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Temas em Psicologia

versão impressa ISSN 1413-389X

Temas psicol. vol.11 no.1 Ribeirão Preto jun. 2003

 

 

Violência contra crianças e discurso jurídicoI

 

Violência contra crianças e discurso jurídico

 

 

Edinete Maria RosaI; Eda Terezinha de Oliveira TassaraII

I Universidade Federal do Espírito Santo
II Universidade de São Paulo

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O objetivo de nossa pesquisa foi investigar a formação dos argumentos utilizados por juízes ao emitirem sentenças judiciais a respeito de crimes de maus tratos contra crianças. Foram estudados nove processos de uma vara criminal abrangendo o período de 1995 a 2000. O tratamento dos dados se deu identificando os argumentos presentes nas sentenças buscando os sentidos contidos nas premissas e conclusões assim como sugerido por Piaget no que se refere aos sistemas de significação. Os resultados apontam que o discurso jurídico, naqueles nove processos, a respeito dos maus tratos contra crianças é composto, em sua maior parte, de um raciocínio falacioso pautado em crenças e valores que legitimam a opressão e o poder dos pais. Os juízos implícitos nas conclusões dos processos revelam a "fragilidade" da lei em relação à identificação de crimes na relação entre pais e filhos.

Palavras-chave: Violência contra crianças, Sistema de justiça, Discurso jurídico.


ABSTRACT

The aim of our research was to investigate the formation of the arguments used by judges at official legal decisions about crimes of ill-treatment against children. We have studied 9 processes at a criminal jurisdiction, between 1995 and 2000. For data analysis we considered the arguments of the judges recorded in the judicial sentences. Data were construed as we identified the senses used by judges in the arguments and conclusions, as suggested by Piaget in relation to signification systems. Results indicated that the legal speech about ill-treatment of children was composed, in those 9 processes, mainly of a fallacy, an idea based on beliefs and values that are in agreement with oppression and power of the fathers. The judgment embedded in the conclusions of the processes review a fragility of the law related to the identification of crimes occurring through the relationship between father and son/daughter.

Keywords: Violence against children, Systems of justice, Juridical discourse.


 

 

Este trabalho teve como objetivo estudar a formação dos discursos jurídicos a respeito da violência contra crianças, encontrados em nove processos judiciais em uma comarca do Estado do Espírito Santo. Os processos constituíam todo o universo do período compreendido de 1995 a 2000 de crimes que chegaram à instância máxima do sistema de justiça naquele município e que já possuíam uma sentença. Ao todo foram encontrados 13 processos, porém somente nove haviam sido concluídos. O principal material de análise consistiu dos textos sentenciais presentes nos processos. Nossa hipótese era de que neles encontraríamos os argumentos compostos por premissas, recolhidas dos processos, que motivaram a decisão do juiz quanto ao reconhecimento, ou não, das ações dos réus como uma prática violenta contra seus filhos. Para realizarmos tal estudo analisamos o discurso jurídico aplicando os conhecimentos da lógica tendo como um importante referencial a teoria de Piaget no que se refere aos sistemas de significação lógico e não lógicos.

A violência contra crianças manifesta-se de várias formas e está descrita em vários artigos do Código Penal Brasileiro. Porém, nesse trabalho nos interessou somente o crime de maus tratos, descrito no artigo 136 do Código Penal Brasileiro:

Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina. Demandou-se muito tempo para que a prática de maus tratos contra filhos viesse a configurar uma infração. Na história do Brasil temos vários registros de crianças que eram tratadas de modo desumano e negligenciadas nos aspectos mais básicos da sobrevivência, como na alimentação e na saúde. Vários eram os episódios que demonstravam um valor inferior da criança em relação ao adulto. Neves (1993), por exemplo, narra que as crianças negras, na época da escravidão, quando doentes, eram entregues à própria sorte, pois a aquisição de outra criança custava menos que as despesas com sua saúde. Esse é um dos muitos exemplos que temos na literatura (Costa, 1989; Del Priore, 1991 e 1999).

As leis que vigoraram até o início do século XIX e que tratavam da criança eram dedicadas àquelas que tinham uma situação irregular: abandonadas, filhos ilegítimos, ou órfãos. Mas o poder familiar, termo utilizado a partir de 11 de janeiro de 2003 quando entrou em vigor o Novo Código Civil brasileiro, é apontado pelos juristas como uma das mais antigas normas sociais que teve, no Brasil, modificações legais significativas no último século principalmente porque o Brasil foi um dos primeiros países a cumprir com o acordo da Convenção Internacional dos Direitos da Criança aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 1989.

A Constituição Federal de 1988 já havia dedicado alguns artigos à garantia do direito da criança e do adolescente porque grandes eram as cobranças mundiais de uma postura política em defesa dos direitos humanos, principalmente devido às severas violações quando se tratava da população infanto-juvenil. Dentre os avanços trazidos pela Constituição estavam o de declarar serem a criança e o adolescente "Prioridade Nacional", e o de estabelecer a participação comunitária nas questões sociais estabelecidas no artigo 204, que resultou posteriormente na formação dos conselhos de direitos e tutelares.

Os direitos garantidos na Constituição foram regulamentados em 13 de julho de 1990, pela lei federal 8.069, intitulada "Estatuto da Criança e do Adolescente" – ECA. Avançando em relação à Constituição, o Estatuto foi ainda mais fiel às normas internacionais das Nações Unidas estabelecidas pelas Regras de Beijing e pela Convenção dos Direitos da Criança (Lahale, 1992).

A proteção contra a violência está explicitada no artigo 5º do ECA que diz: "Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão; punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais" (Ministério Público do Estado do Espírito Santo, 2002, p. 35). O descumprimento desse artigo pode resultar em suspensão do poder familiar.

O poder familiar, até 1962, era exercido somente pelo homem, conforme o Código Civil de 1916, definido como "chefe da sociedade conjugal" (Rodrigues Filho, 1996). Com o Estatuto da Mulher Casada, lei de 17/08/62, o poder familiar passa a ser de competência dos pais, porém a mãe é, simplesmente, colaboradora. Finalmente, o art. 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente veio revogar aquele dispositivo do Código Civil, e conferir igualdade de condições ao pai e a mãe, quanto ao exercício do poder familiar.

Assim também, o novo Código Civil estabelece que o poder familiar compete aos pais e na falta ou impedimento de um deles, o outro exercerá com exclusividade (art. 1.631). O poder familiar pode então ser suspenso, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente, quando os pais descumprirem o Código Civil, que trata de abuso de poder no art. 1.637, e de castigo imoderado no art. 1.638. O código ainda acrescenta o descumprimento dos deveres e obrigações previstos no art. 22 do Estatuto: sustento, guarda e educação.

