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Aletheia

versão impressa ISSN 1413-0394

Aletheia vol.49 no.1 Canoas jan./jun. 2016

 

ARTIGOS EMPÍRICOS

 

Fatores de risco para episódios e sintomas depressivos em usuários de álcool e/ou cocaína

 

Risk factors for depressive episodes and symptoms in alcohol and/or cocaine users

 

 

Roger Camargo1; Luciana Signor2; Cassandra Borges Bortolon3; Taís de Campos Moreira4; Maristela Ferigolo5; Helena Maria Tannhauser Barros6

Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Usuários de drogas tendem a ser mais depressivos do que não usuários. O objetivo deste estudo foi investigar os fatores de risco para episódios e sintomas depressivos em usuários de álcool e ou cocaína/crack que procuraram um serviço de telemedicina. Realizou-se um estudo transversal (n=838) com aplicação do Inventário de Depressão de Beck para mensuração dos sintomas depressivos e o Mini-International Neuropsychiatric Interview para episódio depressivo atual nos usuários no acompanhamento telefônico para cessação do consumo de drogas. O principal fator de risco entre os usuários para sintomas depressivos foi baixa escolaridade (OR=1,4 IC 95%:1,1-2,2). Para o episódio depressivo atual o maior risco entre os usuários foi ser do sexo feminino (OR=1,5 IC 95%:1,0-2,4). O consumo de crack estava associado a episódio depressivo atual (p=0,014). O uso do telefone é viável para detecção de fatores de risco para episódios e sintomas depressivos nos usuários de álcool e ou cocaína/crack.

Palavras-chave: Uso de drogas; Sintomas depressivos; Episódio depressivo.


ABSTRACT

Drug users tend to be more depressed than non-users. The aim of this study was to investigate the risk factors for episodes and depressive symptoms in users of alcohol and or cocaine/crack that called for the telemedicine service. We conducted a cross- sectional study (n = 838) with application of the Beck Depression Inventory to Measure depressive symptoms and the Mini International Neuropsychiatric Interview for current depressive episode in users on the telephone follow-up to cessation of drug use. The main risk factor among users for depressive symptoms was lower education (OR = 1.4; 95% CI: 1.1-2.2). For the current depressive episode the greatest risk among users was being female (OR = 1.5; 95% CI: 1.0- 2.4). The crack use was associated with current depressive episode (p = 0.014). The use of the phone is feasible to detect risk factors for episodes and depressive symptoms in users of alcohol and or cocaine/crack.

Keywords: Use of drugs; Depressive symptoms; Depressive episode.


 

 

Introdução

A depressão é um transtorno mental comum que apresenta como critérios inerentes apatia, anedonia e sentimentos de desesperança (APA, 2014). A doença afeta cerca de 121 milhões de pessoas no mundo e é a principal causa de incapacidade. Entre os brasileiros, a depressão atingiu 4,1% da população em 2008 (OMS,2008). Sabe-se que os sintomas de depressão são mais frequentes e graves em usuários de substâncias lícitas e ilícitas (Torrens, Gilchrist & Domingo-Salvany, 2011). Desta forma, a comorbidade de depressão e dependência química é uma condição prevalente (Harrison & Abou-Saleh, 2002). Estudos demonstram que 20,3% dos dependentes de álcool tem diagnóstico de depressão ou ansiedade, e cerca de 10% de dependentes de cocaína e ou crack sintomas depressivos graves (Boschloo et al., 2011). Estabelecer se o transtorno depressivo antecede a história psiquiátrica dos pacientes com Transtorno Relacionado a Substâncias e Adição (TRSA), é um desafio que há muito a ciência tenta esclarecer (Crome, Chambers, Frisher, Bloor & Roberts, 2009).

A telemedicina tem alcançado resultados positivos no tratamento para doenças crônicas como diabetes e AIDS (Dobkin et al., 2011). Na depressão, a utilização de tecnologias, tais como telefone e internet, tem contribuído para a diminuição de sintomas depressivos (Fortney et al., 2013). Em usuários de drogas, a intervenção por telefone tem beneficiado e auxiliado na abstinência de álcool, cocaína, crack e maconha (Signor et al., 2013, Bisch et al., 2011).

