SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.14 número1Homenagem à sócia honorária: Maria Clotilde Therezinha Rossetti FerreiraOuvindo educadoras de creche sobre suas experiências no trabalho índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Temas em Psicologia

versão impressa ISSN 1413-389X

Temas psicol. v.14 n.1 Ribeirão Preto jun. 2006

 

ARTIGOS

 

O legado de Paul B. Baltes à Psicologia do Desenvolvimento e do EnvelhecimentoI

 

Paul B. Baltes’ legacy to the Psychology of Development and Aging

 

 

Anita Liberalesso Neri

Unicamp

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este texto apresenta as contribuições do psicólogo alemão Paul B. Baltes (1939-2006) à Psicologia do Envelhecimento e à Psicologia do Desenvolvimento, representadas pelo paradigma de desenvolvimento ao longo de toda a vida (lifespan), pelo meta-modelo de seleção, otimização e compensação, por pesquisas sobre a plasticidade da inteligência na vida adulta e na velhice e por investigações interdisciplinares sobre a velhice avançada. O desenvolvimento foi definido por Baltes como um processo contínuo, multidimensional e multidirecional de mudanças orquestrados por influências genético-biológicas e sócio-culturais de natureza normativa e não-normativa, marcado por ganhos e perdas concorrentes e por interatividade indivíduo-cultura e entre os níveis e tempos das influências. O desenvolvimento e o envelhecimento bem-sucedidos baseiam-se em seleção de metas, otimização dos meios para atingir essas metas e busca de compensações quando os meios disponíveis para atingir as metas estiverem ausentes. Com base em dados, Baltes acreditava no caráter incompleto da arquitetura do desenvolvimento humano, na importância da cultura para compensar os limites da ontogênese, no caráter normativo do envelhecimento e na descontinuidade entre a velhice inicial e a avançada.

Palavras-chave: Teoria lifespan, Desenvolvimento humano, Velhice.


ABSTRACT

This paper introduces the contributions of Paul B. Baltes (1939-2006), German psychologist, to the called Psychology of Development and Aging, represented by lifespan theory, model of selection, optimization and compensation, research on intellectual plasticity in adulthood and aging, as well as interdisciplinary investigations on advanced aging. He has conceptualized development as a continuous, multidimensional and multidirectional process of change orchestrated by genetic, biological and socio cultural influences, part of them normative, part not normative. According to the author, development comprises concurrently gains and losses, involving interaction between individual and culture as well as several levels, and different influences timings. Successful development and aging are based on selection of goals, optimization of means to accomplish these goals, and investment on compensations when means fail. Taking empirical data as basis, Baltes believed on in incompleteness of human development architecture, the relevance of culture to compensate human ontogenesis limits, the normative character of aging, and discontinuity between early and advanced aging.

Keywords: Lifespan theory, Human development, Aging.


 

 

O estudo científico envelhecimento pela Psicologia é relativamente recente. Nos primeiros 60 anos do século XX, a Psicologia assumiu que os anos da velhice eram de exclusivo declínio. A Psicologia do Desenvolvimento era uma psicologia do crescimento orientado à produtividade e à autonomia física e cognitiva características do adulto. O desenvolvimento concebido como fenômeno que ocorre ao longo de toda a vida sensibilizava os estudiosos desde os séculos XVIII e XIX (por exemplo, Tetens, 1777; Carus, 1808; Quetelet, 1835), mas não havia clima científico ou cultural para empreender estudos sistemáticos sobre a maturidade e a velhice. Predominava a noção do declínio intelectual na vida adulta e na velhice (Yerkes, 1921; Miles & Miles, 1932; Lehman, 1953) incompatível com qualquer idéia de desenvolvimento em idade mais avançada, corroborada pelos dados de pesquisa e pelas crenças sociais.

Vários eventos sócio-culturais deflagraram o estudo psicológico sistemático sobre o envelhecimento. O principal deles foi o envelhecimento populacional que se evidenciou nos países desenvolvidos no decorrer do século XX e, com ele, o envelhecimento dos cientistas que haviam desenvolvido as grandes teorias da psicologia infantil e da adolescência e as pesquisas longitudinais típicas do período. Eles integravam uma coorte que fora percebendo que as crenças científicas e leigas tidas como corretas não se coadunavam com a realidade do envelhecimento que reconheciam em si e na maioria dos seus iguais. Paralelamente, os movimentos sociais americanos envolvidos com a defesa dos direitos das minorias, entre eles as mulheres e os idosos, começou a interessar-se pela identificação dos elementos responsáveis pela satisfação na meia-idade feminina em face das perdas do envelhecimento, e também, à investigação dos elementos associados a uma velhice saudável e ativa em homens e mulheres. As primeiras teorias sociológicas sobre o envelhecimento, a da atividade (Havighurst & Albrecht, 1953) e a do afastamento (Cummings & Henry, 1961) surgiram nesse contexto e tiveram enorme impacto ideológico sobre a velhice e sobre as instituições sociais. Fortaleceu-se a noção clássica, que depois se mostrou de novo fantasiosa, de que os investimentos científicos e tecnológicos garantiriam uma velhice sem perdas. Datam dessa época os estudos do Instituto MacArthur sobre a meia idade e o envelhecimento saudáveis (por exemplo, Rowe & Kahn, 1987, 1997).

No contexto de um estudo sobre a inteligência na vida adulta e na velhice, iniciado em 1955 e que prosseguiu até 1996, Schaie (1965) criou a metodologia de coortes seqüencializadas, talvez uma das maiores contribuições metodológicas do paradigma lifespan, cuja engenhosidade consiste em mensurar a influência conjunta de variáveis individuais e sócio-históricas. Novos estudos longitudinais, específicos sobre a vida adulta e a velhice foram iniciados, como por exemplo, o Bonn Longitudinal Study of Aging (Thomae, 1976).

Além dessas fontes de influência, as teorias precursoras de Jung (1971) , C. Bühler (1935) e Erikson (1950), o paradigma life course em Sociologia (Havighurst, 1951; Brim & Wheeler, 1966; Neugarten, 1968, 1969; Chiriboga, 1975), o manifesto de Riegel (1976) em favor da adoção pela Psicologia do Adulto, do paradigma dialético a nova metodologia criada por Schaie, o behaviorismo e a psicologia da aprendizagem americana tiveram grande impacto sobre o pensamento de um grupo de acadêmicos interessados na descrição dos padrões evolutivos característicos da velhice e da plasticidade ou capacidade de modificar-se do desempenho cognitivo em adultos e idosos (Baltes, 2000). Nascia a Psicologia do Envelhecimento, caracterizada pela adoção de um enfoque de desenvolvimento ao longo de toda a vida (lifespan), o qual gerou novas metodologias, uma enorme quantidade de dados empíricos e novas perspectivas teóricas, mais orientadas à compreensão e à explicação de aspectos específicos do envelhecimento do que à elaboração de grandes sistemas. Hoje o paradigma lifespan é a corrente dominante na Psicologia do Envelhecimento e é adotado por um número crescente de pesquisadores da psicologia da infância e da adolescência (Lerner, Dowling, & Roth, 2003).

 

Princípios do paradigma de desenvolvimento ao longo de toda a vida (lifespan)

O paradigma lifespan é de índole pluralista, uma vez que considera múltiplos níveis, temporalidades e dimensões do desenvolvimento, é transacional, dinâmico e contextualista (Baltes & Smith, 2004). Compreende o desenvolvimento como processo contínuo, multidimensional e multidirecional de mudanças orquestrados por influências genético-biológicas e sócio-culturais, de natureza normativa e não-normativa, marcado por ganhos e perdas concorrentes e por interatividade entre o indivíduo e a cultura. Compreende uma seqüência de mudanças previsíveis, de natureza genético-biológica, que ocorrem ao longo das idades, e, por isso, são chamadas de mudanças graduadas por idade; uma seqüência previsível de mudanças psicossociais determinadas pelos processos de socialização ao qual que as pessoas de cada coorte estão sujeitas, chamadas de influências graduadas por história, e uma seqüência não-previsível de alterações pela influência de agendas biológicas e sociais e que, por isso, são chamadas de influências não-normativas (Baltes, Cornelius, & Nesselroade, 1979; Baltes, Reese, & Lipsitt, 1980; Lerner, 1983). Como exemplos das primeiras, a maturação neurológica dos cinco primeiros anos, a puberdade e o climatério. As segundas são ilustradas pelo ingresso na escola, o casamento e a aposentadoria por idade. As últimas têm como exemplos a perda de emprego, a viuvez na idade adulta, acidentes, doenças e morte de um filho.

Posteriormente, foram elaboradas abstrações mais refinadas sobre a atuação concorrente dos determinantes genético-biológicos e sócio-culturais do desenvolvimento, segundo as quais: 1) a arquitetura da ontogenia e a interação dinâmica entre fatores biológicos e culturais mudam ao longo da vida; 2) há diferente alocação de recursos ao longo da vida, que passa da ênfase no crescimento (na infância) à ênfase na manutenção e na regulação das perdas (na velhice) e 3) ocorre atuação sistêmica de mecanismos de seleção, otimização e compensação na produção do desenvolvimento e do envelhecimento bem sucedidos ou adaptativos (Baltes, 1987; Baltes, 1997, Baltes & Smith, 2003, Baltes & Smith, 2004, Li & Freund, 2005).

