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Aletheia

versão impressa ISSN 1413-0394

Aletheia  no.31 Canoas abr. 2010

 

ARTIGOS DE ATUALIZAÇÃO

 

Estudo de caso – avaliação neuropsicológica: depressão x demência

 

Relate of case: neuropsychology assessment – depression x dementia

 

 

Nicole Maineri SteibelI; Rosa Maria Martins de AlmeidaII

I Hospital Moinhos de Vento - Memolab
II Universidade Federal do Rio Grande do Sul

 

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Essa pesquisa é um estudo de caso em que foram avaliadas as habilidades cognitivas de um idoso com queixa de memória e de sintomas depressivos. Foram aplicados testes cognitivos, escalas para avaliar as funções cognitivas e realizadas análise qualitativa e quantitativa dos resultados com objetivo de verificar se as queixas seriam decorrentes de um processo degenerativo e/ou se justificam pela presença de sintomas depressivos. Os resultados mostraram uma diminuição de desempenho nas habilidades que envolvem velocidade de processamento de informações e na memória recente. Com isto torna-se importante nestes casos fazer-se avaliações seriadas com objetivo de acompanhar a evolução das dificuldades cognitivas.

Palavras-chave: Avaliação neuropsicológica, Memória, Depressão.


ABSTRACT

This study concerned itself with the assessment of cognitive functions in an elderly man who presented complaints about loss of memory and depressive symptoms. Qualitative and quantitative analyses were performed in order to verify if the problems that were related by the patients comprised primarily a degenerative process or depressive symptoms. Neuropsychological assessements enabled a differential diagnosis of dementia and depression. The study prompts the conclusion that a sequential assessment is essential in order ascertain the pathogenesis of the cognitive impairments.

Keywords: Neuropsychological assessment, Memory, Depression.


 

 

Introdução

A prevalência de co-ocorrência de perdas cognitivas e depressão dobram a cada cinco anos após os 70 anos e cerca de 25% dos idosos acima de 85 anos apresentam depressão juntamente com prejuízos cognitivos (Alexopoulos, Kiosses, Klimstra, Kalayam & Bruce, 2002). Frente à frequente disfunção cognitiva entre os idosos, algumas hipóteses têm sido propostas para explicar essa associação. Primeira, a depressão poderia ser uma reação emocional do idoso ao perceber um quadro de demência inicial. Assim, a depressão seria apenas uma situação pré-demência (um pródromo). Uma segunda hipótese explicativa sugere a existência de uma causa comum subjacente no sistema nervoso central que poderia levar tanto à depressão como também ao declínio cognitivo em idosos. Foi demonstrado que idosos deprimidos têm mais frequentemente e mais severas anormalidades na substância branca e em outras áreas subcorticais em imagens de ressonância nuclear magnética (RNM) (Xavier, 2006).

A depressão está associada com a elevação dos níveis de cortisol, podendo ser outra hipótese explicativa que leva em conta a possibilidade desta hipercortisolemia levar à morte neurônios no hipocampo e a desregulação do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal, com consequente atrofia hipocampal e consequente declínio cognitivo. Ainda que exista frequente associação entre presença de depressão e de disfunção cognitiva, existe a possibilidade de que não existe uma relação causal entre ambas, ou seja, que são apenas duas doenças de apresentação comórbidas. Dado o fato de que ambas as categorias são altamente prevalentes e independentemente uma da outra na terceira idade, a simultânea ocorrência das duas bem poderia não ter uma relação causal (Xavier, 2006). A depressão pode ser um fator de risco para o desenvolvimento de um quadro demencial, o que sugere que a depressão seja já um sintoma inicial da demência (Loyd & cols., 2004; Xavier, 2004).

