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Aletheia

versão impressa ISSN 1413-0394

Aletheia vol.53 no.1 Canoas jan./jun. 2020

 

ARTIGOS EMPÍRICOS - PROMOÇÃO DA SAÚDE

 

Mapeamento da rede de atenção à saúde bucal da região metropolitana de Porto Alegre

 

Mapping of the network of attention to the oral health of the metropolitan region of Porto Alegre

 

 

Rafaella Zappe Soares1,I; Cássia Oliveira Klein2,I; Kelly da Rocha Gomes Benelli 3,I; Maria Renita Burg Figueiredo4,I; Matheus Neves5,II

IUniversidade Luterana do Brasil
IIUniversidade Federal do Rio Grande do Sul

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O objetivo da pesquisa foi identificar a organização dos serviços de atenção à saúde bucal, na perspectiva das Redes de Atenção à Saúde, dos municípios da região metropolitana de Porto Alegre. Trata-se de uma pesquisa transversal de caráter descritivo. Foi realizado um censo entre as equipes de saúde bucal que participaram do segundo ciclo do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica. Neste estudo, foram inseridas 125 equipes de saúde bucal da região metropolitana de Porto Alegre. Foi observado desempenho regular no programa, por supremacia das equipes de saúde bucal. O município de Gravataí apresentou as melhores estimativas de desempenho entre os avaliados no estudo. Com a realização deste mapeamento pode-se concluir que a rede de atenção à saúde bucal da região metropolitana de Porto Alegre está fortalecida quanto aos princípios ordenadores da atenção básica.

Palavras-chave: Saúde bucal; avaliação em saúde; estratégia saúde da família.


ABSTRACT

The goal of the research was identify the organization of oral health care services, in the context of health care networks, in the municipalities of the metropolitan region of Porto Alegre. This is a cross-sectional survey of descriptive character. A census was held between oral health teams who participated in the second cycle of the program to improve access to and quality of basic care. Regular performance was observed in the program, for supremacy of the buccal health teams. The municipality of Gravataí presented the best estimates of performance among the evaluated in the study. With this mapping can be concluded that the oral health care network in the metropolitan region of Porto Alegre is strengthened as the principles of the basic attention authorising officers.

Keywords: Oral health; health evaluation; Family health strategy.


 

 

Introdução

Desde o início da década de 50, os modelos de atenção à saúde bucal no Brasil, eram improdutivos, predominantemente estruturados de forma verticalizada e de acesso restrito. Esse modelo era ineficaz na resolução das necessidades da população em geral, possuindo baixa capacidade de intervenção nas doenças bucais prevalentes, além do alto custo (Bulgareli et al., 2018).

O Sistema Único de Saúde (SUS) possui como meta principal diminuir as discrepâncias no atendimento e na necessidade de saúde básica da população. A Constituição de 88, especificamente no capítulo VIII da Ordem Social, na seção II da Saúde, designa que: "A saúde é direito de todos e dever do estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos, e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". Entretanto, naquele primeiro momento, o cuidado odontológico não estava contemplado na proposta, não sendo considerado essencial. A atenção à saúde bucal estava restrita às áreas estética e emergencial. A prevenção ou promoção não eram cogitadas, o que reproduziu uma resistência da população com os cuidados de higiene oral (Brasil, 1988; Contarato, 2011).

A incorporação oficial do cirurgião-dentista, na equipe de saúde da família, aconteceu somente em 2000, quando o Ministério da Saúde estabeleceu, pela Portaria nº. 1.444, um incentivo financeiro para a reorganização da atenção à saúde bucal prestada nos municípios por meio da Estratégia Saúde da Família. A portaria define que o trabalho da equipe de saúde bucal estará voltado para a reorganização do modelo de atenção e para a ampliação do acesso às ações de saúde, garantindo a atenção integral aos indivíduos e às famílias, mediante o estabelecimento de vínculo territorial (Ministério da Saúde, 2000).