 

A dinâmica biologia-cultura na determinação das trajetórias de influências de natureza normativa e não-normativa sobre o desenvolvimento

As influências normativas graduadas por idade, ou ontogenéticas, são eventos que tendem a ocorrer na mesma época e com a mesma duração para a maioria dos indivíduos. O conceito de normalidade é estatístico e diz respeito à alta freqüência dos eventos para cada grupo de idade. Estes eventos não são causados pela passagem do tempo, mas pelas interações entre o organismo e o ambiente. Por necessidades culturais, os eventos são registrados no tempo, conforme critérios de freqüência, duração, persistência, intermitência e mudança qualitativa. Os eventos normativos graduados por idade dizem respeito a dois conjuntos de influências que afetam a todos os seres humanos: as biológicas, que caracterizam o crescimento ou a maturação, e o envelhecimento, assim como as sociais, que caracterizam o processo de socialização durante toda a vida.

O processo biológico normativo de envelhecimento inclui diminuição da plasticidade comportamental (ou possibilidade de mudar para adaptar-se ao meio), e diminuição da resiliência biológica (ou capacidade de enfrentar e de recuperar-se dos efeitos da exposição a doenças, acidentes e incapacidades). No entanto, eles não são independentes, pois os limites da plasticidade individual dependem das condições histórico-culturais, condições essas que se refletem na organização do curso de vida dos indivíduos e das coortes. Da mesma forma, a resiliência individual depende dos apoios sociais e dos recursos da personalidade, chamados por Bandura (1986) de mecanismos de auto-regulação do self. Sua integridade na velhice promove a continuidade do funcionamento psicossocial e o bem-estar subjetivo dos idosos, mesmo na presença de perdas biológicas, cognitivas e sociais acarretadas pelo envelhecimento (Baltes, 1987; 1997).

Os eventos graduados por idade associados à socialização dizem respeito ao cumprimento de tarefas evolutivas, a expectativas sociais e a ecologias especificas do desenvolvimento envolvendo a família, a educação, o trabalho, as instituições e as políticas sociais. Presidem a aquisição de papéis e de competências sociais associadas às idades. Em alguns períodos históricos as regras sociais são mais rígidas e assim há menos flexibilidade nas trajetórias de desenvolvimento. Em outros contextos, essas normas são mais fluidas e as pessoas têm trajetórias mais variadas e mais independentes da idade (Settersten & Mayer, 1997). Assim, a desnutrição e a falta de oportunidades educacionais associadas à pobreza durante a infância prejudicam a trajetória do desenvolvimento intelectual (Shaie, 1996) e da auto-eficácia individual e coletiva (Bandura, 1997). Em todo curso de vida, as mulheres são mais sujeitas à pobreza, à escolaridade menos extensa e a nível ocupacional mais baixo, motivos pelos quais as idosas são mais expostas a doenças, à incapacidade, à sobrecarga do papel de cuidar e ao isolamento do que os homens.

As influências normativas graduadas por história são eventos macro-estruturais experimentados ao mesmo tempo por todos os componentes de uma dada coorte. Elas co-variam sistematicamente com classe social, gênero e etnia (Baltes & Smith, 2004). Nos últimos 100 anos, a modernização ocasionou crescente variação nas trajetórias intelectuais de várias coortes, como mostraram o Seattle Longitudinal Study (Schaie, 1996) e os estudos longitudinais suecos de Steen e Djurfeldt (1993) e de McClearn et al. (1997), segundo os quais o desempenho intelectual de idosos que atualmente têm 70 anos é comparável ao de idosos que tinham 65 anos. Há 30 anos Baltes e Staudinger (1996) desenvolveram estudos sobre os efeitos da dinâmica das relações interpessoais sobre a plasticidade comportamental. Mostraram que a exposição de crianças e idosos a situações reais de solução de problemas existenciais em grupos (mentes interativas, segundo eles), produziu respostas complexas e efetivas nos dois grupos. Mais importante: os adultos mais velhos beneficiaram-se mais do que as crianças, o que sugere a interveniência de influências sócio-culturais acumuladas.

As influências não-normativas não atingem todos os indivíduos de um grupo etário ao mesmo tempo, ou seja, não são dependentes da ontogenia e nem do tempo histórico. Sua época de ocorrência é imprevisível. Podem ser de caráter biológico ou societal. Interrompem a seqüência e o ritmo do curso de vida esperado, geram condições de incerteza e desafio e impõem sobrecarga aos recursos pessoais e sociais. Seus efeitos de longo prazo variam de acordo com o significado do evento para o individuo, sua condição de enfrentamento e seus os efeitos sobre o status funcional, os papeis sociais e o senso de identidade (Baltes & Smith, 2004). O efeito dos eventos não-normativos é potencializado pela experiência de incontrolabilidade que geralmente acarretam. O potencial estressor dos eventos incontroláveis tende a ser maior para os velhos, na medida em que, na velhice, ocorre diminuição de recursos e que aumentam as possibilidades de convivência com eventos negativos. Aos efeitos da velhice podem somar-se os da pobreza, desnutrição, baixo nível educacional, ser do gênero feminino, pertencer a grupos excluídos por critérios raciais e discriminação por idade. Quanto maior o senso de controle sobre o evento, menor a chance de se desenvolverem problemas de adaptação, tais como sintomas depressivos, isolamento social, doenças somáticas e dependência (Diehl, 1999).

Os três tipos de influências – as normativas graduadas por idade e por história e as não-normativas – atuam de forma concorrente na construção de regularidades e de diferenças individuais nas trajetórias de vida. A biologia e a cultura, atuando em relação recíproca, contextualizam o desenvolvimento e o envelhecimento. Na infância inicial e na velhice avançada os processos genético-biológicos graduados por idade têm mais força na regulação do desenvolvimento do que os de natureza sócio-cultural.

Baltes (1997) propôs três princípios gerais a respeito da dinâmica biologia-cultura nas trajetórias de desenvolvimento ao longo da vida:

1) A plasticidade biológica e a fidelidade genética declinam com a idade, porque a natureza privilegia o crescimento nas fases pré-reprodutiva e reprodutiva, pois é o que fundamentalmente interessa à espécie, falando de seleção natural em termos estritamente biológicos.

2) Para que o desenvolvimento se estenda até as idades avançadas, são necessários avanços cada vez expressivos na evolução cultural e na disponibilidade de recursos culturais. A expansão da duração da vida, que hoje está quase no limite máximo estabelecido pelo genoma humano, só foi possível graças a investimentos em instrumentos, habitação, técnicas e equipamentos de trabalho, higiene, imunização, antibióticos e outros recursos de proteção às agressões do ambiente e educação.

3) É limitada a eficácia da cultura para promover desenvolvimento e reabilitação das perdas e do declínio associados à velhice: os mais velhos são menos responsivos aos recursos culturais, uma vez que sua plasticidade comportamental e sua resiliência biológica são menores.

Nesse momento, no mundo, o envelhecimento populacional e o aumento da longevidade estão exigindo investimentos cada vez maiores em soluções tecnológicas para a cura e a prevenção de doenças incuráveis ou de difícil reabilitação. Na medida em que se aumenta a duração da vida humana, novos problemas deverão aparecer e serão potencializados pela existência de desigualdades econômicas ao redor do mundo. São impedimentos à evolução social e à própria evolução da espécie. No âmbito individual, a rapidez das mudanças tecnológicas e científicas e a velocidade com que as informações são processadas e se tornam disponíveis em uma grande variedade de veículos, entre os quais se destaca a internet, dispõem condições para a criação de um permanente senso de incompletude.

 

Desenvolvimento e envelhecimento bem-sucedidos mediante a orquestração de estratégias de seleção, otimização e compensação

A trajetória das influências que afetam o desenvolvimento e o envelhecimento relaciona-se com a alocação de recursos nos diferentes momentos da vida, caracterizando percursos típicos, tais com o do crescimento na infância, o da manutenção na vida adulta e o da regulação de perdas na velhice. Crescer envolve o alcance de níveis cada vez mais altos de funcionamento ou de capacidade adaptativa. Manter envolve estabilidade dos níveis de funcionamento em face de novos desafios contextuais ou de perdas em potencial. Manejo de perdas significa funcionamento em níveis mais baixos, quando a manutenção ou a recuperação não forem mais possíveis. Esse raciocínio conduziu Baltes e Baltes (1990) à proposição da teoria de seleção, otimização e compensação (teoria SOC), segundo a qual os ganhos e as perdas evolutivas são resultantes da interação entre os recursos da pessoa com os recursos do ambiente, em um regime de interdependência. Durante toda a vida ocorre atuação sistêmica desses três mecanismos na produção do desenvolvimento e do envelhecimento bem sucedidos ou adaptativos (Baltes, 1987; Baltes, 1997; Baltes & Smith, 2003; Baltes & Smith, 2004; Li & Freund, 2005).

