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Temas em Psicologia

versão impressa ISSN 1413-389X

Temas psicol. v.1 n.1 Ribeirão Preto abr. 1993

 

As necessidades emocionais do adolescente e a escola

 

 

Isolda de Araújo Günther

Universidade de Brasília

 

 

O período da adolescencia tem um peso fundamental na determinação de um futuro bem sucedido ou cheio de obstáculos. O significado específico desta fase da vida está, basicamente, na dependencia de duas vertentes: a) variações sociais relacionadas ao contexto sócio-histórico; b) experiencias com pessoas significativas.

Observando a adolescencia na perspectiva da cultura na qual está inserida, verifica-se, de pronto, a existencia de contingencias sociais, políticas, econômicas que exercem influencia na formação do jovem e que afetam o curso do seu desenvolvimento. Nesse complexo entrelaçamento das esferas biológica, psicológica e social que exercem influencia no desenvolvimento, duas questões são de considerável importância: 1) falta de recursos materiais; 2) falta de afeto. Esses dois elementos, quer separadamente, quer combinados, tornam o conjunto de mudanças que marcam a adolescência inescapavelmente estressantes. Em relação à primeira questão constata-se o aumento e aprofundamento da condição de pobreza entre crianças e jovens. Conforme relato de um recente artigo, a Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou os resultados de uma pesquisa, apontando para o fato de que, no Brasil, existem 32 milhões de crianças e adolescentes entre zero e dezessete anos cujas famílias perfazem uma renda per capita de até meio salário mínimo (Revista VEJA, 1992). A pesquisa informa, também, a existência de 18 milhões de pessoas com mais de quinze anos que não sabem ler e escrever, de 2,8 milhões de jovens entre dez e quatorze anos que trabalham, e o dado alarmante de que em cada cem crianças, setenta e três não conseguem concluir o primeiro grau.

Estes dados atestam a chamada demografia da destituição (Resnick e Hibbard, 1988) que limita as oportunidades, compromete a passagem da infância para a adolescência, da adolescência para a maturidade de vez que impede a adoção de papéis adultos, que na nossa cultura são demarcados pela saída da escola, procura de trabalho, mudança de casa dos pais, constituição da família. A segunda questão que também afeta o jovem em desenvolvimento diz respeito à afeição ou desafeição. Há estudos indicando (Hirsch, Moos e Reischl, 1985) que uma relação favorável com a família e os amigos contribui para aumentar a auto-confiança, ajudando, também, a reduzir a depressão. Tais pesquisas indicam que um relacionamento de boa qualidade com adultos e iguais é associado a um funcionamento psicológico adequado.

A literatura psicológica apresenta, também, um número crescente de estudos (Daniels e Moos, 1990) que apontam para a necessidade da compreensão dos fatores que contribuem para o bem-estar físico e psicológico entre adolescentes. Apesar da evidência de que é necessário investigar tanto os fatores de risco quanto os de bem-estar, a maioria das pesquisas focaliza um dos aspectos apenas, fornecendo, assim, uma visão parcial do impacto desses fatores no desenvolvimento. Garmezy (1983), por exemplo, salienta em seus estudos as chamadas "condições de risco". Werner (1987), por outro lado, enfatiza fatores de resiliência. Moos (1986) relaciona em seus trabalhos os conceitos de estressores de vida e de apoio social, propondo-se a investigar dificuldades relacionadas às condições de vida bem como os recursos sociais e psicológicos que são expressos através de sentimentos de apoio e de ajuda. Este autor conceitualiza tais condições como dois conjuntos de fatores contextuais e de socialização que exercem influência sobre o bem-estar dos indivíduos. Holahan e Moos (1987) defendem esta perspectiva por acreditarem que esta linha de trabalho: a) possibilita uma descrição mais acurada dos contextos de vida; b) examina os recursos sociais que podem ser utilizados para lidar com situações de stress; c) e, no caso de adolescentes, pode ajudar na formulação de programas de intervenção destinados a esta faixa etária.

Uma das grandes questões da área prende-se à necessidade de verificar qual o papel que eventos de vida negativos, condições de estresse e escassez de recursos sociais exercem na determinação da problemática adolescente. Ao mesmo tempo que se deve examinar, também, quais os aspectos que possibilitam ou suavizam as dificuldades de adaptação deste período. Dificuldades na família, na escola e nas relações com amigos e colegas são frequentemente associadas a sintomas de depressão e disfunções sociais e comportamentais (Conger e Petersen, 1984). Por outro lado, a pesquisa contemporânea parece dedicar pouca atenção ao argumento de que o relacionamento positivo com colegas é um elemento indispensável para o desenvolvimento social. De fato, encontramos mais estudos enfatizando a influência negativa dos grupos, especialmente no que diz respeito ao uso de drogas e ao aumento de comportamentos violentos.

