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Revista Brasileira de Psicanálise

Print version ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál vol.55 no.2 São Paulo Apr./June 2021

 

INTERFACE: UNIVERSIDADE

 

Breve discurso sobre ética, moral, estética e bioética das relações

 

Brief speech on ethics, moral aesthetics and bioethics relationship

 

Breve charla sobre ética, moral, estética y bioética de las relaciones

 

Bref discours à propos de l'éthique, de la morale, de l'esthétique et de la bioéthique des relations

 

 

Claudio CohenI; Gisele GobbettiII; Reinaldo Ayer de OliveiraIII

IPsiquiatra e psicanalista. Doutor em psicologia social pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP). Livre-docente em ética médica pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Professor associado na FMUSP. Recebeu o Prêmio Jabuti pelo livro Bioética (Edusp), como organizador, e pelo livro Clínica psiquiátrica (Manole), como colaborador. São Paulo / ccohen@usp.br
IIPsicóloga. Mestre e doutora pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Professora de bioética e psicóloga responsável do Centro de Estudos e Atendimento Relativos ao Abuso Sexual (Cearas). São Paulo / gobbetti@usp.br
IIIDocente de bioética da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). São Paulo / rayer@usp.br

 

 


RESUMO

A proposta deste trabalho é rever os conceitos de ética, moral e estética, e articulá-los com os princípios da bioética das relações, que carregam intrinsecamente princípios psicanalíticos. O ser humano constrói seus valores morais no processo de socialização. A estética como qualidade do sentir, proposta por Freud, não passa pela razão. O senso estético é o que nos possibilitará interpretar o mundo externo e os valores morais ou da cultura. Enquanto "a moral vem de fora, a ética parte de dentro". Assim, diferenciamos os conceitos respectivamente como funções do superego e do ego. A forma ética de lidar com os conflitos das relações humanas dar-se-á com um acordo entre a autonomia individual e a responsabilidade social. A máxima da bioética das relações é a "autonomia responsável". O pensamento ético é a conciliação entre os valores morais internalizados e os sentimentos gerados pela percepção do indivíduo sobre a realidade frente às relações humanas. Assim, diante dos conceitos expostos, concluímos que a ética é a estética da moral.

Palavras-chave: ética, moral, estética, psicanálise, bioética das relações


ABSTRACT

This paper aims at reviewing the concepts of ethics, moral and aesthetics and articulating them with the principles of bioethics relationship which inherently carry psychoanalytic principles. Human beings build moral values within socialization process. Aesthetics as a feeling quality, proposed by Freud, does not go through reason. Aesthetic senses are what enables reading the external world and moral or cultural values. While "moral comes from outside, ethics comes from the inside", thus it is possible to differentiate the concepts, respectively, as functions of superego and ego. An ethical way of dealing with conflicts of human relationships will happen with an agreement between individual autonomy and social responsibility. The maxim of bioethics relationship is "responsible autonomy". The ethical thought is the conciliation between internalized moral values and the feelings generated by the individual perception about reality within human relationships. Thereby, it is possible to state that ethics is the moral aesthetics.

Keywords: ethics, moral, aesthetics, psychoanalysis, bioethics relationship


RESUMEN

El propósito de este trabajo es revisar los conceptos de ética, moral y estética y articularlos con los principios de la bioética de las relaciones, que son portadores inherentes de principios psicoanalíticos. El ser humano construye sus valores morales en el proceso de socialización. La estética como cualidad del sentimiento, propuesta por Freud, no pasa por la razón. El sentido estético es el que nos permitirá interpretar al mundo exterior y sus valores morales o culturales. Mientras que "la moralidad viene de afuera, la ética viene de adentro"; así diferenciamos los conceptos respectivamente como funciones del superyó y del yo. La forma ética de abordar los conflictos en las relaciones humanas ocurrirá con la alianza entre la autonomía individual y la responsabilidad social. La moral propuesta por la bioética de las relaciones es la de una "autonomía responsable". El pensamiento ético se dará por la conciliación entre los valores morales internalizados y los sentimientos que genera la percepción de la realidad en las relaciones humanas. Así, a la vista de los conceptos expuestos, concluimos que la ética es la estética de la moral.

Palabras clave: ética, moral, estética, psicoanálisis, bioética de las relaciones


RÉSUMÉ

Ce travail a pour but de revoir les concepts d'éthique, de morale et d'esthétique et de les articuler aux principes de la bioéthique des relations, qui portent intrinsèquement des principes psychanalytiques. L'être humain construit ses valeurs morales dans le processus de la socialisation. L'esthétique comme qualité du sentir, proposée par Freud, ne passe pas par la raison. Le sens esthétique, c'est ce qui nous permettra d'interpréter le monde extérieur et les valeurs morales ou issues de la culture. Alors que « la morale vient de l'extérieur, l'éthique vient de l'intérieur » ; ainsi, nous différencions ces concepts respectivement en tant que fonctions du super ego et de l'ego. La manière éthique de traiter les conflits des relations humaines sera convenue entre l'autonomie individuelle et la responsabilité sociale. La maxime de la Bioéthique des Relations est « l'autonomie responsable ». La pensée éthique est la conciliation entre les valeurs morales intériorisées et les sentiments générés au moyen de la perception, par l'individu, de la réalité face aux relations humaines. Ainsi, étant donné les concepts exposés, nous concluons que l'éthique est l'esthétique de la morale.