Dois são os objetivos da teoria de seleção, otimização e compensação (teoria SOC): descrever o desenvolvimento em geral e estabelecer como os indivíduos podem, efetivamente, manejar as mudanças nas condições biológicas, psicológicas e sociais que se constituem em oportunidades e em restrições para seus níveis e trajetórias de desenvolvimento. A plasticidade comportamental é sua inspiração central, pois interessa saber como indivíduos de todas as idades alocam seus recursos internos e externos a essas três funções no sentido de maximizar ganhos e minimizar perdas. A teoria SOC pode ser incorporada por diferentes perspectivas teóricas, incluindo a comportamental (M. Baltes, 1996), a cognitiva (Smith & Baltes, 1990), a de ação (Heckhausen, Dixon, & Baltes, 1989) e a social-cognitiva (Bandura, 1997); a diferentes processos, como por exemplo, a memória (Linderberger & Reishies, 1999) e o funcionamento físico (M. Baltes et al., 1999) e a diferentes domínios, como, por exemplo, o bem-estar subjetivo (Smith et al., 1999). Por isso é apontada como um meta-modelo de desenvolvimento.

Seleção significa especificação e diminuição da amplitude de alternativas permitidas pela plasticidade individual. Ela é tanto um requisito para os avanços quanto uma necessidade quando recursos, tais como tempo, energia e capacidade, são limitados. Pode ser eletiva ou orientada à recuperação das perdas. Neste caso ela se dirige à reorganização da hierarquia e ao número de metas, ao ajuste do nível de aspiração ou ao desenvolvimento de novas metas que sejam compatíveis com os recursos disponíveis. Otimização quer dizer aquisição, aplicação, coordenação e manutenção de recursos internos e externos envolvidos no alcance de níveis mais altos de funcionamento. Pode ser realizada mediante a educação, a prática e o suporte social dirigidos à cognição, à saúde, à capacidade atlética e às habilidades artísticas e sociais.

A compensação envolve a adoção de alternativas para manter o funcionamento. São alguns exemplos de compensação o uso de aparelhos auditivos e de cadeira de rodas, a utilização de pistas visuais para compensar problemas de orientação espacial e a utilização de deixas para auxiliar a memória verbal. Os três mecanismos são assumidos como universais e como sujeitos a ação consciente ou inconsciente, operados pela pessoa ou por outrem, por indivíduos ou por instituições.

Seleção, otimização e compensação são mecanismos cuja existência e funcionalidade podem ser intuídas na experiência pessoal e na experiência cultural. A utilização de provérbios exemplifica este último caso. Por exemplo, há provérbios na língua portuguesa que enaltecem a seleção, como “Não se pode chupar cana e assobiar a mesmo tempo”, outros enfatizam a compensação, caso de “Uma mão lava a outra”, e outros, ainda, focalizam a otimização, caso de “A prática faz perfeição”, “Devagar se vai ao longe”.

A teoria SOC tem sido demonstrada sob diferentes metodologias (por exemplo, Freund & Baltes 2002a, 2002b). Ambos construíram um questionário contendo provérbios envolvendo seleção, otimização e compensação, com o fito de avaliar o uso de estratégias de manejo de vida. Encontraram um gradiente de idade na utilização das estratégias SOC. Na fase adulta inicial e na velhice as três estratégias apareceram como menos ativas, ao passo que os adultos na meia-idade relataram o uso mais freqüente delas. Varias outras pesquisas descritivas baseadas em auto-relato mostram correlações positivas entre o uso das estratégias e o bem-estar subjetivo, os progressos na carreira profissional, o comportamento de estudo e o desempenho no trabalho (Baltes & Heydens-Gayr, 2003; Bajor & Baltes, 2003; Wiese, Freund, & Baltes, 2000; 2002).

Pesquisas experimentais envolvendo tarefas competitivas (como, por exemplo, memorizar uma lista de palavras e, ao mesmo tempo andar depressa mantendo o equilíbrio em uma plataforma em movimento) mostraram que os idosos foram capazes de cumprir as duas tarefas ao mesmo tempo quando usaram estratégias compensatórias, principalmente em situações cujas exigências eram mais altas e próximas de seu limite superior de desempenho (Rapp, Krampe, & Baltes, 2003; Bondar, Krampe, & Baltes, 2003). Outro estudo mostrou que adultos jovens e idosos diferem no uso de estratégias compensatórias quando a demanda é superior a seus recursos: os jovens reduzem a extensão e a complexidade gramatical de suas sentenças, ao passo que os idosos reduzem a velocidade da fala, quando são solicitados a andar depressa ao mesmo tempo em que falam (Kemper, Herman, & Lian, 2003).

A teoria da seletividade sócio-emocional formulada por Carstensen (1991) é uma derivação da teoria SOC. Explica o declínio nas interações sociais e as mudanças no comportamento emocional dos idosos. Ela se contrapõe às teorias sociológicas da atividade (Havighurst & Albrecht, 1953), do afastamento (Cummings & Henry, 1961) e das trocas sociais (Dowd, 1975) porque considera que as pessoas não são simplesmente reativas ao contexto social, mas o constroem ativamente. Assim, a redução na amplitude da rede de relações sociais e na participação social na velhice reflete a redistribuição ativa de recursos sócio-emocionais pelos idosos, em virtude da mudança em sua perspectiva de tempo futuro. Ao perceber que têm menos tempo de vida pela frente, eles procuram selecionar metas, parceiros e formas de interação, porque isto permite otimizar os recursos de que dispõem. Por esse motivo, na velhice passam a ser mais relevantes o envolvimento seletivo com relacionamentos sociais próximos que ofereçam experiências emocionais significativas, em lugar da ampliação da rede de relações ou da busca de informações e de status, que são objetivos típicos dos mais jovens. As metas dos adultos jovens são mais numerosas e de longo prazo, porque o tempo é por eles percebido como relativamente ilimitado (Fung, Carstensen, & Lutz, 1999).

Na velhice, ocorre diminuição normativa dos níveis de alerta e da intensidade das respostas emocionais e aumento da seletividade emocional. As emoções são menos intensas, moduladas, contrastantes e nítidas ao observador, e mais compatíveis com os recursos biológicos dos idosos que passam a vivenciar e a demonstrar emoções com menos intensidade e a ter menor capacidade de decodificação de expressões emocionais. Pesquisas de laboratório envolvendo medidas da atividade da amídala mostraram que os idosos prestam mais atenção a conteúdos emocionais positivos do que a negativos. Também tendem a evocar mais memórias positivas do que negativas (Carstensen, 1991; Mather & Carstensen, 2003; Mather et al., 2004).

Segundo Carstensen, essas alterações são de natureza adaptativa porque permitem aos idosos poupar recursos, canalizá-los para alvos relevantes e otimizar seu funcionamento afetivo e social. Tal processo reflete-se na maior capacidade de calibrar o efeito da intensidade dos eventos, maior integração entre cognição e afetividade, mecanismos de defesa mais maduros, mais uso de estratégias pró-ativas, maior satisfação com a vida e maior seletividade social.

A teoria da seletividade sócio-emocional é de natureza lifespan na medida em que considera que a adaptação é delimitada pelo tempo e pelo espaço e que a fase do desenvolvimento vivida pela pessoa é um importante contexto ao qual ela deve se adaptar. Esta explicação foi testada com sucesso com pacientes jovens em estado terminal e entre eles foi observado o mesmo processo, confirmando a ocorrência de seleção de metas e de relações em virtude da redução na perspectiva temporal (Lang, 2000). Ela foi testada em estudos longitudinais, nos quais se observou que: 1) o número de parceiros sociais pode ser estável ao longo da vida, mas o número de relações sociais periféricas declina na velhice; 2) os idosos que reduzem os contatos periféricos, mas mantém contatos emocionais significativos com pessoas afetivamente próximas desfrutam de maior bem-estar subjetivo do que os que não o fazem (Fung, Carstensen, & Lutz, 1999, M. Baltes & Carstensen, 2003).