Em 2003, após o levantamento epidemiológico de saúde bucal, o qual concluiu que quase 70% das crianças brasileiras de 12 anos e cerca de 90% dos adolescentes de 15 a 19 anos apresentaram, pelo menos, um dente permanente com experiência de cárie dentária, a trajetória da saúde bucal no país começou a ganhar fôlego e a mudar o percurso. Assim, em 2004, o Ministério da Saúde lançou as Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal (PNSB), designada como Brasil Sorridente o que se configurou como a primeira política específica de saúde bucal no país (Ministério da Saúde, 2004a; Ministério da Saúde, 2004b).

Essa política tem como pressupostos: ações de promoção e proteção da saúde; fluoretação das águas de abastecimento público; educação em saúde bucal; higiene bucal supervisionada; ações de aplicação tópica de flúor e ações de recuperação e reabilitação em saúde bucal. O impacto da PNSB pode ser visto na ampliação do acesso aos serviços de Saúde Bucal, principalmente de atenção primária, por meio da inserção de Equipes de Saúde Bucal (ESB) na Estratégia Saúde da Família (ESF) (Ministério da Saúde, 2004b).

Sete anos após o lançamento da PNSB, o Ministério da Saúde, por meio da Coordenação-Geral de Saúde Bucal, concluiu, em 2011, o quarto levantamento epidemiológico de âmbito nacional na área da Saúde Bucal, intitulado SB Brasil 2010 – Pesquisa Nacional de Saúde Bucal. Nele observamos uma diminuição no índice de cáries da população: 56% dos adolescentes brasileiros de 12 anos de idade tinham pelo menos um dente permanente cariado, enquanto no levantamento nacional de 2003 essa população apresentava 70% de prevalência de cárie (Ministério da Saúde, 2010).

Ademais, o Brasil Sorridente pressupõe a ampliação e qualificação da Atenção Especializada, através, principalmente, da implantação de Centros de Especialidades Odontológicas (CEO) e Laboratórios Regionais de Próteses Dentárias (LRPD). Os profissionais da atenção básica são os responsáveis pelo primeiro atendimento ao paciente, encaminhando-o ao Centro de Especialidades Odontológicas para os tratamentos mais complexos; e aos Laboratórios de Próteses, para realizar, no mínimo, os serviços de prótese dentária total e prótese parcial removível. O tratamento oferecido na atenção. secundária é a continuidade do trabalho realizado pela rede de atenção primária (Ministério da Saúde, 2004b).

A Rede de Atenção à Saúde Bucal possibilita a atenção contínua e integral em todos os níveis de atenção. A Atenção Primária à Saúde (APS) é a porta de entrada do usuário, por seus atributos e alta capacidade resolutiva, determinando também o trabalho de todos os outros níveis dos sistemas de saúde. O Ministério da Saúde reforça a APS e coloca o desafio de estabelecer a ESF como centro das Redes de Atenção à Saúde na ordenação e coordenação dos serviços de saúde, isto é, organizar e racionalizar o uso de todos os recursos, tanto básicos como especializados, direcionados para a promoção, manutenção e melhora da saúde (Portaria n° 2.488, 2011; Souza et al., 2017; Starfield, 2002). Neste contexto, o objetivo do presente estudo é identificar a organização dos serviços de atenção à saúde bucal, na perspectiva das Redes de Atenção à Saúde dos municípios da região metropolitana de Porto Alegre, a partir dos dados do 2° ciclo do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB).

 

Método

Desenho do estudo

Trata-se de um estudo transversal de caráter descritivo, sendo apoiado em análise da base de dados secundários do PMAQ-AB e de dados de domínio público da Coordenação de Saúde Bucal da Secretaria Estadual de Saúde. Foi realizado um censo entre as equipes de saúde bucal dos municípios da região metropolitana de Porto Alegre que participaram do segundo ciclo do referido programa, realizado no ano de 2013.

