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Aletheia

Print version ISSN 1413-0394

Aletheia vol.54 no.1 Canoas Jan./June 2021

http://dx.doi.org/DOI10.29327/226091.54.1-2 

DOI 10.29327/226091.54.1-2

ARTIGOS EMPÍRICOS

 

Avaliação da eficiência de ilhas flutuantes com plantas para a melhoria da qualidade hídrica de ecossistemas aquáticos

 

Evaluation of the efficiency of floating islands with plants for improving the water quality of aquatic ecosystems

 

 

Vinícius Krebs 1; Renata Farias Oliveira 2; Nádia Teresinha Schröder 3

Universidade Luterana do Brasil - ULBRA

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A utilização da água sempre foi vital para a sobrevivência humana, mas com suas ações surgiram os impactos aos ecossistemas comprometendo a qualidade. O ecossistema aquático tem sido prejudicado por isso, principalmente, pelo descarte inadequado de efluentes não tratados. Este trabalho visou avaliar a eficiência de ilhas flutuantes com plantas, a fim de observar a melhoria da qualidade hídrica de ecossistemas aquáticos. Para isso foi analisado o comportamento das macrófitas nas ilhas flutuantes, por meio de experimento controlado. A ilha se mostrou eficiente e resistente e pode ser utilizada para a remoção de macronutrientes. A eficiência na remoção foi cerca de 25% de fosfato e fósforo total, em um período de análise de 60 dias. Isso indica que com um período maior de análises, o resultado de remoção poderá ser maior, bem como a densidade de biomassa para o povoamento da ilha e a sua aplicação em corpos hídricos comprometidos.

Palavras-chave: eficiência, ilhas flutuantes com plantas, qualidade hídrica.


ABSTRACT

The use of water has always been vital for human survival, but with its actions, impacts on ecosystems have emerged, compromising quality. The aquatic ecosystem has been harmed by this, mainly, by the inadequate disposal of untreated effluents. This work aimed to evaluate the efficiency of floating islands with plants, in order to observe the improvement of the water quality of aquatic ecosystems. For this, the behavior of macrophytes on floating islands was analyzed, using a controlled experiment. The island proved to be efficient and resistant and can be used to remove macronutrients. The removal efficiency was about 25% of total phosphate and phosphorus, in an analysis period of 60 days. This indicates that with a longer period of analysis, the removal result may be higher, as well as the density of biomass for the island's population and its application in compromised water bodies.

Keywords: efficiency, island floating plants, water quality.


 

 

Introdução

A água é uma das substâncias mais importantes do planeta Terra, pois, dela depende a maioria dos processos físicos, químicos e biológicos nos ecossistemas. Os corpos hídricos dulcícolas, por serem autossuficientes conseguem realizar, no decorrer do seu percurso, diversos desses processos. Esses possibilitam o tratamento natural da água, pelos microrganismos, plantas, quedas d'água, corredeiras, entre outros. Isso permite a degradação da matéria orgânica, absorção de nutrientes e adsorção de metais, incorporação de oxigênio e criação de barreiras para a decantação de sólidos suspensos. Desta forma, o recurso hídrico se renova, juntamente com todos os processos do ciclo hidrológico.

O monitoramento da qualidade ambiental aquática é fundamental para a gestão sustentável dos recursos hídricos e para reduzir os riscos representados por múltiplos estressores antropogênicos. Para subsidiar as ações referentes a gestão e o planejamento desses recursos, foi instituída a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) pela Lei Nº 9.433/1997, que define os fundamentos, as diretrizes e os instrumentos de implantação de uma política de regulação do uso dos recursos hídricos no país. O seu principal objetivo é garantir o uso racional e integrado dos recursos hídricos, bem como assegurar não só à atual, mas às futuras gerações, a disponibilidade de água com padrões aceitáveis de qualidade (Lei nº 9.433, 1997).

