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Aletheia

versão impressa ISSN 1413-0394

Aletheia  no.42 Canoas dez. 2013

 

ARTIGOS EMPÍRICOS

 

A percepção de idosas acerca das crenças de autoeficácia e envelhecimento saudável

 

The perception of elderly women about the beliefs of self-efficacy and healthy aging

 

 

Luciane Patrícia Boratti Karlinski; Silvana Soriano Frassetto

Universidade Luterana do Brasil

Endereço para contato

 

 


RESUMO

A presente pesquisa aborda o tema autoeficácia em idosas e o envelhecimento saudável. O objetivo foi verificar qual a percepção de idosas acerca das crenças de autoeficácia e envelhecimento saudável. O método de pesquisa utilizado foi o qualitativo, onde foram entrevistadas 6 idosas, entre 70 a 80 anos, as quais responderam uma ficha com dados de identificação, dez questões de uma entrevista semiestruturada e também uma Escala de Autoeficácia Geral Percebida (EAEGP). A base teórica que embasou a pesquisa foi a Social Cognitiva de Albert Bandura. Os dados foram explorados através da Análise de Conteúdo de Bardin, sendo as falas agregadas em unidades de sentido e categorizadas, valendo-se da interpretação e inferência. Os resultados apontaram que idosas com uma autoeficácia adequada possuem uma visão positiva do envelhecimento: não percebem limitações, são otimistas, resilientes e utilizam o enfrentamento através da religiosidade/espiritualidade, neste momento e ao longo do ciclo de suas vidas.

Palavras-chave: Idosas, Autoeficácia, Envelhecimento saudável.


ABSTRACT

This research addresses the theme self-efficacy in older and healthy aging. The objective was to verify the perception of old beliefs about the self-efficacy and healthy aging. The research method used was qualitative, where there were interviewed 6 older women, 70 to 80 years, which responded with a statement identifying data, ten issues of a semi-structured interview and also a range of General Perceived Self-Efficacy (EAEGP). The theory behind the research was to Albert Bandura's Social Cognitive. The data were explored through content analysis of Bardin, the lines being aggregated into units of meaning and categorized, using interpretation and inference. The results showed that elderly women with an adequate self-efficacy have a positive view of aging: do not realize limitations, are optimistic, resilient and coping through use of religiosity/spirituality, both now and over the course of their lives.

Keywords: Older women, Self-efficacy, Healthy aging.


 

 

Introdução

A divulgação preliminar dos resultados do último censo realizado pelo IBGE (2010) apontou para o aumento de idosos e a diminuição da proporção de jovens no país. Houve um alargamento no topo da pirâmide etária, onde se observa que a participação relativa da população com mais de 65 anos, que em 1991 era de 4,8%, passou para 5,9% em 2000 e em 2010 chegou a 7,5%, demonstrando um aumento crescente.

É importante considerar que são diretrizes preconizadas para a atenção à saúde do idoso, segundo o Ministério da Saúde (2011), a promoção do envelhecimento saudável e ativo, a reabilitação e manutenção da capacidade funcional e o apoio ao desenvolvimento de cuidados informais. Sendo que, para uma vida saudável, o idoso deve ter autonomia preservada tanto física como psiquicamente. Um envelhecimento ativo e saudável envolve qualidade de vida, com uma alimentação adequada, prática de atividades físicas, estimulação da convivência social e da diminuição do estresse com práticas prazerosas, evitando-se o cigarro, o álcool e a automedicação.

Este trabalho, que aborda o tema autoeficácia e envelhecimento saudável em idosas, utilizou o método qualitativo de pesquisa mediante a realização de uma entrevista semiestruturada, do preenchimento de um questionário de identificação e da Escala de Autoeficácia Geral Percebida (EAEGP). O objetivo principal foi verificar qual a percepção de idosas acerca das crenças de autoeficácia e do envelhecimento saudável, e como escopo teórico embasou-se na Teoria Social Cognitiva de Albert Bandura (Bandura, 1990).