O consumo de álcool e cocaína agrava a depressão, aumenta o risco de outras comorbidades e de suicídio e interfere na eficácia dos tratamentos face a face para depressão (Dvorak et al., 2013; Bolotner et al., 2011; Rocha et al., 2015). Desta forma, o conhecimento sobre transtornos de humor em usuários de drogas, apoiados pelo uso da telemedicina, são importantes para colaborar com o desenvolvimento de programas de triagem, intervenção em saúde mental e ainda no auxílio para cessação do consumo de substâncias. Se conhece pouco sobre usuários de drogas atendidos via telemedicina e as possibilidades de triagem via ligação. O presente artigo teve como objetivo investigar fatores de risco para episódio e sintomas depressivos em usuários de álcool e ou cocaína e crack atendidos por telefone.

 

Metodologia

Realizou-se um estudo transversal com 838 usuários que usavam álcool e ou cocaína no período de julho de 2011 a novembro de 2012. Foram selecionados todos os indivíduos maiores de 18 anos que aceitaram participar da intervenção e acompanhamento telefônico oferecido pelo Ligue 132 (Central de Atendimento sobre Drogas) para cessação do consumo de drogas. Usuários que não completaram as entrevistas, ou apresentaram baixa compreensão dos instrumentos, foram excluídos. A coleta de dados foi conduzida por consultores, estudantes da área da saúde com treinamento em drogas de abuso, aconselhamento por telefone e intervenção breve motivacional (Barros, Santos, Mazoni, Dantas &¨Ferigolo,2008). O Ligue 132 é um serviço de utilidade pública nacional que oferece a população, de forma anônima e gratuita informações sobre drogas, locais de tratamento, apoio e intervenção por telefone, a usuários de drogas e seus familiares. O acompanhamento oferecido ao usuário e familiares é de 6 meses (Bortolon, et al., 2016).

Os consultores participaram de treinamento e capacitação de 50 horas para aplicação dos instrumentos de avaliação dos sintomas e episódio depressivo atual. Por meio de software foram armazenadas as informações sociodemográficas dos usuários, como sexo, escolaridade, estado civil, renda familiar, informações sobre os tipos de drogas utilizadas, quantidade e intensidade de uso.

Combinou-se com os usuários uma data de parada das substâncias, e o retorno telefônico ao serviço em 24 horas, 3,7 e 30 dias após a data escolhida. Quando não ocorreu contato do usuário após a primeira ligação, os pesquisadores fizeram a busca ativa e ligaram de acordo com os seguimentos combinados.

O instrumento do National Household Surveys on Drug Abuse (NHSDA) permite a avaliação do consumo e abuso de substâncias. A escolha desse instrumento justifica-se pelo fato de já ter sido utilizado em levantamentos epidemiológicos brasileiros (SAMHSA, 1999; Carlini & Galduroz, 2007). Conforme esse questionário, o diagnóstico de abuso de substâncias é considerado quando o usuário apresenta no mínimo dois dos seguintes critérios: a) gasta muito de seu tempo para conseguir drogas, usá-las ou para se recuperar de seus efeitos; b) utilizou quantidades ou em frequência maior do que gostaria; c) tolerância d) estava em situação de risco físico sob efeito ou após o efeito de drogas; e) teve problemas pessoais devido ao consumo de drogas; f) desejo de reduzir ou interromper o uso de drogas.

Para verificação dos sintomas depressivos foi utilizado o Inventário de Depressão de Beck (BDI), o qual é composto de 21 itens com 4 frases cada e o entrevistado escolhe a frase que mais identifica seus sentimentos na última semana (Cunha,2001). O resultado se dá a partir de 4 escores diferentes para pacientes psiquiátricos: < 9 corresponde a sem sintomas ou sintomas mínimos; de 10 a 18 sintomas leve a moderado; de 19 a 29 sintomas moderado a grave; de 30 a 63 corresponde a sintomas grave. As questões envolvem sentimentos e comportamentos cognitivos e físicos. No Brasil, o BDI foi validado com índices de consistência interna (0,81) para a população geral e (0,88) para a população clínica (Gorestein & Andrade, 1998). O inventário também foi validado para ser conduzido verbalmente. O ponto de corte foi estabelecido com escore menor de 19, identificando sintomas depressivos mínimos até moderados e acima de 19 sintomas depressivos de moderados a grave, conforme indicação para a população psiquiátrica brasileira (Cunha, 2001).

