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Estudos de Psicologia (Natal)

Print version ISSN 1413-294XOn-line version ISSN 1678-4669

Estud. psicol. (Natal) vol.26 no.4 Natal Oct./Dec. 2021

http://dx.doi.org/10.22491/1678-4669.20210037 

10.22491/1678-4669.20210037

TEMAS EM POLÍTICAS SOCIAIS: ASSISTÊNCIA SOCIAL E SISTEMA DE GARANTIA DE DIREITOS

 

O cuidado na perspectiva de familiares de pessoas com deficiência: revisão integrativa

 

Caring from the perspective of family members of people with disabilities: an integrative review

 

El cuidado desde la perspectiva de los familiares de personas com discapacidad: uma revisón integrativa

 

 

Taimara ForestiI; Maísa HodeckerI; Andréa Barbará da Silva BousfieldI

IUniversidade Federal de Santa Catarina

 

 


RESUMO

Esta revisão integrativa tem como objetivo compreender como os familiares cuidadores pensam o cuidado de pessoas com deficiência. A busca pelos estudos foi realizada nas bases de dados Scopus, Web of Science, PsycInfo, INDEXPSI, LILACS, SciELO. Foi estipulado o período de tempo que compreende os últimos dez anos de pesquisa (2010-2020).Após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão foram selecionados 19 artigos. A análise dos dados foi categorizada em cinco grandes temas: (a) O cuidado e suas implicações emocionais, psicológicas, físicas, comportamentais e sociais; (b) O cuidado como solidão; (c) O cuidado e suas demandas práticas; (d) O cuidado e as estratégias de enfrentamento; (e) O cuidado e a representação de deficiência.Os resultados mostraram que o cuidado é compreendido conforme a cultura e crenças a respeito da deficiência, além de ocasionar implicações de diferentes ordens aos cuidadores familiares como, discriminações, ansiedade, depressão, solidão e dificuldades financeiras.

Palavras-chave: cuidado; cuidadores familiares; percepção; pessoas com deficiência.


ABSTRACT

This integrative review aims to understand how family caregivers think about caring for a disabled person. The quest for the studies was performed in the databases Scopus, Web of Science, PsycInfo, INDEXPSI; LILACS and, SciELO. The period that comprises the last ten years of research has been stipulated (2010-2020). After applying the inclusion and exclusion criteria, 19 articles were selected. Data analysis was categorized into five major subjects: (a) Caring and its emotional, psychological, physical, behavioral, and social implications; (b) Caring as solitude; (c) Caring and its practical demands; (d) Caring and coping strategies; (e) Disability caring and representation. The results showed that caring is understood according to the culture and beliefs about the disability, in addition it causes different types of implications for family caregivers, such as discrimination, anxiety, depression, loneliness and, financial difficulties.

Keywords: care; family caregivers; perception; disabled person.


RESUMEN

Esta revisión integrativa tiene como objetivo comprender qué piensan los familiares cuidadores sobre el cuidado de las personas con discapacidades. La búsqueda de los estudios se realizó en las bases de datos Scopus, Web of Science, PsycInfo, INDEXPSI, LILACS,y SciELO. Se ha estipulado el período de tiempo que comprende los últimos diez años de investigación (2010-2020).Después de aplicar los criterios de inclusión y exclusión, se seleccionaron 19 artículos. El análisis de datos se clasificó en cinco temas principales: (a) El cuidado y sus implicaciones emocionales, psicológicas, físicas, conductuales y sociales; (b) El cuidado como soledad; (c) El cuidado y sus exigencias prácticas; (d) El cuidado y las estrategias de afrontamiento; (e) El cuidado y la representación de personas discapacitadas. Los resultados mostraron que el cuidado se entiende de acuerdo con la cultura y creencias sobre la discapacidad, además de generar implicaciones de diferentes órdenes para los familiares cuidadores, tales como discriminación, ansiedad, depresión, soledad y dificultades económicas.

Palabras clave: cuidado; familiares cuidadores; percepción; personas con deficiencia.


 

 

No mundo, a deficiência é presente em mais de um bilhão de pessoas (Organização Mundial da Saúde [OMS], 2012). No Brasil, segundo o levantamento realizado pelo censo de 2010, os dados apontam a existência de 45,6 milhões de pessoas com deficiência (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 2012). Nesse sentido, para além das pessoas com deficiência (PCD), as crianças ou os idosos, a própria condição humana se expressa na interdependência, ou seja, as relações de dependência são inevitáveis à vida social e fundamentam-se, a partir de Eva Kittay, como sendo o cuidado princípio ético fundamental para as organizações sociais e a interdependência como condição humana de pessoas deficientes e não-deficientes (Diniz, 2007; Gesser, 2019).

Esses cuidadores familiares, não remunerados, que possuem sob sua responsabilidade o cuidado de uma pessoa com deficiência desempenham um papel vital nesse cuidado e nos resultados dessas práticas como, a saúde e as necessidades e as atividades diárias que esse papel exige (Kobylianskii et al., 2018). O cuidado informal pode ter um impacto negativo na saúde e bem-estar físico e mental dos cuidadores (del Río-Lozano, García-Calvente, Marcos-Marcos, EntrenaDurán, & Maroto-Navarro, 2013).

