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Revista Brasileira de Psicanálise

Print version ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál vol.49 no.2 São Paulo Apr./June 2015

 

EM PAUTA

 

Formas abjetas na clínica e na arte contemporânea: a questão da sua recepção

 

Abject forms in the clinical psychoanalysis and the contemporary art: the question of its reception

 

Formas abyectas en la clínica y en el arte contemporáneo: la cuestión de su recepción

 

 

João Frayze-Pereira

Membro efetivo e docente da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP). Professor livre-docente do Instituto de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte da Universidade de São Paulo

Correspondência

 

 


RESUMO

Considerando uma situação experimentada com um paciente acometido por uma enfermidade psicossomática, fui remetido a certas manifestações artísticas contemporâneas que, no campo da recepção estética, suscitam atitudes que expressam apreciações negativas. Tais atitudes são manifestas por espectadores perturbados pela disposição dos artistas para lidar com os próprios corpos com o propósito de formar cenas e objetos percebidos como abjetos ou sem sentido. Uma situação perturbadora, análoga a um pesadelo, se apresenta, nesse sentido, não do lado do artista, mas do lado do receptor. Como interpretar esse tipo de ressonância no plano da recepção?

Palavras-chave: abjeção; corpo; clínica; arte contemporânea; recepção estética.


ABSTRACT

An experience with a patient affected by a psychosomatic disease led me to some manifestations of contemporary art. On the field of esthetic reception, these manifestations elicit attitudes that express negative evaluations. They are viewers' attitudes towards artists who are willing to deal with their own bodies in order to compose scenes and objects that are considered abject or nonsense. This disturbing situation, which is analogous to a nightmare, is presented not from the artist's viewpoint but from the viewer's viewpoint. How to interpret this kind of resonance on the level of reception?

Keywords: abjection; body; clinical psychoanalysis; practice; contemporary art; esthetic (aesthetic) reception.


RESUMEN

Considerando una situación experimentada con un paciente afectado por una enfermedad psicosomática, fui remitido a ciertas manifestaciones artísticas contemporáneas que, en el campo de la recepción estética, perturban a los espectadores, propiciando la expresión de evaluaciones negativas. Tales actitudes son manifestadas por espectadores perturbados debido a la disposición de los artistas para lidiar con sus propios cuerpos con el objetivo de crear escenas y objetos percibidos como abyectos o sin sentido. Una situación perturbadora, análoga a una pesadilla, se muestra, en este sentido, no desde el punto de vista del artista, sino del lado del receptor. ¿Cómo interpretar este tipo de resonancia en el plano de la recepción?

Palabras clave: abyección; cuerpo; clínica; arte contemporáneo; recepción estética.


 

 

A partir da segunda metade do século xx, é possível constatar a presença de duas fortes tendências poéticas que às vezes se superpõem: a tendência à abstração e a vertente conceitual. Mas, além delas, também se percebe que uma inclinação significativa da prática dos artistas, sobretudo entre os anos 1960 e 1980, é a de confrontar o público com figuras regressivas: "exaltando o pré-genital e oferecendo-o sem retoques, o artista retoma, sobretudo, o que nos séculos anteriores havia sido omitido, negado, reprimido ou sublimado" (Gagnebin, 1999, p. 226). São exemplos dessa cultura do mal-estar certas exposições polêmicas que costumam gerar no público, quando não desprezo, perplexidade, pois a perspectiva que propõem é pensar com crueldade a condição humana.1

Nesse sentido, é instigante a proposição do crítico Hal Foster (1996, p. 166), que afirma ser a perspectiva psicanalítica bastante significativa para interpretar essa tendência artística que apresenta ao espectador objetos que envolvem repetição, horror e violência, que questionam a identidade dos seres e negam a tradicional ideia do belo. São objetos abjetos, segundo Julia Kristeva (1980). O objeto abjeto possui uma forma sensível. E esta, situada no campo da estética, entretanto, escapa à esfera do bom gosto. Ou seja, por "abjeção" entende-se aquilo que esteticamente ameaça a ordem, os limites e as regras, que é excessivo do ponto de vista da sensibilidade e que, portanto, por não ser prontamente assimilável, perturba o espectador. Mas, ao mesmo tempo, por fazer fronteira com o desconhecido, o obsceno e o improvável, fascina. O objeto abjeto testa os limites da sublimação, aproxima a arte de algo que, imediatamente, é inclassificável por intermédio das categorias de que dispomos para a ordenação simbólica do mundo (Douglas, 1976). Ora, essa questão também pode se fazer presente na clínica.