A contaminação de águas pluviais por esgotos sanitários tem sido registrada e a falta de acesso aos serviços de saneamento contribuem para o processo saúde-doença. Ter acesso ao saneamento básico é fundamental para vidas saudáveis e produtivas. Condições precárias de saneamento geram situações contrárias à necessidade de se conservar o recurso água. Para isso é necessário buscar opções para o tratamento dos efluentes que priorizem a manutenção, a qualidade ambiental e a de vida humana. E, além disso, o uso racional dos recursos naturais, fundamentados nos princípios e conceitos da sustentabilidade (Sezerino, Bento, Decezaro, Magri & Philippi, 2015; Metcalf & Eddy, 2016).

Há diversas tecnologias para tratar os efluentes domésticos e evitar o seu lançamento em corpos hídricos. Destaca-se aqueles que utilizam macrófitas aquáticas visando a redução das cargas de contaminantes e a melhoria da qualidade das águas residuais (Avelar, Matos & Matos, 2019). Esses tratamentos são chamados de alternativos e têm sua eficiência comprovada, além de gerar baixos impactos ambientais. As macrófitas ainda podem ser utilizadas como biofiltros para a remoção de microrganismos patógenos da água, especialmente no tratamento de águas cinza e negras. Isso se dá pela alta absorção de matéria orgânica, permitindo a liberação de um efluente com menores níveis de contaminantes em corpos receptores ou melhorando a qualidade de água e ser reutilizada (Dias, Nascimento & Meneses, 2016).

As macrófitas aquáticas exercem papel de destaque nos ecossistemas aquáticos, uma vez que são produtores primários e fornecem habitat e refúgios para vários tipos de animais, além de atuar como substrato para algas, sustentando a cadeia de detritos e de herbivoria e funcionando como compartimento estocador de nutrientes (Esteves & Suzuki, 2013). A diferença nos valores de produtividade e taxas de crescimento de macrófitas aquáticas depende principalmente da espécie e o tipo ecológico, competição intra e interespecífica e das características abióticas, constituídas de temperatura, radiação, transparência da água, nível de água e velocidade de corrente, tipo de substrato e concentração de nutrientes (Dias et al., 2016; Souza & Vasconcelos, 2016; Pompêo, 2017). Essas plantas possuem capacidade de influenciar a química da água, pois desempenham funções-chave nos ciclos biogeoquímicos, como na produção de carbono orgânico e na mobilização de fósforo, influenciando diretamente a hidrologia e a dinâmica dos sedimentos por meio de seus efeitos sobre o fluxo de água dos ecossistemas dulcícolas (Esteves & Suzuki, 2013; Dias et al., 2016). Além disso, esses vegetais também acumulam metais. Devido a essa característica pode ser empregadas para avaliar a saúde do corpo de água, como remediadores dos ecossistemas ou mesmo em sistemas construídos como os wetlands, e podem ser utilizados para tratar efluentes domésticos e industriais (Al-Khafaji, Al-Ani & Ibrahim, 2018; Bai et al., 2020). A utilização de plantas aquáticas tem se destacado entre as tecnologias de tratamento de efluentes, porque além de agirem como "agente purificador" pela intensa absorção de nutrientes e pelo seu rápido crescimento, também fornece uma maneira potencialmente lucrativa de reciclar os nutrientes através do aproveitamento da biomassa colhida e da produção de uma variedade de produtos de valor agregado, a partir da biomassa pós-colheita (Pavlineri, Skoulikidis & Tsihrintzis, 2017).

As ilhas flutuantes, também chamados de jardins flutuantes, são estruturas que proporcionam uma melhoria natural da qualidade da água e oferecem, de forma atraente e econômica, uma paisagem aquática, apoiando processos de restauração ecológica natural e pouca manutenção (Yeh, Yeh & Chang, 2015). As ilhas flutuantes com plantas estão sendo aplicados em várias situações em todo o mundo. As principais aplicações desta tecnologia, em termos de melhoria da qualidade da água inclui o tratamento de águas pluviais, esgoto, efluente industrial e reservatórios de abastecimento de água (Barco & Borin, 2017).