Mots-clés: éthique, morale, esthétique, psychanalyse, bioéthique des relations


 

 

Introdução

Após 25 anos da publicação do livro Bioética (1995), no qual Segre e Cohen propõem uma nova e mais abrangente visão dos valores na ética e na moral, sugerimos repensar esses conceitos.

A proposta deste trabalho é rever os conceitos de ética, moral e estética, e articulá-los com os princípios da bioética das relações, que carregam intrinsecamente princípios psicanalíticos.

Com base na premissa de que não nascemos éticos, Cohen e Segre (1999) propõem que a eticidade, ou seja, a condição de nos tornarmos éticos, irá ocorrer a partir do desenvolvimento humano. Aliás, a "humanidade" se faz por meio do ingresso na cultura, pela possibilidade de nos tornarmos seres em relação e simbólicos.

Lévi-Strauss (1982) define o ser humano como um ser biológico, produto da natureza, e ao mesmo tempo um ser social, produto da cultura, sendo a passagem da natureza para a cultura marcada pela proibição do incesto. Portanto, os seres humanos, sujeitos às leis naturais e às leis culturais, muitas vezes incompatíveis, são em sua essência seres em conflito, sendo o conflito primordial causado entre seus desejos incestuosos e a necessidade de viver em sociedade.

Em O mal-estar na civilização (1930/1980e), Freud discorre sobre a renúncia à satisfação dos desejos incestuosos e hostis em favor do desenvolvimento da cultura. Assim, tanto os desejos incestuosos quanto a agressividade são inerentes ao ser humano, mas a proibição da atuação destes é necessária para o desenvolvimento do indivíduo e da sociedade.

Segundo Freud, o ser humano é movido por dois tipos de pulsão: a pulsão sexual ou de vida, construtiva, e a pulsão de morte, destrutiva, cujo objetivo é o retorno ao inanimado. Dessa maneira, a agressividade intrínseca do ser humano é apenas um modo de projetar ao outro a própria destrutividade, como forma de autoproteção. "Realmente, parece necessário que destruamos alguma coisa ou pessoa, a fim de não nos destruirmos a nós mesmos, a fim de nos protegermos contra a impulsão de autodestruição. Realmente, uma triste descoberta para o moralista!" (Freud, 1930/1980e, p. 132)

Todas essas renúncias são necessárias para o desenvolvimento da sociedade, da qual o ser humano é totalmente dependente. Imerso na cultura, o desenvolvimento do indivíduo faz-se através da capacidade de criar instituições e funções simbólicas. A primeira inserção social é constituída pela família, instituição social com função estruturante biopsicossocial e simbólica. Saímos da natureza apenas como espécie a formar grupos guiados pelo instinto de sobrevivência, como todos os animais, e passamos a nos estruturar enquanto grupos com funções simbólicas.

Será a partir de nossa capacidade de simbolizar que conseguiremos entender o conceito das funções familiares estruturadas pelo parentesco. A noção de parentesco não é natural, mesmo que apoiada no modelo biológico de consanguinidade. Lembramos que a descoberta da paternidade, estruturante para o nosso modelo atual de família, se deu no período neolítico, através de muito tempo de observação, pois a relação entre o ato sexual e a procriação não foi um dado imediato da consciência (Cohen, 1993).

Na sociedade atual, prevalecem os atributos culturais e as funções sociais de parentesco, tal como é apresentado no Código Civil Brasileiro, que valoriza o critério de afinidade no parentesco civil - artigo 1.595 da Lei n.º 10.406 (2002) -, sendo necessário o desenvolvimento da capacidade simbólica para que tais funções sejam assimiladas.

Não nascemos com valores sociais morais e estéticos; esses valores serão interiorizados a partir da cultura e da própria experiência de vida. Da mesma forma, não nascemos éticos nem antiéticos, mas a possibilidade de nos constituirmos enquanto sujeitos éticos depende da consciência desses valores e do reconhecimento do outro como sujeito portador de seus próprios valores (Cohen, 2019).

 

Ética e moral

Como seres sociais, nascemos já inseridos num universo de valores. Nossa formação enquanto indivíduos antecede o nosso nascimento, pois somos impregnados de expectativas e valores de nossos antecessores.