 

Princípios do envelhecimento intelectual apoiados no paradigma de desenvolvimento ao longo de toda a vida

Uma das contribuições mais importantes do paradigma lifespan diz respeito a um conjunto de princípios derivados de pesquisas descritivas sobre os padrões de desenvolvimento intelectual na velhice e sobre a modificabilidade dos desempenhos cognitivos por meio de treino. O modelo de inteligência adotado nesses estudos foi o bidimensional de Horn e Cattell (1966), composto por um fator metaforicamente denominado de inteligência fluida e de outro, chamado inteligência cristalizada. A inteligência fluida reflete capacidades mentais primárias, tais como indução, flexibilidade figurativa e integração, evidenciadas pela proficiência no cumprimento de tarefas verbais (séries de letras), espaciais (matrizes) e topológicas e na derivação de informação viso-espacial complexa, em situações cujo tempo de execução é controlado. Declina com a idade, em função das mudanças neurológicas típicas do envelhecimento e dos efeitos acumulativos de doenças e acidentes. A inteligência cristalizada inclui capacidades e processos intelectuais adquiridos a partir da interação da experiência com as capacidades fluidas e são exemplificadas pela compreensão verbal, a formação de conceitos, o raciocínio lógico tanto quanto o geral. Baltes chamou a inteligência fluida de mecânica ou hardware do funcionamento intelectual e a inteligência cristalizada de pragmática ou software do funcionamento intelectual (Baltes, 1993). A inteligência fluida declina com a idade, porque depende de mecanismos neurológicos responsáveis pelo processamento da informação, os quais normalmente declinam no envelhecimento. A inteligência cristalizada não só não declina como pode apresentar progressos, desde que existam oportunidades culturais e que as capacidades fluidas não sofram declínio patológico acentuado.

Os princípios do desenvolvimento intelectuais na vida adulta e na velhice foram assim descritos por Baltes (1987):

1) O envelhecimento é um processo que acarreta mudanças de natureza ontogenética, traduzidas no declínio das capacidades intelectuais dependentes do funcionamento neurológico, sensorial e psicomotor. Essas mudanças refletem-se na diminuição da plasticidade comportamental.

2) As mudanças intelectuais de base ontogenética não significam descontinuidade da capacidade adaptativa e incompetência cognitiva generalizada: as reservas de experiência podem ser ativas e otimizadas pelos mais velhos, de modo a compensar o declínio nas capacidades de processamento da informação resultantes do processo de envelhecimento.

3) O envelhecimento intelectual é uma experiência heterogênea, isto é, pode ocorrer de modo diferente para indivíduos e coortes que vivem em contextos históricos e sociais distintos. Essa diferenciação depende da influência de circunstâncias histórico-culturais, de fatores intelectuais e de personalidade e da incidência de patologias durante o envelhecimento normal.

4) Há diferentes padrões de envelhecimento intelectual, do patológico ao ótimo, passando pelo normativo, compartilhado pela maioria das pessoas. É relativo às mudanças biológicas que ocorrem depois que os indivíduos atingem a capacidade de reproduzir a espécie e, entre a quarta e a quinta década de vida, converge para o aparecimento de alterações anatômicas e funcionais que definem o envelhecimento. Não se trata de doença, mas de processo natural, dependente da programação genética da espécie.

5) O envelhecimento intelectual é um processo multidimensional e multidirecional: diferentes capacidades começam a mudar em diferentes momentos, com diferentes resultados sobre diferentes indivíduos submetidos a diferentes experiências biológicas, educacionais, históricas e de personalidade.

6) Respeitados os limites impostos pela biologia e as possibilidades abertas pela educação formal e não-formal a que foram expostos ao longo da vida, é possível alterar o desempenho intelectual de idosos por meio de intervenções clínicas, educacionais e experimentais. O Adult Development and Enrichment Project (ADEPT, de Baltes e Willis, 1982) envolveu delineamentos pré-teste/tratamento/pós-teste, com cinco horas de instrução em capacidades básicas, oferecidas a idosos residentes na comunidade. O treino cognitivo não alterou as características estruturais das capacidades intelectuais primárias, isto é, não converteu capacidades básicas que são componentes da inteligência fluida, em componentes da inteligência cristalizada. Porém, em pessoas de 60 anos e mais foram observados ganhos estatisticamente significativos nas relações entre figuras e na indução. Os maiores progressos experimentados pelas mulheres foram em orientação espacial. Homens e mulheres melhoraram em velocidade e precisão, mas os homens foram melhores em precisão. Não foram observados efeitos de generalização de uma capacidade treinada para outra não-treinada. Estudos de seguimento realizados sete anos depois do treinamento mostraram que os indivíduos treinados declinaram menos do que os não-treinados. Além disso, os idosos que haviam declinado mais se beneficiaram mais do treinamento do que os que haviam permanecido estáveis. Os sujeitos foram submetidos a treino de reforço sete anos depois da primeira bateria de instrução, do qual decorreram melhoras significativas para todos os grupos de idade. Porém, os mais velhos não obtiveram melhor desempenho do que os mais jovens.

7) A inteligência muda qualitativamente ao longo da vida adulta e da velhice. As mudanças qualitativas dependem muito mais das oportunidades oferecidas pela cultura do que dos mecanismos de base genético-biológica que estão na base da inteligência humana.

8) O funcionamento intelectual dos adultos e dos idosos é largamente influenciado pelo conhecimento de si, pelas crenças sobre a origem do próprio comportamento, pelas metas pessoais e pelas emoções, elementos esses que devem ser levados em conta na pesquisa básica sobre diferenças evolutivas e na intervenção cognitiva.

9) As principais diferenças no funcionamento cognitivo dos jovens e dos idosos não são de natureza ontogenética, mas por fatores culturais que se expressam na educação oferecida nas fases iniciais do desenvolvimento, quando as competências básicas são desenvolvidas. Mesmo assim, as diferenças em inteligência dependentes da experiência cultural não afetam a inteligência fluida.

10) Graças à ação de mecanismos de seleção, otimização e compensação, no âmbito individual ou cultural, os mais velhos não mostram necessariamente declínio no desempenho de certas tarefas normalmente desempenhadas pelos jovens. Não só isso é verdadeiro, como também os idosos podem exibir níveis elevados de desempenho altamente especializado no âmbito profissional e na solução de problemas existenciais, ou sabedoria.

Os desempenhos sábios são apontados como exemplos por excelência dos mecanismos de seleção, otimização e compensação e atestam a importância da cultura para a continuidade e o aprimoramento de competências cognitivas na velhice. Graças à capacidade de se lembrar de fatos e procedimentos, de fazer novas associações, de aventar hipóteses, de fazer análises éticas e morais e de oferecer alternativas de solução baseadas na experiência acumulada, os idosos podem apresentar padrões de comportamento que permitam ser apontados como sábios. Embora a sabedoria seja vista como fenômeno que envolva características cognitivas, motivacionais e emocionais, ela não é uma variante da inteligência medida por testes convencionais, mas sim uma manifestação de inteligência prática e uma manifestação dos mecanismos de seleção, otimização e compensação descritos por Baltes e Baltes (1990).

No laboratório, as situações mais utilizadas para a avaliação de desempenhos sábios são a revisão, o manejo e o planejamento de vida. A cada sujeito são oferecidos dilemas ou problemas existenciais de pessoas fictícias que devem ser analisados ou resolvidos por eles, em uma tarefa descrita como de “pensar alto” (o sujeito fala livremente sobre o assunto) (Staudinger, 1989; Staudinger & Baltes, 1994). As respostas são analisadas quanto a seu conteúdo por especialistas que foram informados sobre a definição operacional de sabedoria acima apontada. Um novo elemento foi introduzido no conceito por Baltes e Staudinger (2000): sabedoria é a orquestração do desenvolvimento humano em busca da excelência, tanto em termos individuais quanto coletivos.

Os autores propõem para ela uma definição operacional nos seguintes termos:

1) Excepcional conhecimento sobre os fatos da existência os quais compreendem, por exemplo, as necessidades e as motivações humanas, as trajetórias de vida, os eventos físicos, sociais e psicológicos que ocorrem na vida das pessoas, os grandes temas da existência e as relações humanas.

2) Excepcional conhecimento sobre formas de manejo das questões existenciais. Inclui as capacidades de planejar, selecionar e organizar informações relevantes à solução, fazer predições, montar cenários possíveis e interpretar a experiência precedente, por exemplo, apresentada nos provérbios e máximas de uma cultura.

3) Capacidade de considerar o contexto ao analisar os problemas existenciais. Ela consiste em levar em conta elementos tais como a idade, a posição social, os valores, os interesses, as expectativas e as prioridades dos envolvidos; a época histórica, as peculiaridades de cada um; o grau de normalidade das ocorrências (em termos de freqüência na população) e a área na qual o problema a ser resolvido está ocorrendo (família, vida pessoal, trabalho?). Neste critério está incluído também o entendimento de que a vida envolve imprevisibilidade, tensões, conflitos e ambigüidades.

4) Relativismo de valores. Implica na presença de flexibilidade ao interpretar histórias e decisões da vida; na consciência de que todos os julgamentos são relativos a um sistema de valor cultural e pessoal; na capacidade de separar seus valores, objetivos e experiências dos de outrem; em ser capaz de reconhecer que existem inúmeras interpretações e soluções diferentes para um mesmo problema, em suma, de ser capaz de julgar qual interpretação ou solução é a mais apropriada, dado um contexto particular de valor.

5) Capacidade de compreender e de lidar com a incerteza. Envolve o reconhecimento de que nunca se pode saber tudo sobre um problema ou sobre a vida de um indivíduo, de que nem tudo é previsível e de que é preciso admitir a própria ignorância. Porém, é preciso também conhecer as estratégias para lidar com a incerteza, por exemplo, construir cenários de alternativas e resultados, admitir riscos e vantagens e pressupor implicações das decisões.