A identificação de Episódio Depressivo Atual foi realizada pelo Mini- International Neuropsychiatric Interview (MINI) (Amorin,2000). O questionário contém 11 questões, com opções de respostas sim ou não, sendo de curta duração (15 a 30 minutos). A entrevista envolve critérios do DSM IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos mentais) e CID-10 (Classificação Internacional de Doenças) (Amorin, 2001). O MINI foi usado com sucesso em outros estudos por telefone (Faller et al., 2012; Matthey & Ross-Hamid, 2011).

A aplicação dos instrumentos sobre depressão ocorreu na ligação de 24 horas após a data combinada de início da abstinência. Os indivíduos da pesquisa ficaram divididos a posteriori em 3 grupos: os abstinentes de até 7 dias, os abstinentes de 8 a 30 dias e os indivíduos que não pararam o consumo de substâncias. As bases para escolha dos períodos foram às fases de fissura da cocaína descritas por Gawin e Kleber (1986). A abstinência tem sentimentos negativos intensos que podem durar até duas semanas após a parada (representado no grupo de abstinentes até 7 dias) e posteriormente se instala um processo que pode durar até anos com episódios de sintomas depressivos e fissura da droga (exemplificado no grupo de abstinentes de 8 a 30 dias).

Todos os usuários aceitaram verbalmente participar do estudo por meio do termo de consentimento livre e esclarecido. O trabalho foi aprovado pelo comitê de ética da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre sob o parecer 1320/11. Os participantes que apresentavam sintomas depressivos ou episódio depressivo foram informados de locais para buscar ajuda e aconselhados a relatar aos profissionais os problemas que foram abordados nas escalas.

Dados quantitativos foram descritos por média e desvio padrão, e dados qualitativos por frequência absoluta e percentual. A comparação entre as variáveis categóricas foi realizada pelo teste Qui-quadrado. Considerou-se um nível de significância p < 0,05. Para as variáveis contínuas foi utilizado teste T de Student para comparação entre as médias nos casos de distribuição normal, além da realização do teste ANOVA. Variáveis com valores de p < 0,20 na análise bivariada foram selecionadas e incluídas na análise multivariada para controlar possíveis confundidores. Para análise estatística foi utilizado o programa SPSS 19.

 

Resultados

A amostra foi constituída por homens (82%), com idade média de 30 anos (DP± 7,2), e por mulheres (18%), com idade média de 32 anos (DP ± 9,2), com profissão (76%), mais de 8 anos de estudo (59%), renda familiar baixa (62%), casados (60%), e poliusuários de drogas (78%). Aproximadamente 70% dos usuários estavam abstinentes, e 50% apresentavam episódio e sintomas depressivos de moderados a grave. Os sintomas depressivos ocorreram em 68% dos usuários de álcool e em 67% dos usuários de cocaína/ crack. São apresentados na tabela 1 os dados sociodemográficos e consumo de drogas dos usuários.

 

 

No momento da aplicação das escalas, 59% estavam abstinentes; destes, 77% se mantiveram abstinentes até 7 dias e 23% de 8 a 30 dias. Tiveram episódio depressivo atual 59% dos pacientes que não estavam abstinentes, 59,1% dos abstinentes nos últimos 7 dias, e 47% do grupo de 8 a 30 dias (p=0,062). Para o BDI, 65% dos usuários abstinentes até 1 semana apresentavam escores maiores de 19, enquanto 55% dos abstinentes de 8 dias até 30 dias também apresentavam sintomas com escores de de moderados a grave (>19). Utilizando-se escores de BDI foi detectado índices significantemente mais elevados de sintomas depressivos entre os que continuavam o consumo de substâncias (71%) quando comparados aos abstêmios (p=0,008).

Na tabela 2 são mostrados os possíveis fatores de risco para depressão associadas com o ponto de corte e as médias dos escores para sintomas depressivos. Foram estatisticamente significativas as variáveis sexo, ocupação, escolaridade, e dependência de álcool (p<0,05). A análise de regressão logística identificou que a baixa escolaridade manteve associação com sintomas depressivos mais graves (OR=1,4 IC 95%:1,1-2,2).