O presente estudo conceitualiza estressores de vida e indicadores de apoio social como construtos relacionados, baseando-se na concepção de Moos (1986) de que estes dois conjuntos exercem influência mútua, especialmente em contextos interpessoais. Com o objetivo de pesquisar estas questões procurou-se verificar através do auto relato de adolescentes, as condições internas à instituição escola: a) quais os eventos relacionados às experiências escolares; b) como se apresentam as relações interpessoais com colegas; c) como se apresentam as relações interpessoais com os professores. A questão que se coloca é como o adolescente se sente no ambiente da escola uma vez que são precisamente durante estes anos que a escola deve propiciar um ambiente em que fatores pessoais, emocionais, cognitivos, sociais e políticos se aglutinem positivamente, contribuindo para alicerçar o curso do desenvolvimento prospectivo. Será que os jovens que permanecem na escola recebem da mesma o apoio de que necessitam? Ou será que a escola contribui para aumentar os inúmeros problemas que os adolescentes enfrentam? O interrelacionamento entre as diversas esferas da vida, as influências recíprocas de como as transformações físicas repercutem no desenvolvimento emocional, como o emocional afeta o cognitivo, ou de como o ambiente sócio político afeta as aspirações profissionais não estão inteiramente esclarecidos. Inquestionável é que a escola deveria ser um ambiente onde o estabelecimento de relações de confiança com adultos e companheiros possibilitasse a facilitação de um clima propício para o crescimento pessoal e o desenvolvimento intelectual. Em pesquisa realizada com jovens da primeira série do segundo grau (Günther, 1991), constatou-se que os adolescentes estabeleceram uma distinção entre o que é ensinado/aprendido na escola, considerado "desinteressante, chato, irrelevante" para suas vidas, e a vida social com os amigos, avaliada como a melhor e mais estimulante porção que tal instituição oferece. O passo seguinte, que constitui este estudo, foi verificar a existência, ou não, de problemas na escola, ao nível de participação em grupos e equipes, nas relações com companheiros e professores.

Procuramos investigar estressores de vida e indicadores de apoio social relacionados à vida escolar de adolescentes, objetivando responder às seguintes questões: 1) Quais os eventos positivos e negativos relacionados às experiências escolares? 2) Como se apresentam as relações sociais com os colegas? 3) Como se apresentam as relações sociais com os professores? Este trabalho representa parte de um estudo mais amplo que utiliza o Inventário de Estressores de Vida e Recursos Sociais, versão juvenil (Moos, 1986).

 

Método

Sujeitos

O grupo de respondentes é constituído por 160 adolescentes, sendo 89 do sexo feminino e 71 do sexo masculino, matriculados na sétima série do primeiro grau de um colégio da rede oficial de ensino de Brasília. A idade dos sujeitos variou entre 12 anos e 2 meses e 17 anos e 6 meses, sendo a idade média de 14 anos e 4 meses.

Instrumento

Foi utilizado o Inventário de Estressores de Vida e Recursos Sociais, desenvolvido por Moos (1986). Esse instrumento fornece uma avaliação integrada em oito domínios relacionados à vida dos jovens: saúde física, moradia e dinheiro, relacionamento com os pais, com os irmãos, com a família extensa, na escola, com amigos, e com o/a namorado/namorada. Este inventário foi inicialmente traduzido, adaptado e testado em 300 adolescentes, com o objetivo de adequá-lo a uma população com nível de leitura e compreensão correspondente à quinta série do primeiro grau.

Procedimento

O instrumento foi aplicado coletivamente às sete turmas da 7a série. A aplicação ficou sob a responsabilidade de dois membros da equipe de pesquisa e da psicóloga da instituição de ensino, no contexto de um trabalho de acompanhamento que vem sendo desenvolvido na instituição. As instruções foram lidas pelo aplicador, sendo enfatizada a confidencialidade das respostas. Durante a aplicação questões individuais foram esclarecidas, com o objetivo de assegurar a completação apropriada do instrumento.

