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Revista Brasileira de Psicanálise

Print version ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál vol.53 no.1 São Paulo Jan./Mar. 2019

 

ÓDIO

 

O relato de uma experiência estranha1: o surgimento do ódio no analista

 

An account of an uncanny experience: the emergence of hatred in the analyst

 

El relato de una experiencia extraña: el surgimiento del odio en el analista

 

Le récit d'une expérience étrange: la montée de la haine chez l'analyste

 

 

Douglas Rodrigo PereiraI; Nelson Ernesto Coelho JuniorII

IPsicólogo e psicanalista. Doutorando em psicologia experimental pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP). Bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ)
IIProfessor doutor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP). Psicanalista. Autor de Dimensões da intersubjetividade (2012) e, em coautoria com Luís Claudio Figueiredo, de Adoecimentos psíquicos e estratégias de cura (2018), entre outros livros e artigos em periódicos nacionais e internacionais da área

Correspondência

 

 


RESUMO

Neste artigo, apresentamos uma situação clínica na qual o analista viveu o seu ódio como uma experiência estranha (unheimlich). Discutimos como o ódio do analista se relacionou com a necessidade de proteção narcísica contra o perigo da indiferenciação entre o eu e o outro. Conjeturamos que o abalo das fronteiras do eu e a sensação de automatismo foram os dois fatores que levaram o analista a viver o seu ódio como um fenômeno estranho.

Palavras-chave: estranho (Unheimliche), ódio, narcisismo, transferência, contra-transferência


ABSTRACT

A clinical situation is presented in which the analyst experienced hatred as an uncanny (Unheimliche) occurrence. We discuss how the analyst's hatred was related to a need for narcissistic protection against the danger of undifferentiation between Self and other. We conjecture that a disruption of the boundaries of Self and a feeling of automatism were the principal factors leading the analyst to experience hatred as an uncanny phenomenon.

Keywords: the uncanny (Unheimliche), hatred, narcissism, transference-countertransference.


RESUMEN

Tenemos el objetivo de presentar una situación clínica en la que el analista vivió su odio como una experiencia extraña (Unheimliche). Discutimos cómo el odio del analista se relaciona con la necesidad de protección narcisista contra el peligro de la indiferenciación entre el Yo y el otro. Conjeturamos que la sacudida de las fronteras del Yo y la sensación de automatismo fueron los factores principales que llevaron al analista a vivir su odio como un fenómeno extraño.

Palabras clave: el extraño (Unheimliche), odio, narcisismo, transferencia-contratransferencia


RÉSUMÉ

Notre objectif est de présenter une situation clinique dans laquelle l'analyste a vécu sa haine comme une expérience étrange (Unheimliche). Nous discutons comment la haine de l'analyste établit une relation avec le besoin de protection narcissique contre le danger de l'indifférenciation entre le Soi et l'autre. Nous présumons que la secousse des frontières du Soi et le sentiment d'automatisme ont été les deux facteurs qui ont amené l'analyste à vivre sa haine comme un phénomène étrange.

Mots-clés: étrange (Unheimliche), haine, narcissisme, transfert-contre-transfert


 

 

Introdução

A contratransferência é quando nos sentimos vivamente tocados. ... Escutei a mim mesmo respondendo: "De jeito nenhum, é quando nos sentimos mortalmente tocados".

JEAN-BERTRAND PONTALIS

Este trabalho tem o objetivo de apresentar e discutir uma situação clínica na qual o analista viveu o seu ódio como uma experiência estranha (unheimlich). A nossa hipótese é de que o analista, sentindo-se atacado em sua função analítica, viu-se tomado por um ódio que visava restabelecer as fronteiras do eu e reassegurar o seu narcisismo. Procuraremos mostrar como essa experiência foi vivida como estranha (unheimlich).

