SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.53 issue1The neonatal screening in the network of basic health care in the city of Canoas/RSHealth perception of a quilombola population located at an urban region author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Aletheia

Print version ISSN 1413-0394

Aletheia vol.53 no.1 Canoas Jan./June 2020

 

ARTIGOS EMPÍRICOS - PROMOÇÃO DA SAÚDE

 

Panorama do parto e nascimento do município de Canoas/RS no ano de 2017

 

Overview of the birth and birth of the city of Canoas / RS in 2017

 

 

Andressa dos Santos Schoen1 ; Miria Elisabete Bairros de Camargo2

Universidade Luterana do Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O parto e nascimento passarampor mudanças importantes ao longo do tempo, tornaram-se acontecimentos transformadores na vida de mulheres e bebês. O objetivo foi identificar o número de partos ocorridos por cesariana e parto normal, traçar o perfil das mulheres-mães, bem como conhecer as condições de nascimentos dos bebês, de mães residentes no município de Canoas/RS,em 2017. Trata-se de um estudo descritivo, comparativo, com abordagem quantitativa. Foram analisadas 3.143 Declarações de Nascidos Vivos (DNV) do ano de 2017, dessas, 1.227 (39,1%) foram de partos cesarianas e 1.916 (60,9%)departos vaginais. Predominou um perfil de mulheres com idade entre 19 e 30 anos, brancas, solteiras e com ensino médio completo nos dois tipos de partos. O conhecimento das características de uma população é de fundamental importância para planejareimplementarestratégias efetivas para melhoria das condições de saúde da população alvo.

Palavras-chave: Cesariana, Parto Normal, Gestação.


ABSTRACT

Childbirth and birth have undergone important changes over time, have become transformative events in the lives of women and babies. The objective was to identify the number of deliveries by caesarean section and normal delivery, to trace the profile of women-mothers, as well as to know the birth conditions of babies, mothers living in the city of Canoas / RS, in 2017. a descriptive, comparative study with a quantitative approach. A total of 3,143 Live Birth Statements (DNV) of the year 2017 were analyzed. Of these, 1,227 (39.1%) were Caesarean deliveries and 1,916 (60.9%) vaginal deliveries. There was a predominance of women between 19 and 30 years old, white, single and with complete high school in both types of deliveries. Knowledge of the characteristics of a population is of fundamental importance to plan and implement effective strategies to improve the health conditions of the target population.

Keywords: Caesarean section, Normal birth, Gestation.


 

 

Introdução

As Políticas Públicas de Saúde, promovidas pelo Ministério da Saúde, visam atender as necessidades dos diferentes segmentos da população, tais como: idosos, trabalhadores, adolescentes, indígenas, entre outros, sendo a Atenção à Saúde da Mulher e da Criança consideradas prioritárias. No ano de 2011, o Ministério da Saúde, com os objetivos de qualificar as Redes de Atenção Materno-Infantil em todo o país e reduzir a taxa, ainda elevada, de morbimortalidade materno-infantil no Brasil, institui a Rede Cegonha (Ministério da Saúde, 2018).

A Rede Cegonha consiste em uma rede de cuidados que busca assegurar à mulher o direito ao planejamento reprodutivo, à atenção humanizada no processo de cuidado à gravidez, do parto ao nascimento e puerpério.Os princípios da Rede Cegonha consistem na humanização do parto e do nascimento; organização dos serviços de saúde, enquanto rede de atenção à saúde; o acolhimento da gestante e do bebê, com classificação de risco em todos os pontos de atenção; vinculação da gestante à maternidade e a realização de exames de rotina com resultados em tempo oportuno (Ministério da Saúde, 2018; Ministério da Saúde, 2013).

O parto e nascimento vêm passando por mudanças importantes ao longo do tempo, são acontecimentos transformadores na vida de mulheres e bebês e, na maioria das vezes, não apresentam riscos. De eventos privados e assistidos por parteiras tradicionais, essas práticas ou rituais pouco a pouco foram transferidas para o ambiente hospitalar e centralizadas no profissional médico, difundindo-se um modelo tecnocrático de parir e nascer(Riscado,Jannotti, &Barbosa, 2016),incluindo a noção do risco e da patologia como regra, e não mais exceção. Assim, a mulher deixou de ser protagonista, pertencendo ao médico a condução do processo (Dulfe et al., 2017).

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o parto é entendido como um evento natural e o nascimento por via vaginal é considerado o melhor modelo quando levado em conta os desfechos de saúde materna e do bebê, sendo a intervenção mínima considerada o paradigma a ser seguido na assistência (Ministério da Saúde,2016b; Zanardo, Calderón, Nadal&Habigzang, 2017).