Os cuidadores se veem obrigados a preencher as lacunas de serviços públicos fragmentados e sistemas de apoio por intermédio de seus cuidados (DiGiacomo et al., 2017). Como implicações da exigência que esse papel exige, bem como a falta ou a inadequação de apoio, os custos dos cuidados enfrentados pelos cuidadores familiares extrapolam o financeiro (Kobylianskii, et.al, 2018). As famílias que exercem o cuidado de pessoas com deficiência comumente enfrentam vários desafios como, discriminações, ansiedade, depressão, solidão, dificuldades financeiras e materiais nos quais afetam a qualidade de vida dos cuidadores responsáveis (Pousada et al., 2013).

Esses cuidadores familiares carregam demandas objetivas e subjetivas para atender às rotinas diárias que irão promover o bem-estar de seus familiares com deficiência (Chiang, Hsieh, Fan, Wang, & Wang, 2020). Muitas vezes, os próprios cuidadores enfrentam transições que estão relacionadas ao seu próprio processo de envelhecimento e aos desafios físicos de cuidar e, por conta das demandas do cuidado que prestam, acabam não atendendo às suas próprias necessidades (Milliken et al., 2019). Por conta disso, compreender a realidade e experiências vividas por eles é importante para que os sistemas de apoio e intervenções possam atender às suas demandas, oferecendo-lhes um apoio vital para continuar a fornecer cuidados adequados (Kobylianskii, et.al, 2018).

Há dois aspectos fundamentais para considerar no presente estudo: primeiro, é a inclusão da deficiência como categoria de análise no campo da psicologia, sobretudo a social, considerando a atuação desse profissional frente a temática (Gesser, Nuernberg, Juracy, & Toneli, 2012). O campo dos estudos sobre deficiência no Brasil é pouco explorado, pois esse tema deficiência ainda não se desvinculou totalmente da autoridade biomédica e há poucos cientistas sociais que se dedicam a estudá-lo (Diniz, 2007). Nesse sentido, segundo Gesser et al. (2012), existem determinados grupos caracterizados como vulneráveis que ocupam pouco espaço na arena de produção de conhecimentos em Psicologia e um desses grupos é o das pessoas com deficiência.

Considerando a importância de incorporar a deficiência como objeto de análise na psicologia social, somado à relevância do cuidado como princípio de justiça e dos cuidadores como aqueles que possuem um papel central na vida de muitas PCD para aquelas PCD que o necessitam para sobreviver (Diniz, 2007; Gesser, 2019), esta revisão da literatura tem por objetivo geral caracterizar o cuidado, a partir da perspectiva de familiares cuidadores de pessoa com deficiência. Para isso, buscou responder a seguinte questão: como os familiares cuidadores pensam o cuidado de pessoas com deficiência?

 

Método

O método utilizado nesta pesquisa foi a revisão integrativa da literatura nacional e internacional, de caráter exploratório. A revisão integrativa fornece uma compreensão mais abrangente de um determinado fenômeno que incidirão em novos conhecimentos e direcionamentos sobre o tema (Torraco, 2005). A busca dos estudos foi realizada por duas pesquisadoras independentes a partir da elaboração de um protocolo seguindo o modelo do Prisma P (Moher et al., 2015).

Estratégia de Busca

Os procedimentos adotados para a procura dos estudos nas bases de dados aconteceram rigorosamente no dia 23 de novembro de 2020 e no dia 12 de janeiro de 2021, para contemplar todo o ano de 2020. Na questão idiomática, foi necessária a aplicação de filtros para estudos somente em inglês, português e/ou espanhol em função da necessidade de viabilizar a leitura do material. As buscas foram realizadas nas bases de dados Scopus, Web of Science, PsycInfo, INDEXPSI, LILACS, SciELO. Ainda, houve uma busca final nas listas de referências dos artigos selecionados.

Os descritores utilizados foram delimitados com o auxílio de um bibliotecário afim de refinar a estratégia de busca a ser utilizada para esse estudo. Dessa forma, foram utilizados os seguintes descritores/palavras-chave e seus respectivos operadores booleanos: "Disabled Persons" OR "Disabled Person" OR Handicapped OR "People with Disabilities" OR "People with Disability" OR "Persons with Disabilities" OR "Persons with Disability" OR "Physically Disabled" OR "Physically Challenged" AND Caregivers OR Caregiver OR Carers OR Carer OR "Care Givers" OR "Care Giver" OR "Home Nursing" OR "Nonprofessional Home Care" OR "Non Professional Home Care". Foram utilizados os seguintes critérios de inclusão: ser artigo científico; disponibilizado online; dos últimos 10 anos (janeiro de 2010 a dezembro de 2020); abordar o tema, a saber: o cuidado para pessoas com deficiência; público: familiares cuidadores. Já os critérios de exclusão foram: dissertações e/ou teses; livros; artigos que não tivessem acesso completo; cuidadores não familiares. Todos os artigos repetidos foram removidos por meio de processos automatizados (Mendeley e Rayyan) e manuais.