No desenvolvimento do nosso trabalho clínico com pacientes adictos em drogas,2 um afeto nos invadia: o ódio em relação aos pacientes. Esse ódio se manifestava por meio de pensamentos de agressão, abandono, tortura e morte de alguns deles. Sentíamos culpa por sermos invadidos pelo ódio. Passados alguns anos do término do trabalho institucional com esses pacientes, e em uma espécie de après-coup, encontramo-nos revendo essa experiência clínica e dando-lhe outro destino, fora do alcance das mãos da culpa e da vergonha.

Searles (1966/1999a) pensa sobre a culpa do analista de uma forma bastante livre. Nós, influenciados pela sua liberdade para transmitir as suas experiências clínicas, procuramos discutir o ódio do analista como um fenômeno clínico relevante em uma análise, sobretudo no que se refere ao atendimento de casos não neuróticos, como bem mostraram Winnicott (1947/2000) e, em outro texto, Searles (1967/1999b). Com esta comunicação da nossa experiência, pretendemos suscitar no leitor uma reflexão sobre situações do seu trabalho clínico nas quais o ódio do analista se fez presente de maneira inquietante e perturbadora. Sublinhamos que a nossa proposta é realizar questionamentos e aberturas sobre o tema do ódio do analista. Por esse motivo, apresentaremos perguntas sem a pretensão de respondê-las.

 

O ódio narcísico e a fronteira entre o eu-prazer e o objeto

Em seu clássico conto "O Cobrador" (1979/2010), Rubem Fonseca cria uma narrativa que transborda uma brutalidade visceral. A personagem está impregnada de ódio, um ódio em relação ao mundo faltante e frustrante, um ódio vivo e barulhento, dito e atuado em alto e bom som. O mundo lhe deve - mas lhe deve o quê? O que os objetos devem para esse homem sem nome? Ele assim se expressa: "Digo, dentro da minha cabeça, e às vezes para fora, está todo mundo me devendo! Estão me devendo comida, buceta, cobertor, sapato, casa, automóvel, relógio, dentes, estão me devendo" (p. 8). Não há saída: o Cobrador, movido por uma vingança contra objetos internos devedores e ex-cludentes, é impelido a cobrar. Cobrança assassina, mas vital.

O fato de esse homem não ter nome e ser identificado como o Cobrador dá um indício de que a sua busca assassina lhe garantia alguma consistência narcísica. "Eu sou uma hecatombe/ Não foi nem Deus nem o Diabo/ Que me fez um vingador/ Fui eu mesmo/ Eu sou o Homem Pênis/ Eu sou o Cobrador". O ódio lhe era uma espécie de combustível narcísico. "Quando satisfaço meu ódio sou possuído por uma sensação de vitória, de euforia que me dá vontade de dançar" (p. 21) - e ele precisava sempre dançar.

Iniciamos com esse pequeno comentário sobre o conto de Rubem Fonseca para sublinhar o ponto que queremos discutir: a relação entre o narcisismo e o ódio. Mais especificamente, trabalharemos com o ódio e o narcisismo do analista.

Freud3 (1915/2010c) considera o ódio um afeto primário decorrente do encontro do eu-prazer com o objeto. O objeto surge como um intruso que irrompe o fechamento narcísico do bebê. Vale ressaltar que o eu-prazer se refere a um momento inicial mítico, no qual ainda não existe um eu como instância psíquica. Freud utiliza esse termo para pensar a origem da oposição entre sujeito e objeto (Laplanche & Pontalis, 1967/1995). Essa oposição se realiza com base nos registros de prazer e desprazer. Assim, "o eu-de-prazer4 original quer introjetar tudo que é bom e excluir tudo que é mau" (Freud, 1925/2011b, p. 278). Nesse momento inaugural, o objeto precisa ser atacado por provocar o desprazer do contato com a alteridade. O que é prazeroso é idêntico ao eu-prazer; o que é desprazeroso vem de fora e é estranho ao eu-prazer. Cromberg descreve bem a dinâmica desse ódio narcísico:

A experiência com o mundo exterior, onde vai vivenciar os seus limites, vai se encarregar de progressivamente desmentir essa onipotência, que, no entanto, permanecerá inconsciente, passível de ressurgir. Não há razão ou consciência que elimine para sempre os seus monstros. Então, temos aí a irrupção de um ódio narcisista que é expressão agressiva e destrutiva de ruptura, pelo mundo exterior, dessa crença desejante onipotente inicial do mundo interno, ainda que, no início, essa separação seja tênue e que seja a própria constituição dela que às vezes parece ser intolerável e geradora de ódio. (2010, p. 282)

Para nós, é importante o ponto que André (2015) destaca: o ódio traça fronteiras. Assim,

quando a distância entre o eu e o outro tende a ser abolida à força de ser demasiado tênue ... quando o narcisismo é reduzido às "pequenas diferenças", grande é o perigo de ver o ódio rasgar violentamente o que a realidade parece confundir. (pp. 113-114)

O objeto, como fonte primária de sofrimento (Menezes, 2001b), precisa ser constantemente "posto em seu lugar" de externo e diferente do eu-prazer. Dessa forma, o ódio tem a função primária de discriminar o eu-prazer do objeto.

O ódio, no sentido aqui apresentado, inaugura um tempo originário de diferenciação entre o eu-prazer e o objeto. A fronteira originária rudimentar entre o dentro e o fora vai sendo constituída. Entre as suas variadas formas de expressão e qualidades, o ódio pode surgir em uma análise como defesa contra o perigo de uma ruptura narcísica. O ódio defensivo pode emergir tanto no psiquismo do analisando quanto no psiquismo do analista, além de no campo analítico5 constituído pela dupla.

 

Breve comentário sobre o ódio do analista

Como vimos, em um trabalho simultâneo de diferenciação em relação ao objeto e de investimento no eu-prazer, o ódio marca e remarca, de maneira incessante, as fronteiras entre o dentro e o fora, o idêntico e o diferente.

Tendo como tema o ódio do analista, duas questões se configuram: como pensar a função diferenciadora/separadora do ódio no psiquismo do analista em uma sessão?6 Seria esse aspecto narcísico do ódio mobilizado em momentos nos quais o psiquismo do analista é atacado e a fronteira entre sujeito e objeto tende a se desvanecer?

Desde Ferenczi (1990), passando pela contribuição de analistas como Winnicott (1947/2000), Searles (1967/1999b) e Kernberg (1995), sabemos que o ódio do analista será mobilizado de modo intenso nos casos de não neurose. Mesmo em quadros de neurose, o ódio do analista poderá ser mais evocado em momentos clínicos regressivos. Esse ódio pode ser expresso de diversas maneiras. Winnicott (1947/2000), por exemplo, vê o final da sessão como uma forma de expressão do ódio recalcado do analista7 - mas será mesmo que o "fechar a porta" no consultório representa o ódio do analista, sendo esse um afeto tão visceral?

A nossa experiência clínica nos mostra que o ódio do analista pode apresentar tanto um colorido mais forte, exprimindo-se por meio de imagens, sensações e pensamentos violentos e destrutivos (matar, agredir e humilhar), quanto um colorido mais apagado, no qual o ódio passaria a ter um tom mais desinteressado e desvitalizado (indiferença, vazio, tédio e apatia). Há, portanto, um matiz de formas de expressão do ódio do analista. É importante observar que entendemos o ódio como um afeto originado em um registro mais primitivo do psiquismo, no qual a sobrevivência narcísica é central (Minerbo, 2009).

A vinheta clínica a seguir ilustra a emersão do ódio do analista e o seu efeito na dinâmica da transferência-contratransferência.

 

A quase morte em busca de vida

A paciente foi atendida em uma instituição pública de tratamento para adictos em drogas. Apresentamos um breve histórico do caso e destacamos fragmentos de uma sessão.