De início o paradigma pragmático de sabedoria orientou-se para estudar suas manifestações apenas na velhice. Uma boa quantidade de dados mostrou que ela tem maior probabilidade de ocorrência na velhice do que em fases anteriores do desenvolvimento porque depende da experiência de vida acumulada. No entanto, ser idoso não é uma condição suficiente para a emergência da sabedoria, como apontam os estereótipos. Elementos tais como profissão, tipos de experiências sócio-históricas às quais o indivíduo esteve exposto, riqueza de experiências pessoais, personalidade e inteligência concorrem para o aparecimento de desempenhos sábios na velhice, conforme mostrado no Berlin Aging Study e em estudos do grupo de Berlim que compararam os desempenhos sábios de adultos jovens, de meia-idade e idosos. A probabilidade de sua ocorrência aumenta com a idade, porque esta acarreta acumulação de experiências relevantes, mas não existe uma relação necessária entre velhice e sabedoria. Vários autores têm investigado as raízes da sabedoria na adolescência, acreditando que é importante identificar as sementes de sabedoria, porque isso é mais coerente com o paradigma lifespan e com o objetivo de promover o aperfeiçoamento de indivíduos e de grupos.

 

Berlin Aging Study como teste do paradigma de desenvolvimento ao longo de toda a vida

Berlin Aging Study (BASE – Baltes & Mayer, 1999) é um estudo interdisciplinar realizado com idosos de 70 a 105 anos, residentes em Berlim, no antigo lado ocidental. Era uma população única, do ponto de vista de ter vivido todas as grandes mudanças históricas que o mundo, a Alemanha e a cidade de Berlim experimentaram no século XX, as quais afetaram profundamente a vida dessas coortes. Um mil novecentos e oito idosos foram selecionados por sorteio da totalidade dos cidadãos de 70 a 105 anos registrados na cidade. Foram atribuídos a sete grupos de idades sucessivas, ou coortes, com amplitude de cinco anos cada uma. Em cada uma havia igual número de homens e de mulheres. Os dados foram coletados nos anos de 1994 (N = 1.264), 1996 (N = 928) e 1997–1998 (N = 515).

Foram investigadas 32 variáveis pertencentes aos campos da Medicina Interna e da Geriatria, da Psiquiatria, da Psicologia, da Sociologia e da Política Social, compreendendo os seguintes aspectos: saúde objetiva e subjetiva e capacidade funcional; perfil de risco; necessidades de tratamento e valores biológicos de referência; história de vida e dinâmica geracional; estrutura e dinâmica da família; situação econômica e seguridade social; recursos sociais e participação social; inteligência e funcionamento intelectual; self e personalidade; relações sociais; morbidade psiquiátrica associada à idade, seus preditores e conseqüências.

A investigação dos aspectos intelectuais teve como objetivos identificar a estrutura do funcionamento intelectual, as diferenças etárias em relação ao desempenho e os correlatos das diferenças individuais e associadas à idade. Uma bateria de 14 testes computadorizados avaliou velocidade perceptual, memória, raciocínio, fluência e conhecimento. Parte deles foi acoplada a medidas médicas e psiquiátricas, que permitiram aquilatar funções neurológicas e avaliar déficits cognitivos típicos das demências. Também foram feitas comparações entre capacidades intelectuais e competências de vida diária.

O BASE mostrou que a idade é, de fato, um fator de risco para o declínio intelectual, na medida em que o funcionamento das capacidades intelectuais básicas piora nos anos mais avançados da vida. Com o envelhecimento, declinam as capacidades cognitivas dependentes de fatores genético-biológicos. A diminuição da velocidade do processamento da informação ocasiona perdas em memória e atenção, motivo pelo qual a possibilidade de realizar novas aprendizagens sofre prejuizos Os efeitos negativos da idade podem ser acentuados por doenças, por depressão, pelo estilo de vida e por oportunidades sociais e educacionais. Como grupo, as mulheres são mais afetadas pelo declínio intelectual do que os homens, em parte porque são mais longevas, em parte porque são menos saudáveis, menos educadas e mais pobres. Os idosos declinaram mais em termos intelectuais do que em termos do self e da personalidade, o que é indicativo da preservação da resiliência psicológica na velhice.

O estudo não só mostrou que existe considerável heterogeneidade na velocidade e no resultado final do declínio intelectual, como tornou claro que o funcionamento altamente competente é uma possibilidade, quando se trata do funcionamento intelectual em idade avançada. As capacidades indicadoras da inteligência cristalizada mantiveram-se estáveis até os 80 anos, quando passaram a declinar. Desempenhos menos competentes em inteligência cristalizada estiveram fortemente associados a piores condições de educação, prestígio social, classe social e renda, que não afetaram de modo significativo a inteligência fluida. Independentemente da idade, pessoas de 70 a 100 anos que tiveram experiências educacionais e profissionais mais ricas, mostraram melhor desempenho intelectual e mais freqüência de desempenhos sábios. Os idosos preservam a capacidade de aprender coisas novas, evidenciada em situação experimental: cerca de 2/3 da amostra demonstraram essa capacidade, com exceção dos portadores de demência moderada ou grave, o que significa que dificuldade para aprender é um bom indicador de demência. Os déficits cognitivos devidos à demência não ocorrem universalmente entre os muito idosos, muito embora a prevalência de déficits em capacidades básicas e de demência aumente com a idade.

Embora os idosos com boa escolaridade, prestígio social, bom nível socioeconômico e ocupação intelectualmente desafiadora mostrem nível mais alto de desempenho intelectual do que os que não desfrutaram das mesmas oportunidades, a sua taxa de declínio intelectual associada ao declínio biológico é praticamente idêntico nos dois grupos. Contudo, em virtude de sua vantagem inicial, as pessoas que tiveram um ambiente enriquecido mantêm níveis mais altos de competência na idade avançada, níveis esses que se manifestam em maior capacidade de resolver problemas do dia-a-dia (Smith & Baltes, 1999; Baltes et al., 1999; Linderberger & Reischies, 1999).

 

Considerações finais

O estabelecimento da Psicologia do Envelhecimento nas últimas décadas é uma decorrência da progressiva consolidação do paradigma de desenvolvimento ao longo de toda a vida (lifespan), consolidação essa associada ao desenvolvimento de sólidos programas de pesquisa que incluíram sua verificação empírica e que geraram considerável corpo de conhecimentos. Como qualquer outra mudança paradigmática, ela foi filha de seu tempo e decorreu dos progressos antecedentes. A nova perspectiva surgiu como uma síntese entre os conhecimentos vigentes sobre o desenvolvimento ontogenético e os novos pressupostos sobre a dinâmica da interação de variáveis genético-biológicas, socioculturais e psicológicas. Sua influência excedeu o âmbito inicial e hoje influencia o estudo do desenvolvimento em outras fases da vida e a teorização em Psicologia do Desenvolvimento.

A Psicologia do Envelhecimento deixou de ser uma psicologia do declínio, sem, no entanto, dar curso a idéias românticas sobre o envelhecimento bem-sucedido, que indicavam o rumo da ausência de doenças e do máximo de atividade e envolvimento. O modelo psicológico de envelhecimento bem-sucedido, baseado em processos de otimização seletiva com compensação, significa simplesmente fazer e ser o melhor possível com os recursos de que se dispõe. Assim, oferece um meta-modelo para a pesquisa e a intervenção em todo o espectro de experiências do envelhecimento e do desenvolvimento.

Lamentavelmente, o paradigma lifespan ainda tem trânsito limitado na Psicologia do Desenvolvimento brasileira. Nem a velhice e nem o envelhecimento fazem parte da agenda da formação dos psicólogos e de linhas de pesquisa de departamentos acadêmicos. O que existe é ainda de caráter isolado. Desconsidera-se que o envelhecimento populacional, o aumento da longevidade, a feminização da velhice, as mudanças na estrutura familiar, a pobreza e a baixa escolaridade, agravados pelas perdas normativas e não normativas do envelhecimento são condições de risco para a saúde e o bem-estar psicológico da grande maioria dos idosos. A Psicologia pode intervir precocemente no âmbito da educação, da saúde e do trabalho com o objetivo de implementar o potencial de envelhecimento bem-sucedido e de atualizar as reservas de desenvolvimento das pessoas que envelhecem. Pode atuar junto a idosos e familiares no diagnóstico e no tratamento dos déficits físicos e cognitivos e no fortalecimento da sua resiliência psicológica. Faz-se necessária a mudança paradigmática na disciplina e na profissão, que considere a heterogeneidade das experiências de velhice, seu potencial de desenvolvimento e seus efeitos sobre o curso de vida individual e o da sociedade.