A teoria social cognitiva proposta por Bandura (2008) discute a capacidade humana para se adaptar às mudanças, e de como as pessoas influenciam seu funcionamento e as situações de vida de modo ativo e intencional, baseadas na auto-organização, autorregulação e proatividade. As crenças pessoais afetam as escolhas das pessoas, influenciando em como organizam e encaminham os acontecimentos da vida.

A autoeficácia é a crença do indivíduo em sua capacidade para mobilizar suas habilidades, facilidades cognitivas, emocionais e comportamentais na execução de uma atividade ou tarefa num dado momento e contexto, sendo que poderá passar por alterações em função da dinâmica de interações do indivíduo com o ambiente (Azzi & Polidoro, 2006). Para Bandura (1990), dentre os mecanismos de agência, um dos mais centrais são as crenças dos indivíduos sobre as capacidades de exercerem controle sobre situações que ocorrem e afetam suas vidas. As crenças de autoeficácia possuem um papel importante na autorregulação da motivação e resultam de um processo complexo de autopersuasão.

De acordo com Schultz e Schultz (2008), apresentando o conceito de autoeficácia de Bandura, as pessoas com baixa autoeficácia, quando encontram um obstáculo, desistem de modo rápido se a primeira tentativa de solução não surtir efeito. A baixa autoeficácia pode interferir na motivação, nas aspirações, na capacidade cognitiva e afetar a saúde física. Já as pessoas com elevada autoeficácia acreditam que conseguem lidar com as situações de modo satisfatório, apresentam maior confiança em sua capacidade encarando as adversidades como desafios e não como ameaças, fazendo com que haja uma redução do medo de fracasso e maior aperfeiçoamento para a resolução de problemas.

Bandura (1999) enfatiza que, se os indivíduos acreditam que podem manejar com efetividade os possíveis estressores ambientais, não são perturbados por eles; mas do contrário, se pensam que não podem controlá-los, isto vem causar angústia e incapacidade em termos de funcionamento. Silva e Lautert (2010), em investigação qualitativa para compreender como o senso de autoeficácia tem influência na manutenção dos comportamentos promotores de saúde em pessoas idosas participantes de um centro de lazer, constataram que o senso positivo de autoeficácia dos depoentes atinge diversas áreas; os mesmos acreditam em sua capacidade pessoal para garantir a manutenção dos comportamentos promotores de saúde e melhor adesão às atividades.

Fortes-Burgos, Neri e Cupertino (2008) em pesquisa para analisar a relação entre eventos estressantes, estratégias de enfrentamento, autoeficácia e sintomas depressivos em idosos, observaram que o maior risco de depressão foi relacionado ao uso de estratégias de enfrentamento focadas nas emoções negativas, em excessos de comportamento e comportamentos de risco, experiência de situações que afetam a descendência, estar entre os 60 e 69 anos e avaliar a autoeficácia para enfrentar as situações como inadequada. Aqueles idosos que avaliaram a autoeficácia ao enfrentamento como inadequada, mostraram-se insatisfeitos com o próprio desempenho no evento estressante enfrentado. Além disso, tem sido descrito que o aumento da sintomatologia depressiva está relacionado a uma qualidade de vida prejudicada em idosos, principalmente nos aspectos emocionais, físicos e na saúde mental (Neves, Laham, Aranha, Santiago, Ferrari & Lucia, 2013).

Cardoso e Rabelo (2007), em revisão acerca da autoeficácia, doenças crônicas e incapacidade funcional na velhice, identificaram que quanto maiores as crenças de autoeficácia, existe menor incapacidade, menos sintomas depressivos e menor declínio em atividades cotidianas, sendo que a percepção de saúde, a adequação à dor, o ajustamento social e a capacidade de se mobilizar para enfrentar situações que dependam de esforço são maiores.

Uma velhice bem-sucedida ligasse a uma junção de três categorias: a primeira é uma baixa probabilidade de doenças, principalmente das que comprometem a autonomia. A segunda diz da manutenção de um alto nível de funcionamento cognitivo e físico, o que pode ser denominada de uma velhice otimizada, e a terceira é a conservação de um compromisso social e de um adequado bem-estar subjetivo. Estas três condições estão reunidas de modo variado de acordo com cada indivíduo e também considerando as influências desenvolvimentais diversas ocorridas ao longo da vida (Fontaine, 2007).

