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Revista Brasileira de Psicanálise

Print version ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál vol.53 no.3 São Paulo July/Sept. 2019

 

RESENHAS

 

Los huéspedes del yo: las identificaciones y desidentificaciones en la clínica psicoanalítica1

 

 

Mercedes PucholI; Tradução Ruggero Levy

IPsicóloga clínica, psicoterapeuta e psicanalista

Correspondência

 

 

Editora: Teresa Olmos de Paz
Editora: Biblioteca Nueva, Madrid, 2018, 160 p.
Resenhado por: Mercedes Puchol

 

 

Sendo a identificação um conceito central para compreender a organização psíquica do ser humano e uma noção básica que atravessa a teoria e a prática psicanalítica, é fonte de satisfação especial para a comunidade psicanalítica poder dar as boas-vindas a Los huéspedes del yo: las identificaciones y desidentificaciones en la clínica psicoanalítica, livro que percorre esse conceito, em toda a sua amplitude, complexidade e riqueza teórica e clínica, com o mais alto nível de profundidade e rigor que a abordagem dele requer.

Na verdade, como começa dizendo Ruggero Levy no seu artigo, "um livro sobre a escuta das identificações e desidentificações na clínica psicanalítica é muito relevante, pois permite rever a questão desde uma perspectiva contemporânea" (p. 59). A partir dessa perspectiva, penso que a maneira como este livro aborda, tanto na substância quanto na forma, os conceitos de identificação e desidentificação na teoria e na clínica psicanalítica é eminentemente característica da psicanálise contemporânea, o que também nos possibilita descrevê-lo como um estudo bastante atual sobre essas concepções. Um conjunto de psicanalistas internacionalmente renomados iluminam e dão voz a diferentes hóspedes do eu, com base em diferentes vértices, referências e modelos teórico-clínicos, oferecendo um conjunto de perspectivas que permitem ao leitor descobrir por si mesmo a complexidade, riqueza e profundidade inerente ao conceito de identificação e à sua contraparte, a desidentificação, conceito aberto a significações e ressignificações sucessivas - tudo isso ligado ao prazer que sempre acompanha o conhecimento e a boa escrita.

Nesse sentido, Los huéspedes del yo nos abre à complexidade do pensamento sobre o conhecimento tanto do eu quanto dos seus hóspedes, pensamento complexo (no sentido original do termo complexus: o que é tecido em conjunto) que, como tal, essencialmente vincula e/ou cria vínculos. Como observa Rachel Blass, o verbo vincular, em relação a outros verbos que expressam o ato de conectar, enfatiza a distinção entre parceiros (em contraste, por exemplo, com unir) e aponta a tendência a juntar-se numa unidade maior (como os elos de uma cadeia). Precisamente, o conjunto de todos os artigos, enquanto elos de uma cadeia, compõe a unidade deste livro e se abre para que cada leitor-autor reflita a sua singular criação/metabolização dos conceitos de identificação e desidentificação por meio do encontro/diálogo entre as diferentes conceituações nele incorporadas, as quais incluem analogias, complementaridades e até mesmo oposições geradoras de tensões dialéticas fecundas. Tudo isso dá conta da riqueza que brota da complexidade de um conceito princeps, que abrange tanto a teoria quanto a clínica psicanalítica e que nos constitui como seres humanos.

Se o eu é visitado e/ou habitado por hóspedes diferentes, poderiamos perguntar: quem e como são esses hóspedes? Como eles o habitam? Os vários capítulos do livro, editado por Teresa Olmos de Paz, convidam-nos a conhecer o conjunto amplo e diversificado de hóspedes do eu através da criatividade e das reflexões teórico-clínicas dos autores dos cinco trabalhos que o integram, juntamente com a introdução da própria editora. Por meio desse texto, Olmos de Paz nos introduz esplendidamente na essência, função e origem da identificação, discriminando-a também de outros conceitos intimamente ligados, como os de incorporação e introjeção. De acordo com os pontos apresentados pela autora, o problema da identificação é inseparável da constituição do psiquismo, e a sua consideração metapsicológica está ligada à teoria do complexo de Édipo e aos seus eixos centrais. "É por causa da história do vínculo com os seus objetos que o eu constrói a sua própria história" (p. 12), especifica.