Trata-se de uma mulher de 45 anos.8 Casara-se várias vezes com homens agressivos, que batiam nela. As agressões que sofria eram graves e ameaçavam a sua vida. Chegou a ter as costelas quebradas e a ser esfaqueada. Quase morreu após discutir com um traficante: foi espancada e teve fraturas em diversas partes do corpo - corpo esse que se tornava o palco de um espetáculo brutal. Seria uma forma de manter vivo um corpo que somente violentado parecia ser reconhecido?

O seu modo de contato com o outro nos fez recordar os pacientes descritos por Betty Joseph no artigo "O vício pela quase morte" (1982/1992): pessoas que buscam viver perigosamente e criam uma espécie de vício em quase morrer. Joseph atribui esse tipo de dinâmica destrutiva à ação da pulsão de morte. Em nossa opinião, entretanto, no caso que apresentamos o corpo violentado não revelava uma forma de desligamento. Parece-nos que somente por meio desse corpo em "carne viva", desse corpo encharcado de cólera e inebriado por sangue e dor, ela podia manter algum contato com o outro. Dito de outra maneira, o ódio parecia ser o meio mais conhecido de contato com o objeto, algo na linha do que Bollas (1987/2015b) denomina ódio amoroso: o ódio como a único modo de ligação psíquica com os objetos. Odeio e agrido, logo existo e sou visto pelo objeto.

Filha mais nova de uma família de seis irmãos, o pai morrera quando ela era pequena. A mãe, que se deprimiu muito e pouco pôde cuidar da filha caçula, transmitia-lhe uma dupla mensagem: dizia amá-la muito, mas ao mesmo tempo nunca demonstrava afetos sinceros. A paciente buscava manter contato com a mãe, porém elas sempre brigavam ferozmente.

Na adolescência, a paciente começou a se prostituir e a traficar. Desde então, com algumas idas e vindas, a cocaína era uma "amiga" Usava crack esporadicamente, mas dizia que era "apaixonada mesmo por pó" A droga intensificava a sua necessidade de agredir e de ser agredida. Aos poucos, foi se dando conta de que provocava as agressões: lembrou-se das vezes em que atacou um dos seus companheiros quando ele estava "bruxo9 de pó" Com base em Winnicott (1969/1975), pensamos que a paciente necessitava de um objeto que sobrevivesse aos seus ataques. A sobrevivência do objeto é o que estava em jogo. Cada vez que o objeto não sobrevivia aos seus ataques, mais a sua destruição se tornava real? Como o objeto poderia sobreviver aos seus ataques extremamente odiosos?

Além dos atendimentos individuais, a paciente participava de grupos operativos na instituição. Em dado momento de um atendimento gru-pal, ela não concordou com um comentário da psicóloga que conduzia o grupo. Violentamente, a paciente mandou a profissional "tomar no cu" e "se foder" A psicóloga nos contou a situação e sugeriu que lhe aplicássemos uma punição. No entanto, acreditávamos que a punição não era a melhor intervenção possível. Puni-la seria uma forma de atuação. Nesse momento de impasse, a paciente nos procurou, invadindo a nossa sala para uma conversa. Furiosa, disse que mais uma vez ninguém a entendia e que sabia que iríamos finalizar o seu tratamento. Respondemos que não a expulsaríamos da instituição, mas que ela precisaria pensar em um modo de reparar o ocorrido. Exaltada, disse que gostaria de pedir desculpas para a psicóloga perante o grupo de pacientes, e assim o fez. No entanto, pareceu-nos que as desculpas tinham a natureza de uma pseudorreparação.

As suas sessões começaram a se tornar difíceis de suportar. A transferência-contratransferência reproduzia a dinâmica dos seus relacionamentos amorosos: após um momento de "lua de mel", ela provocava uma ação violenta no outro. Apesar dos seus constantes esforços nessa direção, não podíamos atacá-la. Se assim o fizéssemos, perderíamos o nosso espaço de escuta e nos tornaríamos mais um dos objetos sanguinários que a perseguiam e retaliavam os seus ataques. Sabíamos que a nossa missão era sobreviver sem retaliar, mas entre o saber e o viver há uma grande distância.