 

Resultados

A subescala aqui considerada é constituída por três componentes e levanta dados sobre o ambiente da escola. O primeiro componente contém onze questões relacionadas a eventos positivos ou negativos no âmbito da escola. Um segundo conjunto, formado por onze itens, avalia a existência de problemas interpessoais e/ou a existência de sentimentos de suporte e empatia no relacionamento com colegas. Finalmente, o terceiro conjunto de onze itens avalia a existência de problemas interpessoais e/ou de suporte e empatia no relacionamento com professores.

Eventos positivos e negativos na escola

A primeira questão deste estudo é: "Quais os eventos positivos e negativos relacionados às atividades escolares?". Para responder a esta pergunta, o primeiro componente da subescala será considerado. A Tabela 1 apresenta os itens deste primeiro componente, bem como as ocorrências, ou não, destes eventos.

Como foi mencionado, este conjunto é formado por dois grupos: o de eventos ditos 'positivos* e o de eventos 'negativos'. Do primeiro grupo fazem parte os itens a) fazer parte de alguma equipe, f) receber alguma recompensa, g) algum professor influenciar, h) entrar na turma preferida, j) mudar para uma escola melhor. Em média, os respondentes mencionaram 1.9 eventos positivos. No segundo conjunto estão incluídos os itens b) tentar fazer parte de uma equipe sem conseguir, c) meter-se em algum problema na escola, d) ser suspenso das aulas, e) repetir o ano, i) ser deixado de lado pelos amigos, j) mudar para uma escola pior. Em média, os respondentes mencionaram 0,76 eventos negativos. Quanto ao último item, (j) mudar de escola, há que se ressaltar que vinte e oito sujeitos indicaram que a nova escola não é melhor, nem pior que a anterior, quatro não responderam à questão e sessenta e oito informaram que não mudaram de escola, o que significa, no caso, que estão repetindo o ano. Esta última informação já foi computada como um evento negativo.

Quando perguntado 4 A quantas organizações da escola você pertence?', 113 (70.7%) respondentes indicaram 'nenhuma', 24 indicaram 'uma', 14 'duas', seis 'três' e três indicaram 'quatro ou mais'. Considerando o papel central que a escola deveria desempenhar na vida dos adolescentes que a frequentam, chama atenção a grande percentagem (70.7%) de respondentes que indicaram não pertencer a nenhuma organização na escola, bem como o pequeno número, um total de 47 (25 %) que indicaram pertencer a uma ou mais organizações da escola.

Comparando o resultado do grupo feminino com o do grupo masculino, no que se refere aos eventos positivos, verifica-se na Tabela 2 uma média superior de eventos positivos relatados pelas adolescentes (2.04) do que pelos adolescentes (1.72) não sendo a diferença entre os grupos estatisticamente significativa. No caso dos eventos negativos, a média é, também, mais alta para as adolescentes (0.84) do que para os adolescentes (0.66) e, novamente, a diferença entre os dois grupos não é estatisticamente significativa.

Relações sociais com colegas

A segunda questão formulada neste estudo é de como se apresentam as relações sociais com os colegas. Para responder a esta pergunta, foram analisados os itens do segundo sub-conjunto da escala em questão. Na Tabela 3, apresentam-se as respostas médias a onze quesitos sobre este tema.

O conjunto de itens foi submetido a uma análise fatorial, com rotação varimax. Foram encontrados três fatores no que se refere ao relacionamento com colegas. O primeiro fator agrupou os indicadores de apoio social, composto pelos seguintes quatro quesitos: e) algum colega da escola realmente entende como se sente; i) algum colega na escola respeita sua opinião; g) algum colega na escola procura animá-lo quando você está triste ou preocupado; a) você pode contar com a ajuda deles. O resultado de uma análise de fidedignidade com estes quatro itens sugere que o último deve ser deixado de lado, obtendo-se, assim, um índice de fidedignidade Cronbach a = 0.80. O segundo fator incluiu os estressores sociais, composto pelos seguintes quatro itens: b) discussões verbais com algum colega na escola; f) algum colega na escola o/a deixa nervoso(a); h) algum colega fica zangado ou perde a paciência com você; c) troca de agressão física com algum colega na escola. A análise de fidedignidade indicou um a de Cronbach de 0.76 para estes quatro itens. Um terceiro fator reuniu os itens d) algum colega que o/a critica ou desaprova e j) algum colega da escola espera muito de você. Considerando que a correlação entre estes dois itens é apenas r - 0.33, não se criou um índice a partir dos mesmos. O último item, "existe pressão para competir pelas melhores notas com outros estudantes da escola?", não obteve carga fatorial para nenhum dos três fatores.