De acordo com a psicanálise, a personalidade do indivíduo vai se formando a partir da relação de seu mundo interno - constituído por suas pulsões, sua herança filogenética e familiar - com o mundo externo. A noção "estrutural" ou "dinâmica" do aparelho psíquico constituído por id, ego e superego, apresentada por Freud em O ego e o id (1923/1980b), é essencial para a diferenciação dos conceitos de moral e ética.

A partir das primeiras relações com o mundo, o ser humano, então inteiramente movido pela busca de satisfação de suas pulsões, é forçado pelas frustrações impostas pela realidade a diferenciar em seu aparelho psíquico, quase inteiramente id, uma instância de percepção e regulação da relação entre mundo interno e externo, o ego, que começa a estruturar mecanismos de defesa para a sobrevivência. O ego é a parte do id que foi modificada pela influência direta do mundo externo e "esforça-se por substituir o princípio de prazer, que reina irrestritamente no id, pelo princípio de realidade" (Freud, 1923/1980b, p. 39).

Ao mesmo tempo, o indivíduo vai introjetando os limites impostos pela cultura, inicialmente representada pelos pais ou cuidadores, e diferenciando outra instância em seu aparelho psíquico: o superego. Freud responde o seguinte às críticas feitas à psicanálise de que, com sua preocupação com o reconhecimento do inconsciente, não veria o lado "elevado" ou "moral" do ser humano: "E aqui temos essa natureza mais alta, neste ideal do ego ou superego, o representante de nossas relações com nossos pais. Quando éramos criancinhas, conhecemos essas naturezas mais elevadas, admiramo-las e tememo-las, e, posteriormente, colocamo-las em nós mesmos" (Freud, 1923/1980b, p. 51).

O superego é a moral internalizada. Para Freud, o superego é o herdeiro do complexo de Édipo, ou seja, a partir da interdição do desejo incestuoso, o ser humano consegue apreender outros limites e internalizar as normas sociais.

Somente os indivíduos que elaboram ou reprimem os desejos edípicos proibidos, isto é, aquelas pessoas que introjetam o não como um ordenador mental afetivo-cognitivo, podem estruturar o superego e desenvolver o ego. Por esse motivo, um ego mais desenvolvido poderá obter satisfações mais eficientes para sua necessidade de adaptação, tendo uma noção mais realista de seus limites e funções (Cohen & Gobbetti, 2019b).

Assim, entendemos que a eticidade, a possibilidade de nos tornarmos éticos, é uma função do ego e depende do desenvolvimento adequado deste. De acordo com Freud (1933/1980f), o ego é a instância que tem de atender a três senhores: as pulsões do id, as exigências do superego e a realidade externa. É o ego do indivíduo que deverá lidar com os conflitos entre suas pulsões e suas exigências internalizadas em relação às normas instituídas e aos limites impostos pela realidade.

Diversamente da ética, a moral, ou a possibilidade de atuar moralmente, se caracteriza pela capacidade do indivíduo de internalizar e se submeter ao sistema de valores culturais do grupo em que vive, resultado da introjeção das normas consideradas corretas por determinada sociedade, em determinado momento histórico, como os códigos penais e civis, e mesmo os códigos de ética profissional.

Na analogia com o aparelho mental de Freud, a possibilidade ética está estritamente vinculada ao ego: "A posição do ego é semelhante à de um monarca constitucional, sem cuja sanção nenhuma lei pode ser aprovada, mas que hesita longo tempo antes de impor seu veto a qualquer medida apresentada pelo parlamento" (Freud, 1923/1980b, p. 72).

Entendemos que um indivíduo age eticamente quando pode compreender e avaliar os códigos, quando pode se posicionar de forma autônoma frente aos princípios que eles propõem. Caberá à pessoa a possibilidade de discordar do posicionamento moral social, devendo se responsabilizar diante de um conselho institucional, justificando uma atuação diferente da imposta pelo código. Porém, será justamente esse tipo de posicionamento que poderá propiciar reflexões e alterações nos códigos, permitindo o desenvolvimento das instituições.

Um verdadeiro código de ética deveria ser composto por princípios, não por proibições e punições, assim como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro 1948, e a mais recente Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, de 2005.

Sem o desenvolvimento egoico, os valores do superego ou da moral internalizada são absolutos e impositivos, devem ser aceitos e não devem ser questionados, e a desobediência às regras tem punições como consequência. Assim, como apresentado por Segre (1999), a moral é resultado de "obediência", algo oposto ao conceito de autonomia, extremamente vinculado à ética. Para Cohen e Segre, a distinção da moral e da ética é sintetizada na frase: "A moral é imposta, a ética é percebida" (1999, p. 18).

Agir eticamente é poder apreender tais conflitos da vida psíquica (emoção versus razão, mundo interno versus externo) e perceber a necessidade de adquirir um posicionamento próprio e coerente em face desses conflitos. Portanto, a ética se fundamenta em três pré-requisitos:

Percepção dos conflitos: consciência.

Autonomia: condição de se posicionar diante do conflito, com autonomia.

Coerência: um acordo frente aos conflitos.