Nessa perspectiva, a entrada em cena do eu é contemporânea ao início do tempo historizado e, portanto, da criação/construção da história dos hóspedes do eu, que, através do abandono das investiduras de objeto, dá lugar aos processos de identificação como processos inconscientes que produzem uma alteração no eu, oferecendo-lhe também pontos de ancoragem simbólicos, que ao mesmo tempo se abrem e o abrem à dinâmica e a mudanças. Assim, Olmos de Paz mostra que a identificação primária surge como constituinte do eu e instauradora do narcisismo residual do sujeito, por meio de um "ser identificado por" que possibilita ao desejo inconsciente manter-se reprimido. Dessa forma, a repressão se erige em condição da identificação, a qual, ao mesmo tempo, está ligada à sublimação como capacidade de identificação com a potencialidade simbólica do outro e como abertura para a possibilidade de "identificar-se a".

Mas os hóspedes do eu também podem exercer a sua tirania sobre ele, como quando se estabelecem no eu ideal certos modos de ser que submetem o sujeito a uma angústia de aniquilação que não lhe permite encarar os ideais enquanto alternativas, impondo-se assim, segundo Olmos de Paz, uma identificação como traço único. Nessa vertente patológica da identificação em que a autora nos introduz, também podemos encontrar hóspedes que alienam o eu e instauram nele uma potencialidade desorganizadora, ao modo de um vínculo internalizado enlouquecedor - hóspedes que comandam essas diferentes identificações e que farão a sua aparição no processo analítico mediante a transferência, que é "o lugar onde se produz o interjogo das identificações-desidentificações e a criação de novas identificações" (p. 17).

Do ponto de vista de Olmos de Paz, a desidentificação desses tipos de identificação constitui um dos marcos do processo analítico e corresponde ao tempo do desalojamento dos hóspedes do eu. Esse processo de desidentificação, que envolve a reestruturação das identificações e promove o crescimento mental, refere-se às identificações que alienam o sujeito, e exige a desidealização das imagos parentais e um "árduo trabalho de transformação e elaboração de identificações patológicas" (p. 19), as quais, como assinala a autora, correspondem essencialmente às da primeira infância, que foram estabelecidas como resultado de situações traumáticas e que alienam o sujeito e o submetem a um funcionamento psíquico de compulsão à repetição.

São precisamente as identificações alienantes, a sua relação com as imagos e o processo transcendental de desidentificar-se delas que Maurizio Balsamo considera em "Imago, identificações alienantes e processos de de-sidentificação", o primeiro capítulo do livro. Desde o início, o autor lembra o papel fundamental da imago em todas as múltiplas situações clínicas que implicam um bloqueio do trabalho psíquico como expressão de identificação alienante. Esse importante conceito para a teoria e a clínica psicanalítica da identificação-desidentificação, que Balsamo já abordou em trabalhos anteriores, se caracteriza pela remoção de investimentos da natureza móvel e cambiante do tecido representativo mediante o estabelecimento de um corpo estranho interno, a imago que, constituindo um objeto bizarro nos limites do próprio espaço psíquico, ao modo de uma "coalescência dos pais", apresenta um caráter de elemento perceptivo que coloniza o sujeito impondo uma profunda proibição de inscrição de uma diferença. Desse modo, instala-se no sujeito uma imagem fixa e imóvel, nos limites do psíquico, que absorve o fluxo associativo, dando conta da marca do trauma e da instauração da identificação alienante com a (e na) história do outro, alienação que impede a dimensão subjetiva/tradutória e restabelece uma condição fatídica através do desaparecimento do princípio da esperança. Em consequência, esse restabelecimento de uma condição fatídica impede que o assassinato da imago ocorra por meio do perdão e do esquecimento.

A partir dessa perspectiva, Balsamo examina, pelo seu trabalho e pelas vinhetas clínicas que o acompanham, o peso e a potência das imagos que se manifestam através do caráter altamente invasivo e intrusivo das identificações alienantes, as quais tentam impor o mimetismo do outro e no outro, e ainda a possibilidade esperançosa de que um processo de desidentificação comece a acontecer. Assim, podemos observar de que maneira o imóvel, também representante do impensável do buraco do ser, põe em marcha na análise um "processo em idêntico", próprio do "funcionamento em imago", o qual por sua vez pode coexistir com um "funcionamento em representação e associação", essência da dimensão imaginativa, que os processos de desidentificação tornam possível novamente. No entanto, paradoxalmente, o sujeito em análise pode necessitar "reavivar a imago" na relação transferencial, pela necessidade de passar ao ato e apresentar o objeto alienante numa espécie de materialidade da cena desidentificatória que reivindica a presença e o apoio do outro-analista.