A coleta de dados foi realizada a partir do questionário do módulo V (Observação na Unidade de Saúde para Saúde Bucal) e módulo VI (Entrevista com Profissional da Equipe de Saúde Bucal e Verificação de Documentos na Unidade de Saúde) do segundo ciclo da avaliação externa do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica. As variáveis avaliadas foram: modalidade e profissionais da Equipe de Saúde Bucal; horários de atendimento; formação dos profissionais da Equipe de Saúde Bucal; vínculo; plano de carreira; educação permanente; planejamento da Equipe de Saúde Bucal; apoio matricial; territorialização e população de referência da Equipe de Saúde Bucal; organização da Agenda; rede de Atenção à Saúde Bucal; oferta e resolubilidade das ações da Equipe de Saúde Bucal e atenção às linhas de cuidado específicas.

As variáveis foram analisadas através do programa IBM SPSS Statistics 18, e apresentadas por meio de suas frequências absolutas e relativas. Além disso, através do Google Maps® realizamos o mapeamento da rede de atenção à saúde bucal da região metropolitana de Porto Alegre. Este é um serviço de pesquisa e visualização de mapas e imagens de satélite da Terra gratuito na web. O site mostra-se como uma importante ferramenta para interpretação e análise dinâmica do território e da organização da distribuição dos serviços de saúde dos municípios. O mapa foi vetorizado no programa CorelDrawX5 e salvo em formato jpeg.

Local do estudo

Considera-se Região Metropolitana o agrupamento de municípios limítrofes, determinado pela alta densidade demográfica e alta taxa de urbanização. A Metrópole constitui o centro, ao redor do qual há várias outras cidades sob sua influência. Contudo, administrativamente autônomas. As regiões metropolitanas se caracterizam pelas numerosas funções de interesse comum aos municípios contíguos, tornando essencial o planejamento integrado e ação conjunta dos entes públicos nela atuantes (Freitas, 2009).

A região metropolitana de Porto Alegre, escolhida de forma intencional para a realização deste estudo, possui 4 317 508 habitantes, sendo a quinta mais populosa do Brasil – superada apenas pelas regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília respectivamente. Ainda possui o quarto maior PIB do Brasil, e, atualmente, é a 82ª maior aglomeração urbana do mundo. A mesma reúne 34 municípios do Rio Grande do Sul, sendo eles: Alvorada, Araricá, Arroio dos Ratos, Cachoeirinha, Campo Bom, Canoas, Capela de Santana, Charqueadas, Dois Irmãos, Eldorado do Sul, Estância Velha, Esteio, Gravataí, Glorinha, Guaíba, Igrejinha, Ivoti, Montenegro, Nova Hartz, Nova Santa Rita, Novo Hamburgo, Parobé, Portão, Porto Alegre, Rolante, Santo Antônio da Patrulha, São Jerônimo, São Leopoldo, São Sebastião do Caí, Taquara, Triunfo, Sapiranga, Sapucaia do Sul e Viamão (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 2018).

Aspectos éticos

Nesta pesquisa foram utilizados apenas dados de domínio público de acesso irrestrito, compilados em sistemas de informação, e para os dados do usuário, o projeto do PMAQ teve aprovação pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul sob o parecer número: 21904.

 

Resultados

Atenção primária

Dos 34 municípios da região metropolitana de Porto Alegre 17 aderiram ao Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica. Sendo assim, 125 equipes de saúde bucal da região metropolitana participaram do segundo ciclo do PMAQ-AB. A tabela 1 apresenta o perfil dos profissionais das equipes de saúde bucal da região metropolitana de Porto Alegre: Dos cirurgiões-dentistas entrevistados 69,6 % possuem pós-graduação lato sensu em saúde da família ou saúde pública/coletiva. Quanto às características do processo de trabalho das equipes de saúde bucal 36,8% são servidores públicos estatutários e 81,6 % não possuem plano de carreira (Tabela 1).

