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Temas em Psicologia

versão impressa ISSN 1413-389X

Temas psicol. v.13 n.2 Ribeirão Preto dez. 2005

 

RESENHA

 

Psicologia das habilidades sociais na infância

 

 

Nicodemos Batista BorgesI

Instituto Paradigma e Universidade de Santo Amaro – UNISA - Brasil

Endereço para correspondência

 

 

Resenha do livro: Del Prette, Z. A. P. e Del Prette, A. D. (2005). Psicologia das Habilidades Sociais na Infância: teoria e prática. Petrópolis: Vozes.

A obra “Psicologia das Habilidades Sociais na Infância” é de autoria de Zilda e Almir Del Prette, doutores em psicologia e professores da UFSCar e da USP/Ribeirão Preto. O casal é reconhecido nacionalmente na área à qual o livro se refere, Habilidades Sociais, com diversas obras publicadas, trabalhos orientados e apresentações em congressos, sendo deles o primeiro livro lançado no Brasil para tratar, exclusivamente, do assunto (“Psicologia das Habilidades Sociais: terapia e educação”, 1999).

A obra resenhada é dividida em três partes. Na primeira, aborda-se a importância das habilidades sociais, suas bases conceituais e suas especificidades para o universo infantil. Na segunda, debruça-se sobre o planejamento de programas de treinamento de habilidades sociais e a importância das vivências neste procedimento. Na terceira parte, há um aprofundamento das habilidades sociais mais relevantes (na perspectiva dos autores) e a descrição de vivências1 que podem ser aplicadas no desenvolvimento destas competências.

O primeiro dos quatro capítulos que compõem a primeira parte discute os problemas da sociedade moderna, os transtornos psiquiátricos, suas correlações com o déficit de habilidades sociais e seus efeitos sobre as crianças. O capítulo traz, também, a proposta do Treino de Habilidades Sociais (THS) como um instrumento capaz de desenvolver as competências sociais promovendo uma melhor qualidade de vida.

O segundo capítulo, “Base conceitual da área das habilidades sociais”, como o próprio nome informa, apresenta e discute os conceitos pertinentes no campo das habilidades sociais e é uma boa via para interessados em ingressar no estudo da área.

No terceiro capítulo, “Habilidades sociais relevantes na infância”, discutem-se classes, sub-classes e interdependência entre classes de habilidades sociais, além de apresentar uma tabela com as 7 classes prioritárias (Tabela 1), as quais, na terceira parte do livro, merecerão capítulos exclusivos que retomarão suas discussões, aprofundando-as e apresentando propostas de intervenção. O capítulo é mais relevante para pesquisadores, entretanto os clínicos podem optar por observar apenas a Tabela 1, pois, como mencionado acima, cada uma das classes nela apresentada será discutida posteriormente, dispensando sua leitura.

O quarto capítulo, “Aprendizagem de habilidades sociais na infância”, é leitura obrigatória; nele se discute o desenvolvimento ou não das competências sociais, sendo estas produto da interação da criança com seu meio (familiares, escola, creche, etc). Os autores declaram a necessidade de identificar-se às dificuldades específicas do repertório social de cada infante, sendo essa uma condição essencial para o planejamento da intervenção. O capítulo traz ainda uma lista de fatores que podem contribuir na identificação destes déficits, o que é excelente tanto para o clínico como para o pesquisador.

A segunda parte do livro dedica-se ao programa de treinamento de habilidades sociais e está dividido em dois capítulos, quinto e sexto.

O capítulo “Planejamento do programa de treinamento de habilidades sociais” serve como um verdadeiro manual para se planejar a intervenção. Nele é possível encontrar sugestões sobre estrutura do grupo, tais como: composição, tamanho, duração; avaliação pré e pós-intervenção (entrevistas, escalas, etc); objetivos; e procedimentos. Além disso, ele levanta possibilidades que podem interferir negativamente no programa.

No sexto capítulo, “Vivências em habilidades sociais para crianças”, é apresentada a estrutura de uma vivência, sua importância para o THS, requisitos que o facilitador deve ter para utilizá-las, sugestões de como elas devem ser selecionadas, organizadas e conduzidas.