Comparando os resultados dos sujeitos desta amostra no que se refere aos indicadores de apoio social no relacionamento com colegas, verificamos (Tabela 4), no que se refere às adolescentes, que a média de apoio relatado é maior (3,67) do que entre os adolescentes (2,92) e que o resultado do t-teste para amostras independentes é altamente significativo (t - 4,36, p < 0.000). No que se refere aos indicadores de estressores sociais no relacionamento com colegas, verificamos que a média dos jovens (2,14) é maior do que a das jovens (1,92) e que o resultado do t-teste não é significativo (t - 1,51, p = 0.133).

A terceira pergunta deste trabalho diz respeito ao relacionamento entre os respondentes e seus professores. Para responder a esta pergunta, foram analisados os itens do terceiro sub-conjunto da escala em apreço. Na Tabela 5 apresentam-se as respostas médias às onze questões sobre este tema.

O conjunto foi submetido a uma análise fatorial com rotação varimax, da qual resultaram quatro fatores. O primeiro fator reúne cinco variáveis de apoio social: e) professor realmente entende como se sente; a) pode contar com a ajuda do professor; i) professor respeita sua opinião; g) professor procura animar quando está triste; e k) professores e alunos se divertem, riem ou brincam juntos. Uma análise de fidedignidade indica um Cronbach a de 0.77. O segundo fator reúne quatro variáveis de estressores sociais: h) professor fica com raiva/perde a paciência; d) professor critica, desaprova; f) professor deixa você nervoso; e g) professor espera demais. O resultado da análise de fidedignidade sugere que o último item seja deixado de lado, resultando, assim, um alpha de Cronbach de 0.71. Os dois itens b) ter discussões verbais e c) trocar agressões físicas resultaram no terceiro e quarto fator, respectivamente.

Comparando os resultados quanto aos indicadores de apoio social no relacionamento com professores, verificamos que os adolescentes masculinos relatam uma média de apoio maior (2.97) do que adolescentes femininas (2.69). Quanto aos indicadores de estressores sociais no relacionamento com professores verificamos que os sujeitos femininos apresentam maior média (2.27) do que os sujeitos masculinos (2.15). No que se refere aos indicadores de discussão com os professores, as jovens apresentam maior média (1.39) do que os jovens (1.37) e, quanto aos indicadores de agressão, os jovens apresentam média superior (1.05) às jovens (1.00). Os resultados dos t-testes não foram estatisticamente significativos.

 

Discussão

Este estudo teve como propósito responder às seguintes questões: Quais os eventos positivos e negativos relacionados às experiências escolares? Como se apresentam as relações sociais com os colegas? Como se apresentam as relações sociais com os professores? O quadro geral que emerge a partir dos resultados obtidos aponta para algumas conclusões.

No que se refere à ocorrência de eventos positivos e negativos, os sujeitos como um todo relataram maior número de eventos positivos do que de eventos negativos. Diferenciando as respostas por sexo, verificou-se que as alunas apresentam maior frequência tanto de eventos positivos, quanto de eventos negativos. Estes resultados são consistentes com os estudos de Blyth, Simmons e Carlton-Ford (1983) que indicam que as ocorrências da escola parecem ter um efeito mais forte em adolescentes do sexo feminino do que do sexo masculino. Outros pesquisadores, (Crockett, Petersen, Graber, Schulenberg e Ebata, 1989) contrariamente ao que foi constatado nesse estudo, registraram reações de uma maior vulnerabilidade ao contexto escolar entre adolescentes femininas, e menos custo emocional entre adolescentes masculinos. Outro resultado que merece ser salientado é o de que a entrada na sétima série foi vivida com maiores níveis de tensão por alguns dos sujeitos. Verificou-se que 15.0% indicaram ter se metido em algum problema na escola, 11.2% que tentaram fazer parte de alguma equipe não foram aceitos, 7.4% indicaram que os colegas da escola o/a deixaram de lado e 2.5% foram suspensos das aulas.

Quantitativamente, a frequência de eventos positivos foi maior do que a de eventos negativos. Tal resultado pode ser atribuído ao clima da escola, mas pode, também, guardar alguma relação com a extensão e idade média da amostra. Como foi referido, na amostra pesquisada, a idade dos sujeitos variou de 12 anos e 2 meses a 17 anos e 6 meses e a idade média foi de 14 anos e 4 meses. Nesta fase, na chamada adolescência média, a maioria dos sujeitos pode já ter desenvolvido suficientes capacidades para enfrentar as mudanças normativas deste período no que se refere ao desenvolvimento físico e cognitivo, mas, também, às modificações que ocorrem nos contextos sociais dos quais participam.