 

Os trâmites no sistema de justiça: a aplicação do Direito

O inquérito

O inquérito policial é a primeira ação de que o Estado dispõe para investigar um delito, não constituindo ainda uma ação penal. Na literatura consta que o inquérito é um procedimento que antecipa e prepara a ação penal, servindo como "garantia contra apressados e errôneos juízos, que poderiam advir no momento de trepidação moral causada pela proximidade do fato delituoso" (Rocha, 2000, p. 25).

Sempre que um fato criminoso é comunicado à polícia, ela deve determinar a abertura de um inquérito que se inicia com a portaria da autoridade policial ou com o auto de prisão em flagrante, e termina com o relatório do delegado. "Será sempre escrito, dele fazendo parte certidões, mandados, elementos de prova, etc., o que se convencionou chamar de autos do inquérito policial" (Rocha, 2000, p. 26-27).

O inquérito deve conter o máximo de informações e provas, até o ponto de se considerarem elucidadas a materialidade dos fatos e a autoria do crime. Nos casos de violência física, a materialidade geralmente é obtida por meio de exames médicos, relatos de testemunhas e relato da vítima; a autoria, por seu turno, é indicada pelo próprio depoimento do agressor e também pelos relatos das testemunhas e vítima.

O inquérito deverá ser encaminhado no prazo de 30 dias para uma vara criminal do município onde ocorreu o fato e se transformará em processo judicial. Nos casos de flagrante delito a Delegacia tem o prazo máximo de 10 dias para concluir o inquérito.

O processo

Até meados da Idade Média não havia uma distinção entre o inquérito e o processo. Os conflitos, até essa época, eram resolvidos por meio de provas as vezes fazendo parte da cerimônia as testemunhas que emitiam alguma informação sobre os fatos (Foucault, 1999).

Com a emergência da noção de Estado houve uma divisão formal entre processo e inquérito1 e o último constitui parte importante do processo, uma vez que pode constituir as premissas para as resoluções do juiz. A principal característica do processo é que ele reúne as opiniões dos operadores do direito a respeito do delito analisando o conteúdo dos inquéritos e concluindo na aplicação do direito sob a forma de emissão de um juízo sobre o fato apontado como um delito, atividade última exclusiva do Juiz.

Desde o Código de Napoleão (1804) até os dias atuais, o raciocínio jurídico sofreu grandes alterações. Com o objetivo de acabar com a corrupção da justiça característica do Antigo Regime, a escola da exegese pretendia reduzir o direito à lei, impondo técnicas de raciocínio jurídico (Perelman, 2000). Mas a partir da segunda metade do século XIX, uma nova filosofia concebe o direito não mais como um sistema que os juízes devem aplicar – utilizando-se para isso de métodos dedutivos – mas "um meio do qual se serve o legislador para atingir seus fins, para promover certos valores" (Perelman, 2000, p. 70). Como esses valores não podiam estar enunciados, ou evidenciados, pois poderiam introduzir no direito "uma indefinição e uma insegurança inadmissíveis" (p. 70), o juiz devia "remontar do texto à intenção que guiou sua redação, à vontade do legislador, e interpretar o texto em conformidade com essa vontade. Pois o que conta, acima de tudo, é o fim perseguido, mais o espírito do que a letra da lei" (Perelman, 2000, p. 71).

Toda a rigidez na aplicação da lei na Idade Média cederá espaço à influência dos valores sociais e morais aceitáveis em uma dada sociedade. As soluções apoiadas nesses parâmetros não serão mais consideradas extrajurídicas, como o seriam no positivismo jurídico. Pelo contrário, "são os juízos de valor, relativos ao caráter adequado da decisão, que guiam o juiz em sua busca daquilo que, no caso específico, é justo e conforme ao direito, subordinando-se normalmente esta última preocupação à precedente" (Perelman, 2000, p. 114).

Essa característica de uma prevalência dos valores à "letra da lei" fez com que o foco da ação jurídica passasse da busca da verdade sobre os fatos à busca "de uma escolha, de uma ação, consideradas justas, eqüitativas, razoáveis, oportunas, louváveis, ou conformes ao direito" (Perelman, 2000, p. 140). Certamente, essa nova concepção da aplicação do direito delegou um poder muito grande ao juiz e relativizou o poder do legislativo no campo da promoção da justiça. O juiz já não terá o papel de "uma boca pela qual fala a lei", diz Perelman (2000), pois "a lei já não constitui todo o direito; é apenas o principal instrumento que guia o juiz no cumprimento de sua tarefa, na solução de casos específicos" (p. 222). Esse entendimento esclarece o papel do juiz, ao mesmo tempo em que abre uma lacuna imensa entre a lei e sua aplicação, possibilitando que certos valores se apliquem quando da sua interpretação.

 

Análise dos dados

Os discursos jurídicos foram analisados a partir da explicitação dos raciocínios lógicos (compostos por argumentos ou por falácias) presentes nos enunciados que compunham as sentenças judiciais buscando revelar quais conteúdos serviam de premissas para as conclusões de um processo.

Ao analisar o desenvolvimento da lógica, Kant (1800/1992) afirma que "tudo na natureza, tanto no mundo animado quanto no mundo inanimado, acontece segundo regras, muito embora nem sempre conheçamos essas regras" (p. 29) e reconhece a possibilidade da investigação dessas regras, sendo o próprio raciocínio também regido por elas. As regras, continua Kant (1800/1992):

as quais o entendimento procede, são todas elas necessárias ou contingentes. As primeiras são aquelas sem as quais nenhum uso do entendimento seria possível; as últimas aquelas sem as quais um certo uso determinado do entendimento não poderia ter lugar. (p.30, grifos do autor.)

No mesmo sentido, Jean Piaget e Garcia (1989) desenvolveram sua teoria a partir da afirmação de que nem todo pensamento é lógico, apesar de obedecer a um determinado tipo de raciocínio fundamentado em implicações significantes. A lógica é definida então por Kant (1800/1992) como "a ciência das leis necessárias do entendimento e da razão em geral ou (...) da mera forma do pensamento em geral." (p.30). Copi (1978) a define como "o estudo dos métodos e princípios usados para distinguir o raciocínio correto do incorreto" (p.19).

O raciocínio correto seria aquele, que baseado em premissas válidas, leva necessariamente a uma determinada conclusão. Quando uma premissa é válida e emerge dos códigos de conduta aceitos em uma dada sociedade, podemos afirmar que, naquele contexto, ela também retrata uma verdade.

Os procedimentos da lógica formal caracterizam a prática e o discurso científico clássicos. Neles, as conclusões emergem por necessidade estrutural, uma vez que são implicações derivadas de argumentos. Ao contrário do pensamento do "homem comum", o pensamento científico engloba a semântica por necessidade lógica; impondo-se por necessidade lógica, ele é um argumento no qual a forma e o conteúdo não se dissociam.