Em certa sessão, de forma muito sedutora, a paciente começou a nos elogiar. Dizia que nós a entendíamos e que se sentia melhor com os atendimentos, mesmo não conseguindo parar de cheirar cocaína. Havia uma interpelação a um objeto que não era capaz de ajudá-la em suas necessidades. Comentamos algo sobre ela se sentir sozinha. Como de costume, ela se exasperou e disse que ninguém gostava dela. Sublinhou o que já tinha dito em outras sessões: a existência de um profundo desprezo por tudo e por todos. Desprezava a própria existência assim como a de todas as outras pessoas. Esse suposto desprezo indicava algum ressentimento em relação aos objetos. O desprezo e a indiferença encobriam uma busca por ligação e a esperança de um encontro com algum objeto transformacional, de um encontro com "a experiência de um objeto que transforma o mundo interno e externo" (Bollas, 1987/2015a, p. 63).

Segundo o que nos contou, achava muita graça em vídeos de pessoas sendo mortas violentamente - assistia-os com frequência. Em sessões anteriores, sempre com um sorriso no rosto, detalhou essas mortes chocantes. Eram filmagens de acidentes graves e assassinatos cruéis. Interpretamos que ela parecia desejar que também vivêssemos o seu sofrimento ou que sofrês-semos como as pessoas decapitadas nos vídeos. Perder a cabeça seria algo como perder a capacidade de escuta analítica? Ela riu e disse que novamente não a entendíamos.10

Sentimo-nos tomados por pensamentos que, possivelmente, eram efeitos de identificações projetivas, e começamos a imaginar a paciente sendo torturada e assassinada violentamente. Emergiram desejos de maltratá-la e agredi-la. Fomos invadidos por um calor corporal e uma sensação de explosão dentro do peito. Havia um espanto por nos sentirmos quase autômatos. Sentimos o golpe e gostaríamos de golpeá-la, da mesma forma que ocorria com os seus companheiros agressores - contraidentificação projetiva, conforme descrito por Grinberg (1976). Estávamos surdos em nossa capacidade de escuta. O papel do analista fora diretamente atacado. O nosso corpo estava como que possuído por um espírito violento, que nos dominava. O lugar de analista já havia sido perdido. Restou-nos o silêncio. O silêncio representava o medo, e o medo representava um perigo de morrer ou de matar. A enxurrada de ataques continuou. Calamo-nos. Algo de muito estranho se passou nessa sessão...

Vejamos de que maneira, nessa situação clínica, o ódio do analista pode ser relacionado com a experiência do estranho (Unheimliche) e do narcisismo.

 

O ódio do analista como experiência estranha (unheimlich)

"O estranho" (Freud, 1919/2010b) é um artigo curto, mas denso. Entre os temas tratados por Freud, centramo-nos nos processos psíquicos relacionados à experiência do estranho/familiar (Unheimliche/Heimliche). Diz o autor: "Sem dúvida, relaciona-se ao que é terrível, ao que desperta angústia e horror, e também está claro que o termo não é usado num sentido bem determinado, de modo que geralmente equivale ao angustiante" (p. 329). A dificuldade em traduzir Unheimliche mostra a amplitude semântica dessa palavra. De acordo com Hanns (1996), além de ter o sentido de estranho, esse substantivo alemão pode designar o que é inquietante, sinistro, macabro, assustador, esquisito, misterioso e fantasmagórico.11 Em todas essas acepções, há um sentido geral de assombro diante das manifestações psíquicas que produzem uma sensação de conhecimento e desconhecimento em relação aos derivados do inconsciente.