Seleção dos Estudos

A primeira etapa foi a de identificação dos estudos nas bases de dados. Utilizou-se na primeira etapa para o gerenciamento do banco de dados, o software Mendeley. Na segunda etapa, após a exportação dos estudos selecionados nas bases, utilizou-se o software Ryyan QCRI, que permite dentre outras funções a realização dessa etapa pelos revisores no modo "blind on" (revisão às cegas, tradução livre). Nessa fase, os títulos e resumos foram lidos para a inclusão dos estudos. E, para a elegibilidade os estudos foram lidos na íntegra. Por fim, foi realizada a verificação das referências dos estudos selecionados, a fim de agregar estudos que possam atender aos critérios de inclusão.

 

 

Processo de Extração das Informações

Os estudos que contemplaram os critérios de inclusão foram analisados de forma descritiva e qualitativa, de acordo com as seguintes categorias: (a) título do estudo, (b) ano de publicação e autores, (c) temas, (d) delineamento, (e) participantes (f) área de conhecimento e (g) localidade/país para compreensão do fenômeno. Posteriormente, foram apresentadas as informações referentes aos principais resultados e atribuições dos cuidadores sobre a experiência do cuidado de familiares com deficiência.

Análise dos Resultados

A proposta de análise das informações provenientes dos estudos selecionados segue os pressupostos e orientações da Análise Temática de Braun e Clarke (2006), que constitui no desenvolvimento de seis fases, a saber: 1) familiarização com dados; 2) gerenciar códigos iniciais; 3) buscando temas; 4) revisando os temas; 5) definindo e nomeando os temas; e, 6) produzindo o relatório. Realizou-se a análise temática a respeito da perspectiva de cuidadores familiares de pessoas com deficiência sobre o cuidado, suas experiências e implicações psicossociais.

Risco de Viés entre os Estudos

Haja vista maior fidedignidade das informações, tanto a busca, quanto a extração das informações, foram realizadas de maneira independente por duas autoras deste artigo. Caso a autora principal estivesse com dúvidas a respeito da inclusão do artigo, o mesmo seria enviado à análise de juízes (Pasquali, 2010). Como as duas pesquisadoras entraram em consenso não houve a necessidade da intervenção de um terceiro juiz.

 

Resultados

Caracterização dos Estudos

A pesquisa dos descritores nas bases de dados gerou uma amostra geral de 2.279 estudos, cuja temática girava em torno das pessoas com deficiência e cuidado, distribuídos nas respectivas bases de dados: 71,4% (n = 1.498) na base SCOPUS; 15,4% (n = 421) na base Web of Science; 9,1% (n = 248), na base LILACS; 2,6% (n = 70) na base SciELO e, 1,5% (n = 42) na base INDEXPSY. Inicialmente foi realizada a exclusão dos estudos em duplicidade, restando 1.903 artigos, dos quais foram realizadas a leitura dos títulos/resumo pelas autoras, sendo que destes foram rejeitados 1.878 (seguindo os critérios de exclusão), restando 25 estudos completos que foram lidos na íntegra; destes, nove foram rejeitados (sete não se refere ao objetivo e dois não atendiam apenas ao público de cuidadores), restando 16 artigos. Foram incluídos posteriormente, a partir das referências, três novos artigos, a amostra final foi composta por 0,83% (n = 19) estudos encontrados.

Na Tabela 1, é apresentada uma descrição geral dos 19 estudos selecionados. Destaca-se os títulos dos estudos, ano de publicação e autores, temas, delineamento, participantes, área de conhecimento e localidade/país para auxiliar na compreensão do fenômeno. Os estudos selecionados receberão a designação de: E1=estudo 1; E2=estudo 2 e assim por diante, a fim de facilitar a leitura.

Conforme as informações da amostra final apresentadas na Tabela 1, nota-se que o ano das publicações foram distribuídas durante o período de 2011 a 2020, exceto nos anos de 2010 e 2014, nos quais nenhum artigo foi selecionado. Ainda, percebe-se que a maioria dos estudos selecionados foram publicados nos últimos cinco anos, o que sugere um interesse e demanda crescentes sobre o tema.

Em relação aos objetivos dos estudos selecionados em sua maioria, buscavam explorar as experiências vividas, desafios e percepções de cuidado (E1; E2; E3; E4; E7; E8; E9; E10; E14; E15; E18; E19), bem como a jornada dos cuidadores e os mecanismos de enfrentamento (E5; E11), os impactos e aspectos positivos/negativos do cuidado (E16; E6; E17), seus saberes, atitudes e prática (E12) e seus papéis enquanto cuidadores (E13). Todos abordaram por meio das experiências dos cuidadores aspectos relacionados ao cuidado. Por conta dos objetivos já é possível perceber que quase a totalidade dos estudos (n = 16) são de delineamento qualitativo havendo três estudos de revisões sistemáticas (E6; E9; E16) e um estudo misto (E12). Diante disso, pode-se entender essa informação a partir de dois pontos: primeiro, concebendo a pesquisa qualitativa como um apoio metodológico significativo e mais apropriado diante das problemáticas e objeto de pesquisa; segundo, aponta justamente uma escassez de pesquisas quantitativas e/ou mistas, que são capazes de inferir e correlacionar variáveis, como por exemplo, o nível de escolaridade com o conhecimento sobre as estratégias de enfrentamento utilizadas pelos cuidadores familiares de pessoas com deficiência.