Dessa forma, e isso parece especialmente interessante, Balsamo mostra que o excesso da dimensão identificatória alienante nos confronta com uma clínica em que o vazio predomina, vazio esse que o autor interpreta tanto como uma ausência de sujeito e do direito de pensar e existir quanto como um esforço desesperado de "tornar vazio", por meio de processos de contraidentificação patológica ou de um tipo de combate secreto que se institui no mimetismo como uma tentativa patológica de diferenciação. Assim, vemos de que modo o autor constrói, com delicadeza e rigor, a possibilidade de recolher os diferentes sentidos de vazio - o que se pode ver no caso de Sabina - e permite a expressão da sexualidade infantil fazendo falar o infans. Esse novo diálogo com o infans dentro da relação transferencial produz um encontro inédito, que abre aos processos de desidentificação através da sua relação fundamental com os processos de historicização.

No segundo capítulo, intitulado "A identificação projetiva e o terceiro subjugador", Thomas Ogden apresenta a sua compreensão da identificação projetiva como um evento psicológico-interpessoal de grandes dimensões, veiculado pela fantasia de evacuar partes ou aspectos de si mesmo em outra pessoa. Relaciona isso com o original e interessante conceito teórico-clínico de terceiro analítico subjugador. Para ele, o fator interpessoal da identificação projetiva envolve negação mútua da subjetividade dos protagonistas, do projetor e do recipiente, que se tornam ao mesmo tempo e paradoxalmente tanto eu como não eu para si mesmos, resultando num terceiro sujeito, o sujeito da identificação projetiva, que é ambos e nenhum.

A partir desse ponto de vista, produz-se uma "dialética de sujeitos que se criam, se recusam e se preservam, cada um dos quais permitindo-se ser subjugado pelo outro" (p. 52) e negado, de modo que se torna, através do outro, um novo e terceiro sujeito, que é o sujeito da identificação projetiva. Quando esse fenômeno acontece no âmbito do processo de análise, ele subverte a experiência do analista e do analisando como sujeitos separados, envolvendo um tipo parcial de colapso do movimento dialético das subjetividades individuais de analista e analisando, mediante a sujeição por um novo hóspede e/ou por uma terceira intersubjetividade mutuamente gerada, que nada mais é que o sujeito da identificação projetiva.

Um aspecto especialmente interessante e importante dessa contribuição para o processo analítico é que essa nova entidade também pode ser o veículo pelo qual sensações, sentimentos e pensamentos são capazes de serem pensados, sentidos e experimentados pessoalmente tanto pelo analista quanto pelo analisando, permitindo assim o crescimento psicológico. Esse caminho é precisamente aberto pelos processos de desidentificação, através da substituição/superação do terceiro subjugador mediante o reconhecimento da individualidade do paciente e da sua própria por parte do analista, com a compreensão e a interpretação da transferência-contratransferência, e o reconhecimento da individualidade do analista e da sua própria por parte do analisando, com o uso que ele faz da interpretação do analista. Na perspectiva de Ogden, o grau de patologia associado com uma experiência particular de identificação projetiva seria "um reflexo da incapacidade/ relutância dos participantes em renunciar ao terceiro subjugador por um ato de reconhecimento da sua individualidade separada e única" (p. 57), que é a base para a criação de uma subjetividade individual.

No terceiro capítulo, "Identificações, a subjetividade e os processos simbólicos", Ruggero Levy trata da relação entre as identificações, a adolescência e a simbolização e/ou a sua ausência. Para o autor, a simbolização e o processo de subjetivação na adolescência estão intimamente ligados, na medida em que nessa fase da vida testemunhamos, "ao longo do doloroso processo de desconstrução e reconstrução de um sistema de representações, o surgimento de uma nova subjetividade no universo simbólico do sujeito" (p. 60). O novo corpo do adolescente também se apresenta para a psique como um hóspede inquietante eperturbador, ao qual é preciso ser capaz de alojar através do processo de assimilação-metabolização, próprio de toda verdadeira simbolização.