As macrófitas crescem dentro dessas plataformas flutuantes e estendem suas raízes na água, onde absorvem os nutrientes. As ilhas flutuantes com plantas (IFP) ou ilhas flutuantes artificiais (IFA) funcionam à medida que a água contaminada entra em contato com as plantas. Os poluentes são retidos pela superfície das raízes de diversas formas. As raízes, além de acumular metais e outros contaminantes, proporcionam um ambiente ideal para o crescimento de microrganismos em forma de biofilme, que exercem processos essenciais para o tratamento do fluido, e dessa forma proporcionam a purificação da água. Melhoram, as condições microbiológicas e os processos biogeoquímicos da coluna de água. Outro benefício é a remoção do excesso de nitrogênio e fósforo evitando o crescimento exagerado de algas e consequentemente o processo de eutrofização e dessa forma melhoram a qualidade do ecossistema. Além do benefício ambiental, as IFPs estão sendo estudadas para a instalação de painéis fotovoltaicos e obtenção de energia solar aumentando sua sustentabilidade. Devido a sua flutuabilidade, as IFPs não causam estresse às plantas em ambientes com diferentes vazões de água, que variam com a profundidade, sendo predominante para o tratamento de mananciais (Stefani, Tocchetto, Salvato & Borin, 2011; Yeh et al., 2015).

Em pleno século XXI, ainda se observam muitos municípios com ausência de saneamento básico ou parte da população desassistida deste tipo de serviço trazendo graves problemas ambientais e de saúde para a comunidade. Para que haja um equilíbrio ambiental e qualidade dos serviços prestados para a população, a água deve ser preservada e a conservação dos ecossistemas aquáticos se faz necessário, para, além de manter a qualidade e abundância dos recursos hídricos, abrigar inúmeras espécies animais e vegetais, tão necessários para o ciclo da vida. A partir da deficiência no tratamento de esgotos sanitários e do passivo já existente, a construção de alternativas sustentáveis e de baixo custo como as ilhas flutuantestornam-se uma solução para esse tipo de problema. Com um tratamento adequado para os efluentes domésticos, diminui-se a possibilidade de transmissão de doenças que são veiculadas por microrganismos patogênicos presentes no esgoto, além de evitar a poluição e a degradação ambiental.

Neste sentido, este trabalho objetivou testar ilha flutuante construída com materiais de baixo custo e reciclável com macrófitas aquáticas como forma de tratamento de baixo custo em águas ricas em nutrientes. Além disso, avaliar a eficiência de remoção dos contaminantes pelas macrófitas aquáticas da ilha flutuante, a partir de análises de parâmetros químicos e biológicos.

 

Método

A ilha flutuante com plantas aquáticas (IFP) foi construída na Universidade Luterana do Brasil, região metropolitana de Porto Alegre, RS. Ela fez parte de um experimento, onde um sistema de tratamento de efluentes artificial foi testado. As coordenadas da posição da ilha flutuante são Latitude: 29°53'12.6''S e Longitude: 51°09'27.8''W.

O sistema de tratamento foi constituído de uma unidade em plástico reforçado em fibra de vidro e revestidos com gel especial, contendo água e macrófitas aquáticas. A unidade plástica com volume útil de 500 litros com comprimento superior e inferior de 1,52 e 1,15 metros, respectivamente, largura superior e inferior igual a 0,99 e 0,70 metros, respectivamente, além de altura de 0,56 metros. O reservatório foi instalado sobre pallets de madeira para nivelamento topográfico e abastecido com 400 litros da água do lago artificial existente na IES. Para isso utilizou-se bombonas de água com volume de 20 litros. Para evitar problemas com precipitações pluviométricas e manter um ambiente controlado foi instalado cobertura de lona plástica transparente de polietileno de baixa densidade.

A primeira coleta de amostras de água do lago artificial foi para análise dos parâmetros: pH, DBO5, Oxigênio Dissolvido, Fosfato Total, Fósforo Total, Nitrito, Nitrato, Nitrogênio Amoniacal, Nitrogênio Total Kjedahl (NTK) e Matéria Orgânica realizada pelo laboratório Biocontrol, credenciado pela FEPAM. Os métodos de detecção dos parâmetros e os respectivos limites estão descritos na Tabela 1.