Ao reconhecermos a máxima segundo a qual "o direito é a arte da argumentação", consideramos que o discurso jurídico é composto em sua maioria de argumentos, visto que "além de diversos outros fatores, tais como emocionais, psicológicos, utilitários e outros, um dos principais fatores envolvidos no convencimento de um interlocutor é um raciocínio bem articulado" (Araújo, 2001, p. 4).

O que caracteriza um argumento é a existência de "uma proposição dubitável, ou seja, que só pode ser aceita a partir da aceitação da verdade das outras proposições que o formam" (Araújo, 2001, p. 6). Para identificarmos os argumentos presentes no discurso, precisamos identificar os enunciados do texto, identificando os indicadores de conclusão e os indicadores de premissas. Araújo (2001, p. 9), por exemplo, elenca diversos indicadores de conclusão ("logo, portanto, assim, assim sendo, resulta que, então, conseqüentemente, segue-se que, decorre daí que, podemos inferir, podemos concluir, por conseguinte, tem-se que, de modo que, concluímos que, etc.") e indicadores de premissa ("pois, porque, desde que, pois que, como, uma vez que, já que, dado que, tanto mais que, pela razão de que, tendo em vista que, recordando que, ressaltando que, visto que, assumindo que, na medida em que, sabendo-se que, supondo que, pelo fato de que, em vista de...").

Os argumentos podem ser formados por uma ou mais premissas e uma conclusão. Os textos podem, contudo, constituir-se a partir de discursos sem argumentos e de discursos logicamente incorretos ou falácias. Os discursos sem argumentos são, conforme Araújo (2001) os comentários, as descrições, as explicações, as parábolas, as ordens, as interrogações e as exclamações.

A falácia, por sua vez, é definida por Copi (1978) "como uma forma de raciocínio que parece correta, mas que, quando examinada cuidadosamente, não o é" (p. 73). Araújo (2001) amplia essa observação ao comentar que a "invalidez da argumentação falaciosa provém de sua referência a fatores extralógicos (geralmente psicológicos: emoções, sensações, circunstâncias transitórias, etc.) como justificadores da conclusão" (p. 18). Destacaremos, então, as qualidades de algumas falácias que julgamos serem as mais interessantes para o nosso trabalho. Outros tipos de falácias podem ser encontradas em Introdução à Lógica, de Irving M. Copi (1978).

Falácia ad hominen ofensivo (contra o homem) – nessa falácia, ao invés de tentar refutar a verdade do que se afirma, ataca-se a pessoa que fez a afirmação, expondo negativamente sua conduta ou desacreditando suas capacidades intelectuais.

Falácia ad hominen circunstancial – nessa falácia, um dos antagonistas pode sustentar seu argumento utilizando-se da situação do seu "adversário". Assim, em vez de discutir aquilo que alguém diz, procura-se fazer uma relação entre as convicções expressas por essa pessoa e as circunstâncias vividas por ela.

Falácia por apelo à ignorância (ad ignorantiam) – consiste em defender que uma certa proposição é verdadeira porque não foi provado o contrário do que afirma, ou defender que seja falsa porque ninguém provou sua veracidade: "Os lógicos admitem apenas um lugar onde pode ser utilizado esse argumento de modo válido: no campo jurídico com as chamadas presunções, que são uma espécie de premissa pré-estabelecida" (Araújo, 2001, p. 22).

Falácia por apelo à piedade (ad misericordiam) – nesse tipo de raciocínio faz-se apelo à piedade ou à compaixão para conseguir que uma determinada conclusão seja aceita: "Este argumento encontra-se, com freqüência, nos tribunais de justiça, quando um advogado de defesa põe de lado os fatos pertinentes ao caso e trata de ganhar a absolvição do seu constituinte despertando a piedade dos membros do júri" (Copi, 1978, p. 78).

Falácia por apelo ao povo (ad populum) – nesse "argumento" recorre-se aos sentimentos do povo, aos seus hábitos e costumes, para provocar a concordância com uma determinada conclusão que não é sustentada por boas provas: "Aproveita-se de uma crença generalizada (algo que 'todo mundo sabe') ou de uma prática comum (algo que 'todo mundo faz') para convencer a aceitação de uma idéia como verdadeira, de um produto como bom ou de uma novidade como positiva" (Araújo, 2001, p. 24).

Falácia por apelo à autoridade (ad verecundiam) – é fundamentada no "sentimento de respeito que as pessoas alimentam pelos indivíduos famosos para granjear a anuência a uma determinada conclusão" (Copi, 1978, p. 81). Além de utilizar ilustres personalidades para o convencimento de uma conclusão, essa falácia pode utilizar-se do 'critério do mais velho', ou seja, do julgamento de alguém que deve estar certo apenas por ser mais velho ou experiente.

Falácia em acidente (exceção à regra) – "A falácia de acidente consiste em aplicar uma regra geral a um caso particular, cujas circunstâncias 'acidentais' tornam a regra inaplicável" (Copi, 1978, p. 82).

Falácia por acidente convertido (generalização apressada) – consiste no inverso da anterior: tirarmos conclusões a partir de casos acidentais, particulares, aplicando-as de um modo geral: "Aquilo que é afirmado em circunstâncias atípicas passa a ser afirmado dogmaticamente como regra geral. Também ocorre quando a observação dos fenômenos é mal feita ou insuficiente, daí uma conclusão apressada e falaciosa" (Araújo, 2001, p. 26).

Falácia por falsa causa – pode ocorrer de duas formas: a primeira "quando se toma por causa aquilo que na realidade não o é: trata-se de uma causalidade arbitrária e presa aos dados imediatos" (Araújo, 2001, p. 27); e a segunda "quando se toma por causa um determinado fenômeno que antecede outro, simplesmente por ter ocorrido anteriormente" (Araújo, 2001, p. 27).

Falácia por petição de princípio – nessa falácia repete-se a proposição a ser justificada, ou seja, a mesma proposição ocupa o lugar de premissa e de conclusão no mesmo raciocínio.

Falácia por conclusão irrelevante – "o argumentador procura inferir a conclusão de um ‘argumento’ a partir de premissas que indicam para outras conclusões ou até mesmo para uma conclusão contrária à inferida." (Araújo, 2001, p. 29.)

O discurso lógico é constituído por argumentos, mas nem sempre suas premissas apresentam-se de forma explícita na fala, embora seus sentidos a componham. Por isso a necessidade de recorrermos à análise do discurso para compreendermos não só os argumentos explícitos, mas também aqueles que, implícitos, dão sentido à fala. A análise do discurso é uma teoria e um método de investigação que surgiu recentemente, por volta dos anos 60 e 70, estando sua história inicialmente associada à lingüística, tendo como uma espécie de "patrono" a histórica figura de Ferdinand Saussure1.