Deponti e Acosta (2010), em estudo realizado com 30 idosos participantes de um grupo de atividade física, onde foram utilizadas 2 questões abertas e 21 fechadas, perceberam nos idosos uma combinação de múltiplos fatores influenciando os mesmos, como os biológicos, psicológicos ou sociais. A satisfação acerca de sua saúde foi grande; apesar de algumas limitações, eles conseguem, em sua maioria, levar uma vida ativa e com convívio social.

O envelhecimento é um processo natural, e os indicadores apontam para um considerável aumento na população de faixas etárias mais avançadas. Verificar o que idosas percebem sobre o envelhecimento e a sua autoeficácia perante este processo, são pontos que justificam e norteiam esta pesquisa. O objetivo principal foi verificar qual a percepção de idosas acerca de suas crenças de uma autoeficácia adequada e do seu envelhecimento saudável. A partir do momento em que se conhece a realidade vivida pelos idosos e suas crenças relacionadas ao envelhecer, podem ser pensadas ações por parte dos profissionais da saúde auxiliando e contribuindo para que o envelhecimento seja vivenciado com qualidade de vida, de forma saudável e positiva.

 

Método

Participaram do presente estudo idosas entre 70 à 79 anos, não institucionalizadas e não acometidas de doenças que inviabilizassem a compreensão das questões, não apresentando quadro de comprometimento psíquico ou neurológico. As idosas participaram, mediante contato prévio com Termo de Consentimento Livre e Esclarecido assinado e disponibilidade das mesmas. As participantes, em número de 6, foram selecionadas por conveniência.

Os instrumentos utilizados na pesquisa foram uma ficha com dados de identificação, um roteiro com 10 questões para a entrevista semiestruturada e também uma Escala de Autoeficácia Geral Percebida (EAEGP) validada no Brasil por Teixeira e Dias, no ano de 2005, conforme Benites (2006). Foram aplicados no mês de outubro de 2011.

A ficha com os dados de identificação foi preenchida pelas próprias idosas ou pela pesquisadora, composta por questionamentos como nome, sexo, idade, escolaridade, ocupação, número de filhos, profissão, ocupação atual, estado de saúde, medicações e se passou por alguma doença neurológica ou psiquiátrica. A mesma foi entregue primeiramente, em seguida repassou-se a escala e para finalizar foram respondidas as questões da entrevista.

As questões da ficha de identificação das participantes foram elaboradas tendo como base o questionário de dados sociodemográficos elaborado por Benites (2006) em sua tese de Mestrado e também por outras questões de interesse da pesquisa. As perguntas para a entrevista semiestruturada originaram-se a partir do levantamento bibliográfico e da teoria acerca das dimensões autoeficácia, envelhecimento e envelhecimento saudável, bem como questões sobre o que os idosos pensam e inferem do processo de envelhecimento, suas capacidades e potencialidades e a visão percebida sobre o envelhecimento saudável.

As questões foram as seguintes: 1- De que forma percebe o envelhecimento nesta fase de sua vida?; 2- O que é envelhecer de modo saudável para a Senhora?; 3- O que pensa sobre o seu futuro?; 4-Como se sente perante as dificuldades que enfrenta ou venha enfrentar neste momento de vida?; 5- De que forma percebe sua capacidade para atingir metas?; 6- Como se sente ao participar de atividades de integração com outras pessoas?; 7- O quanto de zero a dez considera-se capaz para enfrentar as situações imprevistas?; 8- Sente algum tipo de limitação em sua rotina em função da idade?; e 9- Quais atividades lhe dão prazer ou satisfação?. A questão número 10 (O que leva a senhora a ser assim, disposta, ativa e autoeficaz?) foi questionada tendo como base a avaliação das verbalizações ao longo da entrevista e a boa pontuação na EAEGP.