 

 

Optou-se, também por verificar a presença de metais na mesma amostra de água, a fim de que, se detectados, haveria a necessidade de monitorar as macrófitas em relação a eles. Os metais analisados foram: Cádmio, Chumbo, Cobre, Cromo, Mercúrio, Níquel, Zinco. Os métodos de detecção dos parâmetros e os respectivos limites estão descritos na Tabela 2.

 

 

Análises da densidade de coliformes totais, termotolerantes e bactérias heterotróficas, também foram realizadas, no laboratório de bacteriologia e micologia, da Universidade, por crescimento em meios de cultura. Os coliformes totais e termotolerantes representam bactérias patógenas ou não, encontradas no intestino de animais de sangue quente e podem se reproduzir em ambientes líquidos a temperatura ótima. E a densidade de bactérias heterotróficas é amplamente utilizada como indicador da qualidade da água para consumo humano (World Health Organization [WHO], 2014).

A ilha flutuante foi construída com comprimento externo e interno de 0,90 e 0,66 metros, respectivamente e da mesma forma largura externa e interna de 0,35 e 0,67 metros, de acordo com a estrutura descrita por Krebs, Oliveira e Schröder (2020). Após a coleta d'água, ela foi instalada no tanque. Inicialmente foram introduzidos dois indivíduos de cada espécie selecionada (Cyperus papyrus, Eichhornia azurea e Begonia cucullata), pois as mesmas foram utilizadas em outros estudos com resultados positivos, pela ocorrência próxima a região de estudo e pela facilidade de coleta. Após dois dias foram adicionados mais dois indivíduos de cada espécie para reduzir o tempo necessário para crescimento das plantas dentro da ilha flutuante.

O monitoramento do experimento foi realizado semanalmente e nele se observou que a espécie Begonia cucullata não estava apresentando desenvolvimento adequado e por isso optou-se por manter somente as espécies Cyperus papyrus e Eichhornia azurea. Além disso, verificou-se a necessidade de se fazer uma adaptação para a continuidade do experimento, uma vez que se observou a diminuição dos níveis de água dos tanques e o escasso desenvolvimento da biomassa das plantas. Optou-se por acrescentar matéria orgânica contendo nitrogênio e fósforo e, consequentemente, aumentar o volume dos tanques. Preparou-se uma solução de 1:5, ou seja, composta de 16 litros de esterco para 80 litros de água.

 

Resultados

Na primeira análise das amostras de água do lago artificial identificou-se que não havia contaminação que pudesse comprometê-la (Tabela 3 e 4). Consequentemente as plantas não estavam produzindo a biomassa necessária para o povoamento da ilha flutuante. Assim, optou-se por adicionar matéria orgânica, a fim de observar o aumento de biomassa vegetal.

 

 

 

As análises de coliformes totais e termotolerantes da água utilizada (Tabela 5) demonstraram ausência desses organismos na primeira fase do experimento. Mas registrou-se a presença de 2.000 UFC/ml de bactérias heterotróficas (mesófilas).

 

 

Na segunda fase do experimento, o resultado para coliformes totais, a 35 ºC, foi de 23 NMP/ml e para termotolerantes, a 45 ºC, 23 NMP/ml. Já as bactérias heterotróficas (mesófilas) tiveram um aumento de 1.300.000 UFC/ml (Tabela 6), devido ao aumento de matéria orgânica inseridos no tanque do experimento.

 

 

Na segunda fase do experimento, após a adição de matéria orgânica, os parâmetros se modificaram, conforme Tabela 7. Cabe ressaltar que a análise dos metais, na segunda fase do experimento, foi suspensa, uma vez que não foram detectados na água do lago artificial e que no esterco não existe a possibilidade de haver a presença de metais.

 

 

Após a adição da matéria orgânica, verificou-se um aumento nos parâmetros químicos quando analisados comparativamente. A DBO5 aumentou 30% em relação a análise inicial, assim como o aumento de 96% de fosfato total e fósforo total, já o nitrogênio amoniacal e total Kjedahl, tiveram um aumento de 50% e 91,4%, respectivamente.