O recorte do objeto de estudo na análise do discurso é definido por Orlandi (1999) como sendo o "texto". Mas "a noção de texto, enquanto unidade de análise de discurso, requer que se ultrapasse a noção de informação" (p. 21). Koch (2000), também a respeito de "texto", defende a posição de que:

a. a produção textual é uma atividade verbal, a serviço de fins sociais e, portanto, inserida em contextos mais complexos de atividades;
b. trata-se de uma atividade consciente, criativa, que compreende o desenvolvimento de estratégias concretas de ação e a escolha de meios adequados à realização dos objetivos; isto é, trata-se de uma atividade intencional que o falante, de conformidade com as condições sob as quais o texto é produzido, empreende, tentando dar a entender seus propósitos ao destinatário através da manifestação verbal;
c. é uma atividade interacional, visto que os interactantes, de maneiras diversas, se acham envolvidos na atividade de produção textual.(p. 22)

Todo texto produz sentidos; porém, ainda conforme Koch (2000), "o sentido não está no texto, mas se constrói a partir dele, no curso de uma interação" (p. 25, grifos da autora). Essa construção de sentido, no entanto, é uma produção e está inscrita num todo lingüístico produzido por uma determinada sociedade, ou por uma parcela desta. O sentido é, portanto, social, cultural e ideológico.

Dois processos estão presentes na produção do discurso, de forma a se tornarem vias pelas quais podemos perceber os sentidos presentes no texto: o processo parafrástico e o processo polissêmico. "O processo parafrástico é o que permite a produção do mesmo sentido sob várias de suas formas" (Orlandi, 1999, p. 20), ou seja, "quando digo a mesma coisa duas vezes, há um efeito de sentido que não me permite identificar a segunda à primeira vez, pois são dois acontecimentos diferentes" (Orlandi, 1999, p. 119).

Já o processo polissêmico é responsável pelo fato de que são sempre possíveis sentidos diferentes, múltiplos, a uma mesma construção significante. O sentido, então, "não existe em si, mas é determinado pelas posições ideológicas colocadas em jogo no processo sócio-histórico em que as palavras são produzidas" (Orlandi, 1999, p. 58) e que se materializam nas formações discursivas, constituindo o sentido do discurso e permitindo a identificação do sujeito dentro de um determinado contexto ideológico.

Podemos afirmar ainda que o sentido do texto é pré-determinado pela formação ideológica, mas que esse sentido só se realiza no discurso após concorrer com outras várias possibilidades de discursos (Chauí, 1993). Dessa forma, o sujeito é sempre um sujeito social, na medida em que se apropria de uma fala "coletiva". Ao mesmo tempo em que o discurso manifesta alguns sentidos, ele oculta outros, que acabam por gerar sentidos pela razão mesma de sua ausência.

 

Os sistemas de significação

Até 19762, Piaget admitiu que a estrutura mental funcionava classificando e ordenando/seriando. Desde os primeiros meses de vida, e de forma assemelhada ao funcionamento orgânico, a criança (e depois também o adulto) desenvolve sua atividade mental pela assimilação e acomodação (Piaget, 1937/1996). Porém, em 1977, Piaget afirma que anterior à classificação e à ordenação existe a inferência e "a capacidade que o ser humano tem de inferir é responsável pela construção dos sistemas de significação que constituem a consciência" (Ramozzi-Chiarottino, 1991, p. 22).

Analisando os resultados fornecidos por seus experimentos, Piaget foi induzido a acreditar que desde muito cedo o pensamento humano constitui-se de significações. No período sensório-motor tais significações estão associadas à utilidade das ações, sendo as próprias significações o resultado da assimilação de objetos a esquemas já formados, ou seja, fruto de interpretações (Piaget e Garcia, 1989). No período sensório-motor e, também, num nível pré-operatório, a significação de um objeto, "é o que podemos fazer com ele (...), é também o que podemos dizer dos objetos (...) ou ainda o que podemos pensar dos objetos" (Piaget e Garcia, 1989, p. 148).

No percurso de seu desenvolvimento, a criança vai percebendo as relações de condições prévias e um conjunto de resultados que acompanham suas ações, até chegar à capacidade de abster-se de atuar materialmente e limitar-se a antecipar o que pode fazer, inclusive evitando os erros. A essa capacidade cognitiva Piaget e Garcia (1989) deram o nome de "sistema de implicações" que difere da noção de causalidade e "permanece inicialmente implícita antes de sua tomada de consciência e de sua formulação final em enunciados" (Piaget e Garcia, 1989, p. 112).

Piaget e Garcia (1989) propõem que todas as relações, por mais elementares que sejam, não funcionam sem vínculos intra-sistêmicos. Eles distinguem, então, dois tipos de relações entre ações: as relações causais e as relações de implicação. "As primeiras estão centradas nos objetos e se referem aos resultados das ações, os quais não são constatáveis senão a posteriori. As segundas são relações entre significações e são suscetíveis de serem antecipadas" (p. 149).

Em todos os níveis, dizem os mesmos autores, "por mais baixo que seja, todo conhecimento comporta uma dimensão inferencial, por mais implícita ou elementar que ela seja" (p. 113). A inferência, de acordo com Hegenberg (1991), é a conclusão ("C") a que chegamos, afirmada com base em certas premissas (P1, P2..., Pn); é, em suma, a base do pensamento lógico. Desde pequena, afirma Piaget (1967/2001), a criança faz inferências, e isso sinaliza que ela já possui um sistema de significação, porém "nos níveis mais elementares as inferências são somente implicações entre significações" (Piaget e Garcia, 1989, p. 148).

O sistema de significações que se constitui é adquirido nas experiências do cotidiano e vai evoluindo conforme a capacidade de representar a realidade e relacionar os fatos manifestada pela criança. O bebê poderá alegrar-se ao ouvir a voz da mãe porque isso significa a presença desta. Mas entre a lógica subjacente ao comportamento do bebê e a lógica formal, Piaget detectou um período de uma "lógica concreta", característica do período das operações concretas (Ramozzi-Chiarottino, 1988). Somente quando a criança atinge o pensamento abstrato é que estará apta a responder e formular qualquer questão lógica, assim como a trabalhar com hipóteses. Isso acontece no período em que há definitivamente a noção dos conceitos ou seja, quando a criança adquire a idéia de classe de um objeto qualquer distinta da idéia de um objeto na sua singularidade. Com isso, conclui-se que existe uma lógica de significações que precede a lógica formal dos enunciados, e que essa lógica está fundada sobre implicações entre significações ou mesmo sobre implicações entre ações (Piaget e Garcia, 1989).

