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Revista Brasileira de Psicanálise

versão impressa ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál vol.50 no.1 São Paulo mar. 2016

 

EM PAUTA

 

Laio, ou a fertilidade impossível1

 

Laius, or the impossible fertility

 

Layo, o la fertilidad imposible

 

 

Sônia Curvo de Azambuja (in memoriam)

Formada em Filosofia pela Universidade de São Paulo, uma das fundadoras da revista Ide, membro efetivo e analista com função didática da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP)

 

 


RESUMO

Ao tratar, numa reflexão psicanalítica, do problema da construção da sexualidade e da fertilidade, assim como dos inúmeros significados que pode adquirir na vida psíquica esta construção, a autora privilegia o medo da fertilidade, medo este que mobiliza a situação de violência na vida mental e social. Na genealogia desta situação de medo e violência, a autora destaca a posição de Laio no mito de Édipo, por meio da qual ilumina o material clínico de diversos pacientes.

Palavras-chave: sexualidade; fertilidade; medo; violência; significado.


ABSTRACT

The author emphasizes the fear of fertility - a fear which arouses violence in mental and social life - by writing a psychoanalytic reflection on the issue of building sexuality and fertility, as well as on the several meanings this process may acquire in psychic life. In the genealogy of this situation of fear and violence, the author highlights in Oedipus myth Laius’ place, through which she enlightens several patients’ clinical material.

Keywords: sexuality; fertility; fear; violence; meaning.


RESUMEN

Cuando se trata, en una discusión psicoanalítica, el problema de la construcción de la sexualidad y la fertilidad, así como de los innumerables significados que puede adquirir dicha construcción en la vida psíquica, la autora hace énfasis en el miedo de la fertilidad, miedo que mueve la situación de violencia en la vida mental y social. En la genealogía de esta situación de miedo y violencia, la autora destaca la posición de Layo en el mito de Edipo, mediante la cual ilumina el material clínico de diversos pacientes.

Palabras clave: sexualidad; fertilidad; miedo; violencia; significado.


 

 

[coro]Ó gerações humanas, para mim nossas
vidas são passagens de sombras!
O tempo, que tudo vê, viu também tua maldição.
Triste filho de Laio, quem dera não te
haver conhecido jamais!
No entanto, para dizer-te a verdade, foi
graças a ti que um dia pudemos respirar
tranquilos e dormir em paz.

(Rei Édipo, Sófocles)

Pensando nos conceitos de sexualidade e fertilidade, levei em conta a existência de um elemento constitutivo da psicanálise, que a torna fecunda ao pensamento, na história das ideias. Refiro-me ao fato de, através de nossa práxis, apreendermos aquilo que se poderia chamar de intersubjetividade, isto é, o essencial não está em mónadas - no só sujeito ou só objeto -, mas no inter. É a partir do diálogo analítico que este essencial emerge, essencial que é o significativo. Dentro dessa práxis, refleti sobre pacientes que, em sua relação comigo, recolocam dia após dia a questão edipiana.

No Édipo, revivido na análise, pudemos acompanhar a constituição da identidade, a renúncia à bissexualidade, a "opção"2 pelo heterossexualismo ou pelo homossexualismo, a perda da fertilidade biologicamente considerada e o seu détour para a fertilidade mental.

Mas a pedra de toque que fundamentalmente me intriga, na questão da fertilidade, é o medo dela, a situação de violência que ela mobiliza na mente humana. Na genealogia desta situação, me deparo e me oriento pela posição de Laio no mito de Édipo, graças à qual tenho podido iluminar e trabalhar com o material clínico dos meus pacientes, que aqui comparecem.

Laio teme ter filho, pois pela profecia o filho irá matá-lo e tomar o seu lugar de rei. É ele ou o filho. Vamos encontrar nessa posição os mais diversos perfis psicológicos, diferentes identidades sexuais e diversas idades. O filho é para todos a quebra de um sistema, o perseguidor, o outro que traz o confronto, o diverso. As exigências para satisfação das suas necessidades e demandas colocam todos em risco. Há com ele lutos, perdas, conflitos. Ora é a própria sexualidade que se vê ameaçada nos seus prazeres, ora são as articulações do poder, ora é a própria identidade, no que se refere à sua autonomia. Ao mesmo tempo, é imperioso que o filho possa emergir. Que esperança ele contém? Ele é o decifrador de enigmas, mas também aquele que traz novos enigmas.

Pode-se tentar pensar o problema da fertilidade focalizando-o sob o ângulo da constituição da identidade feminina. Melanie Klein diz, em seu livro Psicanálise da criança (1969), que a menina demora mais tempo para aceitar a sua feminilidade do que o menino a sua masculinidade. Da minha parte, penso que existe em ambos os sexos uma enorme dificuldade em renunciar à bissexualidade.