 

Paul B. Baltes: perfil biográfico

Em julho de 2004, em Berlim, um emocionado e grato Paul Baltes recebeu as homenagens de três gerações de psicólogos europeus e norte americanos e de representantes das mais distinguidas academias de ciências da Europa. Foi no evento organizado pela Sociedade Max Planck para marcar sua aposentadoria, cumprindo a legislação vigente na Alemanha e as normas da própria instituição. Embora não tenha significado seu afastamento do Max Planck Institute for Human Development, que presidira durante os últimos 24 anos, e muito menos da pesquisa e dos intercâmbios internacionais, esse foi um momento de passagem em que certamente desfilaram por sua memória inúmeros instantâneos de uma vida de intensa produtividade, coleguismo e amizade. Lá estavam K. Warner Schaie, responsável pela primeira viagem de Paul e de sua esposa Margret M. Baltes aos Estados Unidos, em 1963, e Albert Bandura, psicólogo plasmado na tradição behaviorista americana, cuja teoria social cognitiva da aprendizagem evoluiu para uma teoria social-cognitiva do desenvolvimento que considera toda a extensão da vida. Na conferência de abertura, Bandura discorreu sobre suas preocupações com o bem-estar das sociedades e com a paz mundial, à luz de seus conceitos de moralidade e de auto-eficácia coletiva, dando o tom humanista para as apresentações que se sucederam. Entre os contemporâneos de Baltes, John Nesselroade e Sherry Willis eram testemunhas da elaboração de linhas de pesquisa que contribuíram para o fortalecimento das bases do paradigma. Da segunda geração, composta por ex-alunos e orientandos de Baltes, compareceram Laura M. Carstensen e Maggie F. Lachman, entre vários outros, que hoje têm forte presença na psicologia do envelhecimento americana. Entre os da terceira geração, estavam os discípulos e depois companheiros de Baltes em pesquisas desenvolvidas na Alemanha, dentre eles Ulman Linderberger, atual diretor do Max Planck Institute for Human Development em Berlim, e Ursula Staudinger, além de um grupo de cientistas mais jovens, entre eles Alexandra M. Freund e Su-Chen Li. De seu staff no Instituto destacava-se a presença de Jacqui Smith, psicóloga australiana radicada na Alemanha há mais de 20 anos e sua colaboradora próxima em vários projetos teóricos e empíricos. Nos dois dias de duração do evento-homenagem, Paul Baltes não fez nenhuma conferência, mas para quem esteve lá, o habitualmente altivo, determinado e brilhante psicólogo mostrou a face do homem que, entre a felicidade, o retraimento e a nostalgia, contemplava o conjunto de sua obra, visto pelos olhos de seus colegas, discípulos e colaboradores. As experiências científicas e afetivas propiciadas pelo evento evocaram, de forma inequívoca, que o empreendimento científico é marcado pela continuidade entre as gerações, que a geratividade lhe confere nobreza e que os temas e as circunstâncias da história pessoal dos cientistas se entrelaçam com os do período histórico no qual viveram, contribuindo para plasmar suas contribuições à ciência.

Paul B. Baltes nasceu em Saarlouis, Alemanha, em junho de 1939 e cresceu durante os anos de privações e medos da II Grande Guerra em uma família de pequenos comerciantes de posses modestas. Dos estudos secundários realizados em sua cidade natal, passou à Universidade de Saarbrücken, onde cursou Psicologia. Influenciado por Ernest Boesch, que por sua vez havia estudado com Piaget e com André Rey, no início de sua carreira Paul Baltes foi um piagetiano com interesse também pelas variações culturais e pela psicologia cultural. Em 1963, assim que concluiu o Mestrado, casou-se com Margret M. Baltes e imediatamente ambos foram para os Estados Unidos, a convite de K. Warner Schaie. Desde 1955, este estudioso desenvolvia uma pesquisa sobre o curso do desenvolvimento intelectual na vida adulta, o Seattle Longitudinal Study, que teria seguimento até os anos 1990. Com ele, Schaie estabeleceu uma nova metodologia, a de coortes seqüenciais, uma engenhosa alternativa ao método longitudinal. O ano passado na Universidade de Nebraska aproximou o jovem casal da nova metodologia, do behaviorismo e da psicologia da aprendizagem americana. A partir dessas influências já se delineavam as bases teóricas da psicologia lifespan e do modelo de desenvolvimento bem sucedido, este elaborado em parceria com Margret Baltes e chamado de modelo de otimização seletiva com compensação.

De volta à Alemanha, Baltes dedicou-se a seu doutorado, sob a orientação de Günther Reinert, sobre o desenvolvimento intelectual de crianças sob a perspectiva piagetiana, o qual incorporava o método de coortes seqüenciais. Em 1967, logo após a obtenção do título de Doutor, voltou ao Estados Unidos, novamente a convite de Schaie, agora para a Universidade de West Virginia. Os quatro anos passados nessa universidade foram de intensa produção em favor do paradigma lifespan. Datam desse período publicações de natureza metodológica, em colaboração com John Nesselroade. Outras, igualmente importantes, foram escritas em colaboração com Larry Goulet e Hayne Reese, estabelecendo os fundamentos do novo paradigma: multidimensionalidade, multidirecionalidade e multicausalidade do desenvolvimento compreendido como processo contínuo de mudanças orquestradas por influências genético-biológicas e sócio-culturais, de natureza normativa e não-normativa. Ao mesmo tempo, em colaboração com William Hoyer e Gisela Labouvie-Vief, Margret Baltes estabelecia as bases do modelo de seleção, otimização e compensação, lastreado na noção de que qualquer produto do desenvolvimento depende em grande parte das oportunidades e das restrições propiciadas pelo ambiente. Em seguida, Sherry Willis e depois Margie Lachman aproximaram-se do modelo e, um pouco mais tarde, Laura M. Carstensen, cuja teoria de seletividade sócio-emocional na velhice viria a ter expressiva presença na Psicologia do Envelhecimento a partir dos anos 1990. Em 1990, Paul e Margret Baltes publicaram uma formulação mais elaborada do modelo de seleção, otimização e compensação aplicado à velhice, cuja idéia essencial é que o envelhecimento bem sucedido depende do investimento seletivo em domínios nos quais o indivíduo resguarda o potencial de desenvolvimento e que esse investimento pode resultar em otimização da funcionalidade, compensando as perdas normativas e não-normativas acarretadas pelo envelhecimento. Hoje ele é considerado como um meta-modelo produtivo também para a explicação do desenvolvimento bem sucedido, em termos de seleção de metas, otimização dos meios para atingir essas metas e busca de compensações quando os meios disponíveis para atingi-las se tornam ausentes. A colaboração intelectual entre o casal Paul e Margret Baltes permaneceu intensa até a inesperada morte desta, ocorrida em janeiro de 1999.

Entre 1972 e 1979, Baltes trabalhou na Pennsylvania State University, onde fortaleceu o intercâmbio com pesquisadores de outras áreas interessadas no desenvolvimento humano, favorecendo as feições interdisciplinares do paradigma lifespan. Datam dessa época as colaborações com Richard Lerner, que teve importante atuação no estabelecimento do campo teórico do paradigma lifespan e em sua vinculação aos seus precursores na Filosofia (Tetens, 1736-1807 e Carus, 1789-1828) e na Psicologia do Desenvolvimento (Charlotte Bühler, 1893-1974 e Carl Gustav Jung, 1875-1961), produzida em língua alemã, e de seu intercâmbio intelectual com o paradigma de curso de vida em Sociologia representado por Bernice Neugarten (1916-2001), entre muitos outros. Outro resultado importante desse período foi o desenvolvimento, com Sherry Willis, de um programa de pesquisa descritiva e experimental sobre a inteligência na vida adulta e na velhice, o qual tinha como pressuposto a noção da plasticidade da inteligência nesses períodos da vida.

Em 1980, Paul Baltes retornou à Alemanha, a convite da Sociedade Max Planck, onde foi investido da função de Diretor de seu centro de estudos de psicologia do desenvolvimento humano, em Berlim. Entre seus planos ao retornar à terra natal, estava a condução de um estudo sobre a plasticidade da inteligência do adulto similar ao conduzido na Pennsylvania State University. Uma vez terminado esse projeto, envolveu-se em um novo desafio: a condução de um grande estudo interdisciplinar sobre a velhice avançada, mediante o método de coortes sucessivas, cobrindo os domínios biológico, psicológico e sociológico do funcionamento, referenciados a variáveis sociológicas e históricas. A queda do Muro de Berlim pareceu a Paul Baltes e Ulrich Mayer, sociólogo e co-autor do projeto, a senha de que precisavam para testar completamente o paradigma lifespan e, adicionalmente, produzir dados de interesse para a sociedade alemã. As coortes que elegeram para participantes do estudo eram formadas por testemunhas, sobreviventes e agentes dos principais eventos que marcaram a história da Alemanha e do mundo no século XX, o que lhes parecia representar uma chance inescapável de estudar as interações entre eventos normativos e não-normativos de natureza individual e cultural, na determinação das várias trajetórias de envelhecimento. Foi então planejado o Berlin Aging Study – Aging from 70 to 100 (BASE). O projeto agregou numerosos jovens cientistas a uma equipe de cientistas seniors, formando um grupo de cerca de 50 pesquisadores liderados por Baltes e Mayer. Mobilizou um grande montante de recursos públicos e privados na Alemanha. Desde 1991, o BASE vem rendendo uma impressionante massa de publicações científicas em Psicologia, Sociologia, Medicina Interna e Psiquiatria.