Em relação aos participantes da pesquisa têm-se duas informações relevantes. A primeira é o número de cuidadores selecionados nos estudos, que variaram de três a 68 participantes, sendo que um estudo (E11) não apresentou o número da amostra. A segunda, que corrobora com a literatura, é a presença da figura da mulher como a mais predominante entre os cuidadores. Do total de 17 estudos, houve 257 mulheres e apenas 69 homens e dois estudos não especificaram o sexo (E11; E17). Diante disso, é relevante a realização de estudos que contemplem cada vez os cuidadores familiares homens, bem como estudos que contemplem questões de gênero. Nesse sentido, as principais autoras da Teoria do Cuidado, Joan Tronto e Eva Feder Kittay, localizam essas práticas para além do campo ético (nas relações de dependência e interdependência), para a o campo político. Assim, a teoria feminista do cuidado, passou a ter como objetivo (1) identificar o funcionamento do sistema de gênero; (2) analisar as formas como as teorias o refletem e perpetuam; (3) encontrar maneiras de alterá-lo; (4) eliminando as injustiças e opressões que produz (Kittay, 2005).

As áreas de conhecimento nas quais os estudos foram desenvolvidos concentraram-se da seguinte forma: medicina, psiquiatria e pediatria (n = 7), enfermagem (n = 7), psicologia (n = 3), saúde pública (n = 2) e serviço social (n = 2). Portanto, o montante de 14 estudos foi desenvolvido na área médica, enquanto sete localizaram-se nas áreas social e humanas. Em relação à concentração dos estudos estarem sob domínio da área médica é possível perceber que as práticas de cuidado, assim como a concepção da deficiência, ainda são compreendidas por meio de um modelo médico (Diniz, 2007; Gesser, 2019; Mello, 2016). O cuidado e suas práticas, a partir dessa percepção, passam a ser exercidos como proposta de reabilitação daquele corpo que não segue um padrão normativo. Ainda, reitera o que apresenta a literatura sobre a importância de incorporar estudos sobre deficiência na psicologia social, somado à relevância de ultrapassar o conceito de cuidado como aquele somente direcionado a manutenção de um corpo físico, mas visto como princípio de justiça (Diniz, 2007).

Em relação à localidade na qual os estudos foram realizados 26,3% (n = 5) conduziram-se na América do Norte (E5; E7; E9; E13; E14); 21% (n = 4) foram desenvolvidos no continente Africano (E1; E3; E11; E17); 15,7% (n = 3) realizados na Ásia Oriental (E2; E15; E19); 15,7% (n = 3) no Reino Unido (E6; E16; E18); 10,5% (n = 2) conduzidos na Ásia (E4; E8); 5,2% (n = 1) desenvolvido na Oceania (E10); e, 5,2% (n = 1) na América Do Sul (E12). As informações importantes a serem destacadas quanto à localidade dos estudos é o fato de considerar a cultura daquela localidade. Por exemplo, em contextos culturais africanos, os cuidadores familiares podem acreditar que seu/sua filho/a possui a deficiência por conta de feitiços ou por acreditar que seja um castigo por erros passados. E, nesse último caso, esses cuidadores podem acreditar estar isentos da responsabilidade pela etiologia e pelo tratamento da deficiência (E1) e, também, pelas práticas de cuidados.

Em relação à teoria empregada pelos estudos, menos da metade 31,5% (n = 6) utilizaram aportes teóricos para explicar o fenômeno e/ou as experiências vivenciadas pelos cuidadores familiares de pessoas com deficiência. As teorias adotadas foram: Abordagem temática de Rubin e Babbie (E1); Teoria fundamentada em codificação aberta (E5); Modelo de transição de cuidados, de Geary e Schumacher e Teoria das transições, de Meleis, Sawyer, Im, Messias e Schumacher (E7); Teoria de gênero relacional, de Connell (E8); Modelo Double ABCX, de Hill, adaptado de McCubbin e Patterson (E9); e, Modelo Ecológico de Bronfenbrenner (E12).

Categorização Temática

Ao analisar qualitativamente os artigos encontrados foi possível obter um panorama geral dos principais resultados, assim como o que pensam os cuidadores familiares sobre o cuidado a partir de suas experiências e vivências. As cinco categorias identificadas nesse estudo foram definidas indutivamente, ou seja, posterior a análise dos dados provenientes dos estudos selecionados, sendo elas:

Categoria A. O cuidado e suas implicações emocionais, psicológicas, físicas, comportamentais e sociais. Essa foi a temática mais recorrente; presente em quase todos os estudos. Esses, demonstram que uma grande parte dos cuidadores experienciam implicações emocionais como tristeza, raiva, vergonha, ressentimento, frustração, culpa, preocupações em relação à vida de seus filhos/as (E1; E2; E8; E11; E12; E14). Além de relatarem questões psicológicas como estresse, ansiedade, depressão, negação, ambivalência, medo e luto (E1; E2; E4; E5; E7; E8; E10; E11; E12; E13; E16). Alguns aspectos físicos foram destacados, entre eles a exaustão, distúrbios do sono, fadiga, perda de apetite, perda de peso, dores de cabeça, tonturas e resfriados constantes (E1; E2; E5; E8; E10; E11; E12; E13; E18), bem como aspectos comportamentais como, inibição, dificuldades de interações, dificuldades financeiras e isolamento (E9; E10; E15). E, por fim, os estudos apontaram para questões de cunho social como a estigmatização, discriminação, rejeição de membros da família, a quase inexistência e/ou estreitamento de vínculos com a comunidade (E1; E3; E7; E8; E11; E17; E19).

Categoria B. O cuidado como solidão. Nessa categoria temática um pouco mais que a metade dos estudos demonstrou que o cuidado de um familiar com deficiência proporciona, em sua grande maioria, experiências de solidão para os cuidadores, que em sua maioria são mulheres. Essa vivência apresenta-se como um afastamento social, ou seja, esses cuidadores apresentam dificuldades ou rupturas das relações familiares e na interação com a comunidade, muitas vezes geradas pela estigmatização, julgamento, discriminação e pela falta de apoio que a família sofre (E1; E7; E10; E11; E12; E13; E14; E15; E17). Além disso, é comumente em seus relatos a verbalização de se sentir sozinho nesse processo (E18).

Categoria C. O cuidado e suas demandas práticas. De igual forma, essa categoria esteve presente em um pouco mais que a metade dos estudos, demonstrando que além das implicações relatadas que os cuidadores familiares de pessoas com deficiência experienciam, existem as demandas práticas que necessitam de recursos materiais (E1). Entende-se como demandas práticas aquelas relativas ao dia a dia no processo de cuidar, como demandas de transportes, de saúde (incluído consultas e medicamentos), de educação, de apoio e de atendimento profissionais e, principalmente, de demandas financeiras (E1; E3; E4; E11; E13; E16; E18). Estas que são potencializadas pela falta ou dificuldade em manter um trabalho remunerado que concilie com as práticas de cuidado (E10; E12; E13; E17).

Categoria D. O cuidado e as estratégias de enfrentamento. Nesse campo de investigação quase a metade dos estudos comunicou sobre as estratégias de enfrentamento. Importante ressaltar que essa categoria não apresenta estudos específicos e direcionados sobre quais são as estratégias mais recorrentes ou as que propiciam maior bem-estar aos cuidadores. Essa categoria é um compilado das indicações de estratégias de enfrentamento que os cuidadores familiares de pessoas com deficiência utilizam para que o cuidado se torne uma experiência menos difícil, mais prazerosa e com maior resiliência psicológica. Sendo assim, algumas estratégias de enfrentamento mais utilizadas pelos cuidadores familiares foram: assistência temporária, espaços de conversa com amigos e familiares, apoio de cônjuges ou parentes, exercícios físicos, sensação de cumprir com obrigações (altruísmo), a percepção de características positivas direcionadas a seus filhos com deficiência proporcionou atitudes positivas e, principalmente a espiritualidade e orações demonstraram ser estratégias mais utilizadas por esses cuidadores (E1; E6; E7; E11; E12; E14; E16; E17; E18).

Categoria E. O cuidado e a representação de deficiência. Essa categoria temática foi encontrada em um pouco menos da metade dos estudos. Apesar de ser encontrada explicitamente em um número inferior de artigos, ela perpassa por todos eles considerando seus contextos. Nessa categoria, o cuidado é pensado a partir de uma representação do que é a deficiência para os cuidadores familiares. Logo, a percepção do que é deficiência pode estar relacionada com a representação do que é o cuidado para esses pais. A exemplo disso, é possível identificar nos estudos desenvolvidos em culturas africanas, que a compreensão da deficiência está ligada a crenças religiosas (E1; E3), e por conta disso, a prática dos familiares buscarem médicos tradicionais e ministros da religião para a cura da deficiência é bastante comum (E1). Por estar a deficiência ligada a questões religiosas, o padrão de cuidado que os familiares desempenham pode ser percebido como uma forma de servir a Deus e, nesse sentido os pais se sentem responsáveis pela condição de seus filhos com deficiência e os enxergam com uma punição por algum pecado cometido contra Deus, o que pode resultar em pais escondendo seus filhos por medo de isolamento, segregação ou discriminação (E3; E11). Na cultura chinesa, pensamentos desfavoráveis à deficiência de uma criança são bem comuns. Essa concepção negativa da deficiência pode ser percebida como resultado de habilidades parentais insuficientes, o que potencializa os pais perceberem que seus filhos refletem suas próprias insuficiências (E15).