Lembro-me de uma jovem de 17 anos que, tendo relações sexuais com o namorado, engravidou. Na análise, o sentimento que ela demonstrava, diante dessa gravidez, era de total surpresa. Ela não avaliara que ter relações sexuais e ficar grávida fossem dois fatos correlacionados.

A pulsão, no caso, era dirigida ao prazer da relação sexual, enquanto que o fato de ser mulher parece ter sido inteiramente desconsiderado. Foi muito depressivo para esta menina aceitar que se encontrava num processo de gravidez: ser um ser que engravida. Por que foi necessário a ela fazer essa negação? Podemos pensar em várias hipóteses. É difícil ser mulher. Ser mulher implica poder fazer a conexão entre o impulso sexual, a procura de prazer e o produto que resulta disto, ou seja, o fato de que o ato sexual dá frutos.

Trata-se de uma conexão dolorosa, dificilmente feita pelos jovens com quem tenho trabalhado analiticamente. É como se assumir o desejo produzido de maneira abrangente trouxesse um bloqueio do desejo, ou fantasias de promiscuidade e prostituição.

Ampliando, porém, meu pensamento, através de um leque de percepções que meu trabalho com outros pacientes me dá, considero ainda outras questões.

Tenho três pacientes homossexuais com quem venho podendo refletir sobre a construção da sexualidade no cenário psíquico. Trata-se de pessoas cultas, sensíveis e de bom nível de informação, pertencentes a uma faixa da população que poderíamos classificar como moderna.

Um deles é casado com uma mulher muito atuante profissionalmente, tendo com ela duas filhas. Em geral, suas fantasias e atuações homossexuais ocorrem quando a mulher está absorvida em seu trabalho - e ela é profissionalmente muito produtiva - ou quando se encontra absorvida pelos cuidados com as filhas.

Por que este homem, diante de uma mulher assim produtiva, "fica louco",como diz ele, fantasiando ou tendo relações homossexuais? À luz da sua história edipiana, vemos que a sua imago paterna é a de um pai déspota. Sua mãe é vista como distante dele, havendo uma ânsia em torná-la acessível; porém, "ela só tem olhos para ele" (seu pai). Segundo meu paciente, seria impossível superar o pai através da transgressão - dado inerente ao crescimento, já que significa criar espaços novos, diversos.

Desde pequeno, sentia-se um tanto gauche em relação aos padrões da família. Estudava piano, coisa de que gostava muito, mas não obtinha atenção por meio disso. Desde a infância até a adolescência, com diferentes grupos de amigos, tinha dificuldade em integrar-se. "Era sempre uma hiena: só conseguia carniça."

Casou-se com uma mulher que sente forte e inteligente. Tem a maior repulsa por mulheres submissas. Na relação, porém, ele foi se apagando à medida que ela se desenvolvia. Em alguns momentos muito traumáticos para ambos, ele tentou uma masculinidade na base da onipotência, isto é, rivalizando com ela e tentando repetir a imago despótica do pai. Em outros momentos, ele retirou-se para uma rotina empobrecedora, graças a um trabalho pouco criativo. Também não frequentava cinema, teatro ou qualquer ambiente cultural que pudesse ser estimulante para uma pessoa culta como ele. Autisticamente, passava suas noites e domingos em casa; quando muito, tomava cerveja num bar. Parece que, nestes momentos, ele deixou para sua mulher a função de fecundar. Sendo forte e inteligente, a esposa reproduzia para ele seu ideal: o que sempre quis ser aos olhos dos pais e dos amigos que não o viam. Ao mesmo tempo, porém, quando ela em sua fecundidade lhe deixava evidente o quanto ele estava sendo estéril, tentava subjugá-la.

Assim, as alternativas que tem encontrado resumem-se às tentativas de viver alienadamente a sua fecundidade através da mulher. Isto, no entanto, o deixa "louco" de inveja. Parte então para a tentativa de construir uma masculinidade à base de onipotência, ou seja, subjugando o objeto. Ou "enlouquece", fantasiando ou atuando o homossexualismo.

O ato homossexual é uma tentativa de reencontrar a sua identidade, mas com tal culpa que ele só constitui parceiros sádicos.

Atualmente, algo novo tem surgido, graças talvez à transferência que vive comigo. Eu sou vista, no momento, como o objeto que pode valorizar seus feitos. Não sou despótica, como ele vê seu pai, nem distante, como vê sua mãe. Assim, tenta articular um trabalho novo. Conversa comigo sobre o fato de ter sido convidado, por um colega, para um trabalho em que poderá ter uma participação bastante rica. Movido por hábitos mentais antigos, algumas vezes tentou retirar-se, refugiando-se na fantasia. Mas este estado de mente não o satisfazia mais. Com isso, foi tendo que refletir e articular essa nova postura. Mesmo provocando problemas para seu chefe, a mudança de emprego não o levou a se sentir "um assassino", como ele me disse: o fato de usar seu pênis (os seus potenciais) não o levava ao parricídio ou à castração do seu pai. Assim como, afastada essa fantasia, ele não precisava se imolar como uma vítima do pai. Trata-se, porém, de construir algo novo, cheio de recuos. Somatiza angústias e tece teorias nas quais os pais realmente sacrificam seus filhos ou os filhos realmente sacrificam seus pais.