Pela sua obra, ele foi agraciado com numerosos prêmios, por exemplo, o Kleemeier Award da Gerontological Society of America (1991), o German Psychology Award (1994), o International Psychology Award da American Psychological Association (1995), o Aristotle Award da European Federation of Psychology (1997), o Novartis Prize da International Association of Gerontology (1999), o Ipsen Foundation Longevity Award (2000) e a German Order pour le mérite of Sciences and the Arts (2000), e foi eleito como membro estrangeiro da American Academy of Arts and Sciences e da Royal Swedish Academy of Sciences.

Recentemente, Baltes envolvera-se em novo empreendimento, a International Max Planck Research School “Life Course: Evolutionary and Ontogenetic Dynamics (LIFE)”, caracterizado pela aplicação de um enfoque integrativo e interdisciplinar ao estudo da dinâmica do desenvolvimento humano em diferentes escalas de tempo e contextos. Integram o projeto, que beneficia estudantes de doutorado e de pós-doutorado, o Max Planck Institute for Human Development, a Humboldt University e a Free University, os três em Berlim, além da University of Michigan, em Ann Arbor, e da University of Virginia, em Charlottesville, nos Estados Unidos. Foi um dos idealizadores e primeiro diretor da International Max Planck Research Network on Aging (MaxNet Aging).

Proponente de um modelo de velhice bem sucedido e defensor da idéia de que na velhice fica resguardado o potencial de desenvolvimento, do qual a sabedoria é um exemplo privilegiado, nem por isso Baltes pode ser descrito como um psicólogo romântico, daqueles que crêem que as possibilidades de desenvolvimento são infinitas e que assumem como verdade que o papel da ciência é adiar a velhice e estender ao máximo a longevidade humana. Ao contrário, ele acreditava no caráter incompleto da arquitetura do desenvolvimento humano, no caráter normativo do envelhecimento e na existência de descontinuidade entre a velhice inicial e a velhice avançada. Nesta, segundo ele, os efeitos da desorganização do organismo tornam-se cada vez mais prováveis, em um contexto no qual as sociedades não estão preparadas para fazer frente ao desafio de compensar as perdas decorrentes desse processo. À vista desses fatos, Baltes perguntava de forma incisiva, se o limite para os investimentos humanos no prolongamento da vida não deveria ser determinado pela perda de dignidade imposta por uma fase final e pela morte em meio à dependência e à perda da identidade.

Esse posicionamento em favor da liberdade, da dignidade e da autodeterminação do ser humano é uma contribuição do homem e cientista maduro à cultura. À Psicologia do Desenvolvimento e do Envelhecimento ele legou um modelo de preferência pelo trabalho científico feito em equipe, cujos componentes devem destacar-se pela excelência individual e pelo esforço contínuo. Permanecer vivo na memória dos colegas e discípulos, assim como das futuras gerações de psicólogos, representará o triunfo de seu gênio e de seu valor pessoal. Aos que lamentam seu desaparecimento fica a pergunta que nos remete ao dilema enfrentado por Ulisses e Aquiles e descrito na Ilíada: com seu espírito livre e destemido, tivesse Baltes o privilégio de escolher, teria optado por uma velhice longa, pacata e recolhida aos passatempos, como a de Ulisses condenada ao esquecimento? Ou teria escolhido uma vida relativamente breve, em que a morte sobreviria em um momento de intenso envolvimento e luta por algo em que acreditasse, como a de Aquiles, que com isso logrou permanecer para sempre na memória da posteridade?

Paul B. Baltes faleceu em Berlim, em 7 de novembro de 2006. Em 12 de janeiro de 2007 o Instituto Max Planck realizou um memorial acadêmico celebrando sua obra.

 

Referências

Bajor, J. K., & Baltes, B. B. (2003). The relationship between selective optimization with compensation, conscientiousness, motivation and performance. Journal of Vocational Behavior, 63, 347-367.        [ Links ]

Baltes, M. M. (1996). The many faces of dependency in old age. Cambridge: Cambridge University Press.

Baltes, M. M., & Carstensen, L. M. (2003). The process of successful aging: Selection, optimization and compensation. Em U. M. Staudinger & U. Linderberger (Eds.). Understanding human development. Dialogues with Lifespan Psychology (pp. 81-104). Boston: Kluwer.        [ Links ]

Baltes, M. M., Mayr, U., Borchelt, M., Maas, I., & Wilms, H. U. (1999). Everyday competence in old and very old age: Theoretical considerations and empirical findings. Em Baltes, P. B., Mayer, K. U. (Eds.). The Berlin Aging Study. Aging from 70 to 100 (pp. 384-402). Cambridge: Cambridge University Press.        [ Links ]

Baltes, P. B. (1987). Theoretical propositions of the lifespan developmental psychology: On the dynamics between growth and decline. Developmental Psychology, 23, 611-696.        [ Links ]

Baltes, P. B. (1993). The aging mind: Potential and limits. The Gerontologist, 33, 580-594.        [ Links ]

Baltes, P. B. (1997). On the incomplete architecture of human ontogeny. Selection, optimization, and compensation as foundation of developmental theory. American Psychologist, 52(4), 366-380.        [ Links ]

Baltes, P. B. (2000). Autobiographical reflections: From developmental methodology and lifespan psychology to gerontology. Em J. E. Birren & J. F. Schroots (Eds.), A history of geropsychology in autobiography (pp.1-6). Washington, DC: American Psychological Association.        [ Links ]

Baltes, P. B., & Baltes, M. M. (1990). Psychological perspectives on successful aging: The model of selective optimization with compensation. In: P. B. Baltes & M. M. Baltes (Eds). Successful aging. Perspectives from behavioral sciences (pp. 1-34). Cambridge: Cambridge University Press, 1990.        [ Links ]

Baltes, P. B., Cornelius, S. W., & Nesselroade, J. R. (1979). Cohort effects in developmental psychology. Em J. R. Nesselroade P. B. Baltes (Eds.), Longitudinal research in the study of behavior and development (pp. 61-87). New York: Academic.        [ Links ]

Baltes, B. B., & Heydens-Gahir, H. A. (2003). Reduction of work-family conflict through the use of selection, optimization and compensation behaviors. Journal of Apllied Psychology, 88, 1105-1018.        [ Links ]

Baltes, P. B., & Mayer, K. U. (1999). The Berlin Aging Study. Aging from 70 to 105. Cambridge: Cambridge University Press.        [ Links ]

Baltes, P. B., Reese, H. W., & Lipsitt, L. P. (1980). Lifespan developmental psychology. Em P. B. Baltes, O. G. Brim, Jr. (Eds.). Annual Review of Psychology, 31, 65-110.        [ Links ]

Baltes, P. B., & Smith, J. (2003), New frontiers in the future of aging: From successful aging of the young old to the dilemmas of the fourth age. The Gerontologist, 49, 123-135.        [ Links ]

Baltes, P. B., & Smith, J. (2004). Lifespan Psychology: From developmental contextualism to developmental biocultural co-construtivism. Research in Human Development, 1(3), 123-144.        [ Links ]

Baltes, P. B., & Willis, S. L. (1982). Plasticity and enhancement of intellectual functioning in old age. Penn State’s Adult Development and Enrichment Project (ADEPT). Em F. I. M. Craik & S. Trehulo (Eds.). Aging and cognitive processes (pp 353-389). New York: Plenum Press.        [ Links ]

Baltes, P. B., & Staudinger, U. M. (1996). Interactive minds. Life-Span perspectives on the social foundation of cognition. Cambridge: Cambridge University Press.        [ Links ]

Baltes, P. B., & Staudinger, U. M. (2000). A metaheuristic (pragmatic) to orchestrate mind and virtue towards excellence. American Psychologist, 55, 122-136.        [ Links ]

Bandura, A . (1997). Self-efficacy. The exercise of control. New York: Freeman.        [ Links ]

Bandura, A. (1986). Social foundations of thought and action: a social cognitive theory. Englewood Cliffs, N. J.: Prentice Hall.        [ Links ]

Bondar, A., Krampe, R. T., & Baltes, P. B. (2003). Balance takes priority over cognition: Can young and older adults deliberately control resource allocation? Berlin, Germany: Max Planck Institute for Human Development.        [ Links ]

Carstensen, L. L. (1991), Socioemotional selectivity theory: Social activity in lifespan context. Annual Review of Gerontology and Geriatrics, 11, 195-217.        [ Links ]

Carus, F. A . (1808). Psychologie. Zweiter Theil: Specialpsychologie. Leipzig: Barth & Kummer.        [ Links ]

Cummings, E. S., & Henry, W. E. (1961). Growing old: the process of disengagement. New York: Basic Books.        [ Links ]

Diehl, M. (1999), Self-development in adulthood and aging: the role of critical life events. Em C. Ryff & U. W. Marshall (Eds.). The self and society in aging processes. New York: Springer.        [ Links ]