O impacto da depressão é observado em diferentes áreas cognitivas, tendo sido reportados prejuízos nas funções executivas, na memória e na velocidade de processamento da informação (Kiosses, Klimstra, Murphy & Alexopoulos, 2001; Pálsson, Johansson, Berg & Skoog, 2000; Portella & Marcos, 2002). Outras funções cognitivas que podem estar alteradas são viso-espaciais, atenção sustentada e a própria motivação durante a testagem (Portella & Marcos, 2002). Paterniti, Verdier-Taillefer, Dufouil e Alpérovitch (2002) demonstraram que há associação entre sintomas depressivos e demência ou declínio cognitivo, porém a natureza desta relação ainda permanece por ser determinada.

A prevalência tanto de sintomas depressivos e de ansiedade parece aumentar nos estágios inicias de declínio cognitivo. Já nas fases mais avançadas, por exemplo, da doença de Alzheimer, estes sintomas tendem a diminuir provavelmente pela falta de critica dos sintomas (Bierman, Comijs, Jonker & Beekman, 2007).

A depressão nos idosos ocorre, com frequência, acompanhada por prejuízos cognitivos (Ávila & Bottino, 2006), no entanto, ainda existem importantes questões a serem respondidas: se a depressão causa declínio cognitivo ou vice-versa; se a idade de início da depressão tem relação com pior prognóstico e risco aumentado para a ocorrência de demência; se a presença de prejuízos cognitivos em idosos deprimidos seria um primeiro sintoma de demência; e se a remissão da depressão ocasionaria também a remissão dos prejuízos cognitivos (Ávila & Bottino, 2006).

A maioria dos estudos aponta para a hipótese de que quanto mais grave a depressão, maior o prejuízo cognitivo e funcional dos pacientes (Alexopoulos, 2005). Também indicam que o agravamento das dificuldades executivas, talvez seja o grande responsável pela piora das outras funções cognitivas, principalmente da memória (Ávila & Bottino, 2006; Lesser, Boone, Mehringer, Wohl, Miller & Berman, 1996). Herrmann, Goodwin & Ebmeier (2007) relataram que pacientes com depressão de início tardio mostraram uma redução em seu desempenho nas tarefas que envolvem a velocidade de processamento de informações e na função executiva.

Foi realizado um estudo com um grupo de 116 idosos com depressão de início tardio e outro grupo com episódio depressivo no passado. Suas habilidades cognitivas foram comparadas, assim como a presença de fatores de risco cérebro vasculares foram investigadas. Os resultados mostraram que idosos com depressão de início tardio obtiveram prejuízos específicos em tarefas atencionais e nas funções cognitivas, quando comparados com o grupo de depressão recorrente. Ainda este grupo mostrou sintomas de anedonia de seus prejuízos e comorbidades associadas a doenças vasculares (Rapp, Dahlman, Sano, Grossman, Haroutunian & Gorman, 2005).

É importante avaliar as funções cognitivas e emocionais em pacientes idosos. Assim, esse estudo justifica-se pela necessidade de investigações no que concernem aos quadros neurodegenerativos na população brasileira idosa, além de contribuir para a melhor compreensão das queixas cognitivas em pacientes com sintomas depressivos. A partir disso, na tentativa de suprir tal lacuna na neuropsicologia clínica e cognitiva, o objetivo geral deste estudo foi de verificar o desempenho cognitivo de um idoso com sintomas depressivos e verificar se suas queixas eram decorrentes de um processo degenerativo e/ou se justificavam pela presença de sintomas depressivos.

 

Método

Delineamento

Estudo de caso, obtido a partir de revisão de prontuário. Foi avaliado um idoso do sexo masculino, com 67 anos que realizou o check up cognitivo no Memolab Laboratório de estudos cognitivos do Hospital Moinhos de Ventos, Porto Alegre – Rio Grande do Sul.

Instrumentos e procedimentos para coleta dos dados

Os instrumentos utilizados para avaliação clínica e neuropsicológica incluíram os que seguem expostos e brevemente descritos na ordem em que foram aplicados por sessão:

Sessão 1

Questionário de dados sócio-demográficos e de condições de saúde. Incluia questões sobre sexo, idade, escolaridade, nível sócio-econômico, e condições de saúde que poderiam influenciar nos resultados da avaliação.