 

Uma abjeção na clínica

Considerando esse tema, abro um parêntese para relatar brevemente a situação de Juliano, indivíduo profissionalmente bem sucedido, com idade na faixa dos 40 anos, em análise há quase três. Sofre de uma séria inflamação da pele, que seu médico concluiu ser de ordem psicossomática, pois os tratamentos prescritos não têm funcionado bem. Tal enfermidade, aparentemente situada no grupo das eritematosas-escamosas, instalou-se um ano antes do início da análise, no dorso do paciente. Com o tempo, alastrou-se, ocupando uma área significativa que arde, coça e sangra, manchando a própria roupa, obrigando-o a usar camisetas sobrepostas de cor escura para que as manchas não se tornem visíveis. Ele diz:

Essa doença que se formou é nojenta, é coisa de pesadelo, e eu não consigo ver nenhum sentido, pois apareceu de repente e o dermatologista diz que a causa é psicológica, algum trauma, sei lá... Não entendo.

Juliano vive com seu companheiro há quinze anos. Há certo tempo, a atividade sexual entre eles decaiu e, mais recentemente, cessou. Juliano não sabe explicar o motivo, dado que ele e seu parceiro sempre se entenderam muito bem. Mas confessa que ele é quem perdeu o interesse, não o companheiro, que reclama da sua indiferença. Tomando em consideração essas duas questões surgidas na análise, a da atividade sexual decrescente e da crescente inflamação da pele, pergunto a Juliano se ele percebia alguma relação entre elas. Ele diz que não percebe relação alguma, que o declínio da atividade sexual aconteceu gradualmente, antes de a doença aparecer, mas que, de qualquer maneira, seria horrível relacionar-se sexualmente com as costas no estado em que se encontram: "Seria uma cena de filme trash ou de terror".

Desde o início da análise, o fluxo associativo de Juliano concentra-se no seu sucesso profissional. Mas, depois de alguns meses, incomodado com a coceira, pergunta: "Você poderia dar uma olhada nas minhas costas?" E levanta-se, suspende a camisa e mostra o dorso tomado pela infamação, algo não muito agradável de ver. De fato, à primeira vista, poderia ser "uma imagem de pesadelo", como ele mesmo a caracteriza, uma forma abjeta, uma grande mancha texturizada que, entretanto, no decorrer da minha observação, como uma Gestalt, configurou-se como uma "boa forma" para mim - parece um mapa. Digo isso a ele, que se surpreende e responde: "Um mapa?" "É", digo eu, "um mapa geográfico como os que figuram num atlas". Faz-se um silêncio que perdura durante todo o tempo que resta da sessão, reiterando-se na sessão seguinte. Mas Juliano, finalmente, observa: "Ainda estou pensando no que você me falou; você foi a primeira pessoa que viu alguma coisa; todos que viram fizeram uma cara de nojo, nunca falaram nada ou, quando falaram, disseram: 'Isso é loucura!'". Então pergunto: "Você costuma mostrar as costas para os outros?" E ele responde: "Sim, às vezes, acho que eu espero ver a reação do outro, ou alguma explicação, porque eu mesmo não entendo, especialmente depois que o médico disse que seria psicológico, que a causa seria algum trauma..." Esse tipo de reação das pessoas, aludido por Juliano, lembrou-me da maneira com que certos espectadores respondem a algumas manifestações da arte contemporânea, em especial, as propostas que envolvem os corpos dos artistas.

 

Abjeções na arte

Cabe lembrar o que todo mundo sabe: desde o começo da história da arte, os artistas se interessaram por representar a forma humana. No entanto, e aí não sei se todo mundo sabe, na chamada arte contemporânea, que abrange as manifestações artísticas desde a Segunda Guerra até hoje, constatare uma forte tendência que considera o corpo humano não como figura a ser representada, mas como um objeto que pode ser tela, pincel, moldura e matéria viva dos trabalhos. Entre os anos 1940 e 1950, com Pollock e a action painting, Klein e a "antropometria", Rauschenberg e a "pintura suja", por exemplo, verifica-se essa tendência contemporânea que coloca o corpo em evidência, às vezes de maneira cruel, quase sempre confrontando o público com a questão da finitude humana. Tal tendência é radicalizada pelas "ações" de alguns artistas - inicialmente, os chamados "acionistas vienenses" - que farão um trabalho de crítica violenta dos valores da sociedade pós-fascista europeia, usando os próprios corpos de modo ritualístico e transgressivo. É o conjunto dessas ações que engendrou uma poética que se expandiu e é ainda bastante forte nos dias de hoje, conhecida como body art (Jones, 1998). Tal perspectiva mostrou-se, entre outras, na exposição Big Bang: destruction et création dans l'art du xxeme siècle, que aconteceu no Centro George Pompidou, Paris, em 2005. Para esses artistas, o pensamento crítico sobre as relações de dominação-subordinação entre Estado e indivíduos exercita-se num campo cujo núcleo é o corpo.