O que torna uma experiência estranha? De acordo com Freud, o estranho está relacionado ao retorno do recalcado - que emerge sob a forma de conteúdos psíquicos estranhos e familiares -, ao pensamento mágico - como vemos nas superstições, por exemplo - e à repetição do mesmo - a convicção de ter sido dominado por um destino repetitivo e demoníaco.12 Rapidamente, Freud afirma ainda que a vivência do estranho também se relaciona com fantasias primitivas (castração e retorno ao ventre materno). Em linhas gerais, ele aproxima a vivência do estranho aos aspectos mais primitivos do psiquismo, mas não desenvolve essa aproximação. O vínculo entre o estranho e o primitivo abre um campo que vai além da psicopatologia das neuroses. Lembremos que esse texto foi publicado na passagem da primeira para a segunda teoria das pulsões. A ampliação da metapsicologia estava em pleno andamento, e os conceitos que seriam desenvolvidos - cisão do eu, recusa (Verleugnung), segunda teoria da angústia e segunda tópica - tornariam a psicanálise mais complexa, aproximando-a dos sofrimentos não neuróticos.

Concordamos com De Martini e Coelho Junior (2010, 2019) quanto à necessidade de avançar na leitura desse texto de Freud, sem encerrar-se no tema do retorno do recalcado. Os autores propõem que, além do retorno do recalcado, da repetição e do pensamento mágico, outro fator é essencial para o surgimento da vivência do estranho: um descentramento do sujeito, que o retira do campo das experiências familiares.

Mais precisamente, é preciso um terceiro fator para que haja o estranho: o eu (self) deve experimentar a vivência momentânea de colapso entre os domínios do que é familiar e do que é estrangeiro. Nem todo pensamento mágico, nem toda repetição ou retorno do recalcado produz o efeito do estranho, mas tão somente aqueles que produzem esse "efeito narrativo", esse descentramento do self em relação ao terreno que lhe é habitualmente familiar. (2010, p. 384)

Esse descentramento nos leva ao tema dos limites e da diferenciação eu/outro, consciente/inconsciente, realidade/realidade psíquica. Além dos processos psíquicos indicados por Freud no artigo de 1919, o fenômeno do estranho teria que ser interpretado como efeito de uma vivência de colapso momentâneo dos limites do eu. Quando Freud analisa o tema do duplo, ele aponta para o tema do limite entre eu e outro. Entretanto, ele não o desenvolve exaustivamente. Partindo das postulações de De Martini e Coelho Junior (2010), entendemos que este é um caminho aberto de pesquisa: a vivência do estranho e a sua relação com os limites.

Em um texto mais recente, os mesmos De Martini e Coelho Junior (2019) reafirmam ser este o fator fundamental para a vivência cotidiana do estranho: o deslocamento/descentramento do sentimento de si para algum lugar fora do seu lugar/espaço habitual. Pensamos que esse deslocamento/des-centramento pode acarretar um perigo de esfacelamento narcísico - e o ódio não poderia ser uma maneira de restabelecer os limites e realizar uma espécie de alinhamento/centramento desse sentimento de si abalado? Dito de outro modo, o ódio narcísico não poderia ter a função, no psiquismo do analista, de restabelecer as fronteiras entre sujeito e objeto e permitir que a escuta analítica seja resgatada?13

A nossa hipótese central é que houve um colapso no psiquismo do analista - uma forma de descentramento descrita por De Martini e Coelho Junior (2010, 2019) - e que o ódio surgiu como defesa narcísica. Esse colapso promoveu uma cisão (uma espécie de duplo?) entre um analista que pensava como sobreviver aos ataques recebidos e um analista que sentia no corpo o ódio quase como uma possessão demoníaca. O ódio surgiu para demarcar os limites entre sujeito e objeto e resgatar a autonomia do analista, o que fora abalado pelo processo de identificação projetiva. Ora, concordando com Menezes (2001a), vemos que o fenômeno da inoculação de aspectos cindidos da paciente no analista já é por si só estranho. Uma fantasia - com efeitos reais - de cisão e invasão do corpo do outro? Que fantasia mais estranha...