No trabalho analítico, tenho podido ver a sua sexualidade sendo construída e reconstruída, conforme as imagos do pai e da mãe se configuram na cena psíquica.

Laio manda matar despoticamente seu filho porque se sente ameaçado por ele. Nas imagos paterna e materna do meu paciente, também ele foi indesejado. Não podendo existir como filho, não podia fecundar como pai.

No momento, sua luta visa uma nova conquista: conseguir sua própria fecundidade.

Pensando ainda nos conceitos de sexualidade e reprodução, simbolicamente constituídos na vida mental, lembro-me de outro homem com quem tenho trabalhado analiticamente.

Ao contrário do caso anteriormente relatado, ele não toma seu homossexualismo como uma expressão de loucura. O homossexualismo é para ele "uma opção", como me diz, e não foi por isso que iniciou a análise. A sua demanda de análise diz respeito a fobias e angústias que o levavam a um sofrimento profundo, vivendo próximo ao suicídio.

Ao tempo em que iniciei o trabalho com ele, a imagem que trazia do seu pai era muito desvalorizada. Sentia-o como ausente em sua infância, alcoólatra e incapaz de trazer dinheiro para casa. Sua mãe era vista como forte e ativa, apesar de já envelhecida, pois, sendo o penúltimo dos seis filhos, ele dizia que ela estava sem leite e sem juventude na época do seu nascimento.

Aliás, é assim também que me constitui, transferencialmente, ao iniciarmos o trabalho analítico. Nos seus sonhos, eu apareço sempre como uma velha avó de família que o recebe numa casa espaçosa, com muitos filhos e netos, mas sem nenhum vestígio de homem. Não há nenhuma erotização em sua relação analítica.

Pensamos no número de providências que a mente pode tomar para lidar com esta pulsão básica: o incesto. Foi Freud quem interpretou pela primeira vez o tabu do incesto como uma interdição cultural, e não instintiva. O instintivo, o pulsional, é a atração ao incesto, e é a cultura interiorizada que garante a sua proibição. Da mesma maneira, este paciente revive comigo uma pulsão que já vivera com sua mãe, tornando-me uma velha senhora que é forte e contém a virilidade. Assim o homem pode ser apagado, por inútil, tal como já fizera com seu pai.

Joyce McDougall, no livro Em defesa de uma certa anormalidade (1983), indica como, no homossexualismo, a vida sexual entre os pais é negada. Contendo em si mesma toda a virilidade do pai, a mãe pode ser constituída como uma figura tão forte que o pai se apaga e se torna frágil e submisso a ela. Na medida em que a imago materna contém o pênis do pai, é negada não só a diferença entre os sexos, mas também a necessidade da relação entre eles. Ao negar essa diferença, meu paciente fantasia conter ambos os sexos. A erotização da própria relação analítica, pela transferência, levou este paciente, tempos depois, à reconstituição da relação que tivera com suas irmãs. Nessa reconstituição, ele se lembrou, com grande angústia, dos sentimentos que tinha ao ver suas irmãs junto a seus irmãos. Vivia o sentimento angustiante de haver relações sexuais entre eles, mas associava esta impressão aos seus próprios impulsos sexuais. Tal reminiscência ocorria ao viver comigo, na situação analítica, os mesmos impulsos angustiantes. Tanto eu quanto as irmãs éramos objetos incestuosos que causávamos angústia.

Prosseguindo na análise dessa temática, ficou claro que o homossexualismo era uma providência tomada como defesa em relação ao incesto. Em todos os contatos (que ele pôde reconstruir) com mulheres, também elas lhe estavam interditas. Tal interdição ocorria mediante a dessexualização da mulher (irmãs) como objeto incestuoso.

Conforme essa situação interna foi sendo elaborada, foi desaparecendo a forte inibição que este paciente tinha em relação ao seu trabalho, que requeria uma alta dose de criatividade.

A sublimação havia recuperado seus direitos, e a fecundidade, na sua dimensão de ato criativo, pôde se reinstalar. As angústias e fobias desapareceram. Este paciente diz não desejar mais que isso. Sua identidade sexual mais profunda permanece imutável. Sua opção homossexual, como ele diz, prossegue.