Os resultados para coliformes totais a 35 Cº se manteve em 23 NMP/ml e para termotolerantes a 45 C, aumentou para 43 NMP/ml, após o período de 20 dias da adição da matéria orgânica. Porém em relação às bactérias heterotróficas (mesófilas) houve uma redução para 864.000 UFC/ml (Tabela 8). Esse número significa uma redução de 66% em comparação com a análise anterior.

 

 

Os resultados mostraram um aumento de 46,5% para coliformes termotolerantes (de 23 NMP/ml para 43 NMP/ml) (Figura 1). Em contrapartida houve uma redução de bactérias heterotróficas (Figura 2), podendo reduzir com o tratamento contínuo até o enquadramento com os padrões de potabilidade previstos pelo Ministério da Saúde.

 

 

 

Após a adição de matéria orgânica (Tabela 9), foi possível ver um aumento de 70% na demanda bioquímica de oxigênio (DBO). Como consequência observou-se a redução de 53,5% de oxigênio dissolvido (OD) pela oxidação bioquímica da água, sendo visível na sequência das análises (Figura 3). Já a redução do fósforo total foi de 24,6% acompanhado pelo do fosfato total com 25,5% (Figura 4).

 

 

 

 

Para o nitrogênio amoniacal houve um aumento de 86,6%. O nitrato (NO3-) apresentou um valor de 4 mg/L na segunda fase do experimento controlado. Por isso também se identificou o aumento de 36,3% de nitrogênio total Kjedahl (NTK) (Figura 5).

 

 

Discussão

A ilha flutuante com macrófitas aquáticas pode ser uma alternativa de tratamento de efluente doméstico de baixo custo. Quanto à estrutura da ilha, para que não ocorresse descolamento da espuma e das emendas utilizou-se espuma expansível de PU em pontos estratégicos, reforçando alguns encaixes. Depois desses ajustes, durante todo o período do experimento, ela permaneceu intacta e continuou apresentando resistência para utilização como meio suporte para as macrófitas.

Quanto ao efluente utilizado, foi necessário inserir matéria orgânica, uma vez que a água do lago artificial coletada para esse uso não estava contaminada. Essa estratégia se fez necessária, pois as principais fontes, nos ambientes aquáticos, são a descarga de dejeto animal, resíduos orgânicos e esgotos sanitários sem tratamento. Em esgoto doméstico, por exemplo, 75% dos sólidos em suspensão e 40% dos sólidos dissolvidos são de natureza orgânica. Estes compostos são constituídos principalmente de carbono, hidrogênio e oxigênio, além de outros elementos como nitrogênio, fósforo, enxofre, ferro, entre outros. Os principais grupos de substâncias orgânicas encontradas nos esgotos são carboidratos (25 a 50%), proteínas (40 a 60%) e óleos e graxas (10%). Outros compostos orgânicos sintéticos são encontrados em menor quantidade como detergentes, pesticidas, fenóis, etc. (Metcalf & Eddy, 2016).

As concentrações dos parâmetros, nitrato, nitrito, nitrogênio amoniacal, oxigênio dissolvido, pH, e metais, cádmio, chumbo, cobre, cromo, mercúrio, níquel e zinco registradas nos ensaios organolépticos realizados com a amostra de água do lago artificial usada no experimento se enquadram como classe I. O resultado do parâmetro DBO5 indica um enquadramento classe III, pois estabelece como valor máximo 10 mg/L O2 (20 Cº). Já a concentração de fósforo total registrada permitiu identificar que esse parâmetro não se enquadra em nenhuma das classes estabelecidas, uma vez que o valor máximo estabelecido pela Resolução CONAMA no 357/2005 para classe III, é 0,05 mg/L P, para ambientes lênticos.