Muitos creem que a eticidade, ou a condição de vir a ser ético, signifique apenas a competência para ouvir o que "o coração diz". Acreditamos que essa seja apenas uma característica de sensibilidade emocional, reservando-se "o ser ético" para os que tiverem a capacidade de percepção dos conflitos entre "o que o coração diz e o que a cabeça pensa", podendo-se percorrer o caminho entre a emoção e a razão, posicionando-se na parte desse percurso que se considere mais adequada. (Cohen & Segre, 1999, p. 13)

Fica claro que o conceito de ética depende da percepção dos conflitos que possam aparecer em virtude do confronto de nossos desejos e valores com os desejos e valores do outro, e de uma busca de ações coerentes com essa percepção, aceitando a responsabilidade pelas últimas.

 

Estética

O valor estético existiu desde a Pré-História. Os povos primitivos de todos os lugares do mundo se adornavam, maquiavam, usavam óleos e perfumes, para celebrar ocasiões importantes. Esse valor é responsável por aguçar nossa percepção, impressão e intuição emocional do mundo.

Por exemplo, a arte rupestre, cujos indícios são datados do Paleolítico Superior (40000 a.C.), ajuda a contar a história do homem pré-histórico com pinturas, esculturas e templos construídos com pedras, mostrando no passar do tempo sua preocupação com a aparência artística caracterizada atualmente como objeto de arte. Isso corrobora o fato de que o ser pré-histórico já sentia a necessidade de se expressar simbolicamente através das artes. Portanto, podemos dizer que o simbólico é inerente ao ser humano. Mas a arte também pode ser apreendida como a capacidade que o ser humano tem de pôr em prática uma ideia, valendo-se da faculdade de dominar a matéria (a arte de usar o fogo, a arte da caça).

A própria medicina é definida como uma ciência e uma arte. A ciência estuda as doenças. A arte se ocupa da manutenção e do restabelecimento da saúde dos indivíduos. Hipócrates, em seu juramento, reza:

Prometo que, ao exercer a arte de curar, mostrar-me-ei sempre fiel aos preceitos da honestidade, da caridade e da ciência. Penetrando no interior dos lares, meus olhos serão cegos, minha língua calará os segredos que me forem revelados, o que terei como preceito de honra. Nunca me servirei de minha profissão para comprometer os costumes ou favorecer o crime. Se eu cumprir este juramento com fidelidade, goze para sempre a minha vida e a minha arte de boa reputação entre os homens; se o infringir ou dele me afastar, suceda-me o contrário. ("Juramento de Hipócrates", s.d.)

Como vimos, a arte é concebida através de várias configurações: música, escultura, pintura, cinema, dança, entre outras. Para Aristóteles (1993), a arte pode imitar a natureza, mas também pode abordar o impossível, o irracional e o inacreditável.

De acordo com Kant (1790/1995), a existência da arte depende do artista (como gênio criador), da obra de arte (com sua beleza) e do público (que a recebe, a identifica e a julga). Ele desenvolveu a ideia de que o gosto não é tão subjetivo como se imaginava. Para haver gosto, é necessário que haja educação e formação desse gosto. Segundo ele, o juízo estético une a universalidade da apreciação da beleza às singularidades e particularidades do artista, da obra e do público.

A estética, ramo da filosofia, irá estudar e analisar a relação entre o ser humano e a beleza e a arte, ou seja, o que estas despertam no ser humano. Na Grécia antiga, os filósofos usavam a palavra aisthesis (da qual derivou a palavra em português estética), que significa "faculdade de sentir". Desse modo, em seu sentido mais estreito, a palavra estética significa "sensibilidade".

No artigo "O estranho", Freud corrobora esse significado qualificando o tema da estética como "não simplesmente a teoria da beleza, mas a teoria da qualidade do sentir" (1919/1980c, p. 275). Essa qualidade do sentir, para Freud, não passa pela razão. As emoções provocadas pela arte, tanto para o artista quanto para o apreciador, têm motivações inconscientes. Assim, Freud compara a criação artística com a formação dos sonhos e dos sintomas nos neuróticos.

Podemos pensar na estética dos sonhos proposta por Freud, com eles sendo uma representação plástica, um teatro, no qual a dramatização está na realização, na maioria das vezes disfarçada, de desejos não realizados durante a vigília. A diferença dos sonhos para a produção artística é que os primeiros servem apenas ao criador.

Todas as vezes que observamos, sentimos e escutamos qualquer coisa, os nossos órgãos sensoriais produzem informações para o nosso cérebro, que rapidamente as processa e nos proporciona uma interpretação sobre o que nos cerca. A apreciação estética será resultado da captação das percepções pelos órgãos dos sentidos e da consequente avaliação pelos sentimentos causados com essas percepções.