Poderia haver, na escolha homossexual, a possibilidade de se lidar com os medos que a fertilidade provoca? Depois de ver o filme O vampiro de Dusseldorf (Lang, 1931), este mesmo paciente comenta certa fala que o emocionara muito. Ao ser julgado por ladrões, o vampiro diz que eles, os ladrões, haviam se marginalizado porque, não tendo socialmente aquilo que desejavam, escolheram usar a violência para atingir tal objetivo. Mas ele não tem escolha. Vê-se obrigado, por um impulso interno, a fazer o que faz. Num movimento da análise que dura esta sessão e a seguinte, eu e meu paciente pudemos perceber como também ele se sentia sem escolha, escolhido que é por seus desejos. Por impulsos aos quais não pode se recusar, ele ataca minha fertilidade. O vampiro diz que, por não poder ver mãe e filha juntas, necessita matar a filha. Também meu paciente necessita matar minhas produções, de modo que, apesar de prosseguir solitário, ele levará consigo a ideia de que toda a seiva lhe pertence.

Esta teoria acerca de si mesmo, ele a traz desde pequeno. Aliás, desde então, ele pensa que todas as suas angústias nunca puderam contar com o respaldo do meio ambiente: narrativas e acalantos. Isso o leva a viver uma espécie de triunfo sobre esse meio: tudo o que conseguiu, segundo essa teoria imaginária, ele deve só a si mesmo. Por isso, com grande angústia tem vivido a experiência das minhas interpretações, que, mesmo muito valorizadas por ele, são minhas, e não dele. Como operar com elas sem sofrer, a todo instante, a tentação de esterilizá-las?

Numa sessão em que se mostrava muito aflito com a aids, pergunto a ele o que era a aids ali na sessão. Ele me diz que a aids era eu e, portanto, canaliza para mim a repressão que a aids exerce sobre ele. Falando ainda sobre isso, conta um sonho no qual observava um grupo de homossexuais tendo relações entre si. Acordando, pensou: "Agora não posso mais ir às saunas e ter relações sexuais; tenho que sonhar." Digo:

A sauna é um sonho, mas agora você precisa dormir para sonhar. Não sonha mais acordado. Você está se queixando de que a análise o levou a ter uma vida interna, já que você não atua mais todas as suas fantasias. Nesse sentido, a análise contém a aids. Acho que a aids é quando a análise (eu) devassa o seu sistema de hábitos mentais, com interpretações que vão abalar esse sistema. Nesse sentido, a análise é virulenta.

Penso que a minha fertilidade é atacada pela inveja dele; ao ser metabolizada, ela se torna má. Penso também que minha fertilidade o ataca como um vírus que ameaça destruir tudo o que ele já demarcara para si. Aliás, ele sempre me disse que não queria mudar as suas opções sexuais. Elas estão sendo tocadas, na medida em que são construções simbólicas e a análise trabalha com essas construções.

Em outra paciente, também homossexual, emerge a ideia de que ela pode, na relação com sua parceira, repetir a relação que via entre seus pais, de resto muito invejada e por ela tida como sendo à base de trocas do mais perfeito entendimento, só possível de ser reproduzida com uma parceira mulher.

A parceira mulher daria a ela tudo o que sua mãe dava àquele "reizinho", o seu pai. Os filhos e todos os conflitos que pudessem surgir com o outro (com o diverso), poderiam ser evitados no homossexualismo.

Assim, não é sem decepção que esta jovem vive, com sua companheira, situações de conflito que identificava como sendo típicas das relações heterossexuais. Parece que, independentemente das opções sexuais, toda consciência pode ter por objetivo a morte de outra consciência, como dizia Hegel.

De qualquer modo, há um referencial comum a esses pacientes homossexuais com quem tenho trabalhado. Em todos eles existe um sentimento profundo de culpa persecutoria. É como se sentissem que uma mancha, um infortúnio, foi inoculada em suas vidas, marginalizando-os. Do próprio bojo desse sentimento surge, ao mesmo tempo, a ideia de que se trata de seres predestinados, com qualidades e características especiais. Neste sentido, quando sou vista como alguém que pode receber a sua peculiaridade e até mesmo que sou meio marginal - na medida em que meu trabalho não pertence a um sistema comum de produção -, formam comigo uma comunhão imaginária. Porém, quando me veem dentro de um sistema heterossexual, fogem de mim como fugiram de suas próprias famílias.

É curioso que, nesses três casos, em que ocorre a prática mais ou menos intensa da relação homossexual, houve na adolescência o afastamento da casa da família original. O que poderia estar sendo evitado'?

Laio não quer permitir que Édipo sobreviva. Édipo irá matá-lo em seu poder de rei. É ele ou o filho.

Na questão homossexual, tal como aqui vista, surge o perigo de um holocausto. Ou o pai será morto para o filho sobreviver - o parricídio -, ou o filho sucumbirá para que o pai sobreviva - o filicidio.

É verdade que, até o momento, aqui foram privilegiadas as construções sexuais em que há dificuldade de renunciar à bissexualidade, como no caso da jovem que engravida. A seguir, encaminhei o problema das construções sexuais em que é feita, de maneira mais ou menos constante, a opção homossexual. Isso talvez pudesse sugerir a ideia de que o temor à fertilidade não se encontra no heterossexualismo ou na genitalidade "maduramente construída".