Clinical Dementia Rating (CDR) (Hughes & cols., adaptada por Morris, 1993). Foi utilizada a versão reduzida da escala validada por Macedo-Montaño e Ramos (2005), que avaliou seis domínios cognitivos e de funcional: memória, orientação, espaço temporal, julgamento, resolução de problemas, relacionamento social, passatempos e cuidados pessoais. Para a obtenção do escore foi realizada uma entrevista, com o próprio paciente e com um familiar. Os escores variaram de zero (indivíduo sem comprometimento cognitivo), 0,5 (CCL), 1 (demência leve), dois (demência moderada) e três (demência severa). Os resultados do CDR foram classificados  conforme algoritmo de Morris (1993) do Centro de Pesquisa da Doença de Alzheimer na Universidade de Washington, disponíveis no site http://www.biostat.wusti.edu/~adrc/cdrpgm/index.html.

Foram aplicados os seguintes testes de rastreio para função cognitiva: o Mini Exame do Estado Mental (MEEM), o Rey Auditory – Verbal Learning Test (RAVLT), o teste de Fluência Verbal (FAS), o teste de trilhas e o Rivermead Behavioral Memory Test (RBMT). Ainda foi aplicada a escala geriátrica para depressão com objetivo de verificar a presença de sintomas depressivos.

Mini Exame do Estado Mental (MEEM). Desenvolvido por Folstein, Folstein e McHugh (1975), é um dos instrumentos de rastreio mais utilizados para a identificação de demência, verifica funções cognitivas de maneira simples e rápida, avaliando em suas 11 tarefas as funções: orientação têmporo-espacial, memória, atenção, cálculo, linguagem e praxia construtiva. Sua pontuação total é de 30 pontos, e a desempenho do indivíduo é influenciada pela escolaridade por isso foi utilizada a versão validada para a população brasileira por Bertolucci, Brucki, Campacci e Juliano (1994) e Brucki, Nitrini, Caramelli, Bertolucci e Okamoto (2003), em que são considerados valores normais; 28 pontos para escolaridade acima de oito anos, 26 para escolaridade entre cinco e oito anos, 25 para escolaridade entre um e quatro anos e 20 para analfabetos. Segundo pesquisas o item de relembrar as palavras é o mais sensível no diagnóstico de demência.

Teste de Trilhas (Trail Making Test). Originalmente faz parte da Bateria de Testes Individual do Exército (Army Individual Test Battery) (1944), este teste consiste em 25 círculos contendo números, versão A, e números e letras na versão B, os círculos devem ser sequenciados na ordem correta de 1 a 25 e na versão B alternando entre as duas sequências de 1-13 e de A - M, o indivíduo deve realizar a tarefa o mais rápido possível e o escore total é dado pelo tempo gasto para completar cada parte do teste. Este teste envolvia velocidade motora e atenção, na versão A e permitiu avaliar a velocidade de processamento e atenção visual e a versão B foi utilizada para medir a capacidade do indivíduo de gerenciar fontes de dados concorrentes, observa a flexibilidade e o planejamento, pode também ser caracterizado como uma medida de memória operacional. O teste de trilhas é um teste considerado sensível para detectar declínio cognitivo progressivo nas demências (Greenlief & cols., citado por Lezak, 1995). Estudos apontaram que o nível de escolaridade influencia neste teste, sendo visto maiores diferenças entre sujeitos com menos de dez anos de escolaridade e mais de onze anos, principalmente na parte B (Bornstein & Suga, citado por Lezak, 1995).