Na terceira e última parte da obra, os autores apresentam 7 capítulos, cada um dedicado a uma habilidade social considerada relevante. Estes capítulos têm como características comuns o aprofundamento das discussões sobre a habilidade em questão e a apresentação de vivências como sugestão de intervenção para o desenvolvimento das competências.

O sétimo capítulo, “Autocontrole e expressividade emocional”, fala da importância de ensinar às crianças a reconhecerem emoções (próprias e dos outros), e de como os psicólogos, pais e educadores devem agir para auxiliá-las nesta tarefa.

O oitavo capítulo, “Habilidades de civilidade”, trata da classe de habilidade social nomeada “civilidade”, que, como os autores bem definem logo no primeiro parágrafo, “pode ser entendida como a expressão comportamental das regras mínimas de relacionamento aceitas e/ou valorizadas em uma determinada subcultura.” (p. 136). Discute-se que esta habilidade tinha seu ensino delegado à família, principalmente à mãe, e que, com os novos rumos da cultura, tem passado para as instituições como creches e escolas. Apontam-se ainda, os possíveis problemas que conduzem a este déficit.

No nono capítulo, “Empatia”, os autores discutem o conceito de “empatia” a partir de uma perspectiva histórica, introduzindo-a como parte integrante das habilidades sociais e apresentando-a operacionalmente. Ainda neste capítulo, os autores trazem uma discussão a respeito do desenvolvimento da empatia e da necessidade de pais e educadores servirem como modelos na instalação deste repertório.

O décimo capítulo, “Assertividade”, qualifica esta competência social, discute as conseqüências do comportar-se de maneira assertiva. Propõe o treino do pensamento assertivo, que consiste de pensar assertivamente, porém, avaliar a conseqüência de comportar-se assertivamente antes de agir.

O décimo primeiro capítulo inicia com uma breve introdução e parte para discussão da integralização da “solução de problemas interpessoais” como parte das habilidades sociais, caracterizando-a e apresentando alguns princípios essenciais desta classe. Aponta como habilidades necessárias para ser socialmente competente na solução de problemas interpessoais: admitir a existência de um problema, identificá-lo, definir objetivos ou metas, formular alternativas de solução, prever conseqüências e escolher uma alternativa, implementar a alternativa escolhida e por fim avaliar os resultados.

O penúltimo capítulo, “Fazer amizades”, fala de estatísticas sobre amizade, discorre sobre a importância desta competência social para o desenvolvimento do infante, alerta para a necessidade de monitoramento das amizades das crianças, e observa condições que facilitam o fazer amizades e habilidades importantes na sua construção e manutenção.

O décimo terceiro capítulo, “Habilidades sociais acadêmicas”, apresenta uma discussão sobre habilidades sociais e rendimento acadêmico. Neste ínterim, discutem-se características de crianças com problemas de aprendizagem e relações possíveis entre desempenho escolar e social. Ainda neste capítulo, os autores sugerem meios pelos quais algumas competências sociais podem facilitar o desempenho acadêmico e listam as principais habilidades sociais acadêmicas.

Observando o movimento de HS no mundo, nota-se que sua literatura é mais forte nos Estados Unidos, Canadá, Inglaterra e Espanha, tendo como um de seus principais expoentes Argyle (por exmplo, Argyle ,1981, 1984; Argyle e Lu, 1990 e Argyle, Bryant e Trower, 1974), o qual foi um dos primeiros a definir a área. Todavia, quando se observa o movimento de HS aplicado às crianças destacam-se como alguns de seus principais pesquisadores Merrell (por exemplo, Merrell, 1999, 2001 e Merrell e Gimpel, 1998) e Gresham (por exemplo, Gresham, 1992, 1995, 2000, 2002 e Gresham e Elliott, 1987, 1990). Já ao se limitar no âmbito nacional, encontra-se poucos grupos envolvidos com a área de HS – Ex. Löhr da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Falcone da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), além do grupo liderado pelos Del Prette da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Entretanto, segundo Villa (2002), a área tem se desenvolvido muito nos últimos anos.