Em suma, conjeturamos que o abalo das fronteiras do eu e a sensação de automatismo foram os dois principais fatores que levaram o analista a viver o seu ódio como um fenômeno estranho (unheimlich). Entendemos que a natureza defensiva do ódio do analista dá indícios da dinâmica da transferência-contratransferência no campo analítico. Lembremos: nos casos de psicose, e nos casos de neurose em momentos de regressão à dependência, o ódio do analista é um fato (Winnicott, 1947/2000). Em companhia de Minerbo (2009), ressaltamos que o ódio do analista foi uma resposta defensiva no nível não neurótico do seu psiquismo e que esse afeto apontava para o sofrimento narcísico vivido pela paciente.

Não obstante, a rigor, se trataria de ódio estranho e familiar (unheimlich/heimlich)? Qual o componente familiar/conhecido desse ódio? A nossa hipótese é que o efeito estranho/familiar não viria do retorno do recalcado, mas da utilização do ódio como processo primitivo - pois constitutivo - de separação, ainda que rudimentar, entre eu e outro. Indiferenciação/diferenciação seria uma forma de expressão do estranho/familiar. Por conseguinte, estamos novamente tocando no tema da alteridade e dos limites do eu.

 

Considerações finais

Freud inaugurou a investigação sobre a experiência do estranho (Unheimliche), mas os analistas ainda têm muito a pesquisar sobre o assunto, especialmente no que tange aos aspectos primitivos/constitutivos do psiquismo e aos seus efeitos na produção da vivência estranha.

A partir do trabalho de De Martini e Coelho Junior (2010, 2019), vimos como o estranho ( Unheimliche) se relaciona com a constituição do eu. É nesse descentramento de si, nesse abalo das fronteiras, que a experiência do estranho se dá. Trata-se de uma necessária aproximação entre o estranho (Unheimliche) e o narcisismo. Foi por isso que trouxemos o ódio narcísico para a cena. Considerando a sua função separadora, entendemos que esse afeto pode surgir como uma espécie de defesa contra a experiência de esfacelamento do eu e de quase dissolução da sua fronteira com o objeto. Para melhor compreender essa função separadora do ódio do analista, precisaríamos nos debruçar mais atentamente sobre uma espécie de metapsicologia do analista em sessão, tarefa que ultrapassaria os nossos objetivos neste artigo.

Retomemos o conto de Rubem Fonseca (1979/2010) abordado antes. O ódio do Cobrador, diante da ameaça narcísica de aniquilamento, leva-o a estabelecer fronteiras nítidas entre o idêntico e o diferente, que nesse caso são os objetos devedores. "Eu não pago mais nada, cansei de pagar!, gritei para ele, agora eu só cobro!" (p. 7). Cobrar se tornava uma espécie de exercício de sobrevivência diante das ameaças narcísicas. O Cobrador não podia escolher cobrar, pois cobrar era-lhe uma "função naturalmente obrigatória", dava-lhe vida, e ele necessitava desse combustível odioso para viver. "Fico na frente da televisão para aumentar o meu ódio. Quando minha cólera está diminuindo e eu perco a vontade de cobrar o que me devem eu sento na frente da televisão e em pouco tempo meu ódio volta" (p. 8). Vemos, portanto, um exemplo de como se dá essa articulação entre o ódio e o narcisismo. Odeia-se para estar vivo, apesar da destruição que esse ódio pode promover.

Finalizamos com um trecho de um texto de Menezes: "Inquietação, inquietante estranheza, Unheimliche, aquilo que diz respeito à angústia que se encontra à espreita nas bordas incertas do eu" (2001a, p. 60). Quantos es-tranhamentos, quantas incertezas, quantas inquietações sobre o estranho e o ódio em nosso ofício de analisar - e de viver.