Fluência verbal com restrição fonológica (FAS). Desenvolvido por Benton e Hamsher (1989) consiste na nomeação de palavras com as letras F-A-S, é pedido que seja nomeado o maior número possível de palavras que comecem com as letras FAS, excluindo nomes próprios, números, a mesmas palavras com diferentes sufixos, conjugação do mesmo verbo, são dados três minutos para evocar as palavras em cada uma das letras, o escore é dado pela soma de todas as palavras ditas nas três letras, o escore é afetado pela idade é pela escolaridade. A redução na capacidade de produzir palavras é associada aos processos de demência, avalia vocabulário, é um teste sensível ao declínio cognitivo, e até o momento não foram encontrados artigos de validação para a população brasileira.

Fluência Verbal Categórico. Verificou o número de animais que o sujeito lembra em um minuto. Em um estudo entre controles e pacientes com doença de Alzheimer (Rosen, 1980) foi visto que os participantes tinham mais facilidade em realizar a fluência verbal categórica do que com restrição fonológica, além disso, tanto a sensibilidade quanto à especificidade avalia a capacidade de busca e recuperação de dados estabelecidos na memória de longa duração dentro de uma determinada categoria semântica, exigindo habilidades de organização, autorregulação e memória operacional, validado para a população brasileira por Brucki e Rocha (2004).

Teste de Aprendizado Auditivo Verbal de Rey (RAVLT). Desenvolvido por Rey (1964) este teste avaliou memória imediata, retenção de curto e longo prazo na memória são observados a aquisição, armazenamento e lembrança da informação. O teste apresenta cinco repetições de uma lista de 15 palavras, em que é possível retirar a curva de aprendizado, uma segunda lista também de 15 palavras é apresentada como distrator, após dez minutos deve ser retomada as palavras da primeira lista, após trinta minutos é observada a retenção da lista inicial. O escore é realizado nas três etapas, sendo sempre observado o número de palavras recordadas, na primeira parte possível observar a aprendizagem o escore é dado pela soma das palavras recordadas na repetição de um a cinco, da lista o escore máximo é 75, quando a soma das palavras for muito perto do escore 15 é indicativo de não aprendizagem e quanto mais próximo deste valor mais palavras foram relembradas, na recordação imediata (A6), recordação sem pista o escore total são 15 palavras e na recordação recente (A7) o escore é 15. A idade pode ser um fator relevante a piora no desempenho é vista entre 70 e 80 anos. Foi validada para a população brasileira por Malloy-Diniz, Cruz, Torres e Consenza (2000).

Sessão 2

Rivermead Behavioral Memory Test (RBMT). Teste criado por Wilson, Baddeley, e Cockburn, (1991) que tem por objetivo avaliar tarefas de memória relacionadas a situações cotidianas. O teste foi dividido em 12 subtestes que avaliaram orientação, planejamento, memória imediata, memória recente e reconhecimento. Em cada tarefa a pontuação pode variar de zero a dois, sendo dois a pontuação máxima indicando funcionamento normal, um indica desempenho no limite e zero sendo assim a pontuação geral do teste varia de zero a 24 pontos. E o escore de triagem de zero-12 em que é dado apenas certo ou errado, este teste tem quatro versões em que as tarefas são diferentes exceto orientação e data não podemos deixar de mencionar, pois fazem parte do teste. O grupo de 16-69 anos ao ser comparado com o de 70-94 foi visto que a idade afetou a lembrança da história, neste grupo a escolaridade também afetou um pouco nesta mesma tarefa. Os subtestes história imediata e recente, caminho imediato e recente e recordação do nome são bastante sensíveis para graduar as demências mesmo entre a distinção de uma demência bem leve e o funcionamento normal (Beardsall & Huppert, citado por Lezak, 1995). História imediata e recente: Foi utilizado de duas maneiras - como um dos subtestes do RBMT e o seu escore foram avaliados juntamente com outros subtestes formando o escore total confuso e avaliado como uma medida separada de avaliação de memória verbal imediata e recente. As histórias contadas na versão A e B tinham o total de 21 ideias, eram contadas o maior número possível de ideias lembradas imediatamente após ser contada a história e depois de vinte minutos

Desenho do relógio (Borod, Goodglass & Klapan, citado por Lezak, 1995). avaliou a habilidade visoconstrutiva, planejamento e negligência visual (escore máximo 14 pontos).