Nas últimas décadas, o Brasil vivenciou uma mudança no padrão de nascimento, as operações cesarianas tornaram-se o modo de nascer mais comum. Em 2017, foram realizados 2,7 milhões de partos no Brasil, somente nos serviços de saúde públicos, destes, 58,1% foram partos vaginais e 41,5% de cesarianas. O Rio Grande do Sul tem uma alta taxa de cesarianas, que inclusive passou de 61% em 2015 para 62%, no ano de 2016. Estudos recentes da OMS sugerem que taxas populacionais de operação cesariana, superiores a 10%, não contribuem para a redução da mortalidade materna, perinatal ou neonatal. No entanto, considerando as características da nossa população, a taxa de referência ajustada para a população brasileira, gerada a partir do instrumento desenvolvido para este fim, pela OMS, estaria entre 25% e 30%. A OMS lançou um manual com recomendações para médicos e enfermeiros, visando diminuir os altos índices de cesarianas no país e qualificando a atenção ao parto humanizado, neste ano (Ministério da Saúde, 2017; World Health Organization[WHO], 2018).

De acordo com a UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), o parto deve respeitar as expectativas da mulher e levar em conta às condições de saúde dela e do bebê, seja o parto vaginal ou cirúrgico. O conhecimento dos seus direitos e a realização de um pré-natal de qualidade é fundamental para favorecer a humanização da atenção ao parto e do nascimento(Fundo das Nações Unidas para a Infância[UNICEF], 2017).

O parto vaginal é um processo que respeita o momento certo de nascimento da criança e acontece da forma mais natural possível. Tem menor índice de bebês prematuros e alterações respiratórias em recém-nascidos. A recuperação da mulher é mais rápida e tem menores chances de hemorragias, infecções e dor após o parto (Brasil, 2017). O parto vaginal deve ser sempre a primeira opção por trazer benefícios para a mulher e o bebê (Ministério da Saúde, 2016a;UNICEF, 2017).

A cesariana é uma intervenção cirúrgica realizada para retirar o feto quando há algum fator que coloca em risco a saúde da mulher, do bebê ou de ambos. Deve-se ressaltar que, quando realizada por indicações médicas, a operação cesariana é umacirurgia segura e essencial para a saúde materna e infantil, porém, quando realizada sem uma justificativa, pode agregar riscos desnecessários sem que haja um benefício claro. Após uma cesariana, as mães ficam sujeitas a complicações como: perda de maior volume de sangue, infecções puerperais e acidentes anestésicos. Para os bebês, os riscos relacionam-se a distúrbios respiratórios, icterícia fisiológica, prematuridade iatrogênica, hipoglicemia e anóxia(Agência Nacional de Saúde Suplementar [ANS], 2016; Rattner& Moura, 2016).

Considerando a importância de garantir os direitos de mulheres e crianças de nascer no momento certo e de forma humanizada, conhecer o panorama de parto e nascimento, torna-se útil para elaboração de políticas públicas na saúde materno-infantil e para sensibilização dos profissionais envolvidos a fim de evitar cesarianas desnecessárias.

Segundo dados do Sistema de Nascidos Vivos de Canoas/RS, no ano de 2017 nasceram 3.284 crianças no Hospital Universitário de Canoas, dentre essas, 3.143 foram de mães residentes no próprio município.

Neste cenário, esta pesquisa tem como objetivo conhecer o número de partos ocorridos por cesariana e parto vaginal, bem como conhecer quais são as condições de nascimentos dos bebês de mães residentes no município de Canoas/RS, no ano de 2017.

 

Metodologia

Trata-se de um estudo descritivo, comparativo, com abordagem quantitativa.A amostra foi constituída de 3.143 formulários referente às Declarações de Nascidos Vivos (DNVs) do ano de 2017, contemplando todos os partos de mulheres que residem no município de Canoas/RS e tiveram seus bebês no ano citado. A coleta de dados considera as variáveis das DNVs de janeiro de 2017 a dezembro de 2017. O período da coleta foi de março a maio de 2018.

Foi realizado um estudo comparativo das condições de nascimento dos bebês, em cada tipo de parto e também do perfil das mulheres. Os resultados das variáveis nominais foram expressos através de análises de frequência e o resultado das variáveis contínuas através de média ± desvio padrão.