Todavia, apesar do crescimento das publicações na área, a obra a qual trata a presente resenha, tem entre algumas de suas principais características, sua excelência como instrumento acadêmico, pois além de sua primazia como fonte de referências bibliográficas – contando com mais de duas centenas de trabalhos da área – também consiste de uma articulação entre conhecimentos empíricos recentes sobre HS e propostas de metodologia de intervenção, principalmente relacionados ao universo infantil. Tais características a distingue das demais publicações da área – inclusive as publicadas anteriormente pelos próprios autores.

Outro aspecto que merece ser mencionado é sua característica didática, a qual pode ser vista a partir da: a) produção de capítulos que permitem ao leitor estudá-los separadamente; b) construção de quadros com trechos importantes em destaque, facilitando uma busca rápida, quando necessária; e c) utilização de uma linguagem simples, possibilitando uma leitura fácil e prazerosa.

Diante do apresentado, o livro se constitui um bom manual para psicólogos que trabalham com crianças, seja no contexto clínico ou escolar, apresentando fácil manejo e ampla aplicabilidade, bem como um excelente recurso para aqueles que pretendem ingressar na área de HS.

 

Referências

Argyle, M. (1981). Social Skills and health. London: Methuen.

Argyle, M. (1984). Some new developments in social skills training. Bulletin of British Psychological Society, 37, 405-410.

Argyle, M. & Lu, L. (1990). Happiness and social skills. Personality and Individual Differences, 11(12), 1255-1261.

Argyle, M., Bryant, B. & Trower, P. (1974). Social skills training and psychotherapy: a comparative study. Psychological Medicine, 4, 435-443.

Del Prette, Z. A. P. & Del Prette, A. D. (1999). Psicologia das Habilidades Sociais: terapia e educação. Petrópolis: Vozes.

Del Prette, Z. A. P. e Del Prette, A. D. (2004). Treinamento de habilidades sociais com crianças: como utilizar o método vivencial. Em: C. E. Costa, J. C. Luzia & H. H. N. Sant`Anna (Orgs.). Primeiros Passos em Análise do Comportamento e Cognição, Vol. 2 (pp. 111 – 118). Santo André: ESETec.

Gresham, F. M. (1992). Social skills and learning disabilities: causal, concomitant or correlacional? School Psychological Review, 21, 348-360.

Gresham, F. M. (1995). Best practices in social skills training. Em: R. Franklin, D. Allison & B. Gorman (Orgs.). Design and analysis of single case research (pp. 93-117). Hillsdale: Lawrence Erlbaum.

Gresham, F. M. (2000). Assessment of social skills in students with emotional and behavioral disorders. Assessment for effective intervention, 26, 51-58.

Gresham, F. M. (2002). Social skills assessment and instruction for students with emotional and behavioral disorders. Em: K. Lane, F. Gresham & T. O`Shaughnessy (Orgs.). Children with or at risk for emotional and behavioral disorders (pp. 177-194). Boston: Allyn e Bacon.

Gresham, F. M. & Elliott, S. N. (1987). Social skills deficits of students: issues of definition, classification and assessment. Journal of Reading, Writing and Learning Disabilities International, 3, 131-148.

Gresham, F. M. & Elliott, S. N. (1990). Social Skills Rating System. Circle Pines: American Guidance.

Merrell, K. W. (1999). Behavioral, social and emotional assessment of children. Mahwah: Lawrence Erlbaum.

Merrell, K. W. (2001). Assessment of children’s social skills: recent developments, best practices and new directions. Exceptionality, 9, 3-18.

Merrell, K. W. & Gimpel, G. A. (1998). Social skills of children and adolescents: conceptualization, assessment and treatment. London: Lawrence Erlbaum.

Villa, M. B. (2002). Psicologia das Habilidades Sociais: terapia e educação. Interação em Psicologia, 6(2), 251.

 

 

Endereço para correspondência
E-mail: nicobborges@gmail.com

Enviado em Novembro/2006
Revisado em Julho/2007
Aceite final em Agosto/2007

 

 

I Psicólogo, Mestre em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento pela PUC-SP e Especialista em Terapia Comportamental e Cognitiva pela USP.

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