A representação da deficiência é carregada por estigmas e por conta disso gera discriminações não somente a pessoa com deficiência, mas também para suas famílias. Essas experiências de pré-conceitos direcionadas a deficiência aliadas a variações culturais, podem influenciar na busca por suporte e acesso a serviços que impactam o cuidado (E10). Por conta disso, também se supõem que à medida que a criança envelhece, seus comportamentos e sua saúde podem se tornar ainda mais complexos, logo a percepção da necessidade de dependência vitalícia pode afetar a capacidade de os familiares perceberem aspectos positivos em seus filhos (E6). Nesse sentido, poucos familiares descrevem que a deficiência está associada à presença de diferentes capacidades e barreiras sociais (E12).

 

Discussão

A discussão explora as diferentes implicações psicossociais decorrentes das práticas de cuidado que são vivenciadas por cuidadores primários (não remunerados) a familiares com deficiência. Discorre ainda sobre os desafios, lacunas e possibilidades de avanço nesse tema. Apesar de ter sido realizada a categorização dos principais achados dos estudos selecionados é evidente que tais categorias conversam entre si. Pois, quando se trata de compreender como os familiares cuidadores pensam o cuidado de pessoas com deficiência, as experiências e as vivências relatadas tornam-se coletivas. Com relação às teorias empregadas, fica perceptível a importância de autores adotarem teorias para auxiliar na compreensão dos achados. Especialmente para não enviesar os achados, considerando que os estudos selecionados (em sua maioria) utilizaram pesquisas qualitativas. Pois, muitas vezes esse delineamento de pesquisa é fortemente apontado por considerar a interpretação do pesquisador em seu processo de análise (Flick, 2009).

Em relação ao primeiro objetivo proposto por este estudo, que consiste em descrever as principais dificuldades enfrentadas pelos familiares cuidadores quanto às práticas de cuidado para pessoa com deficiência, é possível localizá-lo nas categorias A, B e C. Quanto ao segundo objetivo desse estudo, que se constitui em identificar as estratégias de enfrentamento utilizadas pelos familiares cuidadores, pode-se localizá-lo na categoria D.

Em relação à Categoria A. O cuidado e suas implicações emocionais, psicológicas, físicas, comportamentais e sociais, são apresentados um encadeamento de vivências relatadas pelos familiares cuidadores a respeito do cuidado de uma pessoa com deficiência.Desde aspectos emocionais até interferências no social que culminam de maneira geral em diminuição do bem-estar e da saúde desses cuidadores (E10). Outro aspecto relevante a ser observado é a predominância de investigação dos aspectos negativos relacionados ao cuidado. Por conta disso, é importante haver estudos que relatem os aspectos positivos e de resiliência nesses cuidadores (E11), para que seja possível fornecer-lhes orientação e apoio (E14). A necessidade de pais cuidadores obterem apoio de outros membros da família é uma necessidade social. Nesse sentido, os estudos indicam a realização de mais pesquisas que levantem as perspectivas das mães e de seus filhos para melhor compreender a natureza do dia a dia de suas vidas e experiências, a fim de fomentar a criação de políticas públicas e intervenções que promovam a saúde mental dos cuidadores, bem como estudos que auxiliem a compreender o impacto do cuidado sobre esses cuidadores (E4; E5; E8).

Já na Categoria B. O cuidado como solidão é possível compreender o cuidado como um lugar solitário no qual os familiares cuidadores de pessoas com deficiência ocupam. Em seus relatos, as privações e rupturas de apoio social e familiares são bastante comuns (E1; E11). Em algumas culturas, a responsabilidade pelo cuidado é destinada às mulheres e estas, por sua vez, roupem com relacionamentos para evitar compartilhar essas responsabilidades referentes ao cuidar (E10). Nesse sentido, algumas mães também relataram que com o passar do tempo, as ajudas advindas de familiares e amigos foram reduzindo significativamente. Por isso, é importante que os planos de cuidado devem incluir planejamento de contingência a longo prazo para as diferentes mudanças e necessidades nos níveis de dependência que os familiares cuidadores irão se deparar (E18). Aspectos como a rejeição, os estigmas, a discriminação, a exclusão e os preconceitos em relação às pessoas com deficiência parecem ser fatores pré-determinantes para o isolamento e, por conseguinte, a solidão vivenciada pelos familiares cuidadores. Em um dos estudos é possível perceber que essas atitudes negativas ou até mesmo a superproteção por esses familiares, foram tópicos encontrados em 32% de uma amostra de 438 pessoas caracterizadas nos programas de assistência social (E12). Portanto, fica evidente que esses aspectos externos supracitados potencializam o sentimento de solidão vivenciado por esses cuidadores familiares.

Nessa categoria, fica perceptível o quanto as mudanças no estilo de vida parental são alteradas para familiares cuidadores de pessoas com deficiência; e o quanto as consequências advindas dessa experiência podem ter implicações na esfera social desses cuidadores. Uma das alternativas que pode auxiliar esses familiares a sentirem-se menos solitários e possibilitar trocas de experiências entre outros cuidadores e possibilitar interações são as chamadas comunidades virtuais (Guillamón, Armayones, Hernández, & Gómez-Zúñiga, 2010).