 

 

Na tabela 3 estão descritas as associações entre episódio depressivo atual e variáveis sociodemográficas, dependência de álcool e cocaína e ou crack. Verificou-se que cerca de 60% dos usuários, tanto de álcool como cocaína, apresentaram episódio depressivo atual. Na análise bruta, foram significativas as variáveis ser do sexo feminino, ser solteiro ou divorciado, não ter ocupação e baixa escolaridade. Após a regressão, estar casado foi fator de proteção (OR=0,6 IC 95%: 0,4-0,9). Ser mulher confirmou-se como fator de risco para episódio depressivo atual (OR=1,5 IC 95%:1,0- 2,4).

 

 

Homens e mulheres não apresentaram diferenças significativas no consumo mensal de cocaína e crack. Todavia, diferenças entre os sexos foram significativas para o uso no mês de álcool (p=0,044). O uso de crack, tanto no último mês, quanto na vida, mostrou-se relacionado à depressão. Ser poliusuário ou monousuário, não está associado a sintomas depressivos mais graves ou episódio depressivo. Foi realizado o teste ANOVA para comparar diferenças entre os grupos de padrões de consumo, e não se constatou diferença estatística significativa [F (4.833)= 1.382; p=0.238] (Tabela 4).

 

 

Discussão

Dentre os usuários de álcool e ou cocaína que telefonaram para o Ligue 132 quase 70% apresentaram sintomas depressivos de moderados a graves na última semana. Mais de 50% destes usuários estavam com episódio depressivo atual. Portanto, apresentaram índices mais elevados de sentimentos depressivos do que populações oriundas de outros serviços de saúde presenciais. Para comparação, em uma amostra com 1266 usuários de cocaína espanhóis, a prevalência de depressão no último ano foi de 22%, associados a baixo apoio social e instabilidade financeira (Lee, Jeong, Kwak & Park, 2010). Em outro estudo com 2329 pessoas diagnosticadas com depressão e ou ansiedade, 20% dos deprimidos eram dependentes de álcool, com associação para o sexo masculino e uso de múltiplas drogas (Boschloo et al., 2011).

Para usuários de álcool e cocaína que procuraram este serviço de telemedicina para dependência química, ser mulher, ter baixa escolaridade, e fazer o consumo de crack prevaleceram como fatores de risco à depressão. A baixa escolaridade está bem documentada na literatura como um fator de risco (Ramírez & Martínez, 2011). Hailemariam encontrou, ainda, como variáveis importantes a idade, estado civil, e o consumo de álcool, e destacou que a baixa escolaridade é considerada uma barreira para acessar os centros de saúde (Hailemariam, Tessema, Asefa, Tadesse & Tenkolu, 2012).

Outro fator de risco investigado foi o tipo de substância utilizada. O consumo de crack no mês, ou mesmo no ano, ocasionou diferenças significativas para episódio depressivo atual na amostra investigada. Em estudo transversal brasileiro com 30 monousuários de crack, 50% deles apresentavam sintomas depressivos de moderado a grave (Fabiano, Vieira, Cavalari & Brasil, 2008), o que corrobora com a alta prevalência da comorbidade vista nessa população. O estudo de Kessler e pesquisadores (2012) que envolveu usuários de crack e cocaína, demonstrou que os usuários de crack eram mais propensos a suicidar-se, o que sugere a necessidade de cuidados diferenciados aos usuários de crack quanto à depressão e suicídio. Além disso, também é preciso atenção ao uso de crack visto que em pacientes HIV positivos que utilizavam crack houve forte associação com sintomas depressivos e maior frequência de uso (Schönnesson, Williams, Atkinson & Timpson, 2009).

Nossa amostra feminina, apesar do menor abuso de cocaína e álcool, reinterou a conhecimento da relevância do sexo na depressão (Boing et al., 2012; Stegenga et al., 2012). As mulheres apresentam 10% mais depressão que os homens, inclusive entre usuários de drogas. Observa-se também, a alta prevalência de depressão em usuários em comparação com a população não psiquiátrica brasileira, que possui médias de 8,9% para homens e 21,9% em mulheres (Cunha, Bastos & Duca, 2012). Isso auxilia a compreender o quanto os sentimentos negativos e de menos valia e humor triste podem ser mais intensos com o abuso de drogas, como o álcool, e a cocaína, nas mulheres (Almeida- Filho et al., 1997).