O autor retoma as origens do conceito de imago dentro da metapsicologia kleiniana, que podemos entender como a imagem viva, corpórea, de um hóspede primitivo que habita o mundo interno. A partir daí, Levy expõe magistralmente, mediante a análise difícil e complexa de um adolescente gravemente perturbado, o processo de transformação simbólica que ocorre pela passagem da introjeção para a identificação, o qual, por sua vez, é acompanhado pelo processo de desidentificação dessas imagos tão carregadas emocionalmente de ansiedades primitivas. O interesse volta-se para como se pensa, base da identificação com a função analítica com um objeto continente e transformador, em vez de para o que se pensa.

Assim, por meio do processo psicanalítico de Albert, um bebê que se torna um guerreiro, o autor mostra como identificações projetivas massivas ou intrusivas podem afetar o processo de aquisição de identidade em adolescentes. Ao mesmo tempo, somos espectadores da estruturação de uma nova identidade, através do admirável e corajoso trabalho conjunto do analista e do seu paciente, e do novo olhar que o analista confere a Albert, possibilitando-lhe reconhecer-se e olhar-se para si mesmo com novos olhos. Nesse processo, Levy dá extrema importância a trabalhar no transicional, o que permite a expansão da trama simbólica do paciente, com base num profundo trabalho de continência e transformação na mente do analista das suas vivências contratransferenciais. O autor ainda atribui grande relevância ao significado das emoções e à criação de uma rede de significantes pelo analista - o que em outros textos denominou andaimes ao pensar (Levy, 2018) -, a fim de conter e pensar as emoções do paciente inicialmente impensáveis.

Ao longo do quarto capítulo, acompanhamos outro magnífico relato de um processo analítico, o de Agustín. Por meio desse relato, Luis Kancyper mostra, como sugere o título, "O poder das identificações e desidentificações no campo analítico". Com o caso clínico de Agustín, descobrimos "o poder exercido pelo heterogêneo das identificações inconscientes ... na vida anímica, e o obscuro, lento e intrincado processo da desidentificação" como um dos fatores-chave em que "a eficácia terapêutica da psicanálise é afirmada e sentida" (p. 132). Paralelamente, Kancyper expõe de que maneira esse paciente despertou nele "a necessidade de gerar novos termos clínicos e metapsicológicos como andaimes conceituais ... que [lhe] permitiram fundamentar a direção da cura" (p. 108).

Esses novos conceitos teóricos e clínicos desenvolvidos pelo autor incluem, em primeiro lugar, a amizade de transferência, um contraponto à noção freudiana de amor de transferência e que se manifesta como uma transferência positiva sublimada, que favorece a aliança terapêutica. A amizade de transferência permite abrir o caminho à "historicização dos fundamentos infantis e adolescentes dos processos identificatórios no analisando relacionados com os afetos e representações ligados à temática da amizade" (p. 102). Essa forma de transferência-contratransferência, que se diferencia da narcisista, da edípica e da fraterna propriamente ditas, assim como da transferência amistosa idealizada, possibilita alojar de maneira confiável o novo hóspede, que representa a alteridade, e que o paciente se abra, desse modo, a novos aportes identificatórios, os quais permitem criar um produto inédito, que responda ao conjunto modificado e reordenado de diversas identificações combinadas. Esse novo conjunto de identificações é precisamente o que se erige como agente autoprodutor de novos efeitos, abrindo a possibilidade de o sujeito agenciar-se o papel de escrever e ser o autor da sua própria história.

A análise de Agustín também nos leva a percorrer e compreender o conceito de fantasia inconsciente básica pigmaleônica, mediante a relação que Agustín, identificado com Pigmaleão, estabelece com a esposa, Paula, a qual, encarnando por sua vez Paula-Galateia numa fantasia compartilhada e intersubjetiva, permite que se acabe configurando um estado de pigmalionismo. De acordo com Kancyper, para a criação desse tipo de estado requer-se uma conivência inconsciente entre os sistemas narcisistas e edipicos em jogo, a fim de alcançar a materialização da fantasia de neoengendramento" (p. 112).