Conforme Gil (2002), a entrevista permite uma maior flexibilidade dentre as técnicas de interrogação, sendo que duas etapas devem ser seguidas, a especificação dos dados que se quer obter e a escolha e formulação das questões. A Escala de Autoeficácia Geral Percebida (EAEGP) (Tabela 1), utilizada na pesquisa para identificar a autoeficácia das idosas participantes, foi utilizada por Benites (2006) em sua tese de Mestrado. Conforme Benites (2006), a EAEGP foi desenvolvida e viabilizada por pesquisas de Mathias Jerusalem e Ralf Schwarzer em 1979, passando por adaptações para 28 idiomas, sendo que no Brasil a escala foi traduzida e validada por Teixeira e Dias, no ano de 2005.

A Escala de Autoeficácia Geral Percebida (EAEGP) (Tabela 1) possui 10 itens. Cada frase pode ser avaliada pelo sujeito como 1, para nada verdadeiro, até 4, para totalmente verdadeiro. No máximo são somados 40 pontos o que indica máxima autoeficácia.

 

 

Inicialmente foram explicados os objetivos da pesquisa às idosas participantes, questionando-se a sua vontade de participação. Foi marcado o melhor dia e horário para as entrevistas, sendo que foram iniciadas após a avaliação e aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA, sob o número de Protocolo 2011 – 348H.

As entrevistas foram gravadas com o consentimento das participantes e, posteriormente, transcritas para se proceder o levantamento dos resultados da pesquisa, seguindo o método de Análise de Conteúdo de Bardin (1977). As participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, sendo as mesmas esclarecidas do sigilo e confidencialidade quanto a preservação de seus nomes, antes da aplicação dos questionários e das respostas às questões, sanando-se qualquer dúvida. As idosas foram identificadas na pesquisa com a denominação de P1 à P6, sendo o P correspondente à participante e o número uma forma de organização quanto a ordem das entrevistas.

 

Resultados

Com a finalidade de conhecer as participantes, foram realizadas questões acerca da idade, estado civil, número de filhos, escolaridade, saúde, ocupação, cujos resultados observam-se na Tabela 2.

 

 

Os resultados demonstram uma pontuação alta nas respostas à EAEGP [média=37,3 ± 2,9 (DP)], sendo que a escala possui como maior pontuação 40 pontos (quando há autoeficácia máxima), o que demonstra uma autoeficácia adequada das idosas entrevistadas. Quanto às idades das participantes [média= 74,2 ± 4,0 anos (DP)], observase que há homogeneidade quanto ao grupo pesquisado.

Após a transcrição e leitura das entrevistas, iniciou-se o processo de agregação em unidades de sentido, procurando-se através de uma leitura atenta e cuidadosa organizar o material levantado de modo que as verbalizações pudessem ser reunidas conforme os propósitos da pesquisa, sendo assim que se originaram as categorias. Na análise das entrevistas foram encontradas sete categorias que correlacionou-se com a percepção das idosas acerca das crenças de uma autoeficácia adequada e envelhecimento saudável. Destacaram-se as seguintes categorias: Características de Temperamento; Religiosidade/ Espiritualidade; Visão do Envelhecimento (Subcategorias: Aceitação do Envelhecimento e Ausência de Limitações); Visão do Futuro; Características do Pensamento; Resiliência; e Integração Social (Subcategorias: Voluntariado e Internet/Redes Sociais), conforme apresentadas na Tabela 3 a seguir.

 

 

Bassit e Witter (2010) enfatizam sobre a necessidade de pesquisas referentes ao envelhecimento, reforçando que a psicologia tem papel importante nesta construção no momento em que desenvolve estudos a partir da perspectiva do sujeito do processo, o que permite uma visão mais ampla e não somente relacionada aos limites do corpo físico dos sujeitos que envelhecem. Apontam ainda para a responsabilidade da psicologia em promover estudos que rompam com a lógica da associação direta entre doença e velhice. Esta visão destes autores está relacionada às categorias demonstradas neste trabalho, algo que vai além do envelhecimento como processo limitante e de causa e efeito, e na forma como as idosas vivenciam, compreendem e percebem esse processo e momento de suas vidas.