Após a adição de matéria orgânica, foi possível identificar um aumento de 70% na demanda bioquímica de oxigênio (DBO). Como consequência observou-se a redução de 53,5% de oxigênio dissolvido (OD) pela oxidação bioquímica da água, sendo visível na sequência das análises, o que era esperado conforme já avaliado por Martins, Costa e Marques (2010), que demonstraram que a contaminação do arroio por esgoto doméstico muda de intensidade ao longo do seu percurso e em condições semelhantes aquelas encontradas em muitos lagos que estão eutrofizados. A redução do fosfato total foi 25,5% assim como registrado por Stewart, Mulholand, Cunningham, Kania e Osterlund (2008), em experimento utilizando ilhas flutuantes com macrófitas comprovando a eficiência das plantas na remoção desse macronutriente. Para o fósforo total, a redução foi de 24,6% corroborando com Naime e Garcia (2005), que utilizaram macrófitas no tratamento de efluentes agroindustriais e registraram uma redução entre 54 e 72% de fósforo. Também Mendonça, Ribeiro, Borges e Bastos (2012) ao avaliarem a eficiência de sistemas alagados (wetlands) no tratamento de águas residuárias de laticínios, observaram uma remoção de fósforo entre 18,61 a 34,3%, valores promissores levando em conta a dificuldade da remoção desse elemento por sistemas convencionais.

Para o nitrogênio amoniacal houve um aumento de 86,6%. Isso ocorreu devido a incorporação de nitrogênio na água a partir da degradação da matéria orgânica pelos microrganismos fixadores. Estes transformam o nitrogênio orgânico em amônia (NH3), que combinado com a água, a amônia é induzida a hidróxido de amônio e ionizada formando íons de amônio (NH4+). As concentrações mais elevadas destes compostos ocorrem após a floração de algas, fitoplânctons, bactérias, entre outros seres vivos (Barbieri, Marques, Bondioli, Campolim & Ferrarini, 2014; Garcia & Cardoso, 2015). A ocorrência e aumento dos compostos nitrogenados na coluna d'água tem origem da própria decomposição e oxidação da matéria orgânica adicionada, que a partir dos íons amônio (NH4+) são convertidos em nitrito (NO2-) e rapidamente oxidados a nitrato (NO3-), que apresentou um valor de 4 mg/L N na segunda fase do experimento. Este processo é conhecido como nitrificação, após são metabolizados pelos organismos vegetais e animais ou ainda transformado em (N2) pela desnitrificação (Garcia, Cardoso & Santos, 2013; Garcia & Cardoso, 2015), por isso também se identificou o aumento de 36,3% de nitrogênio total Kjedahl (NTK).

Os resultados de coliformes totais e termotolerantes e de bactérias heterotróficas (mesófilas), na primeira fase do experimento, indicam que a água analisada se encontrava fora dos padrões de potabilidade estabelecidos pela Portaria de Consolidação nº 5, de 28 de setembro de 2017, do Ministério da Saúde. Essa Portaria dispõe sobre os procedimentos para controle e vigilância da qualidade da água e padrões de potabilidade para consumo humano, cujo limite é 500 UFC/ml. Na segunda fase do experimento, o aumento registrado para o grupo de bactérias foi devido ao incremento de matéria orgânica inseridos no tanque. A presença dos coliformes totais e termotolerantes provém da diluição de matéria orgânica de origem bovina, sendo que os resultados mostraram um aumento de 46,5% para coliformes termotolerantes. Em contrapartida houve uma redução de bactérias heterotróficas, podendo reduzir com o tratamento contínuo até o enquadramento com os padrões de potabilidade previstos pelo Ministério da Saúde. Apesar da maioria das bactérias heterotróficas não ser patogênica, pode representar riscos à saúde, como também deteriorar a qualidade da água, provocando o aparecimento de odores e sabores desagradáveis (Bortoloti, Melloni, Marques, Carvalho & Andrade, 2018).