A criatividade artística, longe de ser uma atividade destinada apenas a gratificar certas formas de prazer, também pode atenuar o sofrimento. O fato é particularmente surpreendente no caso da tragédia, sobre a qual Aristóteles, na Poética (1993), apresentou sua teoria da kátharsis, que se referia à purificação das almas por meio de uma descarga emocional provocada por um trauma. Segundo Aristóteles, a tragédia descreve, de forma dramática, situações que suscitam piedade e temor de caráter universal; através do sentir essas emoções, o espectador as "purifica".

Breuer e Freud retomaram o termo catarse para a psicanálise, definindo o método catártico como uma forma de psicoterapia, na qual evocar ou reviver acontecimentos traumáticos permitiria uma descarga dos afetos patogênicos. Tal método, inicialmente representado pela hipnose, depois evoluindo até a associação livre de ideias, tinha como objetivo curar o paciente de seus sintomas, restabelecendo uma descarga adequada dos afetos (Laplanche & Pontalis, 1967/1988).

A função da estética em Freud é fundamental, pois, através do seu conceito de sublimação, ele expandiu o potencial de ação da psicanálise para além do divã. O termo sublimação, introduzido por Freud na psicanálise, evoca ao mesmo tempo o sublime, que exprime a grandeza nas artes, e a sublimação da química, que designa uma transformação de estados. A sublimação designa o desvio da pulsão sexual para alvos não sexuais ou alvos aceitos socialmente; Freud se dirigiu especialmente a atividades artísticas e intelectuais (Laplanche & Pontalis, 1967/1988).

Podemos dizer que a produção de obras de arte é uma das mais importantes características da espécie humana - a possibilidade de simbolização, sendo provável que ela constitua a grande fronteira na diferenciação entre o ser humano e as outras espécies animais.

Em Einstein, Picasso: space, time, and the beauty that causes havoc (2001), Miller estabelece paralelos entre a vida e a obra de Albert Einstein e Pablo Picasso, relacionando especificamente a teoria da relatividade (1905) e Les demoiselles D'Avignon (1907). Em entrevista, o autor, que observou uma relação entre estética e ciência, afirma: "Foi o trabalho de Picasso na redução das formas através da geometria que teve impacto nas artes" (2006, p. 229). Na verdade, a parte da teoria da relatividade que os artistas achavam extremamente interessante era E = mc2. A massa, de um lado, algo substancial, como uma mesa e uma cadeira; a energia, de outro, amórfica, espalhada em todo lugar. E = mc2 iguala essas duas entidades (através da velocidade da luz). Os artistas entenderam isso de forma excitante e imaginativa, o que levou ao expressionismo abstrato.

Em relação às artes, Freud se interessou menos pelos aspectos formais e deu maior ênfase ao conteúdo ético das obras de arte, abordando os conflitos que elas ocultam, como na análise elaborada sobre Édipo rei, de Sófocles, que trouxe à luz o grande conflito humano. Outro exemplo é a controversa análise da obra de Leonardo da Vinci em "Leonardo da Vinci e uma lembrança de sua infância" (1910/1980d), por meio da qual buscou desvendar a personalidade do grande artista. Freud criou hipóteses sobre a influência das primeiras relações, principalmente com a mãe, no desenvolvimento de Da Vinci, através da interpretação de características de sua arte, como o sorriso enigmático da Mona Lisa, que reaparece em várias de suas pinturas subsequentes, ou a aparente insatisfação e a dificuldade de finalização de algumas obras.

Todas as produções artísticas representam uma expressão do inconsciente e uma conexão entre seres humanos - uma conexão não racional, mas que perpassa pela sensibilidade emocional dos indivíduos. Podemos considerar que toda produção humana é percebida e traduzida pelo senso estético de cada um.

 

Bioética das relações

A complexidade das relações humanas foi ilustrada pelo filósofo alemão Arthur Schopenhauer em seu dilema do porco-espinho, no qual mostrou o quanto as necessidades sociais impulsionam os indivíduos a se reunirem, mas, devido às características desagradáveis de sua natureza, uma distância moderada é a condição necessária para que a convivência seja tolerada:

Um número de porcos-espinhos ​​se amontoou buscando calor em um dia frio de inverno; mas, quando começaram a se machucar com seus espinhos, foram obrigados a se afastar. No entanto, o frio fazia com que voltassem a se reunir, porém se afastavam novamente. Depois de várias tentativas, perceberam que poderiam manter certa distância uns dos outros sem se dispersarem. ("O dilema do porco-espinho", 2017)

Com a necessidade humana de pertencer a uma sociedade e ao mesmo tempo de se individualizar, o ser humano tem que buscar formas de compartilhar um mesmo espaço e um mesmo tempo com o outro.

O dilema criado por Schopenhauer foi usado por Freud em Psicologia de grupo e a análise do ego (1921/1980g), texto no qual propõe que todas as relações humanas com certa duração contêm sentimentos de aversão e hostilidade, desde as mais próximas, como casamento e relação entre pais e filhos, até aquelas entre grupos maiores, como ambiente de trabalho e moradores de determinada cidade. Essa hostilidade pode estar mais reprimida ou inconsciente - principalmente em relações que envolvem pessoas que também são amadas, formando-se a ambivalência emocional - ou atuar de forma manifesta, como se observa entre grupos.