Artistas como Hermann Nitsch e Andres Serrano recorreram ao uso de fluidos corporais ou de símbolos religiosos como emblemas da dominação. Em suas performances violentíssimas há uma proposição imaginária de algumas das futuras teses de Michel Foucault (1975) acerca das "relações de poder que se inscrevem no corpo" (Geay, 1998, p. 44). Em todos os casos, as ações definem uma poética que, recusando a mercantilização da arte, procura rearticular arte e vida, a relação entre indivíduo e corpo próprio, ainda que, para isso, seja necessário coagir o corpo a manifestar sentidos através da dor (Frayze-Pereira, 2010, p. 307 ss.). Quer dizer, esses artistas contemporâneos, que rejeitam a representação metafórica da dor e mostram de maneira cruel a fragilidade dos limites entre a vida e a morte, engendram a associação entre poética e luta micropolítica.

Claro deve estar que a posição assumida por esses artistas é, sobretudo, política. E que uma das perguntas que os move é a seguinte: que tipo de arte é possível fazer depois da brutalidade das guerras, da ação totalitarista, nazista e fascista? Ou seja, a arte cuja possibilidade de existência tornou-se inteiramente questionada depois da Segunda Guerra foi a arte moderna, que, em larga medida, desde a origem, era movida pela esperança utópica de transformar o mundo num mundo justo. Mais do que instaurar a desesperança, o impacto da guerra sobre os artistas foi o de mostrar aquilo que a racionalidade humana foi capaz de fazer. Daí, com o expressionismo abstrato e, pouco depois, com a body art, os artistas voltaram-se para si mesmos, buscaram matéria para a arte em qualquer vestígio corporal. Não caberia, portanto, falar em excesso compulsivo, ou aplicar qualquer psicopatologia na leitura desse tipo de manifestação artística. Ao contrário, trata-se de uma poética que deliberadamente não representa coisa alguma, mas que apresenta, aos olhos de um público que só quer diversão ou se deslumbrar com a beleza das formas, aquilo que se passa ao seu redor e que ele não quer ou não pode ver. Daí o caráter excessivo das formas nas propostas que tematizam a dor, a solidão, o absurdo, a violência, o vazio, presentes na vida coletiva. São esses aspectos que a body art interroga. Mas, como todas as demais poéticas contemporâneas, ela também deixa claro que, na arte, o que importa é mais o projeto como busca do sentido do que o resultado como bela forma. Então, sem o conhecimento do projeto, não é possível apreender o significado do que é exposto. E, ao se examinarem os projetos body art, conclui-se que não são catárticos nem espontâneos, mas elaborados conceitualmente com recursos encontrados na filosofia e na história da arte, nas ciências e na tecnologia.

O que chama a atenção é a potência dessa poética. Basta lembrar que, no primeiro semestre de 2015, em São Paulo, a artista Marina Abramovic realiza exposições - uma no Sesc Pompeia e outra na Galeria Luciana Brito - que apresentam projetos que reiteram algumas das teses da artista com relação à arte, que, no momento atual, propõem considerar, além do corpo, também a alma. Em 2011, o Moma de Nova York abrigou uma retrospectiva dos seus trabalhos, sempre bem fundamentados, e uma performance de longa duração, A artista está presente. Ao visitar essa mostra, pude ver que uma das perguntas da artista ainda era a seguinte: "É possível fazer arte hoje que não venha da guerra?". É bom lembrar que Marina Abramovic é natural da Sérvia. E realiza instalações performáticas dramáticas nas quais questiona os limites da condição humana. Há propostas comoventes, como Balkan Barroque, que interroga a contradição entre ternura e violência. Com essa performance, apresentada na Bienal de Veneza em 1997, ela reflete sobre o lugar do artista no mundo atual. Sentada sobre uma montanha de ossos ensanguentados, a artista os limpa cuidadosamente, enquanto o público ouve cantos folclóricos e depoimentos de pessoas. Em geral, as performances acontecem uma única vez. Mas, registradas em fotografia ou vídeo, são reapresentadas depois ao grande público. Na retrospectiva realizada no Moma, entretanto, além do conjunto da obra, o público teve acesso a uma manifestação viva da artista que durou 600 horas. É a performance mais longa de que se tem notícia, em que a artista trabalha a imobilidade e o silêncio na comunicação. Para Marina Abramovic, a performance é sobretudo um instrumento para elevar o espírito do público, justamente porque ela sabe que ele pode maltratar o artista, quando convidado a participar das suas manifestações.