De forma alguma esse é o meu pensamento. A sexualidade não se constrói linearmente, e a fertilidade mobiliza sempre o temor em relação ao espaço que ela vai tomar e às exigências que acarretará.

A propósito, ocorre-me a lembrança de uma jovem mulher que tinha uma filha de 1 ano. Ela me trouxe um sonho muito esclarecedor. Sonha que corre, por uma rua, atrás de uma espécie de tonel de vinho que rola. Sabe que sua filha está dentro. Num determinado momento, a filha sai do tonel e avança para ela transformada em monstro ameaçador. Interpreto esse sonho como metáfora do nascimento de sua filha, que saiu do tonel-útero e a ameaça, monstruosamente, com suas necessidades de nenê.

Através deste sonho, podemos pensar a questão de como o filho traz o monstruoso, na medida em que rompe um sistema narcísico comum a todos. Assim, também podemos pensar na situação contrária, em que a mãe cria uma relação de fervor religioso para com o filho. Isto é, a mãe não se sente ameaçada, no seu narcisismo, pela criança, mas projeta o seu narcisismo naquilo que Freud chamou Sua Majestade, o Bebê em "Sobre o narcisismo: uma introdução" (1914/1974). Neste caso, a mãe pode ver no filho algo muito precioso, a ser cuidado de uma maneira tão especial quanto ela gostaria de cuidar de si mesma.

No entanto, a ameaça que o filho pode significar para a mulher não diz respeito só ao narcisismo. Marie Langer, em seu livro Maternidad y sexo (1964), refere a ameaça que a maternidade pode representar para a identidade feminina em seu todo e à sexualidade em particular; como a mulher luta entre a maternidade e o sexo, ora privilegiando um, ora o outro aspecto.

Foi na ficção de Doris Lessing que melhor pude seguir a sutileza desta luta. O seu romance Um casamento sem amor(1983) relata, numa trama sutil, a vida de uma jovem mulher branca vivendo numa comunidade inglesa da África do Sul. Nesse contexto, a pressão e a mutilação de seu corpo e sua identidade são inevitáveis. O fato de que o meio ofereça métodos anticoncepcionais ou operações de amarrar trompas, ou que este mesmo meio apresente uma legislação proibindo abortos ou qualquer interferência na concepção, igualmente não deixa espaço para que seus próprios desejos se produzam. A maternidade faz parte de um jogo de papéis em que o casamento é transformado.

Podemos pensar que se trata de uma situação distante de nós, mas isso não é verdade.

O corpo da mulher, assim como a própria identidade feminina, tem sofrido a intrusão de todas as opressões.

Lemos, em Doris Lessing, a procura que sua personagem Martha faz de si mesma. Só através de uma tenaz luta é que ela pode se constituir desalienada, isto é, produzindo seus próprios desejos.

Assim como Doris Lessing com sua ficção, que contribuição a psicanálise pode oferecer?

Muitas lembranças me tomam. Pensando em Martha, lembro-me de diversas jovens mulheres com quem já trabalhei analiticamente. Há pouco tempo, uma delas me contava que se sentia muito doente - como quando estava grávida e tinha calores, palpitações, pressão alta e uma terrível angústia. Desconfiava mesmo que pudesse estar grávida, apesar de usar DIU. Disse que iria ao médico, o que efetivamente fez. Mas somente mais adiante é que nós ambas pudemos detectar como esta situação opressiva, vivida fisicamente ali comigo, na análise, reproduzia os períodos em que ela esteve grávida, e como toda a ligação com sua mãe era ali revivida inconscientemente. Quando chegou ao final do trabalho de parto de sua primeira filha, o médico disse-lhe que a menina nascera. Ela perguntou se tudo estava bem. O médico respondeu jocoso: "Sim, está tudo bem; é uma linda menina com vinte dedos." Ela imaginou, com grande angústia: "Pronto, só podia ser, não podia ter nascido bem." Ela constituíra a fantasia de que o aleijão imaginado para a filha era a concretização do castigo que tinha que receber pela rivalidade com sua mãe. Ela não podia fecundar coisas belas e perfeitas, pois seus interiores estariam danificados.

Que pressão é essa que vive, neste momento, em sua análise e que lhe lembra gravidez?

Tanto eu quanto suas filhas somos sentidas como o objeto estranho que entra para flagrar os seus interiores estragados pelo montante de rivalidade com a imago materna. Ela sempre viveu a situação de não ser amada por essa imago. Sua irmã era "a bonita", para a mãe. Então, ela tentou desenvolver seus interiores, enquanto "a inteligente". Entretanto, "percebia" que sua mãe ou desvalorizava esta característica, ou a invejava. Com a maternidade, revive a situação das origens de sua identidade.

É na relação sexual com o marido que ela encontra o objeto bom. O seu pênis é o seio bom que nutre.