Dowd, J. J. (1975). Aging as exchange: A preface to theory. Journal of Gerontology, 30, 584-59.        [ Links ]

Brim, O. G. Jr., & Wheeler, S. (1966). Socialization after childhood: Two essays. New York: Wiley.        [ Links ]

Bühler, C. (1935). The curve of life as studied in biographies. The Journal of Applied Psychology, 19(4),405-409.        [ Links ]

Chiriboga, D. (1975). Perceptions of well-being. Em M. F. Lowenthal, M. Thurner, & D. Chiriboga, (Eds.). Four stages of life: A comparative study of women and men facing transitions. San Francisco: Jossey-Bass.        [ Links ]

Cummings , E. & Henry, W. E. (1961). Growing old: the process of disengagement. New York: Basic Books.        [ Links ]

Erikson, E. H. (1950). Childhood and Society. Nova York: WW Nostrand.        [ Links ]

Havighurst, R. J. (1951). Developmental Tasks and Education. Nova York: Longman Green.        [ Links ]

Jung, C. (1971). The stages of life. Em J. Campbell (Ed.). The Portable Jung. New York: Viking.        [ Links ]

Freund, A. M., & Baltes, P. B. (2002a). Life-management strategies of selection, optimization and compensation: Measurement by self-report and construct validity. Journal of Personality and Social Psychology, 82, 642-662.        [ Links ]

Freund, A. M., & Baltes, P. B. (2002b). Adaptiveness of selection, optimization and compensation as strategies of life management: evidence from a preference study on proverbs. Journals of Gerontology: Serie B: Psychological Sciences and Social Sciences,57B(5), 426-434.        [ Links ]

Fung, H. H., Carstensen, L. L., & Lutz, A. M. (1999), Influence of time on social preferences: Implications for lifespan development. Psychology and Aging, 14(4), 595-604.        [ Links ]

Havighurst, R. J., & Albrecht, R. (1953). Older people. Nova York: Longmans.        [ Links ]

Heckhausen, J., Dixon, R. A., & Baltes, P. B. (1989). Gains and losses in development throught adulthood as perceived by different adult age group. Developmental Psychology, 25, 109-121.        [ Links ]

Horn, J. L., & Cattell, R. B. (1966). Age differences in primary mental ability factors. Journal of Gerontology, 21, 210-220.        [ Links ]

Kemper, S., Herman, R. E., & Lian, C. H. T. (2003). The costs of doing two things at once for young and older adults: Talking while walking, finger tapping and ignoring speech or noise. Psychology and Aging, 18, 181-192.        [ Links ]

Lang, F. R. (2000). Endings and continuity of social relationship: Maximizing intrinsic benefits within personal network near the death. Journal of Social and Personal Relationships, 17(2), 155-182.        [ Links ]

Lehman, H. C. (1953). Age and achievement. Princeton, NJ: Princeton University Press.        [ Links ]

Lerner, R. L. (1983). Developmental Psychology. Historical and philosophical perspectives. Hillsdadle: Earlbaum.        [ Links ]

Lerner, R. L., Dowling, E., & Roth, S. L. (2003). Contributions of Lifespan Psychology to the future elaboration of developmental systems theory. Em U. M. Staudinger & U. Linderberger (Eds.). Understanding human development. Dialogues with Lifespan Psychology (pp. 413-422). Boston: Kluwer.        [ Links ]

Li, S.-C., & Freund, A. (2005), Advances in Lifespan Psychology: A focus on biocultural and personal inferences. Research in Human Development, 2(1, 2), 1-23.        [ Links ]

Linderberger, U., & Reischies, F. M. (1999). Limits and potentials of intellectual functioning in old age. Em P. B. Baltes & K. U. Mayer (Eds.). The Berlin Aging Study. Aging from 70 to 100. (pp. 329-359). Cambridge: Cambridge University Press.        [ Links ]

Mather, M., Canali, T., English, T., Whitfield, S., Wais, P., Ochsner, K., Gabriel, J. D. E., & Carstensen, L. L. (2004). Amygdala responses to emotionally valenced stimuli in older and younger adults. Psychological Science, 15(4), 259-263.        [ Links ]

Mather, M., & Carstensen, L. L. (2003). Aging and attentional biases for emotional faces. Psychological Science, 14(5), 409-415.        [ Links ]

McClearn, G. E., Johamssoon, B., Berg, S., Pedersen, N. I., Ahern, F., Pettrill, S. A., & Plomin, R. (1997). Substancial genetic influence on cognitive abilities in twins 80 and more years old. Science, 276, 1560-1563.        [ Links ]

Miles, C. C., & Miles, W. R. (1932). The correlation of intelligence scores and chronological age from early to late maturity. American Journal of Psychology, 44, 44-78.        [ Links ]

Neugarten, B. L. (1968). Adult personality: Toward a psychology of the life cycle. Em B. L. Neugarten (Org.). Middle age and aging: a reader in social psychology (pp. 137-147). Chicago: University of Chicago Press, 1968.        [ Links ]

Neugarten, B. L. (1969). Continuities and discontinuities of psychological issues into adult life. Human Development, 12(129), 121-130.        [ Links ]

Quetelet, M. A. (1835). Sur l´homme et le développement de ses facultés. Paris: Bachelier.        [ Links ]

Rapp, M., Krampe, R. T., & Baltes, P. B. (2003). Preservation of skills in Alzheimer’s disease: The case of postural control. Berlin, Germany: Max Planck Institute for Human Development.        [ Links ]

Riegel, K. F. (1976). The dialectics of human development. American Psychologist, 31, 689-700.        [ Links ]

Rowe, J. W., & Kahn, R. L. (1987). Human aging: Usual and successful. Science, 233, 143-149.        [ Links ]

Rowe, J. W., & Kahn, R. L. (1997). Successful aging. The Gerontologist, 37(4), 433-440.        [ Links ]

Schaie, K. W. (1965). A general model for the study of developmental problems. Psychological Bulletin, 64, 92-107.        [ Links ]

Schaie, K. W. (1996). Intellectual Development in Adulthood. The Seattle Longitudinal Study. Cambridge: Cambridge University Press.        [ Links ]

Settersten, R. A. Jr., & Mayer, K. U. (1997). Measurement of aging, age structuring, and the life course. Annual Review of Sociology, 23, 233-261.        [ Links ]

Smith, J., & Baltes, P. B. (1990). Toward a psychology of wisdon and it ontogenesis. In R. J. Sternberg (Ed.). Wisdom: Its nature, origins and development. Cambridge: Cambridge University Press, pp. 67-120.         [ Links ]

Smith, J., & Baltes, P. B. (1999). Trends and profiles of psychological functioning in very old age. Em P. B. Baltes & K. U. Mayer (Eds). The Berlin Aging Study. Aging from 70 to 100 (pp 197-226). Cambridge: Cambridge University Press.        [ Links ]

Smith, J., Fleeson, W., Geiselmann, B., Settersten J. R. A., & Kunzman, U. (1999). Sources of well-being in very old age. Em P. B. Baltes & K. U. Mayer. The Berlin Aging Study. Aging from 70 to 100 (pp. 450-474). Cambridge: Cambridge University Press.        [ Links ]

Staudinger, U. M. (1989). The study of life review: An approach to the investigation of intellectual development across the lifespan. Berlin: Edition Sigma.        [ Links ]

Staudinger, U. M., & Baltes, P. B. (1994). Psychology of wisdom. Em R. J. Sternberg, et al.. (Eds.). Encyclopedia of intelligence, Vol. 2 (pp. 1143-1152). N.Y.: McMillan.        [ Links ]

Steen, B., & Djurfeldt, H. (1993). The gerontological and geriatric population studies in Göteborg. The Gerontology, 26, 163-169.        [ Links ]

Tetens, J. N. (1777). Philosophische Versucheüber die menschlieche Natur und ihre Entwicklung. Leipzig: Weidemanns Erben und Reich.        [ Links ]

Thomae, H. (1976). Patterns of aging. Findings of the Bonn Longitudinal Sudy of Aging. New York: Karger.        [ Links ]

Wiese, B. S., Freund, A. M., & Baltes, P. B. (2000). Selection, optimization and compensation: An action-related approach to work and partnership. Journal of Vocational Behavior, 57, 273-300.        [ Links ]

Wiese, B. S., Freund, A. M., & Baltes, P. B. (2002). Subjective career success and emotional well-being: Longitudinal predictive power of selection, optimization and compensation. Journal of Vocational Behavior, 60, 321-335.        [ Links ]

Yerkes, R. M. (1921). Psychological examining in the United State Army. Washington, DC: National Academy of Science.        [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
Anita Liberalesso Neri
E-mail: anitalbn@uol.com.br

Enviado em Outubro/2007
Aceite final em Janeiro/2008

 

 

I Conferência apresentada por ocasião da XXXVII Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Psicologia, em Florianópolis, de 25 a 28 de outubro de 2007.

Creative Commons License