É o que ocorre, por exemplo, com Stelarc, um artista que busca articular transcendência e dor. A partir do sentimento agudo da fragilidade humana, completamente nu, o artista se faz suspender, por meio de cordões e ganchos que perfuram seu corpo, em espaços expositivos tradicionais, como galerias e museus, ou em espaços ao ar livre, sempre desafiando a gravidade com posturas antinaturais. Trata-se de um artista que acredita que nossa estratégia evolucionária não é capaz de perpetuar a espécie a não ser que mudanças físicas localizadas se produzam corporalmente em cada indivíduo. Nesse sentido, pensa que o artista pode se tornar um escultor que reestrutura e hipersensibiliza o corpo humano. Não passando por qualquer tipo de preparação, o artista entra num estado de meditação no momento da cena. E, nesse momento, as suas contrações musculares criam uma percussão eletrônica cuja amplificação microfónica acompanha o ritual. Em outra performance, os espectadores podem acionar um dispositivo e aplicar choques de intensidade variada no corpo suspenso do artista, que se movimenta a partir da estimulação, às vezes de maneira dramática, dependendo da energia aplicada. Em todos os casos, a distensão da pele cria o que o artista chama "paisagem gravitational" (Paffrath & Stelarc, 1984, p. 68). E, para interrogar o "corpo obsoleto", o artista transforma a violência em meio para atingir essa terrível perfeição física do seu projeto, perfeição polarizada pelo peso e pelo equilíbrio. Nesse sentido, ele se torna um móbile vivo.

Mas a dor não é um componente sempre presente nos trabalhos que tomam o corpo como objeto (Warr & Jones, 2000). Ao contrário dos anteriores, há artistas que recusam a experiência da dor física e mudam o foco dos seus trabalhos, recorrendo a tecnologias para interrogar radicalmente a problemática da identidade e da alteridade. Nessa vertente, apenas como um exemplo, vale mencionar o inglês Marc Quinn, que, no final dos anos 1990, realizou uma escultura de si intitulada Self, um autorretrato na forma de uma cabeça em cuja composição o artista injetou cinco litros de seu próprio sangue, instalada dentro de uma redoma, refrigerada a - 6º C. O curioso dessa instalação é que, desligado o sistema de refrigeração, a escultura se dissolve, o sangue se liquefaz. Considerando que o sangue detém todas as características do ser que o contém, Marc Quinn decidiu dar forma a essa relação, moldando sua própria cabeça. Mas, considerando as condições da instalação e a sua própria matéria-prima, o artista também tematiza a fragilidade dos limites entre vida e morte.

Quando se consideram os projetos mais avançados tecnologicamente, entretanto, o corpo não é mais solicitado como um suporte polêmico, pois são as suas funções biológicas que se tornam objeto dos trabalhos.

Nesse sentido, por exemplo, lembro Yann Marussich, que é bailarino, coreógrafo e diretor de teatro em Genebra, ganhador do prestigioso prêmio Ars Electronica, em 2008, na categoria Arte Híbrida. Na performance Bleu Remix (Marussich, 2007), ele transpira azul devido ao metileno que ele se fez injetar previamente, expondo-se completamente imóvel num aquário de vidro, como um animal raro ou um daqueles prodígios que eram apresentados nos circos de antigamente. Com minucioso controle da temperatura ambiente, do tempo de sua exposição e do próprio corpo, o artista cria uma coreografia bioquímica e sonora, pois os ruídos corporais internos são audíveis. Com o azul, escolhido por sua simbologia, associada ao espírito, à sabedoria e à serenidade, o artista, inspirado no surrealismo, visa oferecer ao seu público uma experiência que acede ao maravilhoso da surrealidade. Outro artista reconhecido nessa linha de trabalho é o belga Wim Delvoye, que recriou o funcionamento do aparelho digestivo humano por intermédio de uma máquina, no trabalho Cloaca (2000-2007), que também ganhou o prêmio Ars Electronica (Regine, 2008). Esse trabalho dialoga com o de outros artistas, críticos da própria arte, como Piero Manzoni e seu trabalho Merda ¿'artista (1961) -influenciado pelo conceito de ready-made de Duchamp -, cuja atualidade o Museu de Arte Moderna de São Paulo celebra, no momento, com uma exposição. Quer dizer, com o desenvolvimento do projeto Cloaca, que reproduz um processo corporal e produz matéria fecal, a tese defendida pelo artista é violentamente crítica: a arte de hoje produz dejetos. E, com certa ironia, o artista diz que o seu trabalho visa reorientar o entendimento da beleza artística, uma vez que o objeto produzido pela máquina pode ser embalado e comprado por colecionadores de arte contemporânea.

Em suma, os artistas citados até aqui, relacionados à linhagem da arte corporal, que defendem a ideia do corpo como último refúgio da autenticidade, não visam colocar o corpo humano em causa nem modificá-lo, mas, ao contrário, visam apresentar algo básico que existe nele e nas suas capacidades, como a transpiração, a excreção e a relação com a alteridade.