Essa pesquisa foi conduzida dentro dos padrões éticos exigidos pela Resolução nº 466/12, e utilizado o Termo de Compromisso de Utilização de Dados (TCUD) para coleta de dados dos protocolos de DNVs. O projeto passou pela aprovação do Núcleo Municipal de Educação em Saúde de Coletiva (NUMESC) e pelo Comitê de Ética da Universidade Luterana do Brasil com o número CAEE 83315817.6.0000.5349, parecer nº 2.523.643.

 

Resultados

Neste tópico descrevem-se as condições de nascimento e tipos de parto ocorridos em Canoas, no ano de 2017.Um dado que chama muito a atenção após as análises das DNVs, é o grande número de cesarianas que ocorreram no município, perfazendo (39,1%) do total de partos realizados no ano, conforme a Figura 1, ultrapassando significativamente o percentual de cesarianas recomendados pela OMS.

 

 

Na Figura 2 podemos verificar que das 1.227 cesarianas, 559 (45,5%) foram realizadas antes mesmo da mulher entrar em trabalho de parto.

 

 

Pode-se verificar na Tabela 1 que um pouco mais da metade das mulheres, que tiveram filho por parto vaginal e cesariana,possuiensino médio completo, com um percentual de (53,5%) e (57,6%), respectivamente. Dentre as que realizaram cesariana, (55,1%) tinham entre 19 e 30 anos de idade; (85,6%) eram brancas e (75,1%) solteiras. Quando analisamos o perfil das mulheres que tiveram seus filhos por parto vaginal, (62,9%) tinham entre 19 e 30 anos, (84,1%) eram brancas e (81,3%) solteiras.

 

 

Na Figura3 está descrito a distribuição segundo a residência das mulheres no município de Canoas/RS. Podemos observar que as maiores frequências das mulheres analisadas são provenientes do bairro Mathias Velho (22%) e Guajuviras (17,9%).

 

 

Na Figura 4 está descrito a distribuição segundo a área de ocupação das mulheres, a principal ocupação observada foi a de dona de casa com (61,2%) das pacientes.

 

 

Podemos observar uma distribuição bem uniforme em relação ao percentual de nascimentos em cada mês, sendo que o mês de março apresentou um número um pouco mais elevado de partos, conforme a Figura 5.

 

 

Na Tabela 2observamos que houve predomínio das mulheres primíparas nos dois tipos de partos;(67,6%) das mulheres que tiveram filhos por parto vaginal realizaram sete ou mais consultas de pré-natal, assim como (72,4%) das que realizaram cesariana. Quando analisamos a variável número de partos vaginais anteriores, (45,5%) das mulheres que tiveram filhos por parto vaginal em 2017 não tinham passado por este procedimento antes, bem como (74,4%) daquelas que realizaram cesariana no ano citado. Em relação ao número de cesarianas anteriores, (90,2%) das mulheres que tiveram parto vaginal em 2017 não tinham realizado esta cirurgia anteriormente, assim como (56,5%) das que fizeram cesariana neste mesmo ano.Quanto ao aborto, (2,7%) e(4,8%) das mulheres que tiveram partos vaginais e cesarianas, respectivamente, tiveram de dois a cinco abortos prévios.

 

 

Na Tabela 3, podemos observar que em relação à variável peso dos bebês houve predomínio de nascimentos com peso considerado normal para idade gestacional (IG) nos dois tipos de partos. Quando analisamos a variável tipo de gestação, observa-se que (99,5%) delas foram do tipo única nas mulheres que tiveram filhos por parto vaginalassim como em (92,2%) das que realizaram cesariana. Em relação às semanas de gestação em que os partos ocorreram, tivemos (61%) de bebês a termo nascidos por parto vaginal e (51,6%) crianças nascidas por cesariana também a termo, porém (30,3%) dos partos porcesarianas foram realizados antes das 39 semanas de gestação. Somente 10 (0,5%) casos de parto vaginal ocorreram no domicílio. Em relação à malformação, 07 bebês (0,6%) que nasceram por cesariana, apresentaram esta alteração.

 

 

Na Tabela 4 está descrita a associação entre o tipo de parto e a classificação do "apgar" do RN. Quando observado o "apgar" do primeiro minuto de vida do bebê, (86,4%) dos que nasceram de parto vaginal tiveram "apgar" 8 a 10, e (81,6%) dos nascidos por cesariana tiveram este mesmo "apgar". Em relação ao quinto minuto de vida, a maioria dos bebês que nasceu tanto por parto vaginal (97,55%), quanto por cesariana (98,21%), apresentaram ótimas condições de nascimento("apgar"8 a 10).