Marie Langer relata, em seu livro já citado, uma pesquisa de antropologia em que, numa determinada cultura, faz parte do ritual do casamento que, antes da realização da cerimônia, o noivo alimente sua noiva por alguns dias. Numa cabana, ele deve oferecer comida à sua noiva - colheradas de uma sopa, dadas na boca, como se ela fosse um nenê.

Assim, a vida sexual pode ser sentida como o lugar do prazer, na medida em que aí são revividos desejos infantis. Mas nem sempre a reprodução é revivência desses desejos. No caso desta minha paciente, pode bem ser revivência de angústias e perseguições.

Ou como no caso de um outro paciente: um jovem homem que, com sua filha mais velha, vive a ideia de poder reviver sua própria mãe cuidando dele, quando ainda pequeno. Por causa disso, ele não pode sair para trabalhar: fiscaliza a casa, vai à feira e encontra muitos defeitos em sua mulher, à semelhança de sua mãe.

Quando essa filha nasceu, tirou férias, como se tivesse parido. Cuidava dela com esmero. Quando analisamos como não pode, por um lado, deixar sua mulher ser a mãe e, por outro, ser o pai, com grande perplexidade ele conclui que não tem a menor ideia de como é ser pai: "Mas meu pai era um menino de recados de minha mãe."

Contudo, esta mãe que meu paciente quer ser é a mesma que o sufoca. Já esteve hospitalizado por pneumotórax. Nas sessões, quando se sente muito ansioso, levanta-se do divã e se senta, com falta de ar. Quando, no entanto, ganha uma maior autonomia em relação a essa imago materna, ele consegue produzir mais em seu trabalho, assim como admitir a autonomia de sua mulher.

Mas o que significa ter maior autonomia em relação à sua mãe e melhor articular seu trabalho? Por que a imago materna pode, num jogo de cena, ser tanática e lhe tirar o ar que respira e, ao mesmo tempo, ser aquela que, segundo ele diz, lhe ensinou as cores? Sua mãe era chapeleira, e ele ajudava-a quando pequeno. Hoje ele é pintor e faz uso desse aprendizado.

Que tipo de interiorização é feita das imagos materna e paterna para resultar em criatividade ou morte?

Recordo-me de uma entrevista de Fellini (1983) em que ele dizia:

Eu faço sempre o mesmo filme: o mesmo jogo, a mesma técnica, o mesmo processo de criação, as mesmas imagens simbólicas, misteriosas, vitais. Não evoluí, não dei um passo à frente. Sou sempre este menino inconsciente que um dia fez O sheik branco. Nós somos feitos de memória. Somos ao mesmo tempo a infância, a adolescência, a velhice e a maturidade.

Por que, em Fellini, as imagos infantis o liberam para o trabalho? "Amo trabalhar", diz ele. "Assim me encontro dentro de minha verdade, no centro de mim mesmo, no coração do meu verdadeiro destino."

Testemunhamos dia após dia a dificuldade que se pode ter nesta articulação. Diante desse testemunho, pode-se pensar que é a capacidade de sonhar que torna possível o uso das imagos no sentido da criação. Em psicanálise, já é senso comum que o artista usa o sonho e a fantasia para criar, através deles - diferentemente do psicótico, que se perde neles.

Voltando ao paciente, penso no conceito de angústia de castração. A angústia de castração, conforme conceituada por Freud, é a percepção da diferença entre o homem e a mulher. Nesta percepção, sempre está presente uma falta. Quando meu paciente apresenta a imago que constituiu de seu pai como aquela de um "menino de recados", mostra uma tentativa de ver o pai sem pênis. No seu Édipo, precisava fazer isso para não ver a relação entre os pais baseada na diferença, da qual ele necessariamente estava excluído. Negando-se a ter esta percepção, que é a angústia de castração, deslocou o pênis de seu pai para sua mãe. Lacan conceitua o pênis, em seu significado simbólico, como sendo o falo. O falo é o representante da lei. Quando deslocado para a mãe, este representante da lei toma o significado de fiscalizador da lei. Assim, dentro dele, sua mãe está sempre fiscalizando tudo: se suas filhas tomaram um café da manhã como este deve ser, se as compras da casa foram feitas, a que horas a família acorda. Ele está de tal maneira encapsulado no fiscalizar o grupo familiar que pouco consegue trabalhar, e acaba repetindo, na sua atualidade, o "menino de recados" que era seu pai.

Quando consegue autonomia desta relação que os pais tinham, ele consegue também pintar. Aliás, a primeira vez que desenhou, na infância, foi quando conseguiu se isolar dos pais. Desenhou com gilete. Penso que desenhar com gilete significa trabalhar com um instrumento cortante que possa atingir este material duro e difícil que ele está me trazendo. A análise comigo pode ser cortante, contundente.

Num outro polo, é possível pensar que ele também pode estar falando do seu ódio, disposto a me cortar, porque eu o levo a esse conflito.