O resultado da análise referente ao acesso está contido na tabela 2, do total de 125 equipes de saúde bucal que aderiram ao PMAQ, todas atendem no turno da manhã, e 121 equipes atendem no turno da tarde. As demandas das ESB contemplam tanto atendimento de urgência como consultas agendadas (96,8%), sendo, em média, atendidos 8 pacientes por turno de trabalho para 26,4% das equipes (Tabela 2). No que diz respeito à integralidade da atenção, 96% das equipes de saúde bucal promovem atividades de educação em saúde bucal no território; 41,6% registram os casos suspeitos/confirmados de câncer de boca, 97,6% praticam acompanhamento das gestantes; 99,2% atendem crianças de até 05 anos de idade; 89,6% realizam visitas domiciliares e 91,2% desempenham atividades na escola/creche (Tabela 2).

Em relação à coordenação das ações de saúde e à longitudinalidade do cuidado, 105 ESB têm disponíveis ofertas de consultas especializadas; apenas 9,6% das equipes de saúde bucal não recebem apoio de profissionais especialistas para auxiliar casos mais complexos. A garantia de agenda pela equipe de Saúde Bucal para a continuidade do tratamento do usuário é referida por 90,4 % profissionais respondentes (Tabela 3).

Sobre a certificação das Equipes de Saúde Bucal do segundo ciclo do PMAQ-AB, 81,6% das equipes apresentaram desempenho mediano ou abaixo da média, resultados julgados como muito acima da média, foram restringidos a 5,6% das equipes, com destaque para o município de Gravataí que apresentou maior número de desempenhos ótimos. A metrópole Porto Alegre compreende 44 ESB participantes do PMAQ-AB. Destas, 42 apresentaram resultado mediano ou abaixo da média, 1 ESB acima da média e 1 ESB obteve resultado insatisfatório, pois não cumpriu os compromissos assumidos na contratualização.

 

 

 

 

Atenção secundária

Os municípios de Alvorada (1), Cachoeirinha (1), Canoas (1), Gravataí (1), Porto Alegre (6) e Montenegro (1) contam com Centros de Especialidades Odontológicas em suas Redes de Atenção à Saúde. Desta forma, a Região Metropolitana de Porto Alegre dispõe de 11 Centros de Especialidades Odontológicas, sendo que apenas a capital e o município de Alvorada apresentam este na modalidade II. Os demais são classificados como modalidade I.

Quanto aos Laboratórios Regionais de Prótese Dentária, recurso também previsto na atenção secundária em saúde bucal, possuem estabelecimentos nos municípios de Alvorada, Ivoti, Montenegro e Porto Alegre. Totalizando, assim, 4 LRPD na Região Metropolitana.

O município de Alvorada dispõe das seguintes especialidades: endodontia, periodontia, estomatologia, cirurgia bucomaxilofacial (CTBMF) e atendimento a pacientes com necessidades especiais (PNE). No estabelecimento, além de realizar radiografias para a população, através da Rede de Atenção à Saúde Bucal, também são realizadas 20-50 próteses/mês devido ao LRPD credenciado.

No município de Cachoeirinha, são ofertadas as especialidades de endodontia, periodontia, CTBMF, atendimento à PNE e realização de radiografias. A especialidade de estomatologia é oferecida através do telessaúde. Nas cidades de Canoas e Gravataí as radiografias solicitadas pelos dentistas das UBS’s devem ser realizadas em clínicas privadas, pois os municípios não dispõem deste serviço em sua Rede de Atenção à Saúde. São oferecidas as especialidades de endodontia, periodontia, estomatologia, CTBMF, atendimento à PNE e odontopediatria, em ambas as cidades.

Porto Alegre contém 6 CEO’s, onde são realizadas as radiografias solicitadas pela atenção primária, ademais concede atendimentos especializados de endodontia, periodontia, estomatologia, CTBMF e atendimento à PNE. Na capital são confeccionas 51-80 próteses/mês, sendo a maior produção da região metropolitana.