 

Discussão

No presente grupo de idosas evidenciou-se que o envelhecimento é visto como um processo natural e que faz parte do curso de vida. Neste sentido, Fontaine (2007) enfatiza que o envelhecimento não é um estado; porém, um processo de degradação que é gradativo e diferente para cada indivíduo, e que diz respeito a todos os seres vivos. O termo natural é a morte do organismo. Aponta ainda que pontuar seu começo é impossível, pois segundo o nível em que cada um situa-se, se biológico, psicológico ou sociológico, a velocidade e rigor irão variar consideravelmente de uma pessoa a outra.

As participantes também sinalizaram na categoria Visão do Envelhecimento que não percebem limitações, e que o envelhecer de modo saudável é poder fazer as atividades da rotina, aceitar a vida como ela é, ter bons pensamentos, acreditar em Deus e ter saúde, sendo que todas avaliaram-se como tendo uma boa saúde. Neste sentido, Cupertino, Moreira e Ribeiro (2007) também demonstraram, através de suas pesquisas com idosos, que estes não visualizam o envelhecimento como patológico, e apontam ainda que o envelhecimento é visto como algo heterogêneo e multidimensional.

Quanto à visão de futuro, as idosas em sua maior parte enfatizaram que focam no aqui-agora, no viver e aproveitar o dia de hoje, sem preocupações com o que virá. Evidencia-se uma atitude que decorre do amadurecimento e das experiências de vida, e, conforme Neri (2001), as mulheres idosas possuem um envelhecimento diferenciado em relação aos homens idosos; pertencer ao gênero feminino determina papéis que conectam as mulheres ao mundo dos relacionamentos e à interdependência. A maior interação reflete em satisfação e acesso a recursos sociais e interpessoais, que funcionam como proteção, especialmente para as idosas.

A maioria das participantes faz parte de atividades de integração com outras pessoas, como atividades voluntárias, sendo uma rotina para quatro das seis participantes. Uma delas também pratica atividade esportiva em grupo, e outra retomou os estudos e tem contato com pessoas que como ela voltaram aos bancos escolares. Algo que sinaliza para uma nova dinâmica é o acesso às redes sociais como oportunidade de interação e contato social. Quatro das seis idosas utilizam com habitualidade a troca de e-mails, as pesquisas em sites, e duas interagem através do Facebook, o que é avaliado por elas como positivo. Neste sentindo, Jardim e Medeiros (2006), em estudo qualitativo com dez idosos para conhecer o que percebiam sobre o envelhecimento, demonstraram que os idosos não apresentavam uma visão negativa e homogênea da velhice, e sim com diversas vivências sobre esse momento, visto como uma fase prazerosa. Assim, a velhice associada à perda, doença ou incapacidade ficava mais na visão dos outros do que na visão de si dos idosos. Ressalta-se que as idosas apontaram para o fato de já possuírem essa característica de temperamento, esse jeito de ser autoeficaz, como algo que as acompanha ao longo do ciclo vital.

Por outro lado, Silva, Smith-Menezes, Tribess, Rómo-Perez e Júnior (2012) descrevem que a presença de limitações na realização das atividades instrumentais da vida diária do idoso está associada à percepção negativa do estado de saúde, sendo que o elemen to essencial mediador da autoavaliação pessimista da saúde pode ser a própria dependência. Assim, os autores sugerem que o declínio na capacidade funcional do idoso pode ser o maior indicador para o próprio indivíduo de sua condição na velhice.

Schultz e Schultz (2008), quando mencionam os estágios de desenvolvimento e a relação com a autoeficácia, apresentando a teoria de Bandura, enfatizam que para o autor, ser autoeficaz é um fator decisivo na determinação de sucesso ou fracasso ao longo de toda a vida. Assim, as pessoas que ao longo de seu desenvolvimento tem a autoeficácia como uma característica, sentem-se mais confiantes nos momentos que exigem adaptação e enfrentamento de situações novas, como na aposentadoria, em uma doença, ou nas perdas que ocorrem ao longo do ciclo vital.