Ao atingir a adolescência, o ser humano pode ser capaz de raciocinar hipoteticamente, graças a todo o processo de construção das imagens que ele desenvolveu no decorrer de sua vida. Tais imagens são a interiorização da experiência pessoal de cada um, que pode ser compartilhada socialmente: sendo compartilhada, nos aspectos que ela for compartilhada e na denominação de aspectos que ela for compartilhada, ela representa o coletivo e, então, é social.

Os sistemas de significação dão visibilidade à lógica do pensamento humano, tanto na forma como tal pensamento se estrutura, sofrendo modificações com o tempo (Hegenberg, 1987), quanto nos conteúdos e valores pessoais e/ou sociais que estão presentes nos discursos. Finalmente, sem os sistemas de significação não há possibilidade de raciocínio. Por isso, não há homem que não desenvolva um sistema de interpretação do mundo. Os sistemas de interpretação do mundo geram explicações do mundo, e dessas explicações decorrem vários argumentos, várias relações entre conteúdos. Resumindo, podemos dizer que tanto os sistemas de significação lógicos como os sistemas de significação não-lógicos dependem de implicações significantes e, conseqüentemente, das inferências. A diferença é que nos sistemas lógicos as implicações são lógico-matemáticas e, por isso, universais; já nos sistemas de significações não-lógicos, as implicações são individuais, construídas com as experiências que se têm ao longo da vida.

 

Resultado

Em todos os nove processos estudados havia a denúncia de pelo menos um crime - o de maus tratos (art. 136 do CPB) - e as vítimas eram crianças com idade que variou de recém nascida a 10 anos. Dos nove processos estudados, oito haviam sido suspensos por terem sido enquadrados na lei 9099/95, que estabelece, no artigo 89, a suspensão do processo, por dois a quatro anos desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime. Essa lei possibilitou que os réus processados fossem "absolvidos", não recebendo nenhuma penalidade pelo ato que viessem a ter cometido. Podemos, certamente, supor que muitos dos crimes cometidos contra a criança enquadrem-se nesse dispositivo legal, uma vez que o mecanismo de produção de provas é frágil quando se trata de avaliar um crime contra crianças, enfraquecendo os indícios de materialidade e gravidade dos casos. Uma das justificativas para a aplicação da lei 9.099/95 baseia-se na determinação da gravidade das lesões; existe um mecanismo que determina um aumento de pena de 1/3 para os crimes cometidos contra "menores" de 14 anos. Em todo caso, esse aumento, nos casos de lesões leves, não ultrapassa um ano, o que permite aos réus serem julgados pela letra original da lei 9099/95. Somente um processo concluiu na prisão do réu devido o mesmo ter sido pego em flagrante delito, porém sua pena durou o tempo do seu processo, ou seja, trinta e cinco dias.

O material analisado consistiu das sentenças judiciais buscando dar visibilidade às premissas e conclusões que compunham os argumentos. Os textos foram analisados a partir da decomposição de suas partes (enunciados) o que nos permitiu uma análise fiel ao texto original. Apresentaremos apenas a sentença presente no caso 2 como título de demonstração de como foram apresentados os resultados.

 

Discurso jurídico

Enunciado 1

M. S. ou M. S. O., brasileira, solteira, lavadeira, natural de L., com 41 anos de idade, filha de O. M. S. e B. C. S., residente na Rua (...), foi denunciada, como incursa nas sanções do artigo 136 § 3º (sujeição de menor de 14 anos a trabalho inadequado), 244 (abandono material), 245 (entrega de filho a pessoa inidônea) e 246 (abandono intelectual), do Código Penal Brasileiro, pelo fato de obrigar sua filha F. N., de 10 anos, a trabalhar na função de babá na residência de G.C., em violação ao art. 60 da lei nº 8069/90, sofrendo a menor agressão física e sexual. Consta que por diversas vezes a menor tentou sair daquela residência, sendo impedida pela acusada. Consta que a menor recebia a importância de R$ 20,00 (vinte reais) pelo pagamento dos serviços prestados. Consta que a menor somente conseguiu sair da residência de G. C., quando ele foi preso por prática de estupro contra a menor F. N.. Consta que um filho menor da acusada vivia jogado pelas ruas, onde se envolvia com drogas e roubos, e que era espancado constantemente pela acusada e seu padrasto, e que a acusada, sem motivo aparente, deixava de prover a instrução de seus filhos em idade escolar. A denúncia teve por base o Inquérito Policial de fls. 06, que iniciou por portaria.

Recebida a denúncia em 23/11/98, foi a acusada citada e interrogada às fls 67/68. O processo foi totalmente instruído vindo conclusos para sentença

Em suas alegações finais a representante do Ministério Público argumentou que algumas das imputações finais não podem prevalecer, diante do estado de pobreza e ignorância da acusada, o que descaracteriza o dolo, e que apenas o art. 245 do CP está devidamente provado, requerendo fosse a acusada absolvida das demais acusações, e sendo esta última passiva de benefício da suspensão do processo, requeria a designação de audiência para este fim.

A defesa, por sua vez, argumentou que a pobreza e a situação precária em que vivia a acusada foram as causas dos fatos, requerendo sua absolvição."

Esse enunciado materializa uma longa descrição dos fatos composta pelos crimes atribuídos à mãe da criança pela denúncia pública.

No enunciado em questão, mostram-se as opiniões do Ministério Público e da defesa quanto ao caso, por sua vez apresentadas pelo juiz como argumentos. O Ministério Público diz:

(p) – A acusada vive em estado de pobreza;

(q) – A acusada vive em estado de ignorância;

[c] – A situação de vida da acusada descaracteriza o dolo.

A defesa diz:

(p) – A acusada vive em estado de pobreza;

(p) – A acusada vive em situação precária;

[c] – As condições de vida da acusada foram a causa dos fatos.

Ambas as conclusões redundam em falácias por falsa causa. As premissas não levam necessariamente à conclusão formada. Esse tipo de raciocínio erra por não distinguir "causa necessária" de "causa acidental". Nesse caso, as premissas constituem as causas acidentais do fenômeno.

Há, no entanto, uma outra argumentação do Ministério público:

(p) – O dolo deve ser descaracterizado;

[c] – Algumas imputações finais não podem prevalecer.

Porém, como a premissa é a conclusão de uma falácia, esse argumento torna-se também uma falácia por construção de premissa falsa. Nesse caso, só poderíamos aceitar a verdade da conclusão caso aceitássemos a verdade da premissa. Como a premissa é falsa, a conclusão também é falsa.

Enunciado 2

Estudado o processo e as provas nele existente concluí:

O crime do art. 136 do CP: "Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina", tenho que não ocorreu o trabalho excessivo e inadequado. Conforme comprovado a função da menor era tomar conta de uma criança, durante o dia, na ausência de seu genitor. Não era um trabalho excessivo, nem exaustivo, e a menor gostava de executá-lo, tendo inclusive se afeiçoado à criança, o que foi motivo para retornar ao emprego.