Ivoti e Montenegro são municípios da região metropolitana, que não participaram do segundo ciclo do PMAQ-AB, contudo, apresentam LRPD com produção de próteses para a população. Apresentam uma confecção mensal de 20-50 próteses.

Montenegro também dispõe de CEO, igualmente com as especialidades de endodontia, estomatologia, periodontia, CTBMF e atendimento à PNE, além de atender a população adscrita do seu município tem convênio com os municípios de Harmonia, Maracás, Salvador do Sul, São José do Sul, São Sebastião do Caí e Tupandi onde os serviços especializados são oferecidos através de encaminhamentos.

O município de São Leopoldo não apresenta nenhum Centro de Especialidades Odontológicas registrado, contudo oferta as especialidades de endodontia, periodontia, CTBMF e atendimento à PNE junto à UBS Rio Branco, e quando necessário encaminha os pacientes ao CEO de Porto Alegre via regulação.

Quanto aos pacientes com necessidades especiais que necessitem realizar procedimentos em ambiente hospitalar, sob anestesia geral ou sedação, por não poderem ser submetidos à situação odontológica convencional, podem ser encaminhados para o município de Igrejinha-RS. Este possui convênio com o governo do Estado, através do acordo firmado a partir da Portaria SES Nº 575/2017 que institui remuneração para realização de procedimentos odontológicos em ambiente hospitalar. Sendo Igrejinha-RS a referência neste tipo de atendimento para os municípios da Macro Metropolitana. Os pacientes são encaminhados via sistema de regulação (SISREG) e cabe às Secretarias Municipais de Saúde o transporte dos usuários até a referência (Portaria SES Nº 575/2017, 2017).

 

 

Este acordo beneficia os municípios pertencentes à primeira, segunda e décima oitava coordenadorias regionais de saúde. Estando os municípios da região metropolitana localizados na primeira coordenadoria (Campo Bom, Canoas, Capela de Santana, Dois Irmãos, Estância Velha, Esteio, Igrejinha, Ivoti, Montenegro, Nova Hartz, Nova Santa Rita, Novo Hamburgo, Parobé, Portão, Rolante, São Leopoldo, São Sebastião do Caí, Sapiranga, Sapucaia do Sul, Taquara). E na segunda coordenadoria (Alvorada, Arroio dos, Ratos, Cachoeirinha, Charqueadas, Eldorado do Sul, Glorinha, Gravataí, Guaíba, Porto Alegre, São Jerônimo, Viamão). Todos estes podem usufruir deste convênio (Portaria SES Nº 575/2017, 2017).

 

Discussão

Neste estudo foi possível verificar que a maior parte dos profissionais da rede de atenção à saúde bucal são funcionários públicos diretos do governo e seus direitos e deveres estão previstos em lei. Esse resultado se assemelha ao constatado em um estudo que avaliou a gestão do trabalho na atenção básica em todo território brasileiro (Seidl, Vieira, Fausto, Lima & Gagno, 2014). Os demais profissionais são contratados por vínculos que não dão estabilidade no trabalho, com destaque para o emprego público CLT ou contrato CLT. Em relação à gestão de recursos humanos para atenção básica, um fator restringente é a não definição de plano de carreira específico para a área da saúde (Soratto et al., 2018). Analisando os dados do PMAQ-AB realizado pelas equipes de saúde bucal da região metropolitana, foi observado que menos de um quarto dos profissionais da rede de saúde bucal apresentam plano de carreira.