Escala Geriátrica para depressão (Paradela, Lourenço & Veras, 2005). A Escala de Depressão Geriátrica foi utilizada para o rastreamento de sintomas depressivos em idosos.

Relato do caso

Paciente do sexo masculino, 67 anos, casado, morava na cidade de Porto Alegre, com curso superior completo em Engenharia Civil, com história de esquecimento há um ano. Os sintomas eram que JL, não lembrava onde coloca os objetos e queixava-se também de falta de atenção.

Durante a entrevista referia também sentir-se mais cansado, sem vontade de fazer suas atividades como antes e queixava-se muito da memória. Relatava que sua esposa percebia que ele estava mais irritado e sem paciência. De acordo com o questionário do informante sobre declínio cognitivo, que foi preenchido pelo filho, não foi indicativo da presença de declínio cognitivo.

Devido à queixa cognitiva e a presença de sintomas depressivos levantou-se a possibilidade de quadro demencial, sendo então, encaminhado para a realização da testagem neuropsicológica e exames complementares. Abaixo seguem os resultados obtidos na avaliação (tabela 1).

 

 

 

Resultados e discussão

O diagnóstico diferencial entre depressão e demência no idoso não é uma tarefa fácil, pois o desafio é verificar se as mudanças cognitivas e comportamentais são decorrentes do próprio envelhecimento ou já são decorrentes de um processo degenerativo (Lezak, 1995). A maioria dos estudos existentes investiga o impacto da depressão sobre a cognição. Os resultados mostram que pacientes deprimidos de qualquer idade têm dificuldades na capacidade de aprendizado e no comprometimento da codificação da memória (Pálsson & cols., 2000). Em pacientes com depressão maior, várias habilidades cognitivas podem estar comprometidas, como psicomotricidade, memória não verbal, memória verbal, aprendizagem, compreensão de leitura, fluência verbal e funções executivas (Ávila & Bottino, 2006).

Para Ávila e Bottino (2006), outra importante característica que possibilita diferenciar pacientes com processo degenerativo de pacientes com quadro depressivo, é a etapa da memória em que aparece a disfunção. Os pacientes deprimidos costumam lembrar-se dos primeiros e últimos itens de uma lista de palavras em testes de memória, melhorando com as repetições. Em contrapartida, os pacientes com demência geralmente lembram-se dos últimos itens e não se beneficiam das repetições. Outra característica muito importante é que os pacientes com depressão, apesar da capacidade de aprendizagem diminuída, conseguem armazenar a informação e evocá-la após intervalo.

O processo diagnóstico tem de ser visto dentro do ambiente clínico de referência. No presente estudo, analisou-se o desempenho cognitivo de um idoso com queixa de memória e depressão. Foi realizada uma análise tanto quantitativa e qualitativa, principalmente dos tipos de erros cometidos.

Ainda, neste estudo foi escolhida uma bateria que permitisse avaliar a maioria das funções cognitivas, em especial a memória, que teve como resultado: desempenho de acordo com o esperado para a sua idade e escolaridade na avaliação neuropsicológica, como MEEM, fluência verbal (animais e restrição fonêmica), atenção, praxia construtiva e na flexibilidade mental. Estavam preservadas também a capacidade de cálculo, a compreensão verbal e a nomeação de figuras por confronto visual. Apareceu uma diminuição em seu desempenho na velocidade de processamento e na memória imediata.

Na análise qualitativa dos testes não foi observada uma diminuição em seu desempenho. Verificou-se que nas provas de fluência verbal não houve perseverações e/ou intrusões, após recordar uma história depois de ouvi-la relatou os fatos com detalhes e houve uma melhora em seu desempenho nas tarefas cognitivas com auxilio de pistas verbais.