Se a hostilidade e a agressividade estão presentes em todas as relações humanas, já que são características intrínsecas do ser humano, como podemos pensar no desenvolvimento da humanidade?

Os seres humanos tiveram que criar regras para a sua convivência. Assim, os direitos humanos não são naturais, mas uma criação da cultura. Os ideais da Revolução Francesa, embutidos como princípios dos direitos humanos, "liberdade, igualdade e fraternidade", podem ser reconhecidos nos primórdios da bioética, nos princípios de sua fundamental corrente, a teoria principialista de Beauchamp e Childress (1979/2001): autonomia, justiça, beneficência e não maleficência.

A bioética, que surgiu como campo de reflexão para os limites éticos das pesquisas e intervenções com seres humanos na área da saúde, logo estendeu suas discussões para todos os campos do saber, uma vez que as relações humanas em qualquer âmbito trazem novos conflitos, que não podem ser resolvidos pelas normas preestabelecidas.

Cohen e Gobbetti (2019a) propõem uma bioética da vida cotidiana, que visa a reflexão ética de conflitos do dia a dia, distantes das grandes questões da bioética geradas pelo avanço tecnológico, como a clonagem e a inteligência artificial, mas presentes no cotidiano de todos. Dilemas éticos são intrínsecos à humanidade, pois emergem das relações psicossociais, podendo a bioética ser considerada a ética das relações humanas.

Pelas características humanas de dependência da relação com o outro e de individualidade, propomos refletir sobre a autonomia do indivíduo e o respeito ao outro como os princípios da bioética das relações.

A psicanálise, com o conceito de inconsciente, já trouxe o grande questionamento sobre a autonomia do indivíduo, uma vez que são claros os atos humanos movidos por motivações inconscientes.

Freud situou a descoberta do inconsciente como terceiro golpe da ciência no narcisismo humano, após a descoberta de Copérnico de que a Terra não é o centro do Universo e as teorias de Darwin, que incluem o homem como mais uma espécie animal.

Mas a megalomania humana terá sofrido seu terceiro golpe, o mais violento, a partir da pesquisa psicológica da época atual, que procura provar ao ego que ele não é senhor nem mesmo em sua própria casa, devendo, porém, contentar-se com escassas informações acerca do que acontece inconscientemente em sua mente. (Freud, 1917/1980a, p. 336)

Segundo Segre (2002), ao mesmo tempo que Freud questiona a autonomia pela força do inconsciente, ele também nos ensina que é só a partir do conhecimento do inconsciente que podemos buscar autonomia. Segre prossegue dizendo que a autonomia é uma "abstração"; parte-se do pressuposto de que ela exista, e esse pressuposto transita no âmbito da afetividade.

Assim, a autonomia proposta pela bioética das relações, fundamentada pela aceitação da teoria psicanalítica, em nada se assemelha ao conceito de autonomia de Kant, que considerava a vontade de um indivíduo como autônoma quando era regulada pela razão, independente do desejo.

Entendemos a autonomia no campo da possibilidade de optar frente aos conflitos, e a capacidade de opção envolve critérios racionais e emocionais de todo ser humano. Os conflitos surgem a partir das relações humanas, já que a própria autonomia vai se confrontar com a autonomia do outro. A bioética das relações deverá lidar com os limites éticos de tais confrontos, pois, como enfatizou o filósofo, biólogo e antropólogo inglês Herbert Spencer em sua célebre frase, "A liberdade de cada um termina onde começa a liberdade do outro".

Os conflitos morais e éticos diferenciam o ser humano dos outros animais. Deixamos de agir por instintos, e essa renúncia, segundo Freud, é o pilar do desenvolvimento da civilização humana. Em Totem e tabu (1913/1980h), Freud remonta o sentimento de culpa originário da espécie humana, que é transmitido filogeneticamente e revivenciado individualmente através do complexo de Édipo. Essa obra, de cunho psicológico e antropológico, utiliza a ideia de uma primeira comunidade de homens, a "comunidade primeva", constituída por um pai tirano, que tinha direito absoluto sobre as mulheres da comunidade e expulsava os filhos conforme estes cresciam. Os últimos então se juntam e cometem o parricídio, e em seguida devoram o pai em um banquete totêmico.

O violento pai primevo fora sem dúvida o temido e invejado modelo de cada um do grupo de irmãos: e, pelo ato de devorá-lo, realizavam a identificação com ele, cada um deles adquirindo uma parte de sua força. A refeição totêmica, que é talvez o mais antigo festival da humanidade, seria assim uma repetição e uma comemoração desse ato memorável e criminoso, que foi o começo de tantas coisas: da organização social, das restrições morais e da religião. (Freud, 1913/1980h, p. 170)

Os sentimentos ambivalentes de ódio, admiração e amor geram a culpa pela morte da figura paterna; todos esses sentimentos são vivenciados individualmente, motivados pelas fantasias edípicas. O sentimento de culpa passa a ser um mecanismo interno de freio às pulsões destrutivas, que possibilita a convivência social.