O conflito que revive comigo é o de, tendo nascido, encontrar-se diante dos enigmas que precisam ser decifrados por ele. Há o discurso do pai, o discurso da mãe. Em que eles se diferenciam? Como integrá-los nas suas diferenças? Há pulsões que o tomam. Podem servir como gilete que esculpe, molda, desenha, cria. Ou gilete que esfacela, explode, mata.

Vemos como esses pacientes propõem que há uma espécie de jogo de dados, em que são possíveis inúmeras combinações com as imagos edipianas. Tal jogo pode ser repetitivo, estéril e inútil. Pode ser também um jogo que lança sementes em áreas férteis.

Talvez pudéssemos escrever muito mais sobre homens e mulheres diante da fertilidade; pensamos, porém, em nos dirigir para uma questão que muito tem nos intrigado e que se refere aos limites da fertilidade, biologicamente considerada, e seus ecos na vida mental.

Já faz alguns meses, venho tendo em análise uma mulher de 45 anos, que há um ano não menstruava mais. Pude verificar que é uma mulher aparentemente despojada de qualquer vaidade, mostrando-se em geral muito racional e com verdadeira repulsa às emoções, tendo horror a qualquer situação que a tire da consciência plena. Não sonhava há anos. Passa quase todo o tempo da análise falando de uma filha de 17 anos. Percebi que esta filha é uma personagem da qual não pode se separar. Fala dos problemas com a filha, que usa maconha; mas, na verdade, quer falar da angústia que sente comigo, na análise, e dos problemas e questões daí resultantes. Relata os jogos de vôlei da filha e como ela a acompanha a todos esses jogos - quando quer me falar da censura que exerce sobre suas próprias pulsões sexuais. Em outra ocasião, conta que comprou dois vestidos lindos para a sua filha, depois que havia comprado, para si mesma, um vestido bem barato, numa liquidação. Tal situação culmina quando um dia ela vem à sessão com a filha, que permanece na sala de espera e se dirige a mim, muito à vontade, enquanto a mãe me olha tímida. Na sessão, minha paciente comenta como a filha tem uma analista que não é boa tanto quanto eu. A situação trabalhada com ela foi no sentido de reservar alguma coisa para si mesma. Tudo tinha que ser da filha: roupas, sonhos, análise.

No decorrer do trabalho, percebi que essa mulher estava lidando com a perspectiva do envelhecimento e da morte. Na filha, ela constituía uma herdeira, para quem passava toda a sua vida. Assim, não morreria. A morte atinge quem está vivo; se, na fantasia, minha paciente passa toda a sua vida para a filha, ela se mimetiza de morta e a morte não a atinge.

Ela volta a menstruar, a sonhar. Suas associações tornam-se mais livres e próprias, não mais um relato sobre a vida da filha. Com todos os conteúdos imaginarios, ela havia perdido também a menstruação. Perdera antes de perder. O que ela estava perdendo? Com a menstruação, ha simbolicamente o feminino vivido no corpo. Com sua perda e esse vazio, é preciso criar o feminino só mentalmente. Outras equações simbólicas precisam ser constituídas para representar o feminino. A fertilidade tera que ser transferida.

Para grande parte das mulheres, ha algo de mágico no menstruar. Lévi-Strauss (1982) fala como, para os povos primitivos, o sangue significa aquilo que marca as relações de parentesco, a consanguinidade; e como o sangue menstrual, nas mulheres, adquire um caráter sagrado.

Também Frazer, no seu clássico O ramo de ouro (1982), comenta o modo como diferentes culturas tratam o menstruar das mulheres. Há rituais diversos, mas há algo comum em todos eles. As adolescentes na menarca devem ser isoladas de qualquer contato. Esse isolamento não sinaliza fraqueza; refere-se à crença comum, nas mais diversas culturas, de que as mulheres menstruadas estão tomadas de poderes nem sempre possíveis de serem dominados.

Em Heridas simbólicas, Bruno Bettelheim (1974) aponta para o fato de que a menstruação das adolescentes é invejada pelos jovens meninos. Relata como, em sua experiência com adolescentes numa comunidade em que trabalhou, os meninos cortavam-se na época em que as meninas menstruavam, tentando viver uma situação analógica à delas.

No caso desta paciente, observei, porém, que ela passou muito ligeiramente os conteúdos simbólicos da fecundidade para a filha, que seria simbioticamente sua extensão. Por que, aparentemente, para ela, isso ocorrera sem nenhuma dor e luto?

Há uma sessão muito esclarecedora em que essa paciente chega e diz, deitando-se no divã: "Não estou nada contente com esta situação em que me encontro na análise." A partir daí, passa a tecer considerações sobre o fato de todos a estarem vendo bem mais bonita. "O meu marido", diz ela, "está tesudo.’" Através de inúmeras associações, mostra como a relação sexual tem para ela um caráter insuportável. É ela quem quer conduzir a relação. "Não tenho prazer nenhum nas posições ortodoxas.’" Proponho-lhe que ela teme ser submetida na relação ali comigo. Ela responde: "A palavra é essa: submissão. Agora você pegou. Tenho horror a ser submetida.’" Através de uma intrincada rede de associações, e com muita emoção, ela reconstitui um episódio que viveu aos 5 anos. Nessa época, sofria terrores noturnos. Temia ser atacada por monstros. Pode-se pensar na situação edipiana da menina só, excluída do quarto dos pais. Numa noite em que está com medo, ela vai até o quarto deles. Ao abrir a porta, vê os pais tendo uma relação sexual.