No entanto, há ainda artistas que, em contrapartida, utilizam tecnologias e materiais diversos para justamente modificar o corpo, prover a sua extensão e criar um ser novo, híbrido, às vezes abjeto, sempre além dos limites físicos da escala humana. Nessa perspectiva, talvez, a artista que mais impacta o espectador é a francesa Orlan. Trata-se de uma artista multimídia que vincula literalmente arte e medicina, performance e cirurgia plástica, para interrogar os limites e as possibilidades da carne. Com uma persistente reflexão sobre a questão da beleza, num certo momento da sua trajetória artística, Orlan analisa minuciosamente os ícones femininos da história da arte, sobretudo os que representam as deusas da mitologia grega. Em seguida, decide implantar certos aspectos em seu próprio rosto: o queixo de Vênus, os olhos de Psi-quê, o nariz de Diana, a boca de Europa... E, assim, atribui-se o direito de reinventar seu próprio corpo, dissociando a intervenção médica e os critérios da saúde e da doença. Entretanto, em continuidade à sua reflexão, Orlan interroga radicalmente tais padrões canônicos da beleza, considera-os disciplinares e passa a desfigurá-los para reconfigurar seu próprio rosto segundo padrões estéticos de outras culturas (série Auto-hibridação). Assim, tomando o corpo como um readymade modificado, Orlan "desafia o julgamento de Deus". E distingue-se dos artistas da body art ao lançar o Manifesto da arte carnal, que abole a experiência da dor e inaugura a "performance cirúrgica", televisada ao vivo para várias partes do mundo. Opondo-se corajosamente às pressões sociais e políticas violentas, impostas tanto sobre o corpo humano quanto sobre o corpo das obras de arte, a artista interroga "o estatuto do corpo em nossa sociedade e no devir das gerações futuras via novas tecnologias e atuais manipulações genéticas" (Orlan, 1998, p. 64). Mais do que isso, a arte carnal trabalha o autorretrato no sentido clássico, porém, com a aplicação das novas tecnologias ao seu próprio corpo, a artista repõe a problemática do original e da cópia. É, portanto, a questão da identidade do artista contemporâneo que ela põe em discussão (Orlan, 1998, p. 52). E, em um dos seus últimos trabalhos, radicaliza mais ainda esse debate.

Na instalação multimídia O manto do Arlequim, com efeito, Orlan (2008) propõe a fabricação de um manto, utilizando a cultura de tecidos. Nessa instalação, cultivaram-se num biorreator três tipos de células vivas: células da pele de Orlan, hibridadas com células de um feto do sexo feminino da raça negra de doze semanas e com células de um marsupial. Graças à residência da artista num laboratório da Universidade de Perth, Austrália, ela desenvolveu esse projeto que demandou uma tecnologia específica, além de ter se submetido a uma intervenção cirúrgica, nos moldes das anteriores, para realizar uma biópsia. Com o conhecimento de que a cultura da pele tornou-se de uso corrente na medicina, a artista vai mais longe e também fundamenta seu trabalho nas ideias do filósofo Michel Serres (1992), que faz do personagem Arlequim uma metáfora da mestiçagem: os losangos multicoloridos de sua roupa simbolizam influências culturais diferentes. O Arlequim, nesse sentido, simboliza a alteridade e a tolerância à diferença, simbologia retomada no manto de pele, reflexo da mestiçagem cultural. É uma figura que se apresenta como um duplo da artista. Assim, sobre O manto do Arlequim, Orlan escreve:

É uma obra invendável que custou uma fortuna. As células do meu corpo e as outras células utilizadas não me pertencem mais e eu não poderia vendê-las como arte. Mas é um passo a ser dado no sentido de o artista se sentir livre para criar, estudar e se engajar no campo fora do mercado das obras de arte (2008, p. 87).

Em suma, considerando o conjunto dos trabalhos que acabei de mencionar, pode-se perguntar: eles pretendem apenas impactar o espectador, impedindo-o de pensar, ou, ao contrário, eles pretendem despertar a sua curiosidade e fazê-lo pensar?

 

A questão da recepção

Ao serem confrontados com esse tipo de proposta estética, é comum que espectadores de exposições de arte contemporânea se manifestem basicamente de um modo negativo: (1) com comentários que expressam desprezo e denigrem a ação artística considerada sem sentido ou não artística ("Isso é arte?") ou, então, (2) com um silêncio perplexo, perturbados que estão pela disposição dos artistas para lidar com o não sentido e a destrutividade (Frayze-Pereira, 2010, p. 311). Tais espectadores não chegam a se perguntar até que ponto não são eles próprios que vivem o pesadelo paradoxal de, no contexto de galerias e museus, estarem despojados dos recursos cognitivos e emocionais necessários para interpretar a arte de sua própria época.

Cabe relembrar que essa forma de arte foi inventada no pós-guerra como ruptura radical com a própria arte, quando, depois da barbárie nazifascista, o artista foi condenado ao silêncio. No entanto, os artistas resistiram e, ainda que a arte feita por eles seja efêmera, ela é registrada fotograficamente, permanecendo em nossa cultura sempre sob a forma de indícios de uma ação transgressiva, às vezes destrutiva, cujo sentido nem sempre é captado por seus espectadores. Com efeito, todas as manifestações às quais me referi até agora podem aparecer como sem sentido se não forem considerados o projeto que as norteia e a história que elas pressupõem. E a história que engendrou a lógica que sustenta tais manifestações é a história da arte.