Enquanto que na Categoria C. O cuidado e suas demandas práticas,as principais demandas de recursos e os desafios que os familiares cuidadores necessitam são apresentados. Entre eles, os mais recorrentes foram a falta de recurso financeiro e de trabalho (E1; E10; E11; E12; E13; E17). Os pais de crianças com deficiência são mais propensos a ter um emprego instável ou a não ter emprego, em comparação com os pais que não têm um filho com deficiência. Por conta das demandas de cuidado, os cuidadores familiares podem ter despesas adicionais com serviços de saúde, dietas especiais, com dispositivos auxiliares como próteses e órteses, transporte especializado, entre outros (Hartley et al., 2011). Nesse sentido, os cuidadores familiares consideram que o tempo para si, para as atividades pessoas ou de trabalho é afetado pelo tempo que dedicam ao cuidar, isso acaba por limitar as horas de trabalho remuneradas ou a pedir demissão do emprego para conseguir atender às demandas de seus filhos (E12).

Algumas mães que trabalham, muitas vezes sentem-se culpadas porque não podem dedicar o tempo de cuidado que gostariam para seus filhos, enquanto que as mães que ficam em casa se sentem culpadas por não estarem contribuindo para a renda da família por conta das atribuições do cuidado (Lim, Downs, Bao, & Leonard, 2013). Um aspecto que pode potencializar essa demanda financeira é a pobreza. Por conta dela, os cuidadores familiares tornam-se incapazes de fornecer cuidados adequados a seus filhos, ou seja, todos os recursos externos disponíveis para facilitar e apoiar boas práticas de cuidado são reduzidos pela pobreza (Gona, Mung'ala-Odera, Newton, & Hartley, 2011). Nesse sentido, os estudos apontam a relevância de se considerar em pesquisas futuras sobre deficiência e cuidado, as diferenças contextuais nas experiências desses cuidadores, considerar populações prioritárias, a iniquidade de saúde, a intersecção de raça, as condições socioeconômicas e as de gênero (E10).

Em relação ao auxílio governamental a pressão financeira não diminui, já em outros os cuidadores expressaram que a assistência financeira ajudaria a atender às necessidades de seus filhos (E10; E13). É possível perceber nessa categoria duas questões elementares que perpassam os relatos: a primeira é de que o cuidado primário exercido pelos familiares cuidadores não é compreendido e nem concebido como um trabalho; a segunda, como uma consequência da primeira, é de que esses cuidados primários não são remunerados, mesmo quando esse utiliza de todo tempo ou boa parcela do tempo desses familiares que muitas vezes não recebem apoio. Nesse sentido, Kittay, Jennings, e Wasunna (2005), defendem que o cuidado é um trabalho, mesmo quando este não é remunerado. Autora argumenta ainda, que a distribuição de cuidados é uma questão de justiça e as interações entre cuidador e cuidado na comunidade é uma questão de investigação ética e alerta que os índices de dependências de cuidado aumentaram ou devem aumentar até 2050.

O sistema de gênero também se faz presente e possui na família e no mundo doméstico a sua primeira forma de estruturação e é interpretado como uma forma "natural" de ordenamento das relações e atividades humanas, como o cuidado. Assim sendo, orienta as mais diversas práticas sociais e passa, muitas vezes, despercebido pelo campo das teorias morais e políticas. Esse sistema é opressor, injusto e discriminatório, apoia-se em diferenças físicas e comportamentais para criar privilégios e poder para um determinado grupo de homens em detrimento de outros grupos e, em especial, das mulheres. Portanto, é fundamental compreender a importância da Teoria do Cuidado e Ética do Cuidado, na qual em linhas gerais, pode ser dividida em duas fases ou gerações de pensadoras. A primeira delas dedicada a descrever os dispositivos e atitudes do cuidado associando-os a certas emoções e virtudes, buscando demonstrar os limites de uma visão racionalista para questões morais, de justiça e direitos. A segunda geração tem enfatizado a vulnerabilidade e as necessidades humanas como aspectos relevantes para a moralidade e a política. Em comum, ambas as gerações defendem o cuidado para além da responsabilização individual e coletiva como uma questão pública (Kittay, 2005).

A Categoria D. O cuidado e as estratégias de enfrentamento apresentaalgumas das principais estratégias de enfrentamento ou o que alguns autores chamam de coping (E11). Embora os aspectos positivos do cuidado não sejam bem definidos de maneira consistente nos artigos, eles podem ser identificados. As principais estratégias de enfrentamento utilizadas pelos familiares cuidadores foram o apoio familiar e de amigos e a espiritualidade (E1; E11; E12). Importante ressaltar que, em cada cultura ou região essas estratégias podem ser diferentes, pois os costumes e as crenças podem ser muito discrepantes. Portanto, para estudos brasileiros é indicado ser considerada a região a qual estará sendo investigada.

Como pode ser identificado, a grande maioria dos estudos apresenta as implicações negativas do cuidado. Por conta disso, é imprescindível que sejam realizados mais estudos para identificar preditores de aspectos positivos, isso pode auxiliar diretamente os cuidadores familiares, bem como os profissionais no fornecimento de apoio, intervenções e estratégias que aumentem a positividade desses pais de maneira a melhorar seu bem-estar mental (E6). Essas pesquisas podem apresentar detalhes únicos sobre as experiências dos cuidadores, bem como apresentam quais os principais mecanismos de enfrentamento que estes utilizam no manejo do estresse e da resiliência, além dos benefícios atrelados a cada estratégia empregada (E14).

