá-lo universal, a-histórico e eterno, sem se levar em conta outros modos de subjetivação próprios às sociedades contemporâneas. Em outras palavras, considerar que o Édipo corresponda a uma base eterna expressa na estrutura ou no modelo - cujas formas de apresentação podem variar segundo as culturas - impede que se analisem seus limites e aporias.

Por isso, como ressaltei, existem pontos cegos que é preciso enfrentar, já que o complexo de Édipo não abrange todas as questões levantadas com respeito ao feminino e às diversidades sexuais e de gênero. Nesse âmbito, está incluído também o campo do masculino.

Sem dúvida, trabalhar com a noção de Édipo completo amplia muito o panorama. Por isso considero que é necessário pensar o Édipo de modo ampliado (Glocer Fiorini, 2011-12). Deleuze (1972/1973) critica o conceito reduzido do Édipo microfamiliar: mãe-pai-filho. Salienta que era um instrumento, uma estratégia do capitalismo. Ele propôs o conceito de um Édipo transfamiliar, vacuolar, aberto, que transcende o universo fechado da família nuclear.

Isto abre a possibilidade de se pensar nos fatores que, com base nos discursos vigentes em cada época, determinam legalidades e normas, permissões e proibições. Permite também que possamos historicizar aquilo que se apresenta como um axioma imutável da teoria.

Finalmente, nossa proposta (Glocer Fiorini, 2001a) é analisar os processos de subjetivação sexuada de forma triádica, para mais além dos binarismos restritos do Édipo positivo. As séries complementares são um antecedente inevitável desta proposta. Estão em jogo três fatores: (1) a heterogeneidade anatômica; (2) a diversidade de identificações (incluídas as de gênero); e (3) a escolha de objeto, heterossexual ou homossexual, no campo do desejo.

Estas variáveis são atravessadas por narrativas, fantasmas e processos de simbolização, em concordância com os discursos vigentes (incluindo o complexo de Édipo) em seu cruzamento com o campo pulsional.

Nenhuma delas define, por si só, a construção de subjetividade, e elas não se resolvem dialeticamente, mas mantêm-se em sua heterogeneidade. Apenas seus entrecruzamentos, intersecções, definem os processos de subjetivação. São variáveis em tensão, não unificáveis, que representam determinações em conflito.

 

Referências

Bourdieu, P. (1999). La dominación masculina (J. Jordá, Trad.). Barcelona: Anagrama. (Trabalho original publicado em 1998)        [ Links ]

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Correspondência:
Leticia Glocer Fiorini
Zapiola 1646, Piso 2
1426 Ciudad de Buenos Aires, Argentina
lglocerf@intramed.net

Recebido em 27.10.2014
Aceito em 10.11.2014

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