 

 

Discussão

Para alguns autores, a ideia é que uma cesariana eletiva permite à mulher conciliar sua vida profissional à conclusão da sua gravidez, e ao obstetra, organizar suas atividades profissionais e pessoais (Freitas & Fernandes, 2016). Altas taxas de cesarianas estão associadas com maior risco de morbimortalidade materna e perinatal, além da elevação de gastos desnecessários e desvio de recursos humanos, materiais e financeiros (Santana, Lahm& Santos, 2015).Uma pesquisa realizada no Paraná apontou que mais de (80%) das gestantes afirmaram que o parto normal é o melhor para ela e o bebê. O restante, disse que o melhor seria a cesariana, pois vivenciou essa situação anteriormente. Vale ressaltar que o parto é um evento que acompanha todo o processo de gestação e puerpério, umavez que já é antecipado na gravidez sob a forma de expectativas para a gestante e será sempre lembrado após a sua conclusão na forma de lembranças e sentimentos que acompanham a mãe (Rattner& Moura, 2016).

Do ponto de vista clínico, a realização de uma cesariana se justifica em determinadas situações de risco, tais como: eclampsia, placenta prévia, prolapso de cordão, entre outras. Ainda assim, recomenda-se que aconteça o mais próximo possível do desencadeamento do trabalho de parto (Freitas & Fernandes, 2016). Segundo a pesquisa Nascer no Brasil, (35%) dos bebês analisados nasceram entre a 37ª e a 38ª semanas de gestação. Embora não consideradas prematuras, estudos demonstram que essas crianças são mais frequentemente internadas em UTI neonatal, apresentam problemas respiratórios, maior risco de mortalidade e déficit de crescimento (Barros etal., 2012; Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, 2012). O elevado número de nascimentos entre a 37ª e a 38ª semana de gestação está associado ao alto número de cesarianas realizadas antes do trabalho de parto espontâneo, particularmente no setor privado(UNICEF, 2017).

Resultados muito semelhantes aos da Tabela 1 foram encontrados na pesquisa Nascer no Brasil, a qual aponta que a média das idades das mulheres-mães era de 25,7 anos e (39%) delas possuíam ensino médio completo(Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, 2012; Oliveiraet al.,2014). A relação entre o nível de escolaridade e a gravidez pode interferir na fecundidade da mulher, no conhecimento sobre o uso de métodos contraceptivos, importância das consultas de pré-natal, e na hora do parto, pois sem estudo ou instrução a mulher torna-se mais vulnerável e propensa a sofrer influências na escolha da via de parto (Kuzma, Reiter, Carrocini, Morelli, &Venzon, 2016). Em relação à variável raça/cor, os resultados deste estudo são semelhantes aos de uma pesquisa realizada em Santa Catarina, onde (83%) das mulheres eram brancas, (5,5%) delas eram pretas e (11,5%) eram pardas. Quanto ao estado civil, o estudo realizado em Santa Catarina mostra resultados diferentes da presente pesquisa, sendo (88%) das puérperas vivendo em união estável e (11%) delas solteiras (Kuzmaet al., 2016; Oliveira et al., 2014).

Os bairros de Canoas/RS onde ocorrerammaior número de nascimentos, no ano de 2017, foram Mathias Velho e Guajuviras, locais que, segundo o relatório de pesquisa que compõem o Diagnóstico Socioterritorial do Município de Canoas/RS, podem ser considerados com menor Índice de Desenvolvimento Humano Municipal e também são alguns dos bairros onde há menor concentração de renda por pessoa(Instituto HumanitasUnisinos, 2018) Estudos mostram que quanto mais pobre é a mãe, mais filhos ela tem. Muitas mulheres alegam que conhecem alguns métodos contraceptivos, porém não fazem o devido uso. Isso nos mostra que há uma falha nos programas de planejamento familiar e também na área da educação, pois, não há um acompanhamento eficaz das mulheres em situações de vulnerabilidade e em idade fértil, também faltam ações por parte da Atenção Básica que enfatizem a importância do uso de métodos anticoncepcionais e a forma gratuita com que muitos são ofertados (Orsiet al., 2014).

Os resultados apresentados na Figura 4, corroboram com um estudo realizado em Minas Gerais no qual (69,1%) das mulheres entrevistadas declararam serem donas de casa, sem atividade remunerada, o que contribui para uma baixa renda familiar e maior vulnerabilidade sociocultural e econômica.Analisar esse aspecto é importante, visto que representa um indicador de saúde, já que menores condições econômicas remetem a uma maior restrição de acesso aos serviços de saúde e recursos de prevenção. Assim, a rendaé um fator que poderá influenciar no planejamento da gestação, bem como na realização do pré-natal (Costa et al., 2013).