Ora, não por acaso, tais artistas se deixam comparar a artistas de circo. E o circo foi um tema fundamental na arte moderna, desde o final do século XIX. Nesse contexto, ganha importância a figura do clown, com a qual os artistas elaboram a própria identidade, questão apresentada numa grande exposição que aconteceu em Paris, em 2004, que trabalhou o tema do artista como clown, tendo como suporte obras modernas de Seurat, Lautrec, Cézanne, Picasso, entre outros, ou contemporâneas, como as de Cindy Shermann, Hopper, entre outros.

Mas que figura é essa - o clown? São múltiplos os aspectos definidores dessa figura (Frayze-Pereira, 2010, p. 205 ss.). É uma figura complexa elaborada pelos artistas modernos como um duplo deles mesmos, na medida em que todo clown opera uma passagem, isto é, quando ele entra no picadeiro, é aquele que configura uma transgressão dos limites do real. A transgressão realizada pelas acrobacias acontece no momento do salto perigoso, do obstáculo ultrapassado, dos círculos de papel que ele perfura na travessia. Nessas situações, um limite é transgredido e o clown emerge do outro lado, como um ser capaz de realizar prodígios. Assim, ele requer plena liberdade para que sua existência aconteça no jogo insensato e na gratuidade. Então, resumindo muito essa complexidade de sentidos, pode-se dizer que o clown é o contraditor por excelência, o que desafia as nossas certezas, figura com a qual o artista se identifica para negar o existente. Porém, com o desenvolvimento da sociedade moderna, desde as últimas décadas do século xix, essa figura gradualmente perdeu a potência e tendeu a desaparecer. Como alguns pensadores já afirmaram, depois do Holocausto só restou ao artista o silêncio. Nesse sentido, a herança mais significativa deixada pelo clown aos seus pósteros não é apenas a questão da identidade, mas o lugar vazio. E é esse lugar que os contemporâneos interrogam e buscam restaurar.

Assim, quando Orlan propõe O manto do Arlequim, é uma antiga figura da arte que ela resgata, que representa a tolerância ao outro e que é escolhida pela artista para refletir sobre a própria identidade artística e sobre a esperança de a arte transformar a nossa percepção do mundo com vistas ao novo, isto é, ao outro que sempre exige de nós alguma operação criativa para dele podermos ter experiência. Na fotografia de Orlan com a roupa de Arlequim, recuperando-se da cirurgia, podemos ver uma imagem diferente da que aparece na pintura do clown morto de Picasso, em 1902. Nessa performance cirúrgica de Orlan, realizada em 2007, pode-se dizer que o clown figuradamente renasce. E, de fato, no mundo contemporâneo, época social e historicamente sinistra, ao artista que faz da arte negação e alteridade radical cabe o princípio que, para muitos, ainda é determinante do sentido da arte: a elaboração do absurdo, do impensável ou, se quisermos, do impossível.

Nesse sentido, cabe ainda dizer uma última palavra sobre a crueldade do pensamento plástico na arte contemporânea, questão que se manifesta de maneira radical em trabalhos que partem explicitamente do princípio de que criar é destruir. Na instalação Plastered [Engessado], de Mônica Bonvicini (2005), por exemplo, o que se expõe é uma sala vazia cujo chão é pavimentado com gesso. Nessa instalação, o corpo da artista está ausente. O que se faz presente é o corpo do espectador, quando o chão do espaço aberto à visitação pública se quebra com os passos dos visitantes. Que significa isso - chão desconstruído pela travessia dos espectadores? O que restaria ao espectador ao deixar essa instalação? Na melhor das hipóteses, defrontar-se com o vazio. E é esse o ponto limite das propostas dos artistas que comentamos, isto é, expor com crueldade o vazio contemporâneo. E, sobre o modo como isso é feito, com o recurso da tecnologia, mas também de referências conceituais cunhadas na filosofia, nas ciências humanas, inclusive na psicanálise, pode-se concluir que não significa uma adesão impensada dos artistas ao mórbido e ao feio, nem uma dificuldade de se relacionar com valores estéticos como a beleza, mas um projeto que congrega artistas que analisam criticamente o modo de ser da arte produzida na cultura do espetáculo. Nesse sentido, a arte, posicionando-se ao lado da filosofia e das ciências humanas, também reconhece a época atual como "era do vazio", o que, por sua vez, segundo a psicanalista Julia Kristeva (1993) e o filósofo Lipovetsky (2005), contextualiza o chamado esvaziamento da vida mental e o desamparo trágico do homem atual.