A cena clássica, meu pai deitado em cima de minha mãe. Não entendi claramente o que estava acontecendo, mas meu pai ficou absolutamente furioso comigo e começou a berrar. Saí correndo, assustada e humilhada.Penso que devia ser horrível o que eles estavam fazendo, por causa da fúria de meu pai. E eu devia ser mais horrível ainda.

Esta reconstrução, juntamente com outras que se seguiram, tem iluminado sua relação amorosa com os pais, em que se sente invejosa e, principalmente, reprimida em sua própria sexualidade pela imago paterna. Sempre percebe sua mãe como alguém que está sendo humilhada por seu pai e, ao mesmo tempo, como alguém que renuncia a todo prazer pessoal, enquanto "paparica" o pai. Tenho podido notar o quanto essas imagos paterna e materna permeiam toda a sua história sexual, assim como os motivos pelos quais ela suspendera toda a vida sexual e imaginária, passando-a para a filha como quem se desfaz de um pesado fardo. A repressão de seu pai, que ela interiorizara, assim como a submissão de sua mãe estão atuando sempre. Ao longo da história de sua vida sexual com diferentes parceiros, nunca pôde obter o orgasmo de forma plenamente genital, mas sempre através de manipulações. Seu marido adulto e "tesudo" é visto como uma ameaça. Ela maneja-o de maneira a não ser submetida a ele e sim a submetê-lo, como fazia seu pai com sua mãe. Ao mesmo tempo, estabelece com a filha uma relação simbiótica na qual se despoja de tudo o que é seu, repetindo com isso sua mãe submissa.

Podemos pensar o quanto, além de árido, este terreno repetitivo se tornou estéril muito antes de ser assim. A história que vive comigo, durante a análise, poderá jogar os dados da história do seu Édipo e criar novas combinações. Como vimos, seu Édipo está articulado em torno do fato de que o pai, em sua imago, penetra seu espaço enquanto aquele que a submete. Ora ela se identifica com essa imago e vive a que submete, ora vive o temor de ser submetida. Sua vida amorosa e sexual está permeada por esta combinação de imagos.

Penso, contudo, que o pênis pode ser aquele que penetra para que se tenha melhor conhecimento do próprio, isto é, daquele outro que, penetrando o corpo feminino, revela-lhe que ele tem muitos níveis de profundidade. Assim também penso que minha palavra de analista pode penetrar o universo mental dessa paciente, como uma proposta integradora, desalienando sua produção de desejos.

Outra questão que minha paciente suscita é o problema dos herdeiros. Para lidar com o tempo inexorável que não pode ser detido por nossos feitos, ocorre-nos transmitir esses mesmos feitos para as novas gerações.

Essa situação de minha paciente lembrou-me o romance A morte em Veneza, de Thomas Mann (1960), quando o velho escritor Aschenbach apaixona-se por Tadzio, o jovem que simboliza sua própria juventude perdida. Neste conflito entre vida e morte, podemos suportar a morte se pensarmos que nossa fertilidade poderá prosseguir no outro que nos sucederá. Mas também podemos ser abortivos, não suportando as novas gerações, que testemunham o nosso fim.

Essa minha paciente vivia sua ligação com a filha como um amor narcísico, pois a filha deveria estar aderida a ela como uma prótese. Em contrapartida, minha paciente não deveria mais ter vida própria, já que sua filha vivia por ela.

Enquanto analistas, todos sabemos que esta é uma questão fundamental em nosso trabalho: pelo fato de sermos idealizados por nossos pacientes e colegas mais jovens, corremos o risco de criar pequenas cortes para nos alimentar, em vez de simplesmente legarmos a eles a nossa produção.

Termino perguntando por que saímos do isolamento dos nossos consultórios e tentamos refletir sobre nosso trabalho com nossos pares da comunidade científica, assim como com uma comunidade mais abrangente. Creio que também aí a intersubjetividade está presente. Precisamos do outro, da diferença e do conflito, para que enigmas sejam decifrados e novos enigmas sejam propostos.

 

Notas

1 Trabalho original publicado em 1986: Revista Brasileira de Psicanálise, 20(2),187-206.

2 A palavra opção não contém toda a riqueza da constituição da sexualidade, porque não leva em conta o nível da produção de desejo no seu inconsciente.

 

Referências

Bettelheim, B. (1974). Heridas simbólicas (P. Grieve, Trad.). Barcelona: Barral.         [ Links ]

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