Melanie Klein (1937/1996) ressaltou, em sua obra, a importância da instauração do sentimento de culpa e a posterior necessidade de reparação no desenvolvimento humano e nas relações sociais construtivas, advindas da instauração da capacidade de amar. Entendemos ser essa a dimensão constitutiva da bioética das relações.

Através de sua observação de crianças pequenas, Klein ampliou a teoria da constituição do psiquismo, mediante a ideia de que mecanismos de defesa - como cisão, projeção e introjeção - atuam no ego do bebê logo após o nascimento, a partir de suas primeiras relações com o mundo externo. Tais mecanismos são essenciais para que o bebê possa se desenvolver a despeito das ansiedades persecutórias decorrentes da pulsão de morte (Klein, 1948/1991b). Assim, os processos mentais que incluem a culpa e a reparação se iniciam muito cedo no indivíduo, a partir do terceiro ou quarto mês de vida, período em que Klein considera ser possível a entrada na posição depressiva.

As primeiras relações com o mundo, inicialmente do bebê com a mãe, são muito importantes para a constituição do aparelho psíquico do ser humano, pois elas podem reforçar ou apaziguar as ansiedades primitivas, influenciando diretamente na possibilidade de discriminação de mundo interno e mundo externo, e na discriminação e reconhecimento do outro.

Meu trabalho com crianças pequenas tem me mostrado que desde a mais tenra infância a mãe e logo outras pessoas no ambiente da criança são incorporadas ao self, e essa é a base de uma diversidade de identificações favoráveis e desfavoráveis. (Klein, 1959/1991a, p. 294)

A empatia, a capacidade de sentir o que o outro sentiria caso se estivesse na mesma situação vivida por ele, ou o colocar-se no lugar do outro, só é possível por meio do processo de identificação.

Será através da empatia que poderemos nos relacionar com o outro de forma solidária. Portanto, a bioética das relações emerge a partir da percepção empática do outro como indivíduo. Para que isso ocorra, o indivíduo deve abandonar o estado narcísico, pelo qual todos os indivíduos passam em seu desenvolvimento, e reconhecer o outro enquanto sujeito singular.

Quando nos percebemos seres gregários e temos a capacidade empática de perceber o outro como um sujeito diferente, com seus próprios valores, podemos adequar a nossa autonomia à realidade externa. A empatia fortalece conexões e incentiva a colaboração social.

Será a partir dessa percepção das diferenças humanas, e de nossa individualidade, que poderemos desenvolver a bioética das relações, criando a possibilidade de convívio ético entre as pessoas.

Dentro de uma reflexão ética, podemos reconhecer dois tipos de relações humanas interpessoais: simétricas e assimétricas, devendo ambas ser constituídas pela autonomia do indivíduo e pelo respeito ao outro.

A assimetria das relações tem a ver com a função dos indivíduos dentro da relação. Reconhecemos como simétricas as relações entre irmãos, entre cônjuges e entre colegas de trabalho, por exemplo. As assimétricas traduzem a vulnerabilidade de uns diante dos outros na relação específica. Como exemplo, podemos citar as relações entre pais e filhos, professores e alunos, médicos e pacientes etc.

Vamos utilizar a relação profissional entre médico e paciente como exemplo para explicar a assimetria de funções e a vulnerabilidade. Tanto o médico quanto um paciente maior de idade podem ser indivíduos capazes legalmente e com possibilidade de exercer ambos a sua autonomia, mas nessa relação específica o paciente se encontra fragilizado emocionalmente pela doença e pela falta de conhecimento técnico sobre aspectos relativos à sua saúde, o que o torna vulnerável frente às decisões a serem tomadas no âmbito da própria saúde. Apesar disso, o paciente capaz de exercer a sua autonomia é o único a saber o que pode lhe trazer bem-estar, devendo haver entre médico e paciente o respeito à autonomia dos dois na relação.

Porém, conflitos éticos nas relações de pessoas autônomas estão presentes em todas as relações profissionais, e a sociedade precisou criar normas morais para que as vulnerabilidades dos indivíduos fossem consideradas, como a tipificação criminal de assédio sexual na relação médico-paciente e nas outras relações assimétricas, em que a vulnerabilidade de uns é posta diante da hierarquia de "poderes" nas relações.

A sociedade preocupa-se em estabelecer e proteger os indivíduos vulneráveis socialmente. A limitação da autonomia é facilmente justificada quando a sociedade considera uma pessoa incapaz de decidir por seu próprio destino, como é o caso de crianças e portadores de doença mental. Mas entendemos que, para o exercício de uma postura ética, é extremamente necessário reconhecer a vulnerabilidade do outro na relação estabelecida.