Outra categoria identificada foi a da religiosidade/espiritualidade, onde todas as participantes referiram a importância do apoio espiritual. Conforme Socci (2010), escrever sobre religiosidade/espiritualidade ainda representa um desafio à Psicologia científica, mas a atual tendência da psicogerontologia é considerar este enfoque como variável de mediação entre eventos estressantes e as respostas às situações negativas na velhice ou também como recurso para o enfrentamento nas perdas, dificuldades ou adversidades.

Resiliência e características de pensamento com ênfase no positivo são questões percebidas nas falas das participantes. Considerando o que aponta Noronha, Cardoso, Moraes e Centa (2009), a resiliência é a capacidade do ser humano de enfrentar as dificuldades do dia a dia e de responder a elas de modo positivo, apesar das adversidades, e que se origina de uma combinação entre atributos individuais e das interações entre o ambiente familiar, social e cultural. Segundo Couto (2010), a vulnerabilidade biológica e a incapacidade funcional em idosos podem gerar baixa resiliência física, que está intimamente ligada aos aspectos psicológicos e à subjetividade dos recursos internos. A autoavaliação das capacidades funcionais e das dificuldades em manter ou aceitar os recursos reabilitatórios depende de critérios como autoestima e autoeficácia.

Neri (2007) aponta que se os idosos adaptam as crenças de autoeficácia às novas condições desencadeadas pelo envelhecimento, criam-se outras crenças sobre os próprios recursos e capacidades. A autoeficácia e a rede de relações podem contribuir para a adesão a tratamentos de saúde, a investimentos no bem-estar pessoal e ao envolvimento no exercício de controle pessoal. Sendo assim, o incentivo ao desenvolvimento de crenças de autoeficácia exerce um papel relevante no bem-estar dos idosos.

Conhecer como as idosas vivenciam e percebem o envelhecimento e as crenças de autoeficácia relacionadas a este processo, constituiu-se foco desta pesquisa que apontou como resultados o fato das participantes possuírem uma visão de vida que coaduna com ações e pensamentos relacionados a uma autoeficácia adequada.

As participantes julgam-se capazes de enfrentar as adversidades, aceitam o envelhecimento de modo geral como algo natural e integrante do ciclo vital, e denotam a importância de pensamentos que apontem no sentido de uma perspectiva positiva e resiliente perante a vida, nas situações difíceis e no enfrentamento do dia a dia. Há uma aceitação do envelhecimento e disposição para levar uma vida com vitalidade, naturalidade e bom humor. Bandura (1999) reforça que a autoeficácia percebida é vista como um importante determinante de uma conduta que favorece a saúde, capacitando as pessoas a exercer certo controle de ação sobre sua vitalidade e qualidade de vida.

Neste sentido, sugere-se que mais pesquisas possam ser realizadas no intuito de conhecer melhor a realidade vivida pelos idosos em nosso contexto, pois, a partir do momento em que isso é conhecido, podem ser pensadas, planejadas e implementadas ações por parte dos profissionais da saúde, com o foco em melhor atender e intervir no fomento da qualidade de vida, saúde, incentivo à interação social e um novo enfoque para com os idosos, suas necessidades e possibilidades. A Psicologia tem papel importante neste processo, e deve voltar-se para as pesquisas e estudos no que concerne aos idosos e ao envelhecimento, uma faixa etária merecedora de atenção, e onde devem ser implementadas intervenções no intuito de auxiliar na promoção de qualidade de vida e bem-estar.

 

Referências

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Endereço para contato
E-mail: silvanafrassetto@terra.com.br

Recebido em março de 2014
Aceito em abril de 2014

 

 

Luciane Patrícia Boratti Karlinski: Psicóloga pela Universidade Luterana do Brasil (ULBRA).
Silvana Soriano Frassetto: Psicóloga e Bióloga. Especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental (WP – Centro de Psicoterapia Cognitivo-Comportamental). Doutora em Bioquímica (Ênfase em Neurociência – UFRGS). Professora da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA).

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