Esse raciocínio compõe-se da seguinte falácia:

(p) – A função da menor era tomar conta de uma criança (durante o dia, na ausência do genitor desta);

(q) – A menor gostava de executá-lo (tendo inclusive se afeiçoado à criança, o que foi motivo para retornar ao emprego);

[c] – Não ocorreu o trabalho excessivo e inadequado.

Essa é uma falácia por falsa causa, pois as premissas não levam necessariamente à conclusão oferecida. A segunda premissa é falsa, pois consta no processo que a criança não voltou a trabalhar na casa do Sr. G. por ter-se afeiçoado ao seu filho, ocorrendo antes o contrário; esse foi o argumento para que o Sr. G. voltasse à casa da criança para solicitar à mãe a volta da criança ao seu lar. Tampouco foi a criança F. que quis voltar a conviver com o Sr. G e seu filho.

A conclusão à qual chegou o juiz ignora qualquer conhecimento a respeito das peculiaridades e responsabilidades exigidas de uma pessoa ao cuidar de uma criança de cinco anos. Sabemos que é típico da criança nessa idade um comportamento ainda de desrespeito a algumas regras, de exploração do ambiente e manipulação dos objetos ao seu redor, o que exige uma atenção muito grande por parte de um adulto para evitar os perigos de tais comportamentos que resultam, muitas vezes, em "trapaças". Posto isso, avaliamos que é deveras exaustivo o trabalho de cuidar de uma criança de cinco anos para ser exercido por outra criança, de apenas 10. Além disso, o artigo 136 do CPB foi considerado apenas parcialmente, visto que constavam do processo indícios de que a situação em que a criança se encontrava colocava em perigo a sua vida e saúde.

Enunciado 3

É de salientar que em virtude da pobreza da família e do estado que a acusada se mantinha, junto com seu companheiro, grande parte do dia embriagados, tal providência era melhor para a menor F., que não teve os problemas de seu outro irmão que vivia na rua a ponto de não mais retornar para casa. Aparentemente ela não corria nenhum perigo no trabalho que executava.

O raciocínio assim se apresenta:

(p) – A família vive em grande pobreza;

(q) – A mãe e seu companheiro mantêm-se grande parte do dia embriagados;

[c] – É melhor para a criança ficar em companhia do acusado e cuidar a criança.

Trata-se de uma falácia por apelo ao povo. Nesse tipo de raciocínio, busca-se recorrer aos sentimentos e hábitos do povo para provocar a concordância com uma determinada conclusão. Nesse caso, o juiz utilizou o valor positivo que se atribui ao trabalho em nossa sociedade, em oposição ao valor negativo dado a atos como embriaguez e perambulações pelas ruas. Nesse caso, supunha-se que todos prefeririam que a criança estivesse "dentro de uma casa". A afirmativa final desse enunciado ignora as provas e depoimentos, porque contradiz os fatos narrados e atestados.

Enunciado 5

Artigo 245 do CP "Entregar filho menor de dezoito anos a pessoa em cuja a companhia saiba ou deva saber que o menor fica moral ou materialmente em perigo". Neste particular temos o depoimento da testemunha V. R. V. que diz: "Que de fato M. S., há tempos atrás, deixou a filha F. na casa de um senhor, cujo nome não se lembra agora, para tomar conta do filhinho dele; que todos tinham conhecimento de que tal senhor já havia sido preso antes por estupro, sendo que advertiram M. Para que não deixasse a menina com ele, mas M. S. nunca foi de ouvir". Embora a acusada negue desconhecer tal fato, a acusação contra ela não pode ser desconsiderada, eis que no exame de conjunção carnal da menor F. N., apresentou "hímen circular, óstio amplo, com roturas antigas às 05 e 07 horas". F. acusou seu patrão de ter mantido relações sexuais com ela. Tenho que a acusada infringiu a lei neste Particular.

O argumento do juiz, para concluir que a acusada infringiu o art. 245 do CPB, assim se apresenta:

(p) – A acusada tinha o conhecimento de que o Sr. G. já havia sido preso por estupro;

(q) – O exame de conjunção carnal da menor F. N. identificou "hímen circular, óstio amplo, com roturas antigas às 05 e 07 horas";

(r) – F. acusou seu patrão de ter mantido relações sexuais com ela.

[c] – A acusada infringiu a lei (Artigo 245 do CPB) neste Particular.

Nesse caso, as premissas levam à conclusão formada e não a alguma outra. Trata-se, portanto, de um raciocínio efetivamente lógico.

Enunciado 6

Artigo 246 do CP: "Deixar sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar". Pelas informações contidas nos autos os filhos da acusada F. e P. R. chegaram a se matricular e freqüentar a escola, mas, ambos, abandonaram os estudos. Não se pode exigir de uma pessoa analfabeta, de poucos conhecimentos, que vive na penúria, o entendimento que seus filhos devem permanecer na escola. Estes motivos no ensinamento de Heleno Fragoso, são justas causas para a isenção da pena.

O raciocínio expresso nesse enunciado realiza-se a partir de duas falácias nas quais se utilizam as mesmas premissas:

(p) – A acusada é analfabeta;

(q) – A acusada possui poucos conhecimentos;

(r) – A acusada vive em estado de penúria;

[c] – Não se pode exigir da acusada a compreensão de que seus filhos devem permanecer na escola;

(p) – A acusada é analfabeta;

(q) – A acusada possui poucos conhecimentos;

(r) – A acusada vive em estado de penúria;

[c] – Estes motivos, de acordo com o ensinamento de Heleno Fragoso, são justas causas para a isenção da pena.

Ambas as falácias são de apelo à piedade, por isso não são logicamente válidas. Na segunda, há um apelo complementar à autoridade, ou seja, o discurso é defendido como válido simplesmente porque é atribuído a uma autoridade no assunto.

Enunciado 7

Tenho que o crime do artigo 244 do CP não restou provado.

A conclusão do enunciado 4 serviu de premissa para a conclusão da falácia por falsa causa.

(p) – Os R$ 20 ganhos pela menor F. eram necessários para a subsistência de todos (conclusão do enunciado 4);

[c] – O crime do artigo 244 do CPB (sobre abandono material) não restou provado.

Enunciado 8

Os crimes dos artigos 136 e 246 do CP, embora existentes, são justificáveis, e pelo princípio da concussão deverão ser considerados consumidos pelo crime do art. 245 do Código Penal, que no parecer do Ministério Público e no entendimento deste Juiz é o único que deverá prevalecer.

A conclusão a que chegou o juiz nesse enunciado, da existência do crime do artigo 136, é contraditória em relação à idéia apresentada no segundo enunciado, o qual concluiu que "não ocorreu o trabalho excessivo e inadequado". Sendo assim, inferimos que esse juízo comporta, em parte, algumas premissas ocultas ao nível mais explícito do discurso.