Além das relações interpessoais diretas, podemos pensar em relações indiretas ou globais, ou seja, as relações da humanidade com o mundo em que vivemos. Esse relacionamento global é de grande interesse para a reflexão bioética, pois diz respeito ao futuro da humanidade e do planeta. Ele surge a partir de um determinado período da cultura (por exemplo, a atual discussão internacional sobre a saúde e as ciências da vida), que une as pessoas tentando resolver os conflitos morais que são comuns a todos, como o aquecimento global. Embora uma parcela da população empenhe-se em discutir e até criar leis para a proteção do planeta, tais ações não serão suficientes se não houver a compreensão de cada indivíduo de sua responsabilidade no processo.

Ao aceitar essa responsabilidade, todos perderão um pouco de autonomia, mas ganharão na proteção social - por exemplo, em casos de pandemia, como a de covid-19, que estamos vivendo no momento. A realidade é que, nas situações de calamidade, a sobrevivência individual depende da sobrevivência coletiva, e as ações individuais de proteção dependem de ações coletivas sinérgicas correspondentes. Ninguém pode se proteger individualmente de uma epidemia ou de uma catástrofe natural. As ações de proteção ou prevenção são sempre de natureza coletiva (Lin et al., 2020).

Os conflitos éticos e morais variam em cada um de nós, pois temos dificuldade em aceitar a fragilidade humana frente ao desconhecido, mas para ter mais segurança, será preciso renunciar a certa liberdade, e se quisermos mais liberdade, teremos que renunciar a alguma segurança. Portanto, precisamos de ambas, segurança e liberdade.

A responsabilidade diante dos conflitos nas relações interpessoais e globais é pessoal e inalienável, pois o indivíduo enquanto ser único deverá aprender a lidar com os próprios conflitos e aceitar a necessidade de se relacionar com o outro. Por fim, ressaltamos que a máxima da bioética das relações é a "autonomia responsável".

 

Considerações finais

Nascemos da espécie humana; somos seres biológicos. No entanto, para nos desenvolvermos enquanto humanos, somos totalmente dependentes da relação com o outro e com a sociedade; somos seres da cultura.

Como seres humanos, temos tanto a construtividade (Eros) quanto a agressividade e a destrutividade (Tânatos) em potencial. Necessitamos refrear nossos impulsos destrutivos em prol da nossa sobrevivência e a da sociedade como um todo.

Quando não desenvolvemos mecanismos internos para conter nossas pulsões, dependemos de limites externos para a convivência social. Assim, surgem as normas, regras e leis que sustentam a vida em sociedade. Essas normas são baseadas em valores morais da cultura.

O ser humano não nasce com valores morais. Tais juízos de valor serão desenvolvidos no processo de socialização. Apreendemos os valores da cultura a partir de nossa percepção e sensibilidade. A estética, enquanto capacidade de sentir, é o que nos possibilitará interpretar o mundo externo e os valores morais ou da cultura.

A bioética das relações emerge da percepção de que o indivíduo só se constitui enquanto ser humano a partir da sua relação com o outro. Por meio de suas primeiras interações com o mundo externo, o indivíduo se constitui enquanto sujeito e pode reconhecer e respeitar a si próprio e ao outro como sujeito com seus próprios valores.

Entendemos que a reflexão ética perpassa pela autonomia, pelos valores individuais e pelo conflito destes com os valores sociais. As relações humanas são simbólicas - portanto, subjetivas - e permitem a integração com o outro no relacionamento social. Essa possibilidade é o produto civilizatório - por exemplo, a criação das instituições sociais, como a família, as religiões, os países, a ciência e as profissões.

A bioética das relações pressupõe a percepção de conflitos, desde os conflitos internos entre indivíduo e realidade externa até os conflitos entre culturas com diferentes valores morais. A forma ética de lidar com os conflitos das relações humanas dar-se-á com um acordo entre a autonomia individual e a responsabilidade social.

Com a percepção de que somos seres únicos e ao mesmo tempo seres sociais, devemos aceitar a necessidade imperativa de nos relacionarmos com o outro diferente. A percepção e o respeito ao outro emergem a partir da capacidade de empatia e da transposição do constitucional narcisismo humano.

Enquanto a moral é a internalização das regras sociais, a estética é a forma individual de apreensão do mundo externo, ou seja, como o indivíduo percebe e sente a realidade que o cerca. O pensamento ético é a conciliação entre os valores morais internalizados e os sentimentos gerados pela percepção do indivíduo sobre a realidade frente às relações humanas. No âmbito da bioética das relações, a ética, a estética e a moral estão intimamente ligadas. Assim, diante dos conceitos expostos, concluímos que a ética é a estética da moral.

 

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Recebido em 5/4/2021
Aceito em 19/4/2021

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