Entretanto, observou-se uma diminuição em seu desempenho na tarefa de memória de aprendizado verbal. O desempenho de J.L foi menor quando comparado com o de idosos com a mesma idade. No teste de RAVLT seus escores no teste foram nas cinco listas administradas um total de 28, pois o esperado para a sua idade seriam um total de 33 palavras.

Ao mesmo tempo observou-se uma melhora no desempenho com auxilio de pistas. No teste de memória de Aprendizado verbal de Rey, o paciente conseguiu identificar as palavras que foram apreendidas anteriormente. Isto não ocorre com paciente demenciados, onde seu desempenho não melhora mesmo com auxílio de pistas (Strauss, Sherman, & Spreen, 2006). A presença de muitos falso-positivos no reconhecimento da lista de palavras aparece no desempenho de pacientes com DA e é raramente encontrado no desempenho de pacientes com depressão (Strauss & cols., 2006).

No caso do senhor J.L. na administração do reconhecimento, observou-se que J.L conseguiu resgatar a informação. Isto sugere então que não houve falhas no processo do armazenamento e sim na evocação da lista de palavras.

Em conjunto com os dados da história clinica do paciente e com resultados da avaliação neuropsicológica, os dados indicam que seus prejuízos cognitivos nos testes, parecem ser secundários à presença de sintomas depressivos. Esta hipótese parece ser confirmada tanto pelos resultados quantitativos e qualitativos da avaliação. Segundo a maioria dos estudos, pacientes com depressão podem demonstrar lentidão de desempenho e falhas na memória recente. Ainda na análise qualitativa o paciente não apresentou intrusão durante o aprendizado de uma lista de palavras e com auxílio de pistas observou-se resgate da informação da memória.

Outro aspecto importante a ser discutido é que apesar das características da testagem e pela a história clínica do paciente sugerirem alterações cognitivas que pareciam ser secundárias ao quadro depressivo, verifica-se que a própria depressão associada a prejuízos cognitivos é considerada um fator de risco tanto para o diagnóstico de comprometimento cognitivo leve e para a doença de Alzheimer (Barnes, Alexopoulos, Lopez, Williamson & Yaffe, 2006). Com isto, torna-se importante nestes casos fazer avaliações seriadas com objetivo de acompanhar a evolução dos sintomas.

 

Conclusão

Nesse estudo de caso, os resultados mostraram um prejuízo das funções cognitivas do paciente avaliado. Esse apresentou um desempenho inferior nas habilidades que envolvem velocidade de processamento de informações e na memória recente. Ainda analisando os tipos de erros cometidos nestas tarefas, observou-se que são comumente encontrados em protocolos de pacientes com sintomas depressivos. Essa é uma importante característica que possibilita diferenciar pacientes com quadro degenerativo da depressão e é nessa etapa que aparece a disfunção (Ávila & Bottino, 2006).

No teste de aprendizado verbal de REY o paciente apresentou falhas na evocação da lista. No entanto, conseguiu recuperar a informação com auxilio do reconhecimento da lista de palavras. Outra importante característica que pode ser observada é que pacientes deprimidos são mais lentos na execução de tarefas tempo-dependentes. Neste estudo foi verificado que o paciente apresentou uma lentificação na velocidade de processamento das informações.

 

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Endereço para correspondência
E-mail: rosa.almeida@ufrgs.br

Recebido em agosto de 2009
Aprovado em novembro de 2009

 

 

Nicole Maineri Steibel: Psicóloga; Especialista em Neuropsicologia (Projecto/Porto Alegre-RS); Profissional do Hospital Moinhos de Vento- Memolab.
Rosa Maria Martins de Almeida: Psicóloga; Pós-Doutora (Tufts University/USA). Professora do curso de Graduação e Pós-Graduação em Psicologia (UFRGS).

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