Enunciado 9

Na forma do artigo 5º, XL da Constituição Federal e o art. 2º do Código Penal aplicar-se-á ao réu a lei que o beneficiar. Assim, após a entrada em vigor da Lei nº 9.099/95, tenho que nestes casos cabe ao Juiz, antes de efetuar o julgamento, apreciar a tipificação dos fatos, pois pode ocorrer que a nova tipificação esteja entre os crimes beneficiados pela referida lei, com a suspensão do processo. Tenho pois que a única tipificação para o fato é o art. 245 do Código Penal, no qual a acusada poderá ser beneficiada com a suspensão do processo. Considerando que o Ministério Público já se pronunciou pela suspensão do processo, designo o dia 26/10/99 para a audiência. Dê-se ciência às partes deste despacho. Intimem-se.

O trecho destacado trata de descrições e ordens emitidas pelo juiz. A conclusão final ("Tenho pois que a única tipificação para o fato é o art. 245 do Código Penal") tem como premissas todas as conclusões das premissas citadas anteriormente.

Enunciado 10

(Termo de audiência) "... Pelo M. M. Dr. Juiz foi dito que conforme pronunciamento do Ministério Público às folhas 109, foi feita a proposta de suspensão do processo, prevista no artigo 89, da lei 9099/95, pelo prazo de 02 anos, sob condições a serem impostas por este Juízo. Apresentadas as condições foram elas aceitas pela acusada e seu advogado nomeado. Pelo MM Juiz foi dito que concedia a suspensão do feito, pelo prazo de dois anos, condicionada à apresentação da FAC sem restrições, sob as seguintes condições: 1- Comparecer mensalmente em Juízo entre os dias 25 e 30 para justificar suas atividades; 2- Não mudar de residência sem comunicar a este Juízo; 3 – Não se ausentar da Comarca por mais de 08 (oito) dias sem autorização judicial. Abra-se vistas ao Ministério Público."

Apesar de não haver argumento nesse enunciado, uma análise mais detida do raciocínio jurídico permitirá encontrar uma falácia por petição de princípio. Nela, a proposição a ser justificada é repetição da premissa.

(p) – O ministério Público propôs a suspensão do processo por dois anos;

(q) – As condições foram aceitas pela acusada;

[c] – O juiz concede a suspensão do feito, pelo prazo de dois anos.

Em uma análise geral, tendo como base os nove processos e dos discursos jurídicos neles contidos, encontramos oito tipos de falácias. A mais utilizada foi a falácia por petição de princípio, encontrada em cinco processos (sendo que em todos ela foi adotada pelo juiz). Nesse tipo de raciocínio, a conclusão é também uma das premissas adotadas, embora tanto a premissa quanto a conclusão permaneçam carentes de demonstração. Nos casos analisados, o juiz adotou, como conclusão do julgamento, o pedido de suspensão processual feito pelo Ministério Público.

A falácia por apelo à autoridade foi encontrada em um processo, sendo que nele o Ministério Público apresentou-se, pelo discurso jurídico, como a autoridade. A falácia por apelo à ignorância foi utilizada pelo juiz em dois processos. Esse tipo de falácia é admitida no discurso jurídico, uma vez que a filosofia criminal diz que tendo sido feita a comunicação de um crime, o autor da denúncia deve provar quem é o criminoso e qual o crime por ele cometido, ao contrário da filosofia que imperava até a Idade Média, quando era o acusado que deveria provar sua inocência.

(p) – Ante a falta de atenuantes e agravantes;

(q) – Ante a falta de causas de aumento ou diminuição;

[c] – Torno a pena de trinta e cinco dias de detenção em definitiva.

A falácia por apelo à piedade foi encontrada em dois processos, utilizada pelo juiz uma vez e outra pela ré. O raciocínio presente nesse tipo de falácia exalta certas características presentes na situação do crime com o objetivo de provocar reações emocionais. Nos casos analisados, recorreu-se a situações de pobreza, ignorância e solidão para justificar os atos praticados pelos acusados. Em outros estudos a respeito de julgamentos de crimes, o artifício a falácias por apelo à piedade foi também utilizado. Em geral, expressões como "emocionalmente abalado", "sob forte emoção", "tendo se sentido traído" são utilizadas para que se consiga um sentimento de piedade e compaixão para com o réu (Corrêa, 1983; Izumino, 1998).

A falácia por conclusão irrelevante também foi encontrada no discurso jurídico, assim como a falácia ad hominen circunstancial. Nos discursos jurídicos, essa última podia facilmente ser confundida pela falácia por apelo à piedade, porque não raro as situações que envolviam os fatos eram dignas de piedade. Os exemplos abaixo são das falácias acima mencionadas respectivamente.

(p) – A ré é primária (segundo os autos);

(q) – A ré possui bons antecedentes (segundo os autos);

[c] – O MP requer a suspensão do processo.

A suspensão do processo, na verdade, deve ser aplicada considerando o crime cometido pela pessoa e não as características que ela manifesta. É o julgamento da gravidade do crime que permitirá, havendo as circunstâncias acima mencionadas, aplicar a lei 9.099.

(p) – O acusado agiu com dolo de grau médio;

(q) – O acusado é primário;

(r) – O acusado tem bons antecedentes;

(s) – O acusado é trabalhador;

(t) – A vítima contribuiu em parte para o fato;

(x) – Os motivos e circunstâncias não favorecem ao acusado;

[c] – O acusado, deve ser condenado.

Nesse argumento a presença das premissas q, r, s, t, poderiam levar o raciocínio para outra conclusão que não a condenação do réu. Além disso, a premissa p revela uma intencionalidade de descaracterizar o dolo. Nessa tentativa o juiz caracteriza uma ação (socar a filha de 2 anos contra o chão ao ponto da criança desmaiar e ficar com várias lesões no corpo) de dolo de grau médio, sendo que no nosso entender uma ação é dolosa ou não, ou seja, não existe "intenção média". A presença dessas premissas mesmo com uma conclusão onde elas se tornaram inválidas mostra uma tentativa de atenuar a condenação do réu.

Mesmo naqueles processos em que encontramos algumas vezes um raciocínio composto por argumentos corretos as premissas eram duvidosas visto todo o conteúdo do processo tal como exame médico e depoimentos das testemunhas, como podemos ver no exemplo que se segue. Nele as premissas descaracterizam o crime.

(p) – O castigo aplicado pela acusada à vítima teve intuito educacional;

(q) – A surra dada pela mãe não trouxe nenhum dano à criança;

[c] – O processo deve ser arquivado.