A segunda questão desse estudo investiga o relacionamento social com os colegas de escola. Comparações sobre os aspectos positivos e negativos do relacionamento social com amigos são importantes na pesquisa com adolescentes. A razão dessa importância é que as interações com os iguais ocupam mais tempo e, porque não dizer, saliência, do que as interações com adultos. Estudos que têm adolescentes como sujeitos (Cauce, Felner e Primavera, 1982) indicam que apoio social está diretamente relacionado a bem estar, mas que serve também como uma espécie de "para-choque" que ameniza os efeitos de estresse. Neste estudo, os dois fatores mais significativos que emergiram da análise fatorial foram o relacionado aos indicadores de apoio social e os indicadores de estressores sociais. Os resultados mostram média superior de apoio por parte de colegas no relato das adolescentes e, contrariamente, média superior de estressores no relato dos adolescentes. Estes dados são congruentes com a literatura (Siegel e Brown, 1988) no sentido de que existe uma relação inversa entre estes dois fatores: maior presença de apoio social implica menor estresse e menor presença de apoio social implica maior estresse. Além do mais, são, também, consistentes com os achados de Bronfenbrenner e Crouter (1983) que referem maiores dificuldades no relacionamento com colegas entre adolescentes masculinos do que entre adolescentes femininas. Tais resultados não são corroborados, entretanto, por Hirsch e Rapkin (1987) cujos dados referem maiores dificuldades entre as jovens, indicando, inclusive, um aumento de sintomas psicológicos entre adolescentes femininas da sétima série, quando comparadas com os jovens. Vemos, assim, que os estudos apontam para diferenças, mas que a direção dessas diferenças nem sempre é a mesma. Assim sendo, é prudente assentar que os resultados aqui apresentados guardam estreita relação com a amostra estudada e que só pesquisas futuras com outros grupos, poderão esclarecer esta questão.

Um outro dado que chama atenção diz respeito aos itens com conteúdos de expectativa, crítica, desaprovação e pressão para competir que apresentaram cargas fatoriais baixas ou inexistentes. Será que não existem tais componentes no relacionamento entre colegas, ou os sujeitos optaram por não relatá-los? Esta nota de cautela deve ser expressa uma vez que os dados deste estudo são baseados em auto-relatos. Entretanto, considerando que os resultados indicaram que a maioria dos respondentes referiu estar satisfeito com seu grupo, uma vez que 57.7% indicaram ter entrado na turma que gostariam de entrar e que quase 90% não foram rejeitados na tentativa de fazer parte de alguma equipe, a predominância de aspectos positivos advindos destes dados e originados dos auto-relatos pode ser aceita como legítima.

Para responder à questão quanto ao relacionamento aluno x professor verificou-se, através da comparação entre os sexos, que a média de apoio percebido por parte do professor foi maior no relato dos jovens. A média de estressores relatada foi, entretanto, maior entre as adolescentes. Observa-se, assim, um resultado oposto ao encontrado no relacionamento com colegas. É interessante notar, todavia, que a relação mais apoio menos estresse, menos apoio mais estresse foi mantida.

O que chamou particularmente atenção neste estudo foi o número relativamente pequeno de alunos que expressam experiência de sucesso no contexto da escola. A maioria dos respondentes parece ter aprendido que não é tão competente em tarefas valorizadas por adultos significativos.

Como acontece com estudos que examinam territórios relativamente inexplorados, este estudo gerou muitas questões. Por exemplo, quais as razões das diferenças de gênero no relacionamento com iguais e professores? Em que medida o sexo do professor tem um papel nestas diferenças? Quais as dimensões do maior sentimento de apoio? Confiança, companheirismo, aliança, lealdade? Qual a função diferencial do relacionamento aluno x professor na adaptação à escola? Quais as funções do apoio e do estresse no relacionamento com colegas e professores? A necessidade de pesquisas que respondam a estas questões é evidente, especialmente em escolas onde os alunos apresentam tanto falta de recursos materiais quanto emocionais e em que, portanto, esse processo envolvendo mudança e adaptação pode se apresentar intensificado.

 

Referencias Bibliográficas

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