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Revista Brasileira de Psicanálise

Print version ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál vol.49 no.1 São Paulo Jan./Mar. 2015

 

EDITORIAL

 

Editorial

 

 

Silvana Rea

Editora

 

 

Caros leitores,

A partir deste número, iniciamos uma nova gestão editorial. Sabemos que é grande a responsabilidade do exercício dessa função e agradecemos a confiança em nós depositada por Nilde Jacob Parada Franch, presidente da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, e pela Febrapsi, na figura de seu presidente Aloysio Augusto D'Abreu. Não poderia deixar de mencionar meu antecessor, Bernardo Tanis. A ele agradeço tanto pelo convívio enriquecedor como pela sugestão de meu nome. E pela generosidade com a qual conduziu, juntamente com Alice Paes de Barros Arruda, ex-editora associada, a passagem da editoria.

Fiéis à tradição de parceria da RBP com a IPA, publicamos aqui os keynote papers de seu 49º Congresso, sediado em Boston, cujo tema é Mundo em mudança: a forma e o uso de ferramentas psicanalíticas hoje. Agradecemos à IPA e a seus representantes, bem como aos autores, pela autorização de publicação.

Em sintonia com os questionamentos propostos pelo congresso, nosso primeiro número chama-se O homem do futuro, hoje. Quem é esse homem, que nos parecia anunciado para o futuro, mas que já se apresenta - em parte iniciante, em parte plenamente constituído -em nossos consultórios? O que ele exige de nós, psicanalistas?

O cientista (por vezes chamado de futurólogo) venezuelano José Luis Cordeiro afirma que as mudanças tecnológicas se aceleram em velocidade exponencial, levando a que nos próximos vinte anos tenhamos avanços tão radicais que não se comparariam aos vividos nos últimos dois mil anos. Entre outros, anuncia o nascimento de uma pós-humanidade, que levará o homem a uma quase imortalidade. São inovações que mudarão definitivamente a maneira como pensamos e sentimos, e, em última instância, aquilo que se entende por humanidade.

De fato, desde a descoberta do fogo e a invenção da roda o homem cria novas possibilidades de ser - humano. Mas é a partir da Revolução Industrial, denominada por muitos historiadores de Revolução Tecnológica, que a inserção de máquinas no processo produtivo o organiza em escala e velocidade cada vez maiores. Substituindo o trabalho físico humano direto, o maquinário passa a ser o elemento central no processo econômico, trazendo modificações profundas nas relações sociais. Do século xix aos nossos dias, a tecnologia passa a fazer uso significativo da ciência, até que elas se tornam praticamente indissociáveis como índice de progresso.

Os avanços tecnológicos estão em todos os lugares, inclusive em nossos consultórios. As novas tecnologias de informação oferecem facilidades para a comunicação independentemente das distâncias geográficas. Assim, telefones celulares, mensagens de texto, WhatsApp fazem parte de nosso cotidiano e nos ligam a nossos pacientes; a secretária eletrônica do telefone fixo é coisa do passado. Muitas vezes, os celulares são uma presença durante a sessão. Alguns de nós fazem uso de Skype para atendimentos.

O que pensar dessas mudanças? Concordar com Elisabeth Roudinesco (2010), para quem a psicanálise, a partir do momento em que uma realidade toma corpo, deveria pensá-la, interpretá-la e levá-la em conta, e não condená-la por antecipação? Deveria, portanto, o psicanalista lançar mão da tecnologia como uma ferramenta psicanalítica? Ou deveríamos nos manter como foco de resistência, garantindo um lugar único para uma experiência que a vida contemporânea não nos permite mais? A utilização das novas tecnologias em análise poderia acentuar as mazelas do homem de hoje, que, como diz Kristeva (2002), está perdendo a sua “alma”, sem espaço nem tempo para constituí-la, nem para perceber que isso ocorre?

São essas inquietações que trouxemos neste número, pelas vozes de Anette Blaya Luz, Mariângela Mendes de Almeida, Alicia Beatriz Dorado de Lisondo e nosso ex-editor Plinio Montagna, assim como Fernando Urribarri e o cientista Rogério Cezar de Cerqueira Leite.

Contamos também, a título de homenagem e agradecimento, com o texto de Bernardo Tanis “A escrita, o relato clínico e suas implicações éticas na cultura informatizada”, um memorial intelectual de seus anos como editor. Trata-se de uma versão do artigo publicado pela revista Psicanálise, da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Porto Alegre, a cuja editora, Mara Loeni Horta Barbosa, agradecemos pela autorização da publicação.

Como podem notar, apresentamos uma releitura do projeto gráfico, bastante inovador quando de sua implantação na gestão de Leopold Nosek. Respeitando a elegância do projeto original, bem como a identidade visual que marca a revista, atualizamos o design da capa. Seguindo a mesma ideia, as seções ganharam novos nomes. Na parte interna, optamos por deixar a estrutura mais próxima de uma revista com colunas duplas e espaço para anotações. É nosso convite para que o leitor dialogue com o texto, da mesma maneira que a revista propõe o diálogo entre autores.

Para finalizar, gostaria de reiterar que temos como proposta manter a vocação pluralista da Revista Brasileira de Psicanálise, afirmando o valor da clínica como fio condutor para o desenvolvimento de conceitos e teorias psicanalíticas, enfim, como motor para a produção de conhecimento. Entendemos que a revista é um espaço privilegiado de reflexão das questões da clínica e para a clínica, aquelas com as quais todos nós nos deparamos diariamente em nossos consultórios e que muitas vezes nos exigem pesquisa e elaboração. Funcionando como ponto de encontro de autores e leitores, a revista torna-se um espaço intermediário que pode produzir um terceiro sujeito, criado na leitura. Acreditamos que assim estaremos cumprindo a função primordial desta publicação. Afinal, como diz Ogden (1996), é na criação desse terceiro, fruto da tensão entre leitor e autor no texto, e entre analista e paciente na clínica, que se encontra o cerne tanto da experiência de ler quanto da experiência psicanalítica.

Fica aqui, portanto, o convite à colaboração de todos, pois, para que a revista seja plenamente esse espaço intermediário, precisamos que as reflexões em forma de texto cheguem até nós. Como o Brasil é um país de grandes proporções, com semelhanças e com significativa diversidade cultural, acreditamos que a revista pode oferecer a oportunidade de conhecermos modos diferentes de trabalhar em contextos diferentes, ainda que sejamos todos psicanalistas e brasileiros.

Boa leitura!

 

Referências

Kristeva, J. (2002). As novas doenças da alma (J. A. D'Avila Melo, Trad.). Rio de Janeiro: Rocco.         [ Links ]

Ogden, T. (1996). Os sujeitos da psicanálise (C. Berliner, Trad.). São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Roudinesco, E. (2010). Em defesa da psicanálise: ensaios e entrevistas (A. Telles, Trad.). Rio de Janeiro: Jorge Zahar.         [ Links ]

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