Em um estudo realizado sobre as influências do meio ambiente sobre o parto, os resultados foram os mesmos encontrados na presente pesquisa, apontando maiores números de nascimentos no mês de março. Esse resultado é uma medida importante para o planejamento da gestão de um centro obstétrico, por exemplo, quando se pode ter uma noção de quantitativos de leitos, materiais e recursos humanos que deverão estar disponíveis para atender uma maior demanda em determinado mês ou período do ano (Kuzmaet al., 2016; Ochiai, 2018).

Estudos realizados no interior do Rio Grande do Sul apontam que (59%) das mulheres que ganharam seus filhos por cesariana já haviam passado por este procedimento cirúrgico pelo menos uma vez (Renner et al., 2015), dados diferentes dos encontrados na presente pesquisa. Conforme alguns autores assinalam, "a experiência anteriormente vivida pelas mães sobre o momento do parto e o tipo de parto é decisiva na escolha pela via de nascimento em uma futura gravidez". Porém, sabemos que nem sempre o desejo de realizar o parto vaginal é atendido, pois o uso abusivo decesarianas desnecessárias tem favorecido a desumanização da assistência ao parto(Leguizamon, Steffani, &Bonamigo, 2013; Minuzzi& Rezende, 2013).

Em relação à cobertura pré-natal, o presente estudo apontou que a média de consultas foi maior do que seis, que é o preconizado pelo Ministério da Saúde, em ambos os tipos de parto. Sabemos que a assistência adequada à gestação e ao parto é essencial para reduzir os índices de morbimortalidade materno-infantil. Estima-se que um quarto dos óbitos infantis e quase totalidade dos óbitos maternos, decorram da prestação de cuidados inadequados desde o início da gestação até o pós-parto imediato(Souza, 2013; Xavier, Jannotti, Silva& Martins, 2013).

Em relação ao aborto, este estudo revelou que um úmero considerável de mulheres que pariram no ano de 2017, já haviam tido cerca de dois a cinco abortos anteriormente. Relatório publicado no periódico científico Lancet, diz que 56 milhões de abortos induzidos ocorrem anualmente. Um alto crescimento de aborto foi detectado principalmente nos países em desenvolvimento, em parte devido ao aumento da população e o desejo de se ter uma família menor. Cerca de (15%) das gestações entre a 4ª e a 20ª semana de evolução, terminam espontaneamente (abortamento clínico). Se levarmos em conta o momento da fertilização, a incidência de abortamento (até 18 semanas de desenvolvimento ou 20 semanas gestacionais) os números podem chegar a (62%)(Rattner& Moura, 2016).

Pesquisas apontam que cesarianas eletivas antes de 39 semanas aumentam o risco de morbidade neonatal e de desfechos negativos de longo prazo, como resultados mais baixos em testes de leitura e de matemática quando comparados com crianças nascidas após 39 semanas de gestação(Noble, Fifer, Rauh, Nomura, & Andrews, 2012; Universidade Estadual de Campinas [UNICAMP], 2017). Em relação aos resultados sobre prematuridade, a pesquisa realizada porCloherty, Eichenwald, Hansen e Stark (2016) constataram que a prematuridade ocorreu em (9,4%) dos nascimentos por eles estudados;resultado diferentedo observado no presente estudo que foi de (25,5%). Somente, em 2014, 332.992 meninos e meninas (11,2% do total) nasceram antes da 37ª semana de gestação no país (Santos et al., 2017). Os números preocupam, uma vez que as complicações relacionadas com a prematuridade são a primeira causa de mortes neonatais e infantis em países de renda alta e média, incluindo o Brasil (Correio, R., Correio, L., &Correio, M., 2016; UNICEF, 2017).

Os achados do presente estudo também confirmam a hegemonia dos partos hospitalares. Sobre essa questão, menciona-se que "só a partir do século XX, a medicina transformou o parto, que é um evento fisiológico, em um evento patológico, que necessita na maioria das vezes, de tratamento medicamentoso e cirúrgico". Alguns autores que estudaram a vivência de mulheres que escolheram realizar parto domiciliar assistido por enfermeira obstetra, evidenciaram que o vínculo entre o profissional de saúde e sua cliente, bem como o respeito por suas escolhas, expectativas e cultura proporcionaram segurança e confiabilidade a essas mulheres (Pimenta, Cunha, Barbosa, Silva& Gomes, 2013).