 

Conclusão

Analisando os casos, desde a sua comunicação até o julgamento, percebemos a ausência de investigação profunda dos fatos e o uso de um "ritual" de julgamento discursivo, que não esclarece os fatores que permitem qualificar um crime na relação de pais e filhos. O discurso, nesse contexto é capaz de produzir sentidos não a partir dos dados concretos, mesmo que escassos, presentes nos processos, mas impregnados de valores tais como os que defendem a manutenção da família sobreposto à defesa dos direitos das crianças e da prática da justiça.

Como um modelo "perfeito" de paridade dos interesses envolvidos, o sistema jurídico comporta a reunião de operadores do direito que representam as diversas pessoas envolvidas em um conflito. O que nos surpreendeu nos resultados que encontramos em todos os processos analisados foi a atuação do promotor de justiça em consonância com as idéias do juiz e do defensor público, neutralizando os interesses dos envolvidos. Esse tipo de atuação do promotor não corrobora resultados de pesquisas anteriores, que o apontavam como a pessoa que sempre acusa além da medida, em oposição ao defensor, que tenta desqualificar as circunstâncias negativas mencionadas pelo promotor (Corrêa, 1983).

Resgatando uma discussão proposta por Orlandi (1999), a repetição de um texto, de uma idéia ou de uma frase permite a produção do mesmo sentido sob várias de suas formas. Por exemplo, a descrição do acontecimento, quando narrado pelo promotor de justiça no ato de denúncia, reveste-se da idéia de crime porque a função do discurso naquele momento é caracterizar o crime e apresentar a denúncia do agressor. O mesmo fato, narrado pelo juiz no momento da sentença, adquire o sentido de motivação da resolução a ser tomada, e por isso poderia tomar a dimensão ou interpretação de um crime ou não. Quando sua convicção o levava a aceitar tal ato como crime, restava-lhe ainda, por meio do discurso, qualificar o crime como leve, médio ou grave.

Nesse sentido, uma das constatações promovida por nosso estudo foi a de que as paráfrases utilizadas no discurso jurídico das sentenças serviram, em todos os processos analisados, para aliviar a gravidade dos fatos, sendo utilizadas, quase sempre, com omissões de elementos discursivos que qualificavam a gravidade dos casos. Nos nove processos analisados, por exemplo, a palavra "violência" não constou uma vez sequer no discurso dos juízes. Dessa forma, o contorno dado aos fatos, ao se construírem os processos, permite-nos dizer que a constituição do delito estabelece-se num campo bastante restrito do que podemos considerar "violência", alargando o território de tudo aquilo que podemos classificar como "não-violência".

Ao esboçar o conteúdo do conhecimento essencialmente por significações, Piaget possibilita o estudo dos valores e crenças que subjazem ao raciocínio humano. A análise dos valores embutidos nos julgamentos aponta para uma produção discursiva em conformidade com os valores sociais adequados à manutenção da ordem social, legitimando, entre outras coisas, a relação de autoridade dos pais para com os filhos. Os valores revelados constituem as significações que se articulam pelas inferências entre os fatos, associando surras com educação, trabalho com boa formação, criança com submissão e pais com poder.

A idéia de violência que norteia a ação dos operadores do Direito, ao julgarem os crimes de maus tratos contra crianças, está em conformidade com a conceituação apresentada por Alves (1998), visto que em nenhum processo foram reconhecidas as características contidas na conceituação naqueles atos em julgamento. O autor diz que a violência é uma intervenção física que "tem por finalidade coagir, para destruir, ofender e causar dano a si ou a outrem. Se a intervenção física não tiver como fim essa ofensa, destruição ou dano, não se pode considerá-la como violência" (p. 248).

Além do juiz e do promotor não terem considerado nenhuma dessas intenções indicadas, em alguns casos eles desqualificaram a intencionalidade dos atos, atribuindo significados de um "bem que os pais estavam fazendo aos filhos". Dessa forma, sugere-se "a possibilidade de se exercer uma violência não considerável, uma violência exercida de modo ‘justo’" (Alves, 1998, p. 242). Essa idéia se fortificava quando eram utilizados exemplos e interpretações de atitudes desrespeitosas da criança em relação aos pais servindo como atenuante do crime. A mesma característica – considerar a vítima como tendo provocado o réu – foi observada também em outros estudos sobre o judiciário (Corrêa, 1983).

Enfim, ao ter demonstrado a formação do raciocínio jurídico composto significativamente por falácias, o nosso estudo revelou a ideologia que ampara tal discurso, visto que na falácia a conclusão não se baseia em premissas. Nela a semântica se sustenta pelo uso de valores ideológicos que, alheia ao raciocínio formal, dão sentido aos fatos e sustentam determinadas idéias. Nas idéias presentes nos processos constatamos a defesa da manutenção da família servindo ao fortalecimento do poder e da ordem social vigente, tal como apontou Canevacci (1981). Dessa forma, o poder jurídico legitima atos de violência de pais contra filhos, embora não deixe de manter o controle sobre a família.

 

Referências

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Endereço para correspondência
Edinete Maria Rosa.
R. Eurico de Aguiar,120/602, Praia do Canto
Vitória, ES. Cep. 29055-280
E-mail: edineter@hotmail.com.

Enviado em Novembro/2003
Aceite final Março/2005

 

 

I Trabalho apresentado em forma de curso com o título Violência doméstica contra crianças e adolescentes e o sistema de justiça brasileiro, na XXXIII Reunião Anual de Psicologia da Sociedade Brasileira de Psicologia, Belo Horizonte, MG, outubro de 2003.
Trabalho financiado pelo Cnpq.
1 Foucault (1999) aponta que no drama judiciário, a questão de saber quem cometeu e quem sofreu um dano desenrolava-se, até meados da Idade Média, entre dois indivíduos, vítima e acusado, mas a partir do momento em que apareceu a figura do soberano ou do procurador, e este dizia que foi lesado pelo dano, a ofensa passou a ser não somente relativa a um indivíduo, mas também ao próprio Estado. A infração passou a ser então, não um dano cometido por um indivíduo contra outro e sim uma ofensa ou lesão de um indivíduo à ordem, ao Estado, à lei, à sociedade, à soberania e ao soberano.
2 Ferdinand Saussure (1857-1913) foi o primeiro nome de destaque na lingüística. A ele deve-se a distinção entre língua e fala. Ao definir a língua como "um sistema abstrato, um fato social, geral e virtual e a fala como a realização concreta da língua pelo sujeito falante, sendo circunstancial e variável" (Orlandi, 1993, p.24), o autor exclui a fala do estudo da lingüística assumindo a língua como objeto específico da lingüística. A ele deve-se também da distinção entre sincronia (o estado atual do sistema da língua) e diacronia (sucessão, no tempo, de diferentes estados da língua em evolução), e a defesa de que a lingüística deveria excluir de seu domínio o estudo diacrônico.