 

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Correspondência:
Douglas Rodrigo Pereira
Rua Santo Albano, 848, bloco 1, ap. 22
04296-000 São Paulo, SP
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Nelson Ernesto Coelho Junior
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Tel.: 11 3288-8202
ncoelho@usp.br

Recebido em 18/3/2019
Aceito em 16/4/2019

 

 

1 Uma versão preliminar e reduzida deste trabalho foi submetida ao Comitê Científico do 27.° Congresso Brasileiro de Psicanálise. Trata-se de um desdobramento de nossa pesquisa de doutorado sobre o ódio. Desenvolvemos essa pesquisa no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP). Agradecemos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela bolsa concedida.
2 Trata-se de uma experiência institucional vivida pelo primeiro autor deste artigo.
3 Grosso modo, do ponto de vista metapsicológico, podemos destacar três momentos do ódio na obra de Freud: 1) o ódio como expressão do sadismo infantil (1905/2016); 2) o ódio como afeto primário decorrente do encontro do eu-prazer com o objeto (1915/2010c); 3) o ódio como manifestação da pulsão de morte no psiquismo (1923/2011a). No que concerne à psicopatologia, Freud aponta diferentes formas de expressão do ódio e suas relações com determinadas entidades psicopatológicas. Assim, o ódio recalcado ao pai é um elemento central na neurose obsessiva (1909/2013), o ódio paranoico é uma defesa diante do amor homossexual ao pai (1911/2010e), enquanto na melancolia o ódio ao eu representa o ódio ao objeto introjetado (1917/2010d).
4 Souza opta por traduzir Lust-Ich por eu-de-prazer. Optamos por utilizar a expressão eu-prazer, seguindo o texto de Laplanche e Pontalis (1967/1995).
5 Referimo-nos ao conceito clínico de campo analítico, conforme descrito por Baranger e Baranger (1961/2010).
6 O ódio é um tema complexo, e há uma vasta produção psicanalítica sobre ele. Como o nosso foco é a função diferenciadora/separadora do ódio, não discorreremos sobre esse afeto em sua amplitude. Aos interessados em diferentes leituras sobre o ódio, indicamos os seguintes trabalhos: Barros (2013), Enriquez (1999), Falcão (2017), Macedo (2011), Menezes (2001b), Mezan (2014), Minerbo (2009), Pereira e Coelho Junior (2019), Robert e Kupermann (2015) e Stein (1988).
7 Em razão de nosso objetivo, não discutiremos a especificidade da teoria de Winnicott sobre a origem do ódio e a função do ódio da mãe/analista no desenvolvimento psíquico do bebê. Trabalhamos esse tema em outro texto (Pereira & Coelho Junior, 2019).
8 Para preservar a confidencialidade, modificamos algumas informações e não apresentamos dados que possam facilitar o reconhecimento das pessoas envolvidas.
9 Bruxo é a palavra utilizada por alguns para designar o estado de uma pessoa intoxicada por cocaína.
10 Pensamos que essa interpretação (que ela parecia desejar que também vivéssemos o seu sofrimento ou que sofrêssemos como as pessoas decapitadas nos vídeos) pode ter sido um recurso defensivo utilizado pelo analista diante dos ataques vividos como ataques ao seu narcisismo. Atualmente, consideramos essa interpretação um tanto apressada e estereotipada.
11 Na tradução da editora Imago, Unheimliche é apresentado como estranho. Já na tradução de Paulo César de Souza, o substantivo foi vertido por inquietante. Como observa Hanns (1996), as duas alternativas são coerentes. Optamos por utilizar o termo estranho. Essa opção está fundamentada na possibilidade de aproximação e diferenciação entre o estranho e o conhecido.
12  Há aqui um prenúncio do tema da compulsão à repetição, elaborado por Freud em Além do princípio do prazer (1920/2010a).
13 Deliberadamente, tendo em vista que o nosso objetivo é pensar na função separadora do ódio do analista, não discutiremos a dinâmica do ódio nos momentos regressivos de indiferenciação eu/outro. Trata-se de um trabalho a ser realizado.

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