Em relação às crianças que nasceram com malformação,pode-se observar que as populações estão expostas aos riscos de conceberem fetos malformados, no entanto a probabilidade de sua ocorrência irá variar de acordo com fatores como doenças pré-existentes,condições socioeconômicas e ambientais das mulheres grávidas, entre outros. Em diversos países do mundo, inclusive no Brasil, os programas de saúde pública referentes às ações preventivas de malformações congênitas estão relacionados à fortificação de grãos e farináceos como o ácido fólico para a redução da ocorrência primária. Tais mudanças instituídas no Brasil foram recomendações sugeridas pela OMS e Organização Pan-americana de Saúde, com o intuito de reduzir o risco de patologias que comprometem o sistema nervoso central (Fontoura & Cardoso, 2014).

A relação do tipo de parto com a vitalidade do recém-nascido, avaliado com o índice de "apgar", não obteve resultados com diferenças marcantes devido ao fato dos recémnascidos terem obtido um índice de "apgar" considerado ótimo tanto no nascimento por parto vaginal, quanto por cesariana.O índice de "apgar" corresponde a uma avaliação clínica do recém-nascido (RN), o qual se atribui valores abaixo de 07 como sinais de alerta para atenção especial. As condições de nascimento são determinantes para a saúde de uma criança, e essas condições podem ser fortemente influenciadas por características maternas, tais como: idade, tempo de gestação, tipo de parto e pré-natal (Munizet al., 2016).

 

Considerações finais

No presente estudo predominou o perfil de mulheres brancas, solteiras, com idades entre 19 e 30 anos com ensino médio completo. Encontramos também um grande percentual de cesarianas realizadas no ano de 2017, mostrando que estamos em uma época onde há uma epidemia de cesarianas, procedimento que ocorre, muitas vezes, desnecessariamente.

Em relação às condições de nascimentos dos bebês, dos que nasceram por parto vaginal, apenas um apresentou malformação congênita e quase a totalidade deles nasceram com peso adequado para IG e a termo, apresentando um "apgar" entre 08 e 10 no primeiro e quinto minuto de vida. Em relação às crianças que nasceram por cesariana, a maioria delas apresentou peso normal para IG, mais de 17% nasceram prematuros e das 1227 crianças, 07 delas apresentaram malformação congênita. Quanto ao "apgar", a maioria delas apresentaram notas entre 8 e 10 no primeiro e quinto minuto de vida.

O conhecimento das características de uma população é de fundamental importância para o planejamento e a implementação de estratégias efetivas para melhoria das condições de saúde, pois permite ao profissional estabelecer com cada mulher um vínculo e perceber suas necessidades e capacidade de lidar com o processo do nascimento.

É imprescindível que os profissionais incumbidos do preenchimento das DNVs estejam devidamente capacitados e que deem a devida atenção para o correto preenchimento dos dados, visto que neste estudo podemos observar que muitas informações foram ignoradas na hora do completar os dados das DNVs.

Se faz necessária a realização de estudos para se conhecer os desejos dasmulheres em relação à via de parto, e procurar saber o porquê de taxas tão altas de cesarianas no município. Diante das inúmeras variáveis que interferem no processo saúde-doença, o entendimento das características de uma população a ser estudada propicia um cuidado integral e eficaz em seu atendimento, refletindo na qualidade e expectativa de vida da população.

 

Referências

Agência Nacional de Saúde Suplementar.(2016).Estímulo ao parto normal. Rio de Janeiro: ANS. Recuperado em: 10 de setembro de 2018 <http://www.ans.gov.br/images/stories/prestadores/partonormal/apresentacao-parto-rn368-julho-2015.pdf>         [ Links ].

Barros, F. C., Rossello, J. L. D., Matijasevich, A., Dumith, S. C., Barros, A. J. D., Santos, I. S., Mota,D., &Victora, C. G. (2012). Gestational age at birth and morbidity, mortality, and growth in the first 4 years of life: findings from three birth cohorts in Southern Brazil. BMC Pediatrics,12(169), 1-5.         [ Links ]

Cloherty, J. P., Eichenwald, E. C., Hansen, A. R.,& Stark, A. R. (2016).Manual of Neonatal Care.(8ª ed.) Philadelphia (USA): Lippincott Williams & Wilkins.         [ Links ]

Correio, R. A. S., Correio, L. F., &Correio, M. A. B. (2016). Perfil epidemiológico dos nascidos vivos no município de Chapecó-SC. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação e Inovação emSaúde,10(2), 1-16.         [ Links ]