A expressão de tal desamparo pode ser vista em pacientes como o que apresentei no início deste artigo, cuja manifestação psicossomática a princípio era vista por ele como algo ininteligível, análogo a uma "imagem de pesadelo". Mas também pode ser constatada nos espectadores que reagem com desprezo às propostas desses artistas contemporâneos, não reconhecendo que está neles o pesadelo da ignorância com relação à natureza dos projetos da arte contemporânea. Ou seja, penso que o mal-estar gerado pela arte atual relaciona-se, sobretudo, ao não conhecimento dos projetos elaborados pelos artistas, subjacentes às suas concretas manifestações, e a uma preconcepção de o que sejam a arte e o artista, preconcepção baseada em ideias forjadas no século xix que ensejaram a chamada "mentalidade romântica" (Frayze--Pereira, 1995). O espectador ingênuo, não iniciado no campo da arte, fica submetido aos seus próprios pesadelos ideológicos, cujo fundo histórico-cultural desconhece. E, nessa medida, não chega a simbolizar aquilo que vê e reage negativamente.

Retomando a situação clínica que apresentei inicialmente, lembro que Juliano - às voltas com a enfermidade que se apoderou das suas costas - ao falar do livro que está escrevendo, que alude ao tema do absurdo, a certa altura, diz: "Absurda é a situação que estou vivendo, João". E relata que ele e seu companheiro, há aproximadamente um ano, vêm discutindo sobre a adoção de uma criança. Juliano não gosta da ideia, mas o companheiro, profissional especializado em direito familiar, decidiu providenciar a adoção. Pergunto: "Por que não gostou dessa ideia?". Diz Juliano: "Não sei se estou preparado... É muita responsabilidade. Meu companheiro está animado e não sofre como eu. Na verdade, ele acha lindo o projeto de formarmos uma família. Mas eu..." e mergulha em profundo silêncio. Depois de uns minutos, digo: "É como se o peso do mundo estivesse nas suas costas?"; Juliano continua em silêncio por mais alguns minutos e pergunta: "Será que a doença tem a ver com isso? É psicossomática, não é?". E eu digo: "Nesse mapa que se formou nas costas, você está situado nele?". E ele responde: "Devo estar, foi a minha cabeça que criou essa doença, não foi? Responsabilizar-se por uma criança pesou. Criança não, um menino. Meu amigo quer um menino, o que pra mim é mais difícil". "Por que difícil?'', pergunto. "Ah, se eu pensar em como foi a minha relação com meu pai... É muito difícil". A partir daí, Juliano fala de como seu pai era muito controlador, autoritário e violento com todos na casa. E lembra episódios de sua infância e adolescência, dos seus poucos relacionamentos sexuais anteriores ao encontro com o atual companheiro, até o ponto de relatar a sua "iniciação". E, com certo constrangimento, narra que foi iniciado na vida sexual por seu pai, quando tinha uns 6 anos de idade, e manteve com ele, até o início da adolescência, certos jogos sexuais.

Não foram necessárias muitas sessões para que Juliano relacionasse a manifestação psicossomática, o projeto de adoção de um menino e o cessar da atividade sexual. Não foram necessárias muitas associações para concluir que, para ele, era impensável admitir que a história pudesse se repetir. E, por não ser pensável, esse pavor tomou conta do corpo de Juliano, que passou a coçar e a sangrar, tendo aversão ao contato com o companheiro. O "mapa" que a doença desenhou nas suas costas - transfigurando Juliano em Atlas, aquele que sofre por ter sido condenado a sustentar o peso do mundo - localiza o seu sofrimento psíquico, o medo de vir a repetir com um filho a história vivida com seu pai. Nesse caso, não há projeto deliberado pelo paciente para realizar esse desenho. O que há é uma resistência a aceitar o projeto deliberado por outrem. A manifestação psicossomática expressa o seu horror tanto com relação à sua iniciação quanto à adoção. E, a partir daí, o fluxo associativo toma outro rumo que não é o caso relatar aqui. O que importa é que gradualmente a inflamação se atenua e regride, a pele já não coça tanto e não sangra; associada à análise, segundo o dermatologista, a medicação prescrita passa a fazer efeito.

Com a análise, pode-se dizer, houve uma "ruptura de campo" (Herrmann, 2001), isto é, rompeu-se o campo da psicossomática e abriu-se um novo campo psíquico. Nesse outro campo, polarizado pelo abuso sexual e pelo incesto, a abjeção ressurgiu no fluxo associativo, configurando uma questão ainda "não pensada" por Juliano (Bollas, 1992, p. 336). Com efeito, foi quando o "projeto abjeto" discriminou-se como não propositado pelo analisando que a homossexualidade se tornou uma questão: seria ela uma condição que lhe foi imposta ou foi sua escolha? Assim, em certa sessão, resumidamente, ele disse o seguinte:

Eu sei que o ser humano é um animal violento... E, pensando aqui, percebo que eu e meus dois irmãos talvez tenhamos realizado um projeto do meu pai, que foi o animal dessa história. Nós três nos tornamos homossexuais. Será que esse era o projeto dele? Nunca vou saber, ele está morto e ninguém pode falar em nome dele, nem mesmo minha mãe, coitada. O que eu posso supor é que ele acreditou que era seu direito como xerife, como delegado, de exercer seu poder sobre nós. Mas agora é meu direito não querer repetir esse projeto com um filho adotado. Se todo abusador é no fundo um abusado, como a gente lê por aí, eu não vou passar essa sina para um filho meu. Eu não quero correr esse risco. É um ato de liberdade não querer repetir. De verdade, pensando agora, eu me sinto livre. E, honestamente, esse é o melhor fruto da minha análise. Descobrir que sou livre para não correr esse risco. O projeto de adoção não é meu, é do meu companheiro. E eu não tenho que me submeter a ele.

Nesse ponto, observo:

Você não precisa acatar esse projeto de adoção. Mas, mesmo que o ser humano seja um animal violento, será que a destruição que ele promove não é reversível? Será que pensar sobre tudo isso, como você tem feito, não pode gerar alguma transformação?

Juliano fica em silêncio até o final da sessão e nas seguintes, dizendo apenas que está pensando... E, considerando seu sofrimento, também em silêncio, aguardo o que está por vir.

Entretanto, se retornarmos ao campo da arte, creio que a experiência clínica pode nos auxiliar a entender melhor o modo negativo de reação dos espectadores, que não explicitaram para si o sentido das formas contemporâneas. E, apenas para dar um exemplo bem conhecido na história da arte, lembro a recepção do impressionismo na Paris do século xix, cujas obras, hoje, são muito apreciadas positivamente pelo grande público. Porém, em suas primeiras exposições foram recebidas com desdém e os artistas foram desprezados como charlatões, propositores do absurdo, do não sentido (Burollet, 1965). Nesse caso, além de os espectadores não estarem preparados para acolher as novas formas de expressão do visível, também o projeto constituinte da poética impressionista era desconhecido por eles. Mas a questão pode ser mais profunda do que a mera ignorância.

Retomando a problemática que coloquei no princípio, penso que o impacto estético de certa tendência artística, sobretudo contemporânea de seu público, também pode se articular ao contato que ela obriga o espectador a fazer com os seus primeiros encontros com o sofrimento psíquico. E considerar esse sofrimento na arte - num campo improvável como o dos museus e das exposições de arte - é admitir o inominável que ela pode sugerir no plano da recepção, portanto, no plano da experiência estética, entretecendo, na matéria enigmática apresentada pelo artista, os buracos daquilo que é desconhecido e não é meta-forizável (Meltzer & Williams, 1995, p. 44; Cassese, 2002, p. 78). Diante disso, cabem algumas perguntas: não poderia ser esta a característica de uma obra de qualquer contemporaneidades E até que ponto, diante do desconhecido ou do outro enigmático que nos interpela, as reações do espectador como resposta, o desprezo ou o silêncio, não revelariam uma perturbação mais profunda do que a mera ignorância de quem não está familiarizado com a arte contemporânea? Essas reações do espectador comum diante da alteridade poderiam significar não apenas uma ausência de linguagem, não apenas um constrangimento intelectual diante do hermetismo das formas artísticas (ou do desconhecido), mas exatamente uma resposta emocional articulada a um momento de secreta dificuldade para transformar a precariedade de si mesmo em reflexão. Nessa mesma medida, dependendo da potência da obra de suscitar interrogações, não poderia ela, ao contrário, despertar o espectador a fazer uma sofrida elaboração para que, em seu interior, ela venha a ser sua experiência? Esta é uma possibilidade que toda obra de arte sempre enfrenta. No entanto, não são todos os que se dispõem a esse tipo de autointerrogação. Afinal, se os artistas são ou não bem-sucedidos com seus projetos é uma questão que caberia, por exemplo, aos psicanalistas, acostumados a lidar com o estranho - em parceria com críticos e historiadores da arte -, mergulhar no campo de tais poéticas, para se informar e, depois, sem qualquer preconcepção, concluir se tais proposições, ainda que abjetas, são formas criativas ou nada mais do que mero nonsense.

 

Nota

1 "Pensamento cruel" é uma noção inspirada em Walter Benjamin. Refere-se à elaboração crítica que "desaloja as pessoas dos lugares costumeiros, invalida hábitos, ameaça o conforto do que parece 'dado', do que é tido como certo, do que parece natural"; seu propósito é "expressar as perspectivas nas quais o mundo revela suas fraturas para retomar a questão da atividade do sujeito como redenção, isto é, como restituição daquilo de que fomos privados à nossa revelia" (Frayze-Pereira & Patto, 2007, pp. X-XI).

 

Referências

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Correspondência:
João Frayze-Pereira
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Recebido em 14.04.2015
Aceito em 28.04.2015

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