Nesta amostra esses fatores parecem confirmar sua importância, pois ser casado representou um fator de proteção para sintomas e episódio depressivo. É sabido que os usuários de drogas têm dificuldades em manter relacionamentos, muitas vezes por dedicar seu tempo a recuperação dos efeitos ou na sua procura, além das mudanças de comportamento provocada pela substância (Hailemariam et al., 2012). Para a depressão, estar sem relacionamento afetivo também representa um fator de risco adicional. Por sua vez, o entorno empobrecido representa para a pessoa não ter com quem contar nos momentos difíceis, o que agrava os sintomas depressivos (Cai & Oderda, 2012).

Nossos dados corroboram a estreita relação encontrada na literatura sobre a comorbidade da depressão e de abuso de drogas, que acaba impondo-se como desafio ao profissional durante o tratamento. Muitas vezes a depressão atual desaparece conforme a desintoxicação do álcool, em outras vezes é um distúrbio independente, o que demanda maior acompanhamento e tratamento específico (Casas & Guardia,2002), reforçando a importância de triagens e avaliações da depressão durante o tratamento do dependente químico.

Dentre as limitações destaca-se a diferença em números de homens e mulheres que participaram do estudo, e a não avaliação do uso de tabaco nas associações com sintomas/episódio depressivos. O fato da grande maioria dos usuários fazerem um policonsumo de substâncias pode ser também um confundidor para identificar a substância mais relacionada com depressão. Além disso, há poucos estudos que separam usuários de crack dos de cocaína, o que dificulta comparações com outras pesquisas para considerar o crack com maior efeito depressor que a cocaína. Outro fator limitante é a não confirmação biológica da abstinência dos usuários de drogas. No entanto, devido à facilidade de encerrar o contato telefônico com o serviço, acreditamos que os dados sejam confiáveis. Por tratar-se de indivíduos em acompanhamento telefônico os dados podem não ser representativos para pessoas que possuam acompanhamento presencial para abstinência. Reforça-se também que é inadequado tirar conclusões sobre a temporalidade e causalidade da associação entre uso de drogas e depressão com base nos resultados do presente estudo.

 

Conclusão

Os fatores de risco para sentimentos depressivos encontrados, em usuários de cocaína e ou crack e álcool atendidos por telefone, foram a baixa escolaridade, ser mulher e estar solteiro ou separado. Ter relacionamento afetivo é um fator de proteção para pacientes comórbidos. O envolvimento e a provável compreensão pelos cônjuges do problema de dependência de álcool ou cocaína do parceiro parecem ter forte relação com sintomas depressivos menos graves.

Na análise do consumo entre as substâncias utilizadas e fator de risco para episódio e sintomas depressivos, os usuários de crack tiveram associação para episódio depressivo atual. Tratando-se de uma população composta na sua grande maioria de poliusuários, é complexo estabelecer um padrão de consumo associado a episódio e ou sintomas depressivos, mas torna-se relevante a discussão se o usuário de crack está mais exposto a comorbidades.

A metodologia da pesquisa sugere que a triagem por telefone pode ser realizada nos usuários de drogas para detecção de comorbidades e que estes indivíduos podem ter maior prevalência de sintomas depressivos e episódio depressivo que os pacientes atendidos presencialmente.

Destaca-se a importância de estudar e compreender os fatores de risco associados à comorbidade depressão e uso de drogas, e suas relações com as substâncias separadamente ou em grupos. Pois, dessa forma, há maiores chances da triagem por telefone servir de ferramenta para a agilidade e decisão do melhor tratamento nos dependentes químicos.

 

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Endereço para correspondência
E-mail: roger.santoscamargo@gmail.com

Recebido em outubro de 2016
Aprovado em março de 2017

 

 

1 Roger Camargo: Biólogo, Doutorando em Ciências da Saúde/Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.
2 Luciana Signor: Farmacêutica, doutoranda em Ciências da Saúde/Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre/RS.
3 Cassandra Borges Bortolon: Psicóloga, Doutora em Ciências da Saúde/Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre/RS.
4 Taís de Campos Moreira: Fonoaudióloga, Doutora em Ciências da Saúde/Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre/RS.
5 Maristela Ferigolo: Farmacêutica-bioquímica, Doutora em Ciências Médicas/Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
6 Helena Maria Tannhauser Barros: Médica, professora titular na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.

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