Como forma de aumentar a disposição de nutrientes e avaliar a produção de biomassa, a adição do volume perdido pela evapotranspiração e o aumento, no meio, de matéria orgânica diluída foi importante, uma vez que a produção de biomassa na primeira fase do experimento foi efetiva, mas não atingiu a capacidade de suporte da ilha. O crescimento de macrófitas foi avaliado por Tanner e Headley (2011), onde observaram que o desempenho e a absorção de nutrientes estão ligados as espécies e suas características. Para apresentarem desempenho satisfatório, caraterísticas como, rápido estabelecimento e alta taxa de crescimento, capacidade de assimilação dos nutrientes, grande capacidade de estocar nutrientes na biomassa, tolerância às características físicas e químicas do efluente, e tolerâncias às condições climáticas locais, que podem ou não auxiliar na produção de biomassa. Foi possível avaliar a flotação de materiais suspensos pela decomposição bacteriana e criação de biofilme formado na superfície da água. Isso corroborou com as definições de flotação definidas pela ABNT/NBR 9896/1993, e por Zahed et al. (2010).

A espécie Eichhornia azurea, apresentou redução no crescimento e necrose na parte aérea. De acordo com Barbosa (2013), entre as alterações que podem afetar a produtividade das macrófitas aquáticas, flutuantes e submersas, estão: a redução da velocidade da água; redução da diversidade de habitats; alteração do regime de flutuação dos níveis de água, entre outras, como sua adaptação a descarga de nutrientes. A espécie Cyperus papyrus adaptou-se bem ao período de experimento, mas não apresentou um crescimento significativo neste período. Na segunda fase do experimento, pós adição de matéria orgânica ao efluente, observou-se uma alteração na temperatura ambiental da região, com queda de temperatura. Isso pode ter justificado o reduzido aumento de biomassa vegetal, mesmo agora com maior disposição de nutrientes. Segundo Barco e Borin (2017), a temperatura modifica a velocidade do metabolismo microbiano e das macrófitas. Em temperaturas mais elevadas, são aceleradas as reações químicas, enquanto a redução da temperatura diminui as funções biológicas da biota, reduzindo a eficiência global, mesmo que os processos físicos como a floculação e sedimentação não sejam afetados.

 

Considerações Finais

As espécies de macrófitas possíveis de serem usadas em ilhas flutuantes podem ser variadas. A seleção vai depender, por exemplo, dos contaminantes presentes no meio a ser tratado. Para isso devem ser testadas outras espécies de macrófitas emersas nas ilhas flutuantes, para a sua sobrevivência sem sedimento como meio suporte, bem como analisar seu desempenho na recuperação da água contaminada.

O crescimento vegetal das espécies utilizadas não atingiu a capacidade suporte da ilha, isso pode ter ocorrido devido a outros fatores não analisados, como temperatura, tempo de adaptação, tempo de radiação. A falta de nutrientes na água do lago artificial utilizada no início do experimento reduziu o tempo real da ação das macrófitas. A partir do aporte de nutrientes seria necessário um período de testagem maior para o alcance da capacidade suporte das ilhas flutuantes.

Em relação aos parâmetros analisados, após o aumento da carga de nutrientes na água observou-se o trabalho realizado pelas macrófitas demonstrando eficiência na remoção de cerca de 25% de fosfato total e fósforo total. Com isso é possível fazer uma projeção de que ao se repetir o experimento com mais tempo de execução, os resultados de remoção serão melhores.

O dimensionamento das ilhas para um caso real de tratamento torna-se um fator essencial para a evidência da efetiva melhoria e/ou recuperação da qualidade da água de ecossistemas aquáticos, sendo possível a realização de tratamento contínuo de reservatório, rios e outros ambientes aquáticos.

 

Referências

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Endereço para correspondência
E-mail:viniciuskrebs@yahoo.com.br

Recebido em: outubro de 2020
Aceito em: janeiro de 2021

 

 

1 Vinícius Krebs: Engenheiro ambiental e sanitarista, ULBRA, Av. Farroupilha 8001, CEP: 92425-900, Canoas/RS, Fone: 51994167561.
2 Renata Farias Oliveira: Engenheira química, mestre, ULBRA, Av. Farroupilha 8001, CEP: 92425-900, Canoas/RS, Fone: 51996258504.
3 Nádia Teresinha Schröder: Bióloga, doutora, ULBRA, Av. Farroupilha 8001, CEP: 92425-900, Canoas/RS, Fone: 51999189766.

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