E, por fim, a Categoria E. O cuidado e a representação de deficiência,desperta a relevância em compreender qual a representação social de deficiência para cuidadores familiares, ao passo que essa representação pode estar atrelada ao cuidado e suas práticas.Nesse sentido, as crianças com deficiência severa podem ser percebidas como um infortúnio pelos cuidadores familiares e essa percepção pode afetar a qualidade do cuidado, o valor atribuído à criança e influir no próprio estresse associado ao cuidado (E3). As experiências de estigma, assim como diferentes conceitos relacionados à deficiência, somado a fatores pessoais como resiliência, variações culturais, busca ou não de suporte, acesso a serviços e recursos de suporte disponíveis, são todos fatores que podem impactar o cuidado (McCubbin, Thompson, Thompson, McCubbin, & Kaston, 1993).

Dessa forma, é importante que familiares cuidadores recebam informações especializadas sobre a deficiência, suas causas e seu manejo, incluindo material para esclarecer equívocos e mitos, além de proporcionar espaço de discussão sobre receios e promover a inclusão (E11). Importante salientar que as pesquisas que envolvem familiares cuidadores com origens étnicas diferentes podem resultar em perspectivas diferentes sobre o cuidado e o papel que assumem (E13).

 

Considerações finais

A partir da análise dos estudos selecionados evidenciou-se que as implicações emocionais, psicológicas, físicas, sociais, como tristeza, vergonha, frustração, preocupação, ansiedade, depressão, negação, distúrbios do sono, fadiga, dores de cabeça, inibição, isolamento, discriminação, estigmatização, foram alguns dos aspectos encontrados quando os familiares cuidadores relatam sobre o cuidado de pessoas com deficiência. Além disso, os estudos destacaram que as maiores demandas relacionadas ao cuidado no dia a dia são as demandas financeiras e de trabalho. Apresentaram, ainda, a solidão como aspecto relevante relatados pelos familiares cuidadores e as implicações que tal situação gera, como a dificuldade ou inexistência de vínculos comunitários e familiares. Os estudos apontam algumas das estratégias mais utilizadas pelos cuidadores familiares para manejo do estresse e resiliência, como a espiritualidade e o vínculo com familiares e amigos. E, ainda, a importância de conhecer a representação do que é a deficiência para esses familiares cuidadores, pois essa representação pode estar relacionada com as práticas de cuidado desenvolvidas por eles.

Nesse sentido, os estudos sugerem pesquisas que abordem ainda mais os preditores de estratégias de enfrentamento para que seja possível maior apoio para os pais na diminuição de implicações advindas do cuidado, e para os profissionais que trabalham com pessoas com deficiência para melhor traçar estratégias de trabalho e intervenções. Destarte, é necessário que haja estudos que incluam a deficiência como categoria de análise em estudos brasileiros, especialmente no campo da psicologia social; e, o cuidado como questão de investigação para implementação de políticas públicas ou intervenções governamentais que visam auxiliar esses cuidadores familiares no melhor desenvolvimento de suas funções.

A presente revisão apresenta considerações relevantes aos estudos da Psicologia e interface com temas em políticas sociais, no que se refere a localizar o cuidado a partir de uma perspectiva ético-política e de justiça social (aos cuidadores e a quem recebe os cuidados), com a possibilidade de implementação de políticas públicas de cuidado no país. Além de manifestar a importância, realizar a formação do profissional de psicologia, a partir de marcadores sociais como a deficiência, a fim de prepará-los de maneira inclusiva às diferentes interseccionalidades e diversidades, sejam no campo da Psicologia Social, Educacional, Trabalho, entre outras. Em relação à população brasileira, sugerem-se estudos que investiguem quais as representações sociais de deficiência para cuidadores familiares e se estas possuem relação com as práticas de cuidado. Por fim, os estudos apresentam lacunas na utilização de teorias que embasem os achados; dessa forma, sugere-se que pesquisas futuras adotem teorias melhores de compreensão do fenômeno. Esse estudo possui limitações quanto a não inclusão de teses e dissertações em sua estratégia de busca e a especificidade de determinadas bases de dados para realizar a coleta dos artigos.

 

Agradecimento

À CAPES pelo financiamento desse estudo.

 

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Recebido em 05.abr.21
Revisado em 17.dez.21
Aceito em 31.jan.22

 

 

Taimara Foresti, Mestra em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Doutoranda em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Telefone: (048) 3721-9067. Email: taiforesti@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0569-5257
Maísa Hodecker, Mestra em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Doutoranda em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Psicóloga (CRP/SC 16945) na empresa Maísa Hodecker Serviços em Psicologia Ltda ME. Email: maisa_hodecker@hotmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5273-1575
Andréa Barbará da Silva Bousfield, Doutora em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Pós-Doutorado pela Università degli Studi di Padova (UNIPD) e pelo Instituto Universitário de Lisboa (ISCET-IUL), é Professora do Departamento de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Email: a.bousfield@ufsc.br ORCID: 0000-0002-4333-4719

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