Considerando que a qualidade dos cuidados de saúde depende significativamente da satisfação dos funcionários, relacionado ao aumento do nível de eficiência e produtividade, é necessário maior investimento para melhoria destes aspectos. No Brasil, vários estudos já apontaram a desmotivação e rotatividade dos profissionais atuantes na ESF devido à ausência de plano de carreira. Nosso estudo corrobora com a situação atual brasileira, podendo-se afirmar que a incorporação dos Planos de Cargos, Carreiras e Salários (PCCS), em todos os municípios do Brasil, ainda é pequena. Embora o SUS seja o grande empregador dos trabalhadores de saúde, há inexistência, inadequação e/ou desatualização dos planos de carreiras na maioria das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde (Ministério da Saúde, 2006; Ney & Rodrigues, 2012; Seidl et al., 2014; Soratto et al., 2018).

Outro fator causador da rotatividade entre os profissionais da saúde é a ausência de formação complementar, bem como a oferta de educação permanente aos profissionais atuantes (Mendonça, Martins, Giovanella, & Escorel, 2010). Na rede de atenção da região metropolitana de Porto Alegre a maior parte dos profissionais admitiram serem especialistas em saúde da família e comunidade ou saúde pública/coletiva, sendo que a maioria optou por realizar especialização ao invés de residência multiprofissional em saúde, como base para a sua formação. O número de profissionais da rede de atenção à saúde bucal que realizaram residência multiprofissional em saúde é baixo, se refletirmos sobre a atual contribuição das residências para formação permanente e crítica no fortalecimento do SUS (Guerra & Costa, 2017).

No que diz respeito à modalidade das equipes, verificamos que as equipes de saúde bucal tipo I estão mais presentes nos municípios da região metropolitana. A lei 11.889 de 24 de dezembro de 2008 (Lei n. 11.889, 2008) expressa a importância do técnico em saúde bucal na indução de melhorias no processo de trabalho devido à sua maior qualificação e possibilidade de assumir procedimentos mais complexos, simultaneamente com o Cirurgião Dentista assim proporcionando maior resolubilidade das ações da equipe de saúde bucal. Posto isto, o processo de formação das equipes de saúde bucal deve ser ponderado, visto que para o avanço do cuidado integral em saúde bucal seria apropriado a implantação de mais equipes tipo II.

O acolhimento à demanda espontânea predomina na totalidade das equipes de saúde bucal da grande Porto Alegre. No Brasil, o maior percentual de equipes indicou que realizavam acolhimento, contudo a minoria utilizava algum protocolo (Seidl et al., 2014). A garantia do acesso à demanda espontânea é um dos principais desafios na organização da atenção em saúde bucal na Saúde da Família. A equipe de saúde deve desenvolver maneiras apropriadas de receber as diferentes formas com que a população busca ajuda nos serviços de saúde (Ministério da Saúde, 2008).

Considerando os resultados da última Pesquisa Nacional de Saúde Bucal (SB) (Ministério da Saúde, 2010), a porcentagem entre idosos, de 64-75 anos, que não necessitam de nenhum tipo de prótese dentária no Brasil, é de apenas 7,3%. Comparandose as cinco macrorregiões, a região Sul é a que apresenta a maior prevalência de uso de prótese dentária (86%) (Azevedo, Azevedo, Oliveira, Correa, & Demarco, 2017; Ministério da Saúde, 2010). A Inclusão da reabilitação protética na atenção básica é uma das diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal (Ministério da Saúde, 2004b). Entretanto, na região metropolitana a oferta de prótese dentária é muito baixa, por vezes não suprindo as necessidades da população. Observamos também baixa adesão dos municípios aos LRPD, sendo que apenas 11,7% dos municípios da região metropolitana tem credenciado este serviço na sua Rede de Atenção à Saúde Bucal.

Quase todas as equipes de saúde bucal proporcionam agenda de retorno para continuidade do tratamento. Baratieri e Marcon (2012) afirmam que, quando os vínculos entre população e profissionais são estabelecidos, o acompanhamento ao longo do tempo é favorecido, aumentando a resolutividade dos problemas de saúde e proporcionando serviço integral "As respostas obtidas na pergunta se'a ESB realiza tratamento concluído" 97 UBS responderam "sim, para todos os usuários", reforçando o princípio de longitudinalidade.

Existe número considerável de evidências comprovando que a rede de atenção à saúde, quando funciona corretamente, melhora a qualidade clínica, os resultados sanitários e a satisfação dos usuários, ao mesmo tempo em que reduz os custos dos sistemas de saúde. Sendo o PMAQ-AB um projeto que visa estimular o processo contínuo e progressivo de melhoramento dos padrões de acesso e de qualidade das equipes de saúde, é fundamento que ele seja entendido como base para a gestão da saúde, visando à integração dos conhecimentos produzidos pela academia com a qualificação do Sistema Único de Saúde.

Considerando a carência de estudos e pesquisas, avaliando o PMAQ, a originalidade desta pesquisa é uma de suas potencialidades. Com a realização deste estudo, foi possível conhecer e analisar a situação atual da Atenção Básica na região metropolitana, induzindo a problematização, avaliação e reflexão acima dos processos de trabalho em saúde bucal, além de impulsionar permanentemente a ação local para mudanças. As principais limitações deste estudo estão no seu delineamento transversal, pois não é possível esclarecer relações causais. Ademais, é um estudo descritivo, que avaliou apenas as equipes de saúde bucal que aderiram ao PMAQ, dificultando a ilustração de um panorama completo da região metropolitana.

Com a realização deste mapeamento pode-se concluir que rede de atenção à saúde bucal da região metropolitana de Porto Alegre está fortalecida quanto aos princípios ordenadores da atenção básica. A garantia de atendimento à demanda espontânea aos usuários e o alto índice de consultas de retorno para continuidade do tratamento, demostram o vínculo e a corresponsabilização das equipes com a saúde da população. Além disso, a oferta de atividades de educação em saúde bucal, no território, reforça a autonomia e capacidade de construção do cuidado à saúde. Em contrapartida, a atenção secundária à saúde bucal da região metropolitana se encontra limitada, por vezes não suprindo as necessidades da população.

Nesse sentido, o principal desafio de integrar a rede de atenção à saúde, pode ser potencializado pela realização de um mapeamento. A estratégia de mapear a rede de atenção à saúde traz uma visão geral da estrutura da atenção à saúde bucal e abre questões de como esta pode melhorar, bem como informa a população quanto à rede de cuidados ofertada na sua região.

 

Referências

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Endereço para correspondência
E-mail
: rafaellazappe@gmail.com

Recebido em: setembro de 2019
Aprovado em: dezembro de 2019

 

 

1 Rafaella Zappe Soares: Cirurgiã Dentista. Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Comunitária. Universidade Luterana do Brasil, Av. Farroupilha, 8001 - 92425-020, Canoas-RS, Brasil. Telefone: (55)99925- 9597.
2
Cássia Oliveira Klein: Cirurgiã Dentista. Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Comunitária. Universidade Luterana do Brasil, Av. Farroupilha, 8001 - 92425-020 Canoas-RS, Brasil. Telefone: (55) 99155- 8241.
3 Kelly da Rocha Gomes Benelli: Cirurgiã Dentista. Programa de Pós-Graduação Doutorado em odontologia com ênfase em Saúde Coletiva. Universidade Luterana do Brasil, Av. Farroupilha, 8001 - 92425-020, Canoas- RS, Brasil. Telefone: (51)99348-5218.
4 Maria Renita Burg Figueiredo: Enfermeira. Departamento de Enfermagem. Universidade Luterana do Brasil, Av. Farroupilha, 8001 - 92425-020, Canoas-RS, Brasil. Telefone: (51)99569-9434.
5
Matheus Neves: Cirurgião Dentista. Departamento de Odontologia Preventiva e Social. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Av. Paulo Gama, 110 - 90040-060 Porto Alegre-RS, Brasil. Telefone: (51)99625-0763.

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