Costa, N. S., Parreira, B. D. M., Machado, M. O. F., Mattos, J. G. S., Elias, T. C., &Silva, S. R. (2013). Cuidados com recém-nascido realizados por puérperas em um alojamento conjunto. Revista Ciência Cuidado e Saúde, 12(4), 633-639.         [ Links ]

Dulfe, P. A. M., Barcellos, J. G., Alves, V. H., Rodrigues, D. P., Pereira, A. V., &Silva, A. G. (2017). A assistência obstétrica no parto e parto através da percepção das mulheres. Revista de Enfermagem da Universidade Federal de Pernambuco, 11(12), 5402-5416.         [ Links ]

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca. (2012). Fundação Oswaldo Cruz. Nascer no Brasil:sumário executivo temático da pesquisa. Rio de Janeiro: ENSP/ Fiocruz. Recuperado em: 10 de setembro de 2018 <http://www.ensp.fiocruz.br/portalensp/informe/ site/arquivos/anexos/nascerweb.pdf>         [ Links ].

Fontoura, F. C., & Cardoso, M. V. L. M. L. (2014). Associação das malformações congênitas com variáveis neonatais e maternas em unidades neonatais numa cidade do nordeste brasileiro. Revista Texto e Contexto Enfermagem, 23(4), 907-914.         [ Links ]

Freitas, P. F., & Fernandes, T. M. B. (2016). Associação entre fatores institucionais, perfil da assistência ao parto e as taxas de cesariana em Santa Catarina. Revista Brasileira de Epidemiologia, 19(3), 525-538.         [ Links ]

Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). (2017).Quem espera, espera. New York: UNICEF. Recuperado em: 10 de setembro de 2018 <https://www.unicef.org/brazil/pt/quem_espera_espera.pdf>         [ Links ].

Instituto HumanitasUnisinos. (2018). Diagnóstico socioterritorial do município de Canoas/RS. São Leopoldo: Unisinos. Recuperado em: 10 de setembro de 2018 <http://www.ihu.unisinos.br/observasinos/images/outras/Municipios/Canoas/VERSAOSINTETICA-FINAL.pdf>         [ Links ].

Kuzma, G. S. P., Reiter, M. G. R., Carrocini, M. M. S., Morelli, S. R., &Venzon, P. P. (2016). Perfil de puérperas assistidas em alojamento conjunto: estudo comparativo entre os serviços público e privado. Revista Associação Médica do Rio Grande do Sul, 60(2), 87-91.         [ Links ]

Leguizamon, T. Jr., Steffani, J. A., &Bonamigo, E. L. (2013). Escolha da via de parto: expectativa de gestantes e obstetras. Revista Bioética, 21(3), 509-517.         [ Links ]

Ministério da Saúde. (2013). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Atenção ao pré-natal de baixo risco.Brasília, DF: Ministério da Saúde.         [ Links ] Ministério da Saúde. (2016a). Protocolos da atenção básica:saúde das mulheres. Brasília, DF: Ministério da Saúde.         [ Links ]

Ministério da Saúde. (2016b). Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Diretrizes de atenção à gestante:a operação cesariana. Protocolo nº 179. Brasília, DF: Ministério da Saúde.         [ Links ]

Ministério da Saúde. (2017). Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde. Diretrizes nacionais de assistência ao parto normal:versão resumida. Brasília, DF: Ministério da Saúde.         [ Links ]

Ministério da Saúde. (2018). Departamento de Atenção Básica. As Redes de Atenção à Saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde. Recuperado em: 10 de setembro de 2018 <http://dab.saude.gov.br/portaldab/smp_ras.php>         [ Links ].

Minuzzi, A., &Rezende, C. L. (2013).Fatores de influência na escolha da via de parto: uma revisão de literatura. Revista Uningá Review, 14(1), 37-48.         [ Links ]

Muniz, E. B., Vasconcelos, B. B., Pereira, N. A., Frota, R. G., Moraes, C. E. B., &Oliveira, M. A. S. (2016). Análise do boletim de Apgar em dados do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos registrados em um hospital do interior do estado do Ceará, Brasil. RevistaMedicina eSaúde, 5(2), 182-91.         [ Links ]

Noble, K. G., Fifer, W. P., Rauh, V. A., Nomura, Y., &Andrews, H. F. (2012). Academic achievement varies with gestational age among children born at term. Pediatrics,130(2), 257-264.         [ Links ]

Ochiai, A. M. (2018).Influências do meio ambiente no parto. Tese de doutorado, Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.         [ Links ]