A estes conceitos amplamente desenvolvidos pelo autor no artigo, a amizade de transferência e o pigmalionismo, soma-se um terceiro: as autoimagens narcisistas, que, como outro importante andaime conceitual, fundamentam para ele a base dos processos de identificação e desidentificação na análise. Segundo Kancyper, as autoimagens narcisistas são uma representação figurativa que põe em destaque o sentimento de si mesmo, o estilo do ser, a sua substancialidade e autovaloração. Incluindo zonas importantes da história e da personalidade do sujeito, elas têm uma capacidade estruturante, na medida em que são criadoras de acontecimentos para o próprio sujeito em função do tipo de hóspede-identificação que o comanda. Assim, o processo analitico de Agustin também nos faz ser espectadores da possibilidade, plena de esperança, de que a análise permita ao analisando constituir-se como autor criativo e hóspede que aloja a sua própria história.

É importante notar ainda que o processo de identificação com os nossos analistas, professores, teóricos e modelos relacionados, bem como com os criadores da história da psicanálise, constitui uma parte essencial da nossa identidade como analistas e das nossas ancoragens simbólicas identificatórias - hóspedes que sempre permanecerão conosco, mostrando-nos não tanto o que pensamos, mas como pensamos. Nesse sentido, Bion é um dos grandes criadores que marcaram uma mudança no modo de pensar que perpassa a psicanálise contemporânea.

Com base nisso, Rachel Blass, autora do trabalho que ocupa o quinto e último capitulo do livro, apresenta "Bion como um kleiniano: uma elaboração da fantasia da mente em Ataques aos vínculos'". Blass encontra um valor especial em estudar Bion considerando-o um kleiniano. Segundo ela, isso tornaria mais evidente a importância da sua abordagem. A autora diz que a contribuição mais singular do pensamento de Klein é a proposta de uma variação significativa na natureza do trabalho analitico, que tem a ver com o modo de pensar a fantasia inconsciente, vista nesse enfoque como formando blocos de construção básica da nossa mente e do nosso eu. Assim, "as nossas fantasias acerca dos objetos afetam os nossos sentimentos, o nosso comportamento e o nosso eu, mas também a própria mente em que existem (em fantasia)" (p. 142). Por essa razão, Blass acredita que a introdução de Klein do conceito de identificação projetiva, que se concentra na fantasia de colocar partes de um em outro, está intimamente ligada a essas ideias. A partir dessa perspectiva, ela considera que poder responder à pergunta "Quem é o analista na transferência?" permite a este interessar-se tanto pela parte da mente que o paciente projeta nele quanto pela maneira como esta afeta o seu pensamento.

Nesse sentido, a autora afirma que Bion, introduzindo a noção de ataques aos vínculos, oferece uma leitura kleiniana dos processos de retirada da realidade, desenvolvendo a noção de que "temos fantasias internas não só de pessoas, mas também de partes do corpo, do nosso self e do nosso eu, assim como da nossa mente pensante e dos processos de pensamento de que ela é portadora" (p. 148). Blass sustenta que o ataque ao objeto deve ser entendido como uma consequência de um ataque à mente e de um ato incitado pela destruição e dirigido aos processos de pensamento do analista, o que, em paralelo, está intimamente relacionado com a falta de continência, na medida em que nessas situações o pensamento não pode ter lugar. No entanto, a autora mostra como Bion também abre a porta para a esperança de que, através da identificação projetiva, partes dolorosas e não pensáveis do nosso self depositadas na mente do objeto possam ser transformadas nela, de modo que retornem de maneira tolerável e pensável, abrindo caminho para a possibilidade de desidentificação.

Gostaria de concluir esta resenha com algumas palavras da editora do livro, Teresa Olmos de Paz:

A sublimação não deve ser definida apenas como um processo de distanciamento do fim sexual; ela inclui a sua conexão com a identificação. Os destinos sublimatórios implicam processos ligados a uma capacidade de identificação com o potencial simbolizante do outro. (p. 16)

Nesse sentido, penso que este valioso livro, que pode ser considerado uma referência na psicanálise contemporânea para a compreensão das identificações e desidentificações na clínica psicanalítica, também nos abre o caminho, enquanto leitores, à essência da identificação como sublimação, envolvendo o processo ligado à identificação com o potencial simbolizante do outro.

 

Referências

Levy, R. (2018). A polifonia da psicanálise contemporânea: as múltiplas linguagens do homem. Trabalho apresentado no iv Encontro de Psicanalistas de Língua Espanhola, Sevilha.         [ Links ]

 

 

Correspondência:
Mercedes Puchol
Arturo Soria, Ciudad Lineal
28027 Madrid, España
psicologia@mercedespuchol.com

 

 

1 Os hóspedes do eu: as identificações e desidentificações na clínica psicanalítica.

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