Oliveira, M. A. M., Sousa, W. P. S., Pimentel, J. D. O., Santos, K. S. L., Azevedo, G. D.,& Maia, E. M. C. (2014). Gestantes tardias de baixa renda: dados sociodemográficos, gestacionais e bem-estar subjetivo. Revista Psicologia: Teoria ePrática, 16(3), 69-82.         [ Links ]

Orsi, E.,Brüggemann, O. M., Diniz, C. S. G., Aguiar, J. M., Gusman, C. R., Torres, J. A., Tuesta, A. A., Rattner,D., &Domingues, R. M. S. M. (2014). Desigualdades sociais e satisfação das mulheres com o atendimento ao parto no Brasil: estudo nacional de base hospitalar. Cadernos de Saúde Pública, 30(1), S154-S168.         [ Links ]

Pimenta, D. G., Cunha, M. A., Barbosa, T. L. A., Silva, C. S. O.,&Gomes, L. M. X. (2013). O parto realizado por parteiras: uma revisão integrativa. EnfermeríaGlobal,30, 494-505.         [ Links ]

Rattner, D., &Moura, E. C. (2016).Nascimentos no Brasil: associação do tipo de parto com variáveis temporais e sociodemográficas. Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil, 16(1), 39-47.         [ Links ]

Renner, F. W., Garcia, E. L., Renner, J. D. P., Costa, B. P., Figueira, F. P., Ebert, J. P., Nascimento, L. S., Ferrari, L., Grossi, M., &França, V. T. (2015). Perfil epidemiológico das puérperas e dos recém-nascidos atendidos na maternidade de um hospital de referência do interior do Rio Grande do Sul no primeiro semestre de 2014. Boletim Científico de Pediatria, 4(2), 27-32.         [ Links ]

Riscado, L. C., Jannotti, C. B., &Barbosa, R. H. S. (2016). A decisão pela via de parto no Brasil: temas e tendências na produção da saúde coletiva. Revista Texto e Contexto Enfermagem, 25(1), 1-10.         [ Links ]

Santana, F. A., Lahm, J. V., &Santos, R. P. (2015). Fatores que influenciam a gestante na escolha do tipo de parto. Revista da Faculdade de Ciências Médicas de Sorocaba. 17(3), 123-127.         [ Links ]

Santos, G. M., Silva, A. J. A., Costa, R. F., Silva, L. A., Sousa, C. R. O.,&Barreto, M. T. S. (2017). Análise do perfil das puérperas e dos nascidos vivos em um estado do nordeste brasileiro. RevistaUningáReview, 31(1), 12-18.         [ Links ]

Souza, J. P. (2013). Mortalidade materna e desenvolvimento: a transição obstétrica no Brasil. RevistaBrasileiradeGinecologia e Obstetrícia, 35(12), 533-535.         [ Links ]

Universidade Estadual de Campinas. (2017). Núcleo de Estudos de Políticas Públicas. Pré-natal e puerpério: manual técnico. Campinas: UNICAMP. Recuperado em: 10 de setembro de 2018 <http://www.saude.sp.gov.br/resources/ses/perfil/gestor/ homepage/programa-de-fortalecimento-da-gestao-da-saude-no-estado-de-sao-paulo/ consultas-publicas-manuais-da-linha-de-cuidado-da-gestante-parturiente-e-puerpera/ manual_de_consulta_rapida.pdf>         [ Links ].

World Health Organization.(2018). Recommendations intrapartum care for a positive childbirth experience.Geneva: WHO. Recuperado em: 10 de setembro de 2018 <http://febrasgo.mccann.health/childbirth_experience_2018.pdf>         [ Links ].

Xavier, R. B., Jannotti, C. B., Silva, K. S., &Martins, A. C. (2013). Risco reprodutivo e renda familiar: análise do perfil de gestantes. Revista Ciência e Saúde Coletiva, 18(4), 1161-1171.         [ Links ]

Zanardo, G. L. P., Calderón, M., Nadal, A. H. R., &Habigzang, L. F. (2017). Violência obstétrica no Brasil: uma revisão narrativa. Psicologia e Sociedade, 29, 1-10.         [ Links ]

 

Endereço para correspondência
E-mail
:Dessa_ss15@hotmail.com

Recebido em: setembro de 2019
Aceito em: abril de 2020

 

 

1 Andressa dos Santos Schoen: Enfermeira. Especialista em Saúde Comunitária, Universidade Luterana do Brasil, Avenida Açucena, 2917 – Igara/Cep 92025-840. (51) 985097405.
2
Miria Elisabete Bairros de Camargo: Enfermeira. Mestre em Educação, Universidade Luterana do Brasil. Rua Marques do Herval, 467-92020-400